Na escuridão da noite, carruagens puxadas por cavalos paravam junto de um palácio, em Lisboa, e delas saíam homens envoltos em capas e com grandes chapéus enterrados até aos olhos. Eram assim as reuniões secretas dos fidalgos que preparavam uma revolução marcada para o dia 1 de dezembro de 1640.
Mas contra quem se revoltavam estes vultos misteriosos? Contra o governo dos reis de Espanha, que mandavam em Portugal há 60 anos. O rei espanhol da altura era Filipe IV, conhecido entre nós por Filipe III, visto ser o terceiro Filipe a usar a coroa portuguesa.
Entravam na conspiração 40 fidalgos, entre os quais o dono do palácio onde se reuniam. Tinham o apoio do duque de Bragança, D. João, a quem queriam oferecer o trono depois de terem expulsado dele o rei espanhol.
Só que o duque não estava disposto a trocar a tranquilidade da sua propriedade de Vila Viçosa, onde caçava e ouvia música, pelos perigos de uma aventura que podia correr mal. Mas acabou por aceitar quando a mulher, D. Luísa de Gusmão (que até era espanhola), lhe disse que sempre seria melhor ser «rainha por um dia do que duquesa toda a vida».
Como chegaram os espanhóis
Mas como vieram os espanhóis mandar em Portugal? Tudo tinha começado em 1578, quando o nosso rei D. Sebastião desapareceu na batalha de Alcácer Quibir, em Marrocos, sem ter deixado filhos, ou seja, herdeiros da coroa. O tio-avô dele, D. Henrique, que era cardeal (uma espécie de padre muito importante), ainda foi rei durante dois anos, antes de morrer, mas isso não resolveu o problema.
Na verdade, quem tinha mais direito a ser rei de Portugal era mesmo Filipe II de Espanha, por ser filho de D. Isabel de Portugal, filha do rei português D. Manuel I, que casara com o imperador Carlos V, e, portanto, neto de D. Manuel I. Os portugueses das classes populares receberam mal a notícia de que vinha aí um rei espanhol, e teriam preferido ver no trono D. António, também neto de D. Manuel I mas não por via legal (a mãe dele não era nobre, nem mulher do pai). Este ainda reuniu um pequeno exército para travar a invasão espanhola que se anunciava, mas foi derrotado às portas de Lisboa.
Depois de alguns anos de ligação à Espanha marcados por um certo progresso, as coisas pioraram. Portugal ia mesmo tornar-se uma província espanhola. Ora, isso não agradava a ninguém: os camponeses e artesãos pagavam pesados impostos, os comerciantes empobreciam com a perda das colónias e com os ataques aos navios pelas esquadras inglesas e holandesas inimigas da Espanha, os nobres viviam afastados da corte de Madrid e eram obrigados a combaterem nas guerras do império espanhol.
E foi assim que, na tal manhã de 1 de dezembro, os 40 conspiradores se dirigiram ao palácio do governo, no Terreiro do Paço. Ali, prenderam a duquesa de Mântua, que governava Portugal em nome do rei espanhol.
Depois procuraram o secretário de estado Miguel de Vasconcelos, um português considerado traidor, que se tinha escondido dentro de um armário. Atiraram-no pela janela e, aplaudidos pela multidão que se juntara na praça, proclamaram D. João de Bragança rei de Portugal, com o nome de D. João IV.
Vinte e oito anos de guerra
Mas o pior estava para vir. É que os espanhóis não se resignavam a perder uma importante parte do seu território, que ainda por cima incluía a grande cidade portuária de Lisboa. Iria seguir-se uma guerra de 28 anos.
Por sorte, o império espanhol estava envolvido em guerras por toda a parte. Primeiro tinha sido a revolta da Catalunha. Depois, a revolta da Andaluzia. Depois, ainda, o envolvimento na Guerra dos Trinta Anos.
A Espanha não tinha tempo para respirar. Portugal teve também a sorte de contar com um bom primeiro-ministro, o conde de Castelo Melhor. Obtida a colaboração da França e da Inglaterra, pôde-se organizar com calma um bom exército.
E assim, após uma trégua de quase vinte anos em que a Espanha esteve ocupada noutros combates, começou a Guerra da Restauração. As vitórias portuguesas sobre os espanhóis foram surgindo com naturalidade. Ao mesmo tempo, os invasores holandeses eram expulsos das colónias portuguesas que tinham ocupado aproveitando o facto de o nosso país estar ligado à sua inimiga Espanha.
Por fim, em 13 de fevereiro de 1668, a Espanha reconheceu a independência de Portugal. Se és de Lisboa, deves saber que uma das mais importantes praças da capital se chama «dos Restauradores».
Este nome é uma homenagem aos 40 conspiradores de 1 de dezembro de 1640. O dia 1 de dezembro é um dos mais importantes feriados nacionais.
Este artigo foi originalmente publicado na edição nº 163 da VISÃO Júnior