Vinod Kumar Sharma. Ou então, apenas Tittu Sharma. Assim de chama o homem que (re)construiu o nosso sidecar. É hindu (pertence à casta brahman), casado e tem três filhos, um rapaz e duas raparigas. Quando o questiono sobre a data de nascimento, olha muito seriamente para mim, faz aquele trejeito de cabeça tipicamente indiano e afirma muito categoricamente “I don’t know”. A minha expressão facial deve ter-se transformado num misto de surpresa e admiração porque ele sorriu e disse que ia pensar. Muda de posição na cadeira e atira para o ar “25 October, I think. 1960, I guess”. Ah, exclamei, é já amanhã! Novamente aquele abanar de cabeça despreocupado e desinteressado, e desvia o olhar. Não ligou nenhuma ao que eu disse, como se não fosse de todo importante para ele. Sorrio interiormente porque, para mim, seria impensável não dar importância ao meu dia de anos.
Na maior parte do tempo, podemos encontrar o Mr. Sharma sentado na sua cadeira de madeira almofadada, com o pé direito sobre a mesma e o outro no chão, a mão direita agarrada ao pé, a camisa enrodilhada sobre o peito, com a barriga proeminente à vista de todos, e a mão esquerda a apontar e emitir, de forma bastante audível, ordens, que a nós nos são incompreensíveis, para os seus empregados. Mas não me interpretem mal. Falar com o Mr. Sharma torna-se cómico porque sorri complacentemente a tudo o que dizemos, emite pequenos grunhidos como forma de resposta e apenas fala se for estritamente necessário, se os sons emitidos não o fizerem por si. É um típico indiano simpático.
Sharma Motor Cycle Depot. No cartão que me deu pode ainda ler-se “Deals and Restorer of BRITISH & AMERICAN MOTOR BIKE / CAR SCOOTER AND SPARE PARTS”. É uma pequena oficina com 35 anos, mas pelo aspeto ninguém diria, parece ter muito mais. Foi criada e gerida inicialmente pelo irmão e passou, entretanto, para o Mr. Sharma. Emprega cinco/seis pessoas, incluindo o filho, Lucky, provavelmente já a pensar na hereditariedade e continuidade do negócio. Perguntei-lhe onde arranjava e comprava todas aquelas “latas velhas”. Por toda a Índia. Tem um “agente” que procura e ele só tem de se deslocar à cidade e constatar se realmente o negócio vale a pena. A mota mais antiga que já comprou foi uma Red Indian de 1910. O carro, um Grampage de 1920.
Os clientes são, não só indianos (ricos, como fez questão de salientar), mas também japoneses, italianos, ingleses, alemães e portugueses (nós!). O gerente do hotel de cinco estrelas Le Meridien aqui em Delhi, Tarun Thukral, também o é. Fez questão de repetir o nome, de forma cerimoniosa, porque, pelos vistos, é de espantar que eu não saiba quem é este ilustre senhor. Não sei não, apenas pesquisei no Google para confirmar se escrevia bem o nome. Não vá ele ler isto mais tarde.
Por fim, quando me estava já a levantar para vir embora, perguntei se era feliz. Sorriu muito abertamente, abanou a cabeça, novamente aquele trejeito, e disse tão simplesmente “Yes, very happy. You are happy?”.
Helena Pimentel
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