Habituados a serem polémicos e a serem escrutinados sempre que tentam pôr o dedo na ferida, Nuno Markl e Diogo Faro ainda têm esperança no lado bom das redes sociais. A caminho dos 700 mil seguidores no Instagram, Nuno Markl, 49 anos, tem uma tolerância cada vez menor à estupidez. “Fui daquelas pessoas que quando a pandemia começou pensava que se calhar isto iria unir a Humanidade. Acreditei, mas rapidamente percebi que não e afinal revelou o que de pior há na espécie humana. Há uma crescente falta de empatia entre as pessoas. Veja-se o caso da fotografia que se tornou viral do recém-nascido a puxar a máscara ao cirurgião no Dubai – precisamos de pequenos ingénuos sinais de esperança”, alerta Nuno Markl. “Um ser humano apenas com dois minutos de vida e já está a ser criticado”, remata Diogo Faro. “Estamos na era do ódio pronto-a-comer, em que o primeiro instinto é ser desagradável.”
Diogo Faro, 33 anos, reconhece ter um estilo mais ácido e anda a tentar ser mais otimista, pois tem visto coisas muito bonitas nas redes sociais, casos de solidariedade e de empatia, como os vizinhos que ajudam outros vizinhos, a Caixa Solidária com recolhas de bens. “Percebo a tua descrença”, remata Faro.
“Temos tendência a olhar mais para o mal. Um comentário de ódio mexe muito mais connosco. As pessoas são muito mais vocais nas redes socais a ofender, a ameaçar, a escrever em CAPS LOCK”, enumera Diogo que conta com 111 mil seguidores no Instagram.
Na altura do assassinato da jovem Beatriz Lebre, Nuno Markl trocou algumas impressões com a mãe da jovem e ela estava surpreendida com a culpabilização da vítima. “A culpa é sempre da mulher. Mas, o Bruno Candê também deve ter feito qualquer coisa, escreviam as pessoas nas redes”, lembra Diogo. Nuno Markl analisa que “estamos crescentemente mais fechados e só socializamos nas redes sociais.”
Mas servirá o humor também para fazer ativismo? Nas suas partilhas, Diogo Faro tenta passar as suas perspetivas, às vezes com graça, outras vezes parece que só está a ralhar com o mundo, só a hostilizar e a ser agressivo. “Ainda bem que há o Markl com os seus rabiscos mais doces”, brinca. Markl, a caminho dos 50 anos, já tem muita experiência em “levar porrada” nas redes sociais. Descontraído lembra o episódio em que gerou uma ira imensa no Facebook (quando ainda o tinha aberto para a multidão) quando desenhou um cocó menina e pestanudo, a pedido do filho, na altura com cinco anos. Além de o Facebook o ter bloqueado (os riscos das nádegas são semelhantes às mamas femininas) a discussão durou muito tempo. “Nós muitas vezes tendemos a olhar as redes sociais como se fosse o mundo e a vida, mas aquilo é só um grupo”, relativiza Markl. Para Diogo “quem mais odeia fala mais alto nas redes sociais.”
As redes sociais alimentam-se também das raízes da indiferença de líderes mundiais face às alterações climáticas. “A ganância de líderes de países ou de grandes corporações, hoje com mais de 60 e 70 anos, mostra uma falta de empatia gigante para com as gerações dos 20, 30 e 40 anos, o que leva a uma desigualdade económica”, analisa Diogo. Os super ricos vão fazer colónias em Marte ou já compraram os seus bunkers, um contraste muito grande face ao número crescente de refugiados climáticos, por exemplo. Nuno Markl indigna-se cada vez mais quando vê as redes sociais, há uns anos considerado algo futurista, a servirem para propagar teorias da conspiração. A propósito, conta que a atriz Maria Vieira postou que se o Trump vencer as eleições na América, daqui a dois meses a pandemia será erradicada…
Para Nuno Markl, “há uma grande urgência da humanidade em encontrar um bode expiatório”. Diogo alerta que “a verdade perde a validade, acredita-se em vídeos sem qualquer evidência científica. Mark Zuckerberg, dono do Facebook, alimenta todo este ciclo de ódio, de deturpação da verdade, de fabricar mentiras, veja-se por exemplo, como é que o Bolsonaro foi eleito no Brasil, vai-se validando a mentira. As redes sociais só querem mais anúncios e mais dinheiro e se se mantiverem tão desreguladas como o são agora, só vão criar mais mentiras.”
Mas, como se combatem as teorias da conspiração? Questionando, por exemplo: “o que ganham os democratas em beber o sangue das criancinhas, género de mensagem espalhada pelo grupo Qanom”.
Markl, sempre na tentativa de ser agradável e educado com quem o aborda sugere: “temos de tentar entrar em diálogo, criar empatia, até mesmo com as pessoas que acreditam nessas teorias”. Diogo sabe que é contraproducente hostilizar toda a gente e quer tentar a veia mais diplomática de aproximação.
E se há assunto que suscita controvérsia nos posts é sem dúvida a questão ambiental e a urgência de combater as alterações climáticas. “Quando se tenta sensibilizar vêm sempre vozes contra que acham que gostamos mais de ursos polares do que de pessoas. O planeta é de todos e estamos lixados se acharmos que só interessa o nosso dia-a-dia. Mesmo os egoístas podem perceber que o clima também lhes vai tocar à porta”, garante Markl.
Além das ações individuais, como a reciclagem, a tentativa de comer menos carne, andar menos de carro ou de evitar usar e comprar plástico, Diogo Faro apela ao voto. “Votar em quem aponta o dedo às grandes corporações, a quem polui os rios, como as indústrias têxtil ou petrolífera. Tem de ser uma ação mais concertada e mais sistémica.”
Racismo, homossexualidade, feminismo, entre tantos outros assuntos suscetíveis de polémica, ambos os humoristas concordam que a agressividade dos comentários das pessoas sobre estes temas prende-se com o facto de existir uma recusa de reflexão. “É difícil sermos confrontados com os nossos defeitos. Mas, porque não lutarmos contra os preconceitos com que fomos educados em vez de os perpetuar?”.
Como alegações finais deste manifesto anti-egoísmo, Nuno Markl e Diogo Faro deixam conselhos. O radialista sugere: “Tentem pôr-se na pele do outro. Não recusem seja qual for o outro. A empatia é isso. Já o ativista pede que nos oiçamos mais uns aos outros. “Está tudo ligado.”
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