Na escura noite de 3 de setembro de 1758, uma carruagem, daquelas puxadas por cavalos, foi atacada a tiro por uns homens mascarados. Passou-se isto numa ruela estreita e entre muros da zona da Ajuda, em Lisboa. Os assaltos deste género eram frequentes, e não estaríamos a falar deste se dentro da tal carruagem não estivesse… o rei de Portugal.
Mas é verdade. O rei D. José I, com a gola da capa puxada para cima e o chapéu tricórnio enterrado até aos olhos, regressava àquela hora noturna ao Palácio da Ajuda depois de ter tido um encontro amoroso secreto com uma senhora da alta nobreza, a marquesa de Távora. Alvejado a tiro, foi atingido no braço direito e na anca. Os acompanhantes levaram-no rapidamente a casa de um médico, na Junqueira, onde recebeu os necessários tratamentos. O rei voltou em seguida ao palácio, onde ficou uns meses sem sair à rua, oficialmente em convalescença de uma doença. Mas as pessoas não acreditavam…
O Marquês de Pombal
Durante esse período, iam correndo boatos acerca do atentado, e o que mais se ouvia dizer era que algumas famílias nobres queriam que o rei desaparecesse porque não gostavam nada do homem que ele escolhera para dirigir o governo. Já ouviste, certamente, falar desse homem: era o ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, mais tarde Marquês de Pombal, inimigo dos privilégios da alta nobreza. Estivessem, ou não, ligados ao atentado, não há dúvida de que os nobres poderosos eram inimigos políticos do rei e do seu ministro. E Pombal aproveitou o pretexto para abrir logo a «caça» às famílias dos marqueses de Távora e dos duques de Aveiro, acusadas, juntamente com os padres Jesuítas, de terem pago aos mascarados que dispararam contra o rei. A relação amorosa que D. José mantinha com D. Teresa de Távora, mulher do marquês Luís Bernardo de Távora, permitia-lhe estar sempre ao corrente de todos os rumores, com ou sem seu fundamento, que corriam entre a nobreza a seu respeito e a respeito do seu governo (que é como quem diz, do seu ministro).
O ‘azar’ dos Távora
Passados poucos dias, dois dos mascarados que tinham disparado contra o rei eram presos e torturados. Antes de seguirem para a forca, acusados de crime de lesa-majestade (atentado contra o rei), confessaram ter recebido ordens dos marqueses de Távora e dos duques de Aveiro. Nas semanas seguintes, a maior parte da família Távora foi presa, tal como o duque de Aveiro, o marquês de Alorna, o conde de Atouguia e o padre jesuíta Malagrida, confessor de Leonor de Távora. Se calhar já ouviste a expressão «azar dos Távora», que ainda hoje se usa aplicada a alguém que tem uma grande pouca sorte…
Torturados e julgados, foram todos condenados à morte e executados perto da Torre de Belém. Como se isto não bastasse, o palácio do duque de Aveiro foi demolido e o terreno salgado, para que nenhuma erva ali voltasse a crescer. Ficava por detrás do atual prédio dos pastéis de Belém, num sítio ainda hoje chamado Beco do Chão Salgado. A Companhia de Jesus foi ilegalizada e todos os jesuítas expulsos de Portugal e das colónias. Algumas mulheres das famílias Alorna e Aveiro que tinham conseguido escapar com vida passaram o resto dos seus dias encerradas em conventos.
Foi depois disto que o ministro Carvalho e Melo recebeu o título de Conde de Oeiras, antes de vir a obter o de Marquês de Pombal. Ao leres esta história, é natural que o consideres um homem cruel (e com razão!), mas ele, como político, fez muito para desenvolver o País. Sim, estes castigos agora fazem-nos muita impressão, mas naquele tempo ainda eram considerados naturais, quando se tratava de punir crimes graves…