Muitos pais queixam-se de que a hora de ir para a cama é sempre uma luta, de que adormecer os miúdos é tão difícil que chegam a cair no sono antes deles ou, então, que durante a noite acordam várias vezes e de manhã estão cheios de sono.
Isto pode ser um problema, visto que dormir bem é essencial para a saúde, como nos explica Filipa Pimenta, psicóloga clínica e docente e investigadora do ISPA. «É durante o sono que as crianças e os jovens segregam a hormona do crescimento. Por outro lado, garante um equilíbrio metabólico, dado que é nessa altura que se processam os lípidos (gorduras), o que é fundamental para uma gestão saudável do peso. Uma boa higiene do sono permite também a construção de imunidade, podendo, inclusive, ajudar a prevenir o desenvolvimento de células cancerígenas. Finalmente, dormir bem é essencial para uma boa regulação emocional.»
Três grandes motivos que justificam um mau sono
Novidades – A chegada de um irmão, uma educadora nova, a mudança de casa, escola ou até de horários podem fazer com que a criança tenha mais dificuldade em acalmar-se e adormecer.
Falta de rotinas – As crianças sentem-se mais confortáveis quando conseguem antecipar o que vai acontecer. A previsibilidade dá-lhes segurança, por isso, se não houver uma rotina que promova a calma antes de ir para a cama, será mais difícil que adormeçam.
Exposição a conteúdos desadequados – No caso de as crianças usarem tablets, telemóveis ou até televisão, é aconselhável que haja um controlo parental. Se tiverem acesso a conteúdos que, não sendo explicitamente violentos, os possam inquietar, isso pode refletir-se à noite. Ao verem-se sozinhos no escuro poderão sentir medo.
Estratégias para uma boa noite de sono
«Nos mais novinhos, a previsibilidade é muito importante, e treina-se desde o início», reforça Filipa Pimenta. Saber que depois do jantar há um momento de brincadeira a que se segue o banho e a ida para o quarto onde os pais leem uma história permite à criança antecipar cada um dos passos e «aceitar» a rotina e «permite-lhes autoregular-se, mesmo ao nível das emoções.»
Uma outra estratégia para garantir um adormecer tranquilo é usar objetos de transição, como peluches ou bonecos, que representam a segurança que os pais lhes dão. Ter estes objetos junto a si tranquiliza-os.
O bocejo é também uma boa técnica. «A partir dos 5 anos, as crianças já imitam o bocejo por reflexo, por isso, à noite, os pais que bocejem à vontade», aconselha a especialista. «E até podem validar o bocejo, dizendo ‘Ei, que grande bocejo, vê-se que estás cansado!’, isso permite à criança identificar no seu corpo sinais de que precisa mesmo de repousar.»
A atividade física é essencial. Uma hora por dia promove um desenvolvimento saudável e ajuda-os a gastar energias. Contudo, é de evitar que realizem atividades físicas ou mentais exigentes nas duas horas anteriores a ir para a cama.
Pessoas para um lado, tecnologia para o outro
Filipa Pimenta deixa um alerta relativo ao uso de ecrãs, seja telemóvel, tablet ou computador. «Não devem ser utilizados pelo menos uma hora antes de deitar, uma vez que emitem uma luz azul que inibe a produção de melatonina, uma hormona que prepara o corpo para o sono», sublinha. «Além de que estimulam cognitivamente a criança ou jovem. Eles ficam como que em alerta, até porque muitas vezes estão a jogar ou a ver vídeos divertidos que os fazem rir, e tudo isso fá-los despertar, que é precisamente o que não queremos.»
O ideal, como nos diz, é que os telemóveis nem sequer fiquem à noite no quarto: «As pessoas dormem num sítio da casa e a tecnologia fica noutra assoalhada.» E esta é uma nota também para os pais, já que o exemplo é muito importante. A ideia é que, antes de ir para a cama, deixem tudo na sala ou na cozinha, por exemplo.
«Vários estudos mostram que os jovens que dormem com os telemóveis no quarto acordam com as notificações, mesmo que não sejam sonoras e vejam apenas a luz do aparelho. De manhã vão estar mais cansados, mais irritados, com maior dificuldade em aprender e até na memória.» Em alguns casos, acrescenta, «as crianças mais novas revelam até alguns sintomas de hiperatividade.»
Quantas horas devem dormir?
Antes de mais, é desejável que a criança se deite a uma hora regular. «Claro que a vida é feita de imprevistos e tem de ser vivida com flexibilidade, mas tanto quanto possível a regularidade na hora de deitar é importante», avisa a psicóloga. E mesmo em período de férias não convém que varie para além de uma hora, ou seja, se costuma deitar-se às 21 horas, o ideal é que vá para a cama às 22.
Quanto ao período de sono, entre os 2 e os 4 anos, é desejável que durmam 10 a 13 horas por dia (incluindo as sestas); entre os 6 e aos 13 anos, o habitual são 9 a 11 horas.
Filipa Pimenta é autora, em parceria com Ivone Patrão, do livro A Almofada Mágica do Coelho Tomás (editora PACTOR Kids).