São conhecidos por POP (sigla de poluentes orgânicos persistentes) e há 20 anos foram alvo de uma convenção das Nações Unidas, que baniu ou limitou fortemente os 12 químicos mais nocivos. Tal como o nome indica, estas substâncias persistem no meio ambiente. E, pior que isso, são bioacumuláveis: acumulam-se nos tecidos gordos e podem provocar uma miríade de problemas de saúde graves, desde infertilidade e mau desenvolvimento dos fetos a doenças cardiovasculares, depressão e cancro.
Devido à sua perigosidade, e cumprindo as diretivas da convenção da ONU, a legislação europeia determinou que resíduos que se suspeite conterem plásticos com POP (entre os mais comuns estão químicos retardadores de chama) sejam destruídos por processos químicos ou incinerados. Ou seja, estes materiais não podem ser reciclados nem colocados em aterros.
Em Portugal, no entanto, a legislação europeia não estará a ser cumprida. Na conferência “Plásticos com poluentes orgânicos persistentes – regulamentação, barreiras e oportunidades“, organizado pela Associação Smart Waste Portugal e pelo Pacto Português para os Plásticos, agentes do setor disseram acreditar que há POP a reentrar no mercado, através da reciclagem. Isto porque as entidades gestoras de resíduos só fazem a triagem de 20% dos resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos (REEE), onde se encontra grande parte dos POP.
“Estamos muito longe do que devíamos fazer”, criticou Rui Berkemeier, especialista em resíduos da associação Zero. “Oitenta por cento dos REEE têm destinos ilegais. Não sofrem qualquer tratamento. O problema é grave a dois níveis: na recolha e no tratamento, e a responsabilidade é das entidades gestoras, que não estão a cumprir as metas das suas licenças. Uma delas recolheu só 2%, quando a meta era 65%. E o Ministério do Ambiente não faz nada sobre esta situação.”
Onde andam estes químicos? Ninguém sabe
A partir de um estudo irlandês, calcula-se que sejam produzidas em Portugal oito mil toneladas de plásticos que contêm POP. Outra estimativa aponta para a necessidade de remoção de 2 240 toneladas de plásticos com POP, presentes nos REEE. Mas as entidades gestoras removeram apenas 380 toneladas em 2019, último ano com relatórios disponíveis. “Isto só dos [20% de] REEE que foram removidos”, sublinhou Rui Berkemeier.
A VISÃO perguntou aos intervenientes o que estava a acontecer ao resto dos POP – e se havia alguma garantia de que não há plásticos com POP a reentrar no mercado ou a contaminar os nossos lençóis freáticos, através da deposição em aterro. “A Agência Portuguesa do Ambiente [APA] tem vindo a desenvolver esforços para que seja cumprida a legislação, mas não tenho dados sobre essa questão”, respondeu Cristiana Gomes, da APA, entidade responsável por implementar as políticas de Ambiente em Portugal.
O representante da Zero, por seu lado, disse apenas que “as entidades gestoras não fazem essa referência”. Finalmente, António Lorena, da consultora de Ambiente 3Drivers, lembrou que os POP irem para aterro não é o pior cenário em cima da mesa. “É pior se estiverem a entrar nos processos produtivos. A ir parar a utensílios de cozinha.” Ou seja, a maior preocupação é os POP irem parar a estações de reciclagem e voltarem à cadeia, através de plástico reciclado e transformado em novos produtos.
Em 2018, um grande estudo europeu, em que a Zero participou, analisou 420 artigos de plástico, como brinquedos, acessórios para o cabelo e utensílios de cozinha, e descobriu que 12% não respeitava a legislação europeia dos POP – tinham concentrações destes químicos acima do permitido. “O produto com maior concentração em toda a Europa foi uma guitarra de brincar, em plástico, em que 0,3% do peso total era PBDE [retardante de chama e um dos POP mais perigosos]”, diz Rui Berkemeier. “Essa guitarra foi encontrada em Portugal. Mais uma vez, estamos em primeiro. Ou em último, dependendo do ponto de vista.” O problema é particularmente grave nos brinquedos, acrescenta. “As crianças levam-nos à boca.”