Mark Schneider liderou a maior retalhista do mundo durante os últimos oito anos mas decidiu agora resignar ao cargo de CEO, anunciou a multinacional em comunicado. O francês Freixe, que até agora era vice-presidente executivo da empresa e que liderava o negócio na América Latina (onde a Nestlé tem estado debaixo de fogo) é o sucessor. “Laurent é a escolha perfeita para a Nestlé, nesta altura. Sob a sua liderança, a Nestlé vai conseguir reforçar a sua posição como uma empresa confiável através da consistente e sustentável criação de valor”, referiu o ‘chairman’ da empresa no mesmo comunicado, Paul Bulcke.
Antes de integrar a Nestlé, Schneider foi executivo da gigante da saúde Fresenius – líder de mercado no segmento de máquinas de hemodiálise. Na retalhista, conhecida em Portugal por marcas icónicas como a Cerelac ou o leite NaN entre tantos outros produtos, Schneider focou-se em fazer crescer categorias de elevado valor acrescentado, como os alimentos para animais, o café e produtos alimentares nutricionalmente mais saudáveis.
Mas apesar de ter conseguido crescer em vários segmentos, e ter no seu palmarés a liderança de mercado de marcas como Nescafé e KitKat, os investidores têm penalizado a companhia, cujas ações desvalorizaram 14% no ano passado. Este ano, após o anúncio dos resultados semestrais, e as previsões da empresa de que as vendas vão sofrer no segundo semestre de 2024, os investidores voltaram a reagir e ofereceram uma queda de 6% aos títulos da retalhista.
Laurent Freixe assume a liderança da Nestlé a 1 de setembro. D.R.
A Nestlé tem enfrentado também uma série de constrangimentos, desde problemas na cadeia de abastecimento – supostamente causados por um problema informático – até investigações sobre a utilização de técnicas ilegais de purificação da água mineral engarrafada que vende sob a sua etiqueta. Apesar disso, a empresa tem-se concentrado em comunicar cada vez mais com os seus consumidores, falando abertamente dos projetos de desenvolvimento e investigação que passam por garantir embalagens mais sustentáveis, cadeias de valor certificadas seja ao nível da qualidade das matérias-primas seja para cumprimento de todas as diretivas de Direitos Humanos e mesmo o desenvolvimento de novos produtos.
Os suplementos alimentares, a comida para bebés com cada vez mais opções e a redução de açúcares e gorduras nos produtos comercializados têm garantido à companhia a escolha dos consumidores – apesar de nem sempre ser líquido que isso represente a aprovação do mercado de capitais.
“Haverá sempre desafios, mas temos alguns pontos fortes que são inigualáveis”, referiu Freixe aquando do anúncio da sua nomeação, que terá efeitos a partir de dia 1 de setembro, citado pelo Financial Times. “Podemos posicionar estrategicamente a Nestlé para liderar em todas as geografias em que operamos.”, admitiu.
Kamala Harris aceitou esta madrugada a nomeação do partido democrata para as presidenciais de novembro. No último dia da Convenção Nacional Democrata, a atual vice-presidente da Casa Branca fez um discurso histórico onde prometeu ser uma “presidente para todos os americanos”. “Vou ser uma presidente que nos une em torno das nossas mais elevadas aspirações”, prometeu. “Uma presidente que lidera e que ouve. Que é realista, prática e tem senso comum. E que luta sempre pelo povo americano, do tribunal até à Casa Branca. Esse tem sido o trabalho da minha vida”, acrescentou.
A sua nomeação surge um mês depois da desistência do atual Presidente dos Estados Unidos da corrida eleitoral, Joe Biden, de 81 anos. Em pouco tempo Kamala Harris conquistou elevado número de apoios para a campanha, incluindo milhões de dólares – segundo a agência de notícias Reuters – e o apoio de grandes figuras norte-americanas, como Oprah e Obama. Ao lado de Kamala Harris está Tim Waltz, o escolhido para ocupar o cargo de vice-presidente. O democrata e governador do Minnesota, aceitou a nomeação para o cargo na terceira noite da Convenção.
No primeiro discurso enquanto candidata oficial às eleições marcadas para novembro deste ano, Harris referiu-se a estas eleições como uma “uma oportunidade preciosa e fugaz de ultrapassar a amargura, cinismo e batalhas divisórias do passado”. “Sei que há pessoas com várias visões políticas a assistirem esta noite”, disse referindo-se ao público presente na Union Center, na cidade de Chicago, onde decorreu a Convenção Democrata. “E quero que saibam isto: prometo ser uma presidente para todos os americanos”, continuou.
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A sua intervenção ficou marcada pela exposição de episódios da vida pessoal e do seu percurso profissional, ao contar histórias da sua infância e procurar associar o percurso dos seus pais, imigrantes, aos ideais americanos. “América, o caminho que me trouxe aqui nas últimas semanas foi, sem dúvida, inesperado. Mas eu não sou estranha a jornadas inesperadas”, relatou. Filha de pai jamaicano e mãe indiana, Kamala Harris explicou aos presentes como é que a sua mãe emigrou para a Califórnia com apenas 19 com o sonho de ser cientista e como cresceu, junto dos irmãos, em apartamentos arrendados porque não tinham dinheiro para comprar uma casa. “Vivíamos num bonito bairro da classe trabalhadora com bombeiros, enfermeiros e trabalhadores da construção civil, onde todos cuidavam com orgulho dos seus relvados”, descreveu.
Harris procurou mostrar as similaridades da sua história com a de milhões de norte-americanos que vivem em condições semelhantes às que cresceu. “Sabemos que uma classe média forte sempre foi crítica para o sucesso da América. E que construir a classe média vai ser um objetivo definidor da minha presidência”, prometeu. “Isto é pessoal, para mim. A classe média é de onde eu venho”, defendeu.
A guerra da Ucrânia e o conflito em Gaza
Kamala Harris, ex-procuradora da Califórnia, dedicou ainda parte da sua intervenção na Convenção Democrata à enumeração de medidas concretas que tomará caso chegue à liderança da Casa Branca, especialmente na adoção de políticas externas que prometem encerrar o conflito de Gaza e continuar a defender a Ucrânia.
A candidata democrata prometeu apoiar os aliados e membros da NATO bem como garantir que os Estados Unidos têm o maior poder militar do mundo. “Como presidente, vou defender a Ucrânia e os nossos aliados da NATO”, referiu a democrata. A vice-presidente criticou ainda o adversário Trump e as suas políticas enquanto chefe de estado, lembrando que o mesmo ameaçou abandonar a Organização do Tratado do Atlântico Norte. “Como comandante suprema, vou garantir que a América tem sempre a maior e mais letal força de combate do mundo e vou cumprir a nossa obrigação sagrada para com as nossas tropas”, referiu.
Harris criticou ainda a guerra de Gaza, classificando a situação como devastadora e defendendo o direito dos palestinianos a viver em paz e segurança. “Tantas vidas inocentes perdidas, pessoas desesperadas e esfomeadas a fugirem sem parar”, descreveu. “Deixem-me ser clara: vou sempre defender o direito de Israel de se defender a si própria e vou garantir que tem a capacidade de o fazer, porque o povo de Israel nunca mais deverá ter de enfrentar o horror que uma organização terrorista chamada Hamas causou a 07 de outubro”, defendeu.
“Tantas vidas inocentes perdidas, pessoas desesperadas e esfomeadas a fugirem sem parar”, descreveu. “A dimensão do sofrimento é de partir o coração”, continuou.
Kamala encerrou a Convenção Democrata sublinhado a importância do voto e defendeu que estas eleições – que a opõem ao republicano Donald Trump – são uma oportunidade de construir um novo caminho “não como membros de qualquer partido ou fação, mas como americanos”. “Meus caros americanos, adoro o nosso país com todo o meu coração”, afirmou. “Somos os herdeiros da maior democracia na história do mundo”, concluiu.
A Convenção Nacional Democrata decorreu em Chicago, no estado do Illinois, e contou com a presença de figuras como Barack Obama, Bill Clinton, Nancy Pelosi, Joe Biden e a estrela de televisão norte-americana Oprah Winfrey. As eleições americanas, que opõem a democrata Kamala Harris e o republicano Donald Trump estão marcadas para 5 de novembro.
A Apple publicou uma nota no portal de programadores onde informa que “em breve” vai permitir que os utilizadores europeus possam escolher as apps predefinidas no iPhone para realizar várias atividades. Chamadas telefónicas, envio e receção de mensagens, o teclado, o gestor de palavras-chave são as primeiras tarefas incluídas nesta alteração, com os utilizadores a poderem, ainda este ano, optar por outras aplicações para as executar que não as aplicações predefinidas por Cupertino.
No próximo ano, a abertura deve estender-se à navegação, às traduções e aos filtros de chamadas de spam. Também nessa altura, os utilizadores vão poder apagar a App Store, a Mensagens, a Câmara, a Photos e a Safari como aplicações do iPhone. As Definições e a Telefone vão ser as únicas que não podem ser apagadas, explica o The Verge.
A abertura na escolha de predefinições já chega ao navegador de Internet, mas a Apple tem algumas alterações previstas para aí. Com uma atualização, os utilizadores que tenham o Safari como predefinido, vão ter de percorrer um ecrã com todas as opções disponíveis e onde vão poder ler uma legenda sobre cada browser para depois poder confirmar a sua escolha.
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Todas estas mudanças vão chegar aos utilizadores europeus devido a alterações nas políticas no ‘velho continente’, nomeadamente ao Regulamento dos Mercados Digitais.
O mundo nunca esteve, propriamente, em paz. Mas os acontecimentos geopolíticos dos últimos dois anos, com destaque para a invasão da Rússia à Ucrânia, fez a sociedade despertar para a necessidade de investimento em sistemas militares. E isso está a fazer com que uma nova geração de empresas, com raízes altamente tecnológicas, esteja a dar cartas na delicada, multimilionária e, por vezes, sangrenta indústria da defesa.
Helsing
CEO: Torsten Reil Origem: Alemanha
Se dúvidas existem de que a procura por soluções militares está a aumentar, a Helsing conseguiu, recentemente, um investimento chorudo, na ordem dos 450 milhões de euros. E algo que destaca esta empresa logo à partida é o facto de ter nascido na Europa, onde, durante muito tempo, a ideia de uma possível guerra parecia ter ficado no passado. A startup está a desenvolver um sistema operativo para o campo de batalha, capaz de mostrar a localização das tropas aliadas e de detetar, em poucos segundos, potenciais ameaças na área circundante. A empresa usa dados de sistemas óticos, elétricos, infravermelhos e sonares, assim como de sensores equipados a bordo de veículos militares (drones e helicópteros, p.ex.) para criar esta visão ampla do que está a acontecer no terreno. E um aspeto diferenciador é que o sistema da Helsing tanto pode ser usado nos centros de comando, como pelos militares que estão na linha de combate. A empresa não esconde que vê a Inteligência Artificial como a grande oportunidade para mudar o processamento de informação numa guerra e vai usar parte do dinheiro angariado em sistemas de computação próprios. A tecnológica pretende ainda expandir as operações para os países dos Balcãs.
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Uma das poucas imagens divulgadas publicamente do sistema operativo da Helsing AI
Anduril
CEO: Palmer Luckey Origem: EUA
Se o nome deste executivo não lhe é estranho, é porque Palmer Luckey já teve (e tem) muitas vidas: foi o aficionado da realidade virtual que vendeu a Oculus à Facebook, em 2012, por dois mil milhões de dólares. Mas é outra aventura do norte-americano que tem dado que falar. A Anduril recebeu, recentemente, um investimento de 1,6 mil milhões de dólares (cerca de 1,4 mil milhões de euros ao câmbio atual), o que catapultou a avaliação da startup para os 14 mil milhões de dólares. A empresa começou por desenvolver um sistema de proteção de fronteiras, baseado em diferentes sensores, mas rapidamente evoluiu para outras áreas, disponibilizando um arsenal de soluções: o Lattice OS como sistema operativo de suporte a operações de defesa; o FURY e o Ghost, projetos de aeronaves não tripuladas para missões de vigilância, reconhecimento e combate aéreo, estando também a desenvolver motores para foguetes, sobretudo como solução para fabricantes de mísseis.
O Ghost é um dos mais recentes projetos de desenvolvimento da Anduril
Baykar
CEO: Haluk Bayraktar Origem: Turquia
Talvez nunca tenha ouvido falar desta empresa turca, mas garantimos-lhe que para os que seguem a área militar de perto este nome já tem peso. A tecnológica especializou-se no desenvolvimento de aeronaves não tripuladas (drones) e que, com o início da guerra na Ucrânia, deu outra projeção (e dinheiro) à empresa. De tal forma que a Baykar é, por valor, atualmente o principal exportador da área militar da Turquia. O produto estrela da empresa é o Bayraktar TB2, um drone altamente versátil: é capaz de transportar cargas até 140 quilos, dispara mísseis guiados, atinge velocidades de 130 km/h e custa entre dois a cinco milhões de euros (mas fica muito abaixo do valor de um caça de combate, p.ex.). Segundo a imprensa especializada, a Baykar já comercializou este modelo para mais de 30 países, incluindo a Ucrânia, Líbia, Azerbeijão, Polónia e Roménia.
O drone Bayraktar TB2 é o produto ‘estrela’ da tecnológica turca
Shield AI
CEO: Ryan Tseng Origem: EUA
Destas quatro empresas (que são apenas os exemplos mais sonantes de uma indústria claramente em crescimento, a chamada defense tech), esta é aquela cuja missão é mais fácil de definir. A Shield AI está totalmente focada no desenvolvimento do melhor piloto de aeronaves inteiramente baseado em Inteligência Artificial, um software que apelidou de Hivemind. Na prática, utiliza sensores de imagem para gerar um mapa do ambiente circundante e para tomar decisões, em tempo real, com base nessa informação. Segundo a descrição da empresa, o Hivemind não usa sistemas como o GPS ou outras comunicações para conseguir concretizar as respetivas missões (um ponto claramente positivo em situações de combate mais difíceis). Além do software, a empresa está a apostar noutros projetos, o que inclui o ViDAR, um sensor de imagem capaz de detetar, localizar, reconhecer e monitorizar, de forma persistente, um objeto considerado de interesse, numa ampla área de ação, durante o dia ou à noite. A Shield AI também desenvolve os seus próprios drones – é o caso do V-BAT, sistema que tem uma elevada capacidade de descolagem e aterragem vertical, podendo funcionar como torre móvel de vigilância e monitorização em diferentes cenários.
O V-BAT é o sistema de drones desenvolvido pela Shield AI
“Nós não somos iguais e nunca seremos”. Ouvi a frase da boca do Chef Nuno Diniz, numa entrevista a Joana Barrios. Diniz di-la com firmeza a propósito do episódio em que um aluno de cozinha ousou tratá-lo por Nuno em vez de “Chef”. O tom altivo, áspero, seguro, que usa para afirmar a impossibilidade de ultrapassar a diferença fez-me pensar. Nos últimos 50 anos, vivemos numa democracia baseada numa ideia de igualdade formal perante a lei, que até agora ninguém parecia disposto a pôr em causa de maneira explícita, mesmo que as diferenças materiais tenham sido sempre tão grandes, que esta “igualdade” não passou nunca de uma abstração, que serve algumas boas consciências.
Mas por que me arrepiou tanto, então, a frase de Nuno Diniz, quando sei há muito que a igualdade é mais dita que real e o fosso entre os que estão por cima e os que ficaram por baixo não para de aumentar? Talvez porque Diniz diz de peito feito e voz límpida o que ao longo da minha vida ouvi sempre (e foram muitas vezes) em surdina.
Demos, então, outra vez a voz ao Chef para perceber de onde vem e como entende a diferença que lhe parece natural, incontestada e inultrapassável. “Eu pertenço a um meio social que já não se usa muito. (…) De cada vez que uma filha se casava, ia para a lua de mel logo com a criada. Portanto, havia a filha de uma das criadas da minha avó, que era despachada com a menina que casava. Isto quer dizer que eu até ter 22 ou 23 anos tive uma criada em casa, que era a Celeste. Para as pessoas com complexos, que me estejam a ouvir, ‘criada’ não é um termo depreciativo, o nome ‘criada’ é porque era criada connosco. E, portanto, era uma pessoa da família, comia connosco à mesa”, explica-nos Nuno Diniz.
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A candura com que Diniz fala de uma pessoa que é dada a outra como um objeto e impossibilitada de qualquer arbítrio sobre si mesma mostra uma naturalização da desigualdade que parece incompreensível para alguém que acredite num sistema democrático. Há aqui uma ordem natural que confere direitos e deveres à nascença: há as que nascem ‘criadas’ e os que se dispõem a criá-las e até as deixam comer à mesa.
Nuno Diniz só se engana quando diz pertencer “a um meio social que já não se usa muito”. Entende-se-lhe a nostalgia nas palavras, perante um tempo em que não seria sequer preciso explicar o que lhe parece óbvio às “pessoas com complexos”.
Mas a verdade é que o sentimento de superioridade natural que ostenta usa-se muito. Usa-se cada vez mais. Vem disfarçado de “meritocracia” (que o que não se usa tanto é a “aristocracia”). Mas essa é só mais uma forma de distinguir entre os que à nascença têm quase tudo aquilo de que precisam para vingar na vida e os que só por um acaso da sorte estatisticamente muito irrelevante lá chegarão.
Agarrados à ideia de que se se esforçarem muito, conseguirão ter sucesso, os de baixo já não se vêm como as “criadas” que são dadas às filhas casadoiras. Mas os de cima ficam libertos para se assumirem como os vencedores naturais, mesmo que as condições de partida lhes tenham dado uma vantagem praticamente insuperável.
É neste contexto que a ostentação do luxo passou a ser uma espécie de pornografia social consumida em larga escala. O luxo é um objeto de desejo para quem nunca o terá, uma afirmação grotesca de superioridade para quem o alcança. É exibido sem pudor, precisamente porque se criou a ficção de que é acessível a quem se esforce. É o “mérito” que o torna aceitável.
As vidas medem-se, mais do que nunca, pelo seu peso em ouro. Não acreditam? Há uma matemática simples de fazer. Entre 2013 e 2023, mais de 26 mil pessoas perderam a vida a tentar cruzar o Mediterrâneo. Vinham em botes precários, fugidas da guerra, da fome e da miséria. Prestamos-lhes pouca atenção e, quando o fazemos, é para as temer como invasores. Mas seguimos atentamente e com ansiedade as buscas pelas cinco pessoas que naufragaram no submarino Titan, no ano passado, e cujas fortunas somadas equivaliam a 2,6 mil milhões de dólares (mais do que o PIB de Cabo Verde). E vemos agora com detalhe as vidas dos seis milionários que naufragaram num iate de luxo ao largo da Sicília.
Nuno Diniz tem razão. “Nós não somos iguais”. Só espero que um dia possamos vir a sê-lo. E essa é a diferença que nos separa.
Falar do tempo não é só um bom desbloqueador de conversa. Falar do tempo, principalmente das condições ambientais adversas, seja das temperaturas elevadas que batem todos os recordes ou dos eventos climáticos mais intensos e mais frequentes, poderá estar no cerne de questões ligadas à saúde. Ou pior, à doença e à morte.
Entre 22 de julho e 4 de agosto morreram mais 700 pessoas do que o esperado para a época. Segundo a Direção-Geral da Saúde, o aumento foi de 19% em relação ao ano passado. As doenças do clima também são uma causa do excesso de mortalidade registado na União Europeia.
“Em maio de 2024, dos 27 Estados-membros, 15 apresentaram excesso de mortalidade. Destes, Malta, Países Baixos, Irlanda, Portugal e Áustria apresentaram os valores mais elevados de excesso de mortalidade”, destaca o boletim Estatísticas Vitais, recém-divulgado pelo Instituto Nacional de Estatística.
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Soluções É necessário melhorar o planeamento urbano, criando mais espaços verdes e melhores transportes públicos Foto: Dreamstime
Em abril, uma decisão judicial inédita veio corroborar o que muitos já sentem na pele. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, em Estrasburgo, França, deu razão a Rosmarie Wyder-Walti e Anne Mahrer, membros e representantes da organização KlimaSeniorinnen Schweiz (Associação Suíça de Mulheres Idosas para o Clima), na ação interposta contra o governo da Suíça por inação climática. O país culpado tem de tornar o combate às alterações climáticas mais eficaz, garantindo, por exemplo, que limita a emissão de gases com efeito de estufa, pelo menos, até 2030.
As Avós do Clima, como ficaram conhecidas, apoiadas pela organização ambientalista Greenpeace, representam mais de 2 500 mulheres, com 64 anos e mais, que consideraram que o governo do país onde moram não faz o suficiente para travar as alterações climáticas, deixando-as bastante suscetíveis a doenças relacionadas com o calor. Quatro senhoras relataram sofrer doenças cardíacas e respiratórias que as colocam em risco de morte em dias muito quentes. Outros membros do grupo falaram da luta que travam contra fadiga, tonturas e outros sintomas devido ao calor extremo.
Além de basearem a queixa no artigo 8º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que diz que “qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar”, as Avós do Clima também alegaram o artigo 2º, “o direito de qualquer pessoa à vida é protegido pela lei”.
1,5ºC é muito
Os efeitos nefastos das alterações climáticas na saúde humana não atingem apenas quem trabalha ao ar livre, exposto ao sol e ao calor, nem quem sofre um golpe de calor único – incidem sobretudo nos mais vulneráveis, como os mais velhos, com e sem doenças crónicas, com doenças respiratórias, diabetes, hipertensão ou outros problemas cardiovasculares.
Em causa está a menor e mais lenta capacidade de reação a uma sobrecarga cardiovascular adicional provocada por temperaturas altas, por exemplo, com ondas de calor “cinco a seis vezes mais intensas, a durarem mais tempo, entre nove e 17 dias”, explica Pedro Garrett, especialista em alterações climáticas, na antena televisiva.
“A poluição do ar, resultante primordialmente da utilização de combustíveis fósseis, é uma fonte crítica de gases com efeito de estufa e de partículas finas perigosas, incluindo PM 2.5 que, após inalação e translocação sanguínea, podem potenciar inflamação sistémica e um aumento das doenças cardiovasculares, que são as principais causas de morte globalmente. A exposição continuada a essa poluição está associada a mais de 3,5 milhões de mortes no mundo”, alerta Daniel Caldeira, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e assistente hospitalar no Hospital Universitário de Santa Maria.
Este ano tem estado a bater todos os recordes, mas o problema já vem detrás. Em 2023, 47 690 pessoas na Europa morreram em consequência do calor, o ano mais quente já registado a nível mundial e o segundo mais quente na Europa, segundo um estudo liderado pelo Instituto de Saúde Global de Barcelona (ISGlobal) e publicado na Nature Medicine.
A análise usou os registos de óbitos de 35 países, fornecidos pelo Eurostat, gabinete de estatísticas da União Europeia, e representando cerca de 543 milhões de europeus. Das 47 690 mortes registadas, um total de 47 312 terá ocorrido no período mais quente do ano, entre 29 de maio e 1 de outubro.
São os países do Sul da Europa os que registam taxas de mortalidade mais elevadas: Portugal com 136 mortes por milhão de habitantes, depois da Grécia (393 mortes por milhão), da Bulgária (229 mortes por milhão), de Itália (209 mortes por milhão), de Espanha (175 mortes por milhão) e do Chipre (167 mortes por milhão).
Segundo Joan Ballester, investigador do ISGlobal e coautor do estudo, quase metade dos dias de 2023 ultrapassaram o limite de 1,5ºC estabelecido pelo Acordo de Paris e as projeções climáticas indicam que esse limite será provavelmente excedido antes de 2027.
Restam apenas três anos, pouco mais de mil dias, para pôr em prática algumas das soluções há muito encontradas, como reduzir ou mesmo acabar com a dependência de combustíveis fósseis, investir em energias renováveis para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, melhorar o planeamento urbano, criando mais espaços verdes e mais e melhores transportes públicos, melhor conceção de edifícios e o ajuste de horários de trabalho.
O perigo dos mosquitos
Os primeiros seis meses de 2024, especialmente de fevereiro a julho, ficarão para a História da geoclimatologia mundial como o período de tempo em que mais recordes de calor foram batidos. Além de um conjunto de 15 recordes nacionais de calor (ver caixa Termómetros no vermelho), também foram ultrapassados mais 130 recordes mensais de temperatura nacional, juntamente com dezenas de milhares de máximos locais registados em estações de monitorização desde o Ártico até ao Pacífico Sul, segundo Maximiliano Herrera, climatologista especializado em estatísticas climáticas e condições meteorológicas extremas, fundador do site Extreme Temperatures Around The World (Temperaturas Extremas à Volta do Mundo).
O Serviço Copernicus para as Alterações Climáticas (C3S), da União Europeia, divulgou que junho deste ano foi o 13º mês consecutivo a bater um recorde global de calor, e o mesmo mês de 2023 já tinha sido declarado “o junho mais quente” de sempre. De acordo com a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (NOAA), julho de 2024 foi o mais quente registado no mundo desde 1850 e 0,03ºC mais quente do que julho de 2023. No dia 22 de julho deste ano, a temperatura média global do ar à superfície chegou aos 17,15ºC – foi o dia mais quente de que há registo na Terra.
Como lidar com calor extremo
Os mais vulneráveis
– Crianças nos primeiros anos de vida – Pessoas a partir dos 65 anos – Portadores de doenças crónicas – Trabalhadores no exterior, expostos ao sol e/ou ao calor – Praticantes de atividade física – Pessoas isoladas e em carência económica e social
Sintomas e consequências
– Desidratação grave – Cãibras – Agravamento de doenças crónicas – Esgotamento devido ao calor – Insolação – Morte
Prevenção
– Estar em ambientes frescos, arejados ou com ar condicionado – Beber água ou sumos naturais com regularidade, mesmo sem sede – Evitar o consumo de bebidas quentes, alcoólicas, gaseificadas, com cafeína e ricas em açúcar – Evitar a exposição direta ao sol entre as 11h e as 17h – Aplicar creme com fator de proteção solar 30 ou superior a cada duas horas – Vestir roupa leve, larga e de cor clara, de preferência de algodão – Usar chapéu e óculos de sol – Evitar fazer grandes esforços físicos, como desporto ou atividades de lazer ao ar livre – Não permanecer dentro de viaturas estacionadas ao sol – Fazer refeições leves e comer mais vezes ao dia
Fonte: Direção-Geral da Saúde
As altas temperaturas noturnas associadas a níveis de humidade elevados não dão tempo suficiente para os ecossistemas recuperarem do calor. Em junho, em Assuã, no Sul do Egito, foi registado um novo recorde nacional com 50,9ºC, e Tepache, em Sonora, o segundo maior estado do México, igualou o seu recorde nacional com 52ºC.
O enfraquecimento do fenómeno oceano-atmosférico natural El Niño – aquecimento anómalo das águas superficiais do setor centro-leste do Oceano Pacífico, predominantemente na sua faixa equatorial –, responsável por anos considerados secos ou muito secos, ainda não produziu os efeitos desejados.
Ao manter elevadas as temperaturas nas Américas, o El Niño abre caminho à proliferação dos mosquitos Aedes aegypti, transmissores de dengue, que causa febres altas e fortes dores musculares, entre outros sintomas.
No Brasil, onde a campanha de vacinação pública contra a dengue teve início em fevereiro, os casos continuam a aumentar, depois de 2023 ter registado resultados elevadíssimos: 1,6 milhões de casos, mais de um quinto de todos os notificados no mundo, e 1 094 mortes, valor máximo.
O aquecimento global está a trazer essas espécies para a Europa e os casos de dengue e de infeção pelo vírus do Nilo Ocidental estão em expansão. Em Portugal continental foram detetados, pela primeira vez, mosquitos Aedes albopictus, transmissores da dengue, no final de julho de 2017.
Fungos mais potentes
As infeções fúngicas matam cerca de 1,7 milhões de pessoas em todo o mundo por ano – mais do que a tuberculose ou a malária. Falamos de pé de atleta (Tinea pedis), infeções de tecidos moles, blastomicose (doença pulmonar causada pelo fungo Blastomyces dermatitidis), criptococose (micose causada pelos fungos Cryptococcus neoformans ou gattii presentes no ar que respiramos) ou novos agentes patogénicos como Candida auris, uma levedura com grande tolerância ao calor e capaz de se adaptar às temperaturas do corpo humano, que persegue doentes nos hospitais.
A maior longevidade dos humanos, com uma maior prevalência de doenças como obesidade ou diabetes, torna-os ainda mais frágeis e melhores hospedeiros para o desenvolvimento dos fungos.
Ameaça As secas e as tempestades de areia que nos chegam do Norte de África deixam o ar carregado de partículas finas que agravam as condições alérgicas Foto: Dreamstime
As doenças fúngicas invasivas devem-se a fungos mais virulentos e potentes, mas as alterações climáticas também influenciam a propagação de doenças fúngicas endémicas, como a coccidioidomicose ou febre do vale (doença pulmonar disseminada pelos fungos Coccidioides immitis ou posadasii) e a histoplasmose (doença respiratória causada pelo fungo dimórfico Histoplasma capsulatum).
As alterações nos padrões de precipitação e na temperatura da água costeira também podem afetar a propagação de doenças transmitidas pela água, como a E. coli e o vibrião colérico.
“Emergem novas preocupações com a vasta prevalência de microplásticos e nanoplásticos no ambiente. Essas minúsculas partículas, originárias da degradação de produtos plásticos, entram na cadeia alimentar humana através do ar, da água e de alimentos contaminados. Dados científicos recentes mostram que os microplásticos e nanoplásticos podem, por via da inflamação, aumentar o risco de aterosclerose e outros problemas cardiovasculares”, faz notar Daniel Caldeira, num artigo escrito para a VISÃO Saúde.
Muito mais alergias
Já as alergias sazonais afetam entre 25% e 30% da população portuguesa, como rinite (20% a 25%), conjuntivite ou asma (10%). Além dos espirros, da comichão e dos olhos lacrimejantes, estes incómodos individuais transformam-se depois em impactos económicos negativos, com custos com cuidados de saúde e dias de trabalho perdidos.
Na revista The Atlantic, Yingxiao Zhang e Allison L. Steiner, duas investigadoras em Ciências Atmosféricas na Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, partilharam as conclusões do seu mais recente estudo: se o mundo continuar a produzir emissões de dióxido de carbono provenientes da queima de combustíveis fósseis para a produção de energia e materiais, os EUA enfrentarão um aumento de até 200% do pólen total neste século. A temporada de alergias, habitualmente mais sentida na primavera, começará 40 dias mais cedo e durará até 19 dias mais do que hoje.
As secas e as tempestades de areia que nos chegam do Norte de África deixam o ar carregado de partículas finas que agravam as condições alérgicas – não se trata apenas de dar mais uns espirros por ano; ficamos mais suscetíveis a infeções respiratórias.
Tome nota: um aumento da temperatura global de um grau centígrado está associado, segundo um estudo publicado na revista cientifica PLOS Climate, a uma diminuição da esperança média da vida humana de aproximadamente cinco meses e uma semana.
Termómetros no vermelho
Nos primeiros seis meses deste ano foram batidos ou igualados 15 novos máximos nacionais de temperatura elevada. Além disso, foram quebrados 130 recordes mensais de temperatura nacional, bem como dezenas de milhares de máximas locais registadas em estações de monitorização do Ártico ao Pacífico Sul
28 de fevereiro Ilhas Cocos, arquipélago no oceano Índico, repetiram a temperatura mais alta de sempre com 32,8ºC, e de novo a 29 de fevereiro e a 7 de abril
6 de março Costa Rica bateu o seu recorde nacional com 41ºC em Cerro Huacalito, o qual foi novamente superado com 41,5ºC, a 23 de março, no mesmo local
12 de março Comores, país da África Austral, quebrou o seu recorde nacional com 36,2ºC no Aeroporto de Hahaya
13 de março República do Congo superou o seu recorde nacional com 39,6ºC em Impfondo
24 de março Maldivas bateu o seu recorde nacional com 35,1ºC em Hanimaadhoo, acontecendo de novo dia 11 de abril
31 de março Togo, no golfo da Guiné, quebrou o seu recorde nacional com 44ºC em Mango
3 de abril Mali registou novo máximo nacional com 48,5ºC em Kayes
10 de abril Belize teve um novo recorde, com 42,3ºC, em Barton Creek, repetindo-se a 17 de maio em Chaa Creek
24 de abril Chade igualou o seu recorde nacional com 48ºC em Faya, valor atingido novamente a 5 de junho
27 de abril Camboja ultrapassou o seu recorde nacional com 42,8ºC em Preah Vihear e Svay Leu
1 de maio Gana bateu o seu recorde nacional com 44,6ºC em Navrongo
1 de maio Laos quebrou o seu recorde nacional com 43,7ºC em Tha Ngon
29 de maio Palau, arquipélago na Oceânia, igualou o seu recorde nacional com 35ºC no Aeroporto Internacional, em Babelthuap. A 2 de junho a temperatura chegou aos 35,6ºC
7 de junho Egito tem um novo recorde nacional com 50,9ºC em Assuã
20 de junho México repetiu o seu recorde nacional com 52ºC em Tepache
Fonte: Organização Meteorológica Mundial; The Guardian
Depois de umas refrescantes semanas de silêncio, e percebendo que ninguém lhe estava a prestar atenção, André Ventura sacou da cartola um “trunfo” que lhe valeu mais uns minutos de exposição televisiva, umas horas de discussão política e alguns textos como este. Ventura exige que se faça um referendo sobre imigração, com duas perguntas, como condição para vir a aprovar o Orçamento de Estado para 2025. A ideia de arranjar um tema que nada tem a ver com o Orçamento para viabilizar o documento não é nova, pelo menos, no que diz respeito às estratégias usadas por movimentos populistas, sejam eles de esquerda ou de direita. Em tempos, na agonia da geringonça, o Bloco de Esquerda também fez depender o seu voto no Orçamento de um governo de António Costa da alteração às leis laborais, também uma matéria que nada tinha a ver com as contas do Estado (viria a votar contra, claro). Por detrás da chantagem de André Ventura, como na de (então coordenadora do Bloco) Catarina Martins, esconde-se uma confissão mais ou menos óbvia: o Chega está-se nas tintas para o Orçamento ou para qualquer que seja o seu conteúdo: se lhe dessem o referendo, assinaria de cruz o documento que há de vir na pen apresentada pelo ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, no Parlamento. Ou, mais provável, encontraria outra exigência para não ter de o fazer. É por isso que há partidos de Governo e, depois, há estes.
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Um estudo realizado por uma equipa de investigadores da Universidade de Lipscomb, no estado norte-americano do Tennessee, concluiu que várias capas e ilustrações de livros mais antigos – do final do século XIX e início do século XX – podem conter níveis elevados de toxinas nocivas para a saúde, como o chumbo e o crómio. Tal deve-se ao facto de, durante estes séculos, terem sido utilizados compostos corantes, pelos editores das obras, nas suas capas de forma a realçar a cor da obra.
“Estamos a falar de um período de tempo em que as pessoas queriam apenas o brilho, a luminosidade destes corantes”, explicou Joseph Weinstein-Webb, professor de química na Universidade Lipscomb. “Isto foi antes de compreendermos os perigos tóxicos dos metais pesados”, adicionou.
Os corantes utilizados estariam, na verdade, cheios de metais tóxicos – como o arsénio, o crómio e o chumbo – conhecidos por provocar doenças como cancro e infeções pulmonares. Analisada no âmbito do estudo, por exemplo, uma edição do livro “A mão invisível”, de Adam Smith, publicada na década de 1880, continha mais de duas vezes e meia a quantidade de chumbo permitida nos Estados Unidos atualmente.
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No total, a equipa de cientistas analisou 26 obras diferentes recorrendo a três técnicas de análise como a XRF (fluorescência de raios X), a espectroscopia de emissão ótica com plasma indutivamente acoplado – para medir a quantidade de metal presente – e, por fim, a difração de raios X, para identificar as moléculas de pigmentos específicas que continham estes metais. As descobertas levaram a biblioteca da universidade a retirar os livros do século XIX, que ainda não tinham sido testados, de circulação pública.
A investigação surge no âmbito do projeto Poison Book, uma iniciativa patrocinada pelo museu Winterthur, Garden & Library e Universidade de Delaware, criada em 2019. Este dedica-se à identificação e catalogação de livros antigos que possam provar-se um perigo para a saúde pública.
Como é que estes livros se podem tornar perigosos para a saúde?
Sendo tóxicos, estes pigmentos podem ter consequências graves para a saúde ao entrarem em contacto com as mãos quando se manuseia os livros ou através da sua inalação. A exposição prolongada a estas substâncias pode provocar doenças como o cancro, lesões pulmonares e problemas de fertilidade. “Acho fascinante saber o que as gerações anteriores pensavam ser seguro e depois ficamos a saber que, na verdade, pode não ter sido uma boa ideia utilizar estes corantes brilhantes”, explicou Weinstein-Webb.
O estudo realça um potencial risco para a saúde pública que nunca tinha sido estudado anteriormente. “Estes livros antigos com corantes tóxicos podem estar em universidades, bibliotecas públicas e coleções privadas”, contou Abigail Hoermann, estudante de química na Universidade de Lipscomb. “Por isso, queremos encontrar uma forma de facilitar a todos a descoberta da sua exposição a estes livros e a forma de os guardar em segurança”, acrescentou.
Futuramente, os investigadores pretendem desenvolver uma ferramenta que facilite a identificação destes químicos nas obras mais antigas. “Esperamos poder evitar a exposição crónica a longo prazo a metais pesados”, concluiu Weinstein-Webb,
A equipa, afeta à Universidade de Lipscomb, irá apresentar as conclusões do estudo na reunião da American Chemical Society, marcada para outubro.
Passado e presente podem ser tempos difíceis de conjugar, mas não impossíveis. Que o diga a equipa do atelier de arquitetura Openbook, a quem coube renovar o terraço do icónico hotel Ritz, hoje gerido pela cadeia Four Seasons.
O passado foi, aliás, reaproveitado para o presente, aninhado num bar circular que nasceu a partir de um edifício existente desde 1959, data em que o hotel nasceu no centro de Lisboa, com vista para o Parque Eduardo VII. Respeitaram-se a génese e a época do edifício, exemplo maior da arquitetura modernista em Portugal, e é por isso que a arquiteta e designer de interiores Diana Noronha Feio lhe chama “uma intervenção silenciosa, que veio dar uma nova vida a um espaço que precisava de ser resolvido”.
A renovação integra um projeto maior que começou, em 2015, nas antigas Galerias do Ritz (hoje Castilho 77, destinado a escritórios e onde se encontra também o restaurante japonês Kabuki), continuou nos quartos e suítes (pelo atelier OitoemPonto), já na pandemia, e desceu depois ao terraço. O resultado está à vista: uma piscina com música subaquática, que uma clientela jovem de hóspedes aproveita (e bem) numa tarde quente de agosto, e um bar de apoio que se abre para o terraço de 200 metros quadrados, agora pontuado de jardins curvilíneos. A referência direta ao trabalho do arquiteto paisagista brasileiro Burle Marx (1909-1994), que fez par com Oscar Niemeyer, trouxe o elemento orgânico (a curva) de contraste ao brutalismo do edifício.
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Já neste ano, o projeto do gabinete de arquitetura e design de interiores, sediado em Lisboa, integraria a lista dos Architizer A+Awards, que somou mais de cinco mil participações vindas de 80 países. Selecionado na categoria de Bares e Adegas, conquistou a preferência do público, posicionando a Openbook entre os 220 melhores ateliers de arquitetura ao nível internacional.
Respeitar a herança
Quem passar do lobby do Ritz há de deslumbrar-se com os enormes arranjos florais, primeiro, e os trabalhos encomendados a artistas na época: as tapeçarias de Almada Negreiros, de Sarah Afonso ou de Helena Vieira da Silva, os cavalos-marinhos esculpidos por Lagoa Henriques, a coluna revestida a azulejos em relevo de Querubim Lapa… A herança desta arte decorativa está representada nos azulejos em castanho e em cinza muito claro, desenvolvidos na fábrica Viúva Lamego, que revestem a única parede e as duas colunas do Ritz Pool Bar, perpetuando assim esse saber-fazer.
Mais do que inspirações, Diana Noronha Feio prefere falar em ideias debatidas e gizadas pela equipa da Openbook, a partir das maquetas do hotel projetado por Porfírio Pardal Monteiro. E é assim que chegamos à altura das cadeiras, ao tamanho das mesas, à cultura de esplanada dos franceses. “O mobiliário incute no comportamento”, afirma a arquiteta e designer de interiores. “Uma pessoa está tanto mais relaxada, descontraída, quanto mais baixo for o assento. Testámos isto com muitas pessoas”, conta. “Às vezes, neste trabalho”, continua, “é deitar fora o livro de Ernest Neufert, que diz quais as métricas corretas de ergonomia, e usar a fita métrica que levamos no bolso para todo o lado. As mesas não têm de ter todas 1,20 m, podem ter 80 cm, e consegue-se fazer uma refeição ligeira, sem comprometer o serviço de luxo”.
A forma circular do edifício, de tal forma sui generis, seria replicada em muitas das opções: nos tampos das mesas, na mesa de buffet, na claraboia… “O círculo acaba por ser uma forma fluída e arejada de viver o espaço e tem também que ver com o ambiente e a disposição de uma pessoa quando está numa piscina. Fomos em busca desse estado de espírito”, contextualiza.
Lá fora, um universo colorido quebra a sensação tórrida do calor e ajuda a criar ambiente – vejam-se os chapéus de sol num vibrante vermelho ou as espreguiçadeiras cor de laranja, em volta da piscina, a lembrar a forma de um boomerang. Quando terminaram o projeto, sentiram que lhe faltava qualquer coisa. E assim surgiu o castiçal Bugio, também ele um círculo chanfrado, no qual a luz da vela bate e reflete, difundindo-se na mesa.
Neste resort urbano, como lhe chama o Ritz, a carta inclui umas ostras da ria Formosa, roll de polvo à algarvia, hambúrguer de novilho, um bao de garoupa, a clássica Sandwich Club, entre outras sugestões, acompanhadas de sumos do dia espremidos na hora, um mojito ou um copo de vinho, branco ou tinto. Um brinde ao futuro.
Ritz Pool Bar > R. Rodrigo da Fonseca, 88, Lisboa > T. 21 318 1400 > seg-dom 12h-19h
Terraço As linhas orgânicas da piscina e do bar contrastam com os traços modernistas e a geometria mais formal do edifício do Ritz. O projeto de arquitetura e design de interiores da Openbook conquistou um Architizer A+Awards, na categoria de Bares e Adegas