Daniela Martins, mãe das gémeas luso-brasileiras tratadas com o medicamento Zolgensma (para a atrofia muscular espinhal) no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, foi ouvida esta sexta-feira na Comissão Parlamentar de Inquérito ao caso do tratamento hospitalar das crianças.

Daniela Martins recusou qualquer relação com o Presidente da República ou com o seu filho, dizendo que se gabou do assunto numa conversa informal e que “errou” e “mentiu”.

“Nunca conheci e nem me dirigi pessoalmente ao Sr. Dr. Presidente da República, ou seu filho, Sr. Dr. Nuno Rebelo de Sousa. Numa conversa, supostamente informal, vangloriei-me. Sobre isso, só posso pedir imensa desculpa, fui parva, errei, porque disse algo que não era verdade por vaidade naquele momento, mas o contexto daquela gravação é importante”, defendeu-se, esclarecendo que só conheceu a mulher de Nuno Rebelo de Sousa “anos depois”, num jantar de Natal.

A mãe das gémeas diz que foi apanhada numa “armadilha”: foi contactada através do Instagram pela TVI, “interessada em, alegadamente, fazer uma matéria sobre a evolução da medicação”. “Depois”, continua, “percebi que havia caído numa armadilha, onde fui gravada com uma câmara escondida em minha própria casa por uma pessoa que se apresentou como técnico de equipamentos”, disse.

Daniela diz que teve “consulta com os Lusíadas [Hospital] confirmada” e, na “semana seguinte”, “consulta com a mesma médica no [Hospital de] Santa Maria”. Nessa altura, acrescenta, “eu não sabia que podia ter apenas vindo a Portugal sem nenhuma marcação de consulta, às urgências, e as meninas teriam acesso ao Serviço Nacional de Saúde”, disse.

Em resposta ao deputado do PSD, António Rodrigues, Daniela Martins disse houve uma “conspiração”. “Houve manipulação” da história real. “A minha vontade de viver em Portugal e ter uma empresa, em 2016, sempre foi o meu plano, desde que me casei, antes de as minhas filhas nascerem. Mas a doença delas fez antecipar estes planos por causa da medicação. Não tinha casa comprada ou arrendada. Vim com a esperança de elas conseguirem ter acesso a este medicamento por serem portuguesas.”

Quando o deputado do PS João Paulo Correia lhe perguntou “quem são os amigos em comum” que pode ter com Nuno Rebelo de Sousa, tal como este escreveu no email enviado a Marcelo Rebelo de Sousa, respondeu: “Não sei”.

Daniela acrescentou que não sabe “como chegou a informação da histórias das meninas a Nuno Rebelo de Sousa. Não enviei emails diretamente para ele nem para a mulher. Tinha emails padrão que disparava para todo o sítio”.

Logo depois, o mesmo deputado do PS insistiu se Daniela Martins enviou ou não um email para a esposa de Nuno Rebelo de Sousa. Daniela Martins confirmou que “não”, mas o deputado mostrou na CPI o email enviado para a nora do Presidente da República. A mãe das meninas disse que iria “checar” depois a sua conta de email, tendo confirmado que aquele era o seu endereço.

Questionada por André Ventura, a mãe das gémeas negou ter enviado um email à mulher de Nuno Rebelo de Sousa, Juliana Drummond: “Não tenho conhecimento desse email.”

Quando Ventura pediu que o email fosse mostrado a Daniela Martins, uma funcionária levou o computador portátil até à mãe das crianças e a mesma reconheceu que aquele email, que tinha como destinatário final o secretário de estado da Saúde, António Lacerda Sales, tinha saído da sua caixa de correio eletrónico. No entanto, Daniela Martins afirmou: “Eu vi que saiu da minha caixa pessoal de email. Como eu disse antes… Foram feitos grupos de WhatsApp, pessoas que me ajudavam a disparar os emails”. E acrescentou: “Vou checar depois a saída da minha caixa pessoal. Não posso garantir que fui eu mesma que escrevi. Diversas pessoas tinha acesso à minha caixa de email”.

Na declaração inicial, nervosa e em lágrimas, a mãe das gémeas referiu que o processo de nacionalização das gémeas começou a 16 de Abril de 2019, quando estas tinham cinco meses de idade e quando “não havia ainda suspeita de nenhuma doença”. As crianças receberam a cidadania portuguesa a 2 e 3 de setembro de 2019 e Daniela Martins, neta de “quatro avós portugueses”, recebeu a cidadania “há mais de 15 anos”. O diagnóstico de atrofia muscular espinal das gémeas foi a 9 de Setembro de 2019, o que leva Daniela Martins a argumentar a obtenção de cidadania das crianças em 14 dias “foi notícia falsa”.

A mãe das crianças diz que, em 2019, acreditava que tinha tido ajuda ou cunha do Presidente da República porque era o que se “ouvia” no Hospital Santa Maria.

No início dos trabalhos da sessão de inquérito foi aprovada a ida de António Costa à CPI para responder aos deputados. A iniciativa do Chega foi aprovada com os votos a favor de todos os partidos da direita. PS, PAN e Livre a votarem contra e o Bloco de Esquerda e o PCP abstiveram-se. Refira-se que António Costa pode escolher responder por escrito.

A luz é escura. O silêncio inexistente. Os olhos e os ouvidos demoram a entender o que acontece. A sala está fechada à identificação. Se a respiração parasse por um instante, a vida ficava-se por ali.

A ideia de vazio é totalmente preenchida. Por desconhecimentos. Volta-se atrás na aprendizagem humana, para receber o mais recente trabalho de Henrique Pavão. Por causa da insistência do artista, fica-se sem movimento. A expectativa começa por revelar a obra. Pouco a pouco. Um som musical, uma fotografia na parede, duas caixas negras.

A surpresa colide com dois meteoritos. São destroços de ferro, caídos no Egipto, há mais de cinco mil anos, para conviverem com uma música intensa e um sapo parado. Com origem na cratera Gebel Kamil, os objetos da matéria espacial, mostram-se como mistérios, sem que haja gravidade, nem tempo nem lugar. Perante a sensação de conjunto, há um reconhecimento: cinema. Essa ficção permanente.

Henrique Pavão afirma que constrói o seu trabalho a partir de histórias, em que conjuga pormenores diferentes, de diferentes histórias, sejam objetos ou narrativas. A partir desta primeira triagem, relaciona-os numa nova e sua história.

Para o artista, há uma relação muito forte com o cinema e com a história do cinema.  Aliás, acredita que o cinema e a música são as artes mais eficazes, no sentido mais emocional da experiência.

O que mais lhe interessa explorar é a emoção como temática global. A fotografia “It’s not going to stop”, com a representação do tal sapo, é uma citação do filme Magnolia, do realizador norte-americano PT Anderson. A longa-metragem de 1999 termina com uma chuva de sapos, relacionando-se diretamente com a praga bíblica do Egipto, país onde foram também encontrados os meteoritos da exposição. Castigo? Ou redenção?

Responde Henrique Pavão, existir assim, e também, uma moral nesta exposição. Uma moral, mas não uma conclusão. A obra traz essa hipotética moral sem fim. Daí ter a peça musical em loop contínuo, que se inspira na primeira transmissão via rádio terrestre para o espaço.

“Essas mensagens ainda estão a caminho.”, afirma o artista, para sublinhar essa perpétua viagem. Existirá retorno? Será a queda de meteoritos no planeta Terra, a resposta às mensagens enviadas para o espaço? Responde-se assim ao mito do eterno retorno? Como escreve Eva Mendes, na Folha de Sala da exposição “o artista compõe uma ode à impertinência – onde a mística do som, de metalurgia e dos objetos celestes se aliam num mantra às qualidades entrópicas da transformação.”

A transformação a que nos sujeitamos perante a arte é esse espanto original, inseguro e legítimo. Para Henrique Pavão, a história da arte é uma cadeia de acontecimentos e de diferentes linguagens reinterpretadas. O que faz dessa originalidade, sempre procurada, uma quase impossibilidade. Mas a obra de arte só se estabelece quando se baseia na verdade. Para ser obra de arte, tem de ser verdadeira.

Henrique Pavão é exigente nessa pureza. Como se fosse uma consciência.

Galeria Bruno Múrias > R. Capitão Leitão 10-16, Lisboa > ter-sáb 14h-19h

Henrique Pavão (1991) estudou Escultura na Faculdade de Belas Artes de Lisboa (2013) e obteve o Mestrado em Artes Visuais (MFA) pela Malmö Art Academy (2016 – Professor Joachim Koester). Recebeu bolsas da FLAD (2022), Fundación Marcelino Botín (2021), Royal Academy of Arts Stockholm (2016) e da Fundação Calouste Gulbenkian (2015). Em 2016 foi galardoado com o Prémio Edstrandska Stiftelsens e nomeado para o Prémio Novo Banco Revelação da Fundação de Serralves. Em 2019, Henrique Pavão foi nomeado para a 13ª edição do Prémio Novos Artistas da Fundação EDP.

Em abril deste ano, o projeto colaborativo para a regeneração da bacia do Rio Mira, Guardiões do Mira, lançou, com apoio da DGArtes e do programa Odemira Criativa, o seu primeiro programa de Residências Artísticas.

De abril a junho e de setembro a novembro de 2024, oito artistas vão refletir sobre o Rio Mira e o território local, em quatro associações da região de Odemira. O JL falou com Leonor Carrilho, uma das curadoras do projeto.

O projeto Guardiões do Mira já existia numa vertente mais educativa. De onde nasce a ideia de associar também um programa de residências artísticas?

Da vontade de incluir a arte na mediação entre a comunidade e aquilo que é o Rio Mira e as suas temáticas. O programa concretiza-se pela primeira vez este ano, mas queremos que continue e que numa das próximas edições haja também residências científicas.

O que se espera que saia das residências?

Muitas vezes as residências artísticas obrigam os artistas a apresentar uma exposição ou deixar uma obra no final. Aqui preferimos não o fazer, lançando apenas o desafio aos artistas de pensarem a estrutura de cuidado, de aproximação e relação da comunidade com o Rio.

Daí a criação de caminhadas quinzenais, ao longo do Rio, gratuitas, abertas ao público e guiadas pelos artistas?

As caminhadas começaram por ser pensadas como momentos em que nos encontrávamos para discutir e partilhar reflexões sobre o que cada artista estaria a viver. Mas acabaram por transformar-se no verdadeiro objeto artístico das Residências. Percebeu-se que é neste encontro de pessoas que se cria de facto alguma coisa absolutamente nova.

Ainda é possível participar em alguma caminhada?

Dia 15 de junho realizamos a 4ª e última caminhada deste período “Primavera”. Vamos percorrer um troço do Rio Mira junto a Vila Nova de Milfontes, guiados pelas propostas da artista Adriana João e das convidadas Mariana Pestana e Fátima Teixeira. No outono haverá mais.

Haverá uma exposição final do projeto?

Sim, em novembro, numa igreja dessacralizada de Odemira. Há de refletir o processo de trabalho dos oito artistas e/ou uma obra que tenham continuado a fazer depois da residência. A meu ver, seria muito interessante que refletisse também a construção feita por cada artista em torno da sua caminhada. Foi neste momento que se gerou alguma coisa mesmo especial, que só aconteceu ali, naquele contexto em Odemira.

Qual a importância deste tipo de projetos?

Este projeto reúne várias componentes que me parecem essenciais na prática artística e na minha prática também como curadora. Pensar a ecologia de um lugar, não só do seu contexto natural, mas da própria ecologia das relações, implicarmos o nosso corpo nesse mesmo lugar, promover momentos coletivos, provocar pensamentos, reações, ou até mesmo novos objetos de mediação e experimentação com o Outro.

Também descentralizar. O país tem várias realidades. É preciso trazer a discussão ao seu lugar de origem, chamar pessoas, convocar agentes, expandir os lugares de fala, quem conta a história. Só assim conseguiremos perceber melhor o que nos rodeia e agir.

São 10h da manhã do dia 1 de junho. Ainda sobram 20 dias de Primavera, mas em São Luís, concelho de Odemira, o odor que se ergue da terra já é de Verão.

Os quase 26 graus matinais pedem água fresca, sombra e um café gelado, e são prenúncio do render da guarda que, em breve, o castanho do pó e da erva seca fará ao amarelo do tojo e da salva brava.

A poucos quilómetros de onde nos encontramos corre o Rio Mira, “o único, além do Sado, que segue de Sul para Norte”, explica o geólogo brasileiro Sergio Maraschin, “alentejano por opção” que reside em São Luís há 14 anos. Está à conversa com algumas das cerca de 30 pessoas que vão chegando à porta da Taberna da Carrasqueira.

Uns são da terra, outros acabaram de chegar de Lisboa. As apresentações intercalam-se com comentários sobre o tempo, o calor, o trabalho de cada um ou a seca preocupante, que se prevê ainda mais agreste nos meses vindouros.

Entre os presentes há artistas, curadores, cientistas, fotógrafos, estudantes, poetas, reformados. Por quão diferentes possam ser tais geografias espaciais, culturais e sociais, nas horas seguintes um único propósito uni-las-á: caminhar lado a lado.

Pela terceira vez, desde abril, a proposta, aparentemente simples, é lançada a quem se quiser juntar. Por detrás do convite está o projeto colaborativo para a regeneração da bacia do Rio Mira, Guardiões do Mira.

Com apoio da DGArtes e do programa Odemira Criativa, o projeto lançou, em abril de 2024, um Programa de Residências Artísticas, nascido “da vontade de incluir a arte na mediação entre a comunidade e aquilo que é o território local, o Rio Mira e as suas temáticas”, explica Leonor Carrilho, co-curadora do programa, juntamente com Filipa Oliveira.

De abril a junho e de setembro a novembro de 2024, dois grupos de quatro artistas, convidados por Filipa e Leonor, são acolhidos pelas associações locais Project Earth (Santa Clara-a-Velha), CACO – Associação de Artesãos de Odemira (Odemira), Cultivamos Cultura (São Luís) e Oficina na Escola (Vila Nova de Mil Fontes), onde terão tempo e espaço para refletir sobre esse grande mistério que são as relações: com a Terra, com o tempo, com o espaço e, inclusive, com o Futuro.

Além das residências, Filipa Oliveira e Leonor Carrilho planearam caminhadas quinzenais, como a que está prestes a começar, ao longo do rio, gratuitas, abertas ao público e guiadas por um dos quatro artistas, por um curador convidado e por um especialista local.

De garrafa de água na mão, pronta para começar a andar, Leonor assegura que a única orientação que deu a Sérgio Carronha, Hugo Brazão, Maja Escher e Adriana João, artistas em residência de 20 de abril a 23 de junho, “foi a de trabalharem sobre o Rio, de uma forma positiva, tentando aproximar as pessoas do mesmo”.

Para isso, e apesar de reconhecer a importância de problemáticas como a poluição da água e a diminuição do leito do Mira, a curadora defende que talvez seja mais importante refletir sobre a crescente distância física e afetiva entre o rio e as comunidades locais.

“As pessoas deixaram de olhar para o Mira como um sítio próximo das suas vidas, já ninguém lava a roupa no rio ou ensina os filhos a nadar naquelas águas”.

São precisamente essas relações de afetividade entre água, biodiversidade, solo e comunidade que interessa fomentar. […] Só se cuida aquilo que se conhece

diogo dias coutinho – fundador dos guardiões do mira

A seu lado, Diogo Dias Coutinho, um dos fundadores do projeto Guardiões do Mira, acrescenta que “são precisamente essas relações de afetividade entre água, biodiversidade, solo e comunidade que interessa fomentar”.

O poder da arte no meio de tudo isto? É que “só se cuida aquilo que se conhece”, diz Diogo, e há poucas coisas capazes de “falar sobre as histórias, as lendas, as afetividades, as memórias, as imagens e os sons como a arte”.

Além disso, continua, o pensamento artístico é talvez o único capaz de “olhar o mesmo objeto, neste caso o Rio, através de perspetivas muito diferentes”.

Afinar a observação e a escuta

A perspetiva que nos é oferecida nesta manhã de fim de Primavera é a de Maja Escher. À artista em residência na Cultivamos Cultura, juntam-se o geólogo Sérgio Marachin e o artista, performer e investigador Ritó Natálio.

“Gostava de propor que, a partir deste momento, não fôssemos só indivíduos, mas um tecido único, unido pela caminhada, que mergulhássemos numa observação e escuta intensas do que se encontra à nossa volta”, começa Maja.

Entregando cabaças vazias, à laia de alforges, a alguns dos caminhantes, a artista desafia-os a recolher pedras, paus, flores e outros elementos que espoletem reflexões ao longo do caminho. O objetivo da “investigação” coletiva, feita individualmente, é a de “afinar a observação e a escuta”.

O caminho arenoso do percurso conta, por si só, uma história tão imensa que nela caberiam milhões de vezes as 30 vidas que hoje o percorrem.

De tempos a tempos, em breves paragens, Sérgio Marachin conta-nos como o solo que esta manhã arde sob o calor de junho já esteve submerso pelo mar, foi deserto gelado e, em lugar de sapatos, já foi pisado pelos pés descalços dos primeiros hominídeos.

Ao longo de pouco mais de 5 km, os caminhantes são transportados não só através da paisagem alentejana, a precipitar para as margens do Mira, mas também através do mundo do “artista-guia”.

O movimento no espaço surge como pretexto para uma viagem coletiva ao interior de um processo criativo em construção, pautado por momentos de contemplação, reflexão e debate de ideias, de idas e vindas, de becos sem saída, de descobertas.

A proximidade ao Rio sente-se no pó das margens, que se agarra às solas dos sapatos, da mesma forma que se sente quando inscrevemos uma palavra numa pedra, algo que Sérgio Carronha propôs na caminhada que conduziu em abril, ou nos vestimos de amarelo para nos mimetizarmos entre os campos floridos, desafio de Hugo Brazão, em maio.

Sente-se ainda quando nos entregamos ao outro, de olhos vendados, explorando as possibilidades que o ato de confiar na bondade de estranhos pode oferecer, atividade que Maja está prestes a pedir ao grupo de caminhantes atrás de si.

As caminhadas, que “começaram como uma coisa mais processual”, conta Adriana João, acabaram por transformar-se num verdadeiro “objeto artístico”. Segundo a artista, a diversidade de experiências vivida em cada uma delas tem contribuído para que “todos se sintam muito estimulados”.

“Percebeu-se que é neste encontro de pessoas que vêm de vários pontos do país, artistas, convidados e conhecedores locais que se cria, de facto, alguma coisa de absolutamente novo”, acrescenta a curadora Leonor Carrilho.

À medida que avançamo pelos trilhos, o Rio ainda não está lá, mas, de certa forma, já está.

Sabê-lo por perto alimenta a imaginação, apura o olfato e o ouvido, instiga-nos a procurar o perfume de água fresca e o zumbir dos mosquitos que costumam povoar as suas margens. Essas margens que, antes de serem de lama e lodo, são de tudo o que cabe nos versos declamados por Ritó Natálio no cimo de uma colina, dando vida a ideias que ardem com mais força do que qualquer escaldão.

Percebeu-se que é neste encontro de pessoas que vêm de vários pontos do país, artistas, convidados e conhecedores locais que se cria, de facto, alguma coisa de absolutamente novo

leonor carrilho – curadora

Tal como o mar fez há 800 mil anos, as palavras de Ritó arrastam as margens colina abaixo, desenhando trilhos que serão percorridos pelos caminhantes do Futuro. Já Maja desafia aqueles do presente a vendarem os olhos, à vez, deixarem-se guiar uns pelos outros e, por fim, registarem o que “viram” em tiras de tecido, usando elementos da Natureza e lápis de cera criados pela artista com argilas da região.

“Desenvolvi estas peças de tecido como forma de oferecer às pessoas ferramentas de relação, mostrando-lhes, em micro-escala, o que eu acho que é necessário fazer quando se chega a um território específico: perceber o que lá está, entrar em relação com isso e com os nossos pares”.

A Arte enquanto território de relação

Entrar num território e trabalhá-lo artisticamente é, nas palavras de Leonor Carrilho, “muito complexo e pode soar, de certa forma, intrusivo ou superficial. É preciso ter muito cuidado”.

Nascida e crescida na região, no entanto, Maja já procura há vários anos, através do seu trabalho, uma “reconciliação” com a Terra.

Consciente de que a zona de Odemira é “um território bastante dividido em bolhas e comunidades que não comunicam entre si”, a artista chegou à conclusão que “é preciso curar as relações no território para podermos pensar num futuro ecológico da região”.

Apesar de serem naturais de Cascais e da Madeira e de viverem em Montemor o Novo e Lisboa, Sérgio Carronha e Hugo Brazão, “guias” das caminhadas anteriores, também encontraram formas de entrar no território com respeito e dignidade.

Se Maja conduziu os caminhantes através da contemplação da Natureza, Sérgio fê-los refletir sobre as leituras que se encontrava a fazer acerca das vagas migratórias da região e Hugo partilhou ideias relacionadas com a questão da cor, fundamental no seu trabalho.

À semelhança de Maja, ambos os artistas contaram com um curador convidado e um “detentor” do conhecimento local.

Sérgio fez-se acompanhar do diretor artístico da Bienal Walk and Talk, Jesse James, e de Maria Odete Oliveira, nas palavras de Leonor Carrilho “uma senhora do monte, que conhece todas as tradições, que lavava a roupa no rio que fundou o Grupo Etnográfico Gente do Alto Mira”.

Hugo Brazão conduziu a caminhada ao lado de Madalena Vitorino, coreógrafa responsável pela criação do programa Lavrar o Mar, que leva teatro, música e performances ao Interior algarvio, e Helena Loermans, holandesa que vive e tece em Odemira, há mais de 20 anos.

É preciso curar as relações no território para podermos pensar num futuro ecológico da região

maja escher – artista

Adriana João está ainda a preparar a sua, que decorrerá a 15 de junho, na companhia de Mariana Pestana, curadora-chefe do Centro de Arquitetura do Museu de Arte Contemporânea do Centro Cultural de Belém (MAC/CCB) e de Fátima Teixeira, fundadora do movimento de cidadãos de Odemira e Aljezur, Juntos Pelo Sudoeste, contra o avanço da agricultura intensiva no Litoral Alentejano.

À medida que a manhã se aproxima do fim, o grupo chega mais perto do Mira, junto do qual parará para almoçar. Lisboa está a 200 km de distância, porém, o ancoradouro sobre o qual se estendem mantas coloridas cobertas de saladas, húmus, tomate da região, pão alentejano, queijo, figos, cerejas, melancia e limonada fresca parece encontrar-se a milhares de quilómetros de distância da capital.

Neste lugar, entre a Terra, o Mar e o Rio, longe da azáfama citadina, perto da azáfama das almas inquietas, pensa-se melhor.

A brisa fresca convida à conversa e à troca de ideias, sobretudo entre Maja, Sérgio, Hugo e Adriana que, apesar de estarem em residências no mesmo concelho, vêm-se apenas quinzenalmente, durante as caminhadas.

A arte, nestes pequenos sítios, desencadeia ações e interações muito positivas. Se conseguirmos encontrar uma maneira de ligar as pessoas, a arte pode ser o processo de cura, operando, inclusive no sistema ecológico, social e até político

sérgio carronha – artista

Adriana João conta como o isolamento da aldeia lhe tem permitido dedicar-se mais à leitura, enquanto Hugo Brazão sublinha como o contacto com uma geografia diferente, e com artesãos locais e estrangeiros, das áreas da cerâmica e do têxtil, permitiram-lhe encontrar “alguma coisa que nunca encontraria no atelier”.

Sérgio comenta como, apesar de nas ruas das aldeias vizinhas a Santa Clara a Velha, onde está a trabalhar, ter encontrado comunidades separadas, sentiu que “os artistas despoletam sentimentos diferentes, são relativamente aceites”.

O artista não tem dúvidas de que “a arte nestes pequenos sítios desencadeia ações e interações muito positivas” e acredita que “se conseguirmos encontrar uma maneira de ligar as pessoas, a arte pode ser o processo de cura, operando, inclusive no sistema ecológico, social e até político”.

Chegar às margens

De facto, apesar de um dos objetivos de Diogo Dias Coutinho, ser a criação de pontes, através do Programa de Residências Artísticas, o fundador dos Guardiões do Mira confessa que “ainda há um público grande que é preciso alcançar. As pessoas acham que não pertencem, que não sabem o suficiente ou que o seu conhecimento não é relevante”.

E eis que, de repente, voltamos às margens. Até porque ser artista é viver à margem, ou talvez mesmo ser margem, moldando a forma de um rio que corre, tantas vezes, mais rápido do que gostaríamos.

Importa não esquecer, porém, o que se ouviu há pouco mais de uma hora, da boca de Sergio Maraschin, enquanto explicava de que forma o mar já esteve onde hoje há terra.

Ainda há um público grande que é preciso alcançar. As pessoas acham que não pertencem, que não sabem o suficiente ou que o seu conhecimento não é relevante

diogo dias coutinho – fundador dos guardiões do mira

As margens são móveis, como os povos, as ideias, a paisagem. Para que o Rio continue a correr para o Mar é preciso adaptar estruturas e formas de pensamento às realidades cada vez mais complexas, não só de Portugal, como de outras regiões do Mundo.

Não há receitas únicas, assegura Leonor Carrilho, para quem é importante “encontrar propostas artísticas que façam sentido em lugares e contextos rurais”, aproximando-os da arte de forma natural. “Há coisas que funcionam em Lisboa, mas não funcionam aqui, porque as pessoas vivem com horários diferentes, hábitos diferentes. Isto obriga-nos a perceber como é que as coisas funcionam e como é que a vida acontece”.

É importante encontrar propostas artísticas que façam sentido em lugares e contextos rurais. Há coisas que funcionam em Lisboa, mas não funcionam aqui, porque as pessoas vivem com horários diferentes, hábitos diferentes. Isto obriga-nos a perceber como é que as coisas funcionam e como é que a vida acontece

leonor carrilho – curadora

E sob o Sol de junho, a vida acontece lentamente. Após o almoço, a preguiça e o calor apoderam-se de todos os participantes. Há quem dê um mergulho e quem durma uma sesta à sombra de toldos coloridos. Quem sabe por quanto tempo as ideias trocadas durante a manhã ressoarõ na alma de cada um e que frutos darão.

Tudo parece possível. Há rios que mudam de direção por forças menores do que as da poesia.

Atualmente os inquilinos podem abater ao seu IRS 15% com a renda da casa até ao limite de 600 euros. A subida de 200 euros proposta pelo PS prevê que 50% (ou 100 euros) deste aumento ocorra em 2025, 25% em 2026 e 25% em 2017.

A medida, aprovada esta sexta-feira em votação final global, com os votos contra do PSD e CDS-PP e o voto favorável dos restantes partidos, entra em vigor a 1 de janeiro de 2025 pelo que terá aplicação prática em 2026 quando for entregue a declaração de IRS relativa aos rendimentos de 2025.

Aplicação da taxa reduzida de 6% do IVA da eletricidade, um projeto do Partido Socialista, foi aprovada esta sexta-feira em votação final global e entra em vigor em janeiro do próximo ano.

Em causa está a duplicação da parcela de consumo mensal de eletricidade sujeita à taxa reduzida do IVA. Passam, assim, a ser taxados a 6% os os consumos domésticos de eletricidade (para potência contratada que não ultrapasse 6,90 kVA) até aos 200 kWh por período de 30 dias. Para as famílias numerosas (com três ou mais dependentes), o consumo abrangido aumenta até aos 300 kWh por período de 30 dias.

Segundo dados do PS, a medida vai beneficiar 3,4 milhões de famílias.

O ERP ARTSOFT foi desenvolvido a pensar numa adaptação rápida às mudanças empresariais e estruturais das empresas. É uma solução que garante uma capacidade de resposta acima da média, onde é possível incorporar outras soluções ARTSOFT à medida das necessidades específicas que vão surgindo com o crescimento de qualquer negócio.

A Momel é uma das empresas a que se aplica esta descrição, como utilizadora deste software de gestão. Trata-se de uma empresa familiar fundada há mais de 30 anos que comercializa produtos para a construção civil. Otimizar processos das empresas, a melhoria para um aumento da competitividade e nível de satisfação de clientes, são o mote desta empresa de sucesso que utiliza ARTSOFT na sua gestão diária.

Do problema à solução

Ao longo dos anos, à medida que foi aumentado a gama de produtos e também as áreas de negócio, a Momel foi também aumentando o número de infraestruturas, o que por sua vez trouxe uma grande complexidade e burocracia às encomendas, fossem grandes ou pequenas, uma vez que a mercadoria estava distribuída pelos vários armazéns, o que implicava uma grande quantidade de papel desde a receção da encomenda até à expedição do material. Este crescimento do negócio levou a empresa a procurar um ERP que os pudesse auxiliar nesta gestão.

A capacidade de adaptação da solução ARTSOFT às necessidades de empresas como a Momel é uma das grandes vantagens deste ERP

Após um levantamento das ofertas de mercado que pudessem responder às necessidades da Momel, optaram por uma solução ARTSOFT com desenvolvimento específico que permite a otimização de encomendas e expedição de mercadorias de forma rápida e organizada. Através de um circuito de aprovação a encomenda é repartida pelos diversos armazéns através de terminais móveis, após cada um terminar a sua parte da encomenda é gerada uma notificação que levará à emissão da guia de transporte e/ou fatura do conjunto de mercadoria a expedir.

Mas estes são apenas alguns dos processos valiosos para a Momel a que o ARTSOFT dá resposta. Implementada pelo parceiro ARTSOFT Magikevolution, esta solução da gama Premium conta ainda com todos os processos de Gestão Comercial, Contabilidade, Ativos, toda a informação referente aos Recursos Humanos da organização, e a automatização de processos de receção, preparação e expedição de artigos, com a APP de Logística e Inventariação e as ligações a dispositivos móveis.

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“As estimativas que nós temos hoje para 2024 e para 2025, com aquilo que são as medidas do Governo, apontam para um ligeiro excedente orçamental em 2024 e 2025, [mas] nós teremos de analisar, em sede de orçamento, que margem existe para eventualmente acomodar alguma medida que possa vir da oposição no âmbito daquilo que possa vir a ser a negociação” do Orçamento do Estado para o próximo ano, declarou Joaquim Miranda Sarmento, aos jornalistas portugueses no Luxemburgo, após uma reunião do Ecofin.

A garantia do “ligeiro excedente” surge depois dos alertas do Banco de Portugal sobre um eventual retorno ao défice na sequência de medidas como as reduções fiscais e as negociações salariais na administração pública. Apesar de o ministros das Finanças admitir que o peso destas medidas ascende a centenas de milhões de euros, o Governo continua a estimar “um excedente orçamental em torno de 2%-3% do PIB [Produto Interno Bruto], que era o que estava previsto inicialmente no Orçamento para 2024”.

“Portanto, será em torno desse valor ligeiramente superior e isso permite-nos continuar a reduzir a dívida pública em cerca de 3-4 pontos percentuais, procurando chegar ao final da legislatura, em 2028, com uma dívida pública próxima de 80% do PIB”, esclareceu o governante.

O Supremo Tribunal de Justiça voltou a recusar um pedido de José Sócrates para afastar juízes da Relação de Lisboa no processo Operação Marquês. Segundo refere a Lusa, os conselheiros Celso Manata , Agostinho Torres e Vasques Osório não vêem razão para afastar Francisco Henriques e Adelina Barradas de Oliveira, os desembargadores. Em causa, na perspetiva da defesa de Sócrates, está a imparcialidade dos magistrados.

“Não existem elementos no processo que permitam considerar que a intervenção dos referidos juízes desembargadores no processo possa ser considerada suspeita nem – muito menos – que o requerente tenha indicado e provado factos objetivos que constituem motivo, sério e grave, para gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade. Pelo exposto, (…) acorda-se em indeferir o requerimento de recusa”, lê-se na decisão do Supremo, citado pela Lusa.

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