Dois dias e meio de mar foi o que demorámos para voltar a por os pés em terra. Desta vez já no Arquipélago dos Açores, na Ilha de São Miguel. Durante esses dois dias passei por muitos estados de espírito, passaram-me imensas ideais pela cabeça, cruzaram-se comigo milhas e milhas náuticas, alguns golfinhos e uma baleia de que não consegui reconhecer a sua espécie.
Na última noite de mar estava ansioso por começar a ver terra e portanto às 05:30 da manhã já estava desperto. Tomei o meu duche matinal que me soube tão bem, ou melhor, todos os duches que tomo de manhã aqui a bordo me sabem tão bem. Não sei porquê, são diferentes. Após ter terminado as minhas tarefas rituais, que passa apenas por me despachar a comer e a vestir, fui logo para a Ponte do navio espreitar o horizonte. A primeira impressão que tive foi de um cenário idêntico ao dos dias anteriores, de céu sobre mar e… mar. Estava tão ensonado que nem me apercebi da proximidade a que já estávamos da ilha. De repente, ali diante dos meus olhos avisto pela primeira vez uma das maravilhas que me conquistou mais tarde.
O céu ainda com muito pouca claridade, com o Sol a querer nascer pela popa do navio e na proa um monstro acima da linha do horizonte, ainda sem cor definida. À medida que a luz do dia aumentava, a ilha muito lentamente começava a exibir as suas montanhosas encostas verdes, bem como muitas das suas zonas habitadas com casinhas brancas e telha laranja. A uma velocidade constante e já com o Sol sobre nós, navegávamos ao largo da maior ilha açoreana com rumo traçado a Ponta Delgada. Previa-se um dia agradável sem grandes alterações climatéricas. Ainda assim, umas nuvens algures no horizonte relembravam-me o mês que tinha passado, há dois anos, pelo grupo central.
Pouco tempo depois tínhamos o Piloto do porto a bordo para auxiliar a manobra. O espaço no cais era apertado, mas tiradas as medidas pelo Cmt. do navio e o Piloto do porto, o Sete Cidades encosta sem problemas. Visto de fora até parece fácil. Apreciados os primeiros momentos já atracado, a sensação de descer a escada e por os pés em terra foi óptima! Estava assim cumprida a primeira etapa após 800 milhas náuticas.
Este primeiro dia em Ponta Delgada começou logo com um passeio a pé até ao centro. Ansioso por conhecer o máximo, não aguentei ficar retido no cais. A duas horas do almoço a bordo, servido sempre às 12:00, iniciei a minha pequena visita. Achei muito engraçado o percurso que fiz pois já tinha feito antes o reconhecimento no Google Maps, em modo street view. Tenho esse hábito quando vou para um local novo e a minha curiosidade, normalmente, fala mais alto.
Gostei muito do primeiro contacto. Poder andar a pé com todo o espaço à minha volta era mesmo do que estava a precisar. Durante os dias de mar o muito que andava era do meu quarto à cozinha no piso inferior, lances de escadas até à Ponte no 4º piso e pouco mais. Refrescava as ideias com as saudades que tinha de pisar território açoreano. Ainda que estando numa ilha nova, parecia que já por ali tinha andado. Passei, há dois anos, um mês entre a Ilha do Faial, Pico e São Jorge, pelo que reconhecia as fachadas dos edifícios, os desenhos da diferente calçada utilizada nos passeios, a cor azulada da água e a rocha preta proveniente destas ilhas, formadas por erupção vulcânica. Sem esquecer a cor verde destas 9 maravilhas perdidas num oceano imenso. Que sensação…
(Próxima crónica descrevo a minha passagem por esta ilha; um dos melhores dias da minha vida)
Reportagem-vídeo “A bordo do navio Sete Cidades (Episódio 2)” – on youtube