Parafraseando o comentário duma amiga: “o gajo é bom.”
Tão bom que consegue, com o seu estilo histriónico e com linguagem de snack bar, dar a volta a um jornalista altamente competente com o José Alberto de Carvalho, não lhe respondendo a uma única pergunta.
Não sei quem é o guru da comunicação que lhe faz assessoria, mas espero que seja bem pago porque merece. Identifica previamente os pontos que pretende falar, invariavelmente os malvados imigrantes que não querem trabalhar, os ciganos e os portugueses de bem, e… aí vai disto sem pausas para respirar. É uma estratégia velha como os tempos, mas que funciona, funciona.
Mesmo instado a comprovar o que diz, acaba sempre por usar o argumento dos ignorantes, que os números são falsos (a não ser quando lhe convém ), que as pessoas sabem muito bem como as coisas se passam, que os asilados (já agora, e para quem quer ser Presidente da República, talvez fosse bom fazer um upgrade de linguagem. Os asilados são as pessoas, na sua maioria indigentes, que estão num asilo. Aqueles a que se refere são “ Requerentes de Asilo “- nomenclatura internacional e oficial) se “piraram “ ( idem à primeira parte do parênteses anterior) com 750 euros dados pelo Estado enquanto os nossos combatentes recebem… não sabe e, como tal, não disse. Ou se disse não se ouviu com a gritaria que ele próprio faz.
Comecemos então pela questão dos marroquinos que desembarcaram no Algarve.
Na altura, numa das crónicas que assinei neste mesmo espaço, referi achar estranho que nenhum tivesse solicitado asilo. Não possuo elementos para afirmar se o pedido era ou não fundamentado. Reconheço que, em muitos casos, o pedido destina-se a protelar o retorno coercivo ao país de origem.
Mas, isto dito, não quer dizer que não se apliquem as normas europeias vigentes, que determinam o direito a alojamento condigno, alimentação, apoio jurídico e de saúde. Podemos até nem concordar com o estipulado pela Europa para a aplicação genérica nestes casos, mas o que não podemos é utilizar as leis e as normas só quando nos dão jeito.
É falso que sejam os nossos impostos que pagam estas situações. Não sei se o histérico indivíduo sabe da existência de algo chamado FAMI, que é um fudo europeu destinado a este fim. E antes que o dito cujo argumente que o FAMI também advém dos nossos impostos há que dizer que todos os apoios europeus, em última análise têm a mesma origem sejam eles destinados a armamento para a defesa, seja para o apoio a economias mais anémicas.
No meio da vozearia, entendi que o tal senhor considerava que os imigrantes tinham que ser presos imediatamente. Ora bem, eles ficaram retidos até o pedido de asilo ser analisado. Mas esta análise tem um tempo limite, findo o qual, e não havendo resposta, tão pouco há razões para o aprisionamento das pessoas.
Resumindo: se aquilo é um candidato a Presidente da República, antes apoiar a monarquia. Pelo menos um rei louco não é culpa de ninguém!
Como a coisa não lhe correu propriamente bem e como a agenda da corte desse cavalheiro (perdão aos cavalheiros, sim?) é “um facto político por semana”, nada melhor que arranjar um não tema para afastar do espaço público as questões que preocupam de facto os portugueses.
E como já é costume, os partidos do “arco da governação” foram logo a correr morder o isco. Uns porque lhes dá jeito desviar a atenção daquilo que verdadeiramente interessa, outros porque lutam para não serem ultrapassados e se tornarem irrelevantes.
As únicas burcas que vi em toda a minha vida em países não muçulmanos foi em Paris e Londres. Fez-me uma enorme impressão e estou convicta que nenhuma mulher se submete a tal tortura de bom grado.
Mesmo com os nossos exemplos de épocas passadas em que as mulheres em público se cobriam da cabeça aos pés, mesmo assim não creio que o fizessem de moto próprio.
Na aldeia, que assumo como minha, as mulheres, a partir do casamento, passavam a usar cores entre o azul escuro e o preto, passando pelo cinzento e o castanho, de lenço na cabeça e xaile pelos ombros. Este e aquele obrigatoriamente negros.
Já mais velhas, e fossem ou não viúvas, amortalhavam-se em preto total da cabeça (coberta) aos pés. Faziam-no por tradição e para “não parecer mal”. Não era bem uma vontade própria mas sim uma imposição social.
Esta discussão sobre se tal era ou não uma forma de limitar a liberdade individual é coisa para levar tempo. O que sei é que, naqueles dias idos, bater na mulher era uma atitude de homem e perfeitamente consentida até mesmo pelas próprias vítimas que consideravam que tal prática era “normal”. Tal como “mulher honrada não dá nas vistas”.
Mas burca é outra coisa! Burca é algo que impede uma mulher de comer em locais públicos de forma normal, que lhe limita o raio de visão e que, sim, pode colocar em causa a sua segurança e até a dos outros. É discutível se existem outras formas de segurança, que as há, que possam ser tomadas. Pessoalmente, estou convicta que nenhuma mulher usa um traje que a limite, a submeta ou a torne alvo de olhares mais ou menos desconfiados.
Mas nada disto está em causa em Portugal onde… NÃO HÁ BURCAS, caramba!
O tal senhor que se insurge contra o facto de os nossos impostos serem desbaratados, não tem vergonha nem pejo em colocar um não assunto à discussão na Assembleia da República onde os deputados eleitos deveriam, isso sim, discutir questões prementes da nossa sociedade: o êxodo dos nossos filhos e netos a quem se oferece (segundo o mesmo interveniente) empregos a servir à mesa mesmo que tenham doutoramentos, enquanto se fomenta a imigração de pessoas altamente qualificadas, o drama da violência doméstica que continua a crescer a um ritmo assustador, o desrespeito pela juventude impedida de constituir família por não ter casa enquanto se fomenta o agrupamento familiar dos Vistos Gold, os ataques à liberdade de imprensa, a situação da Justiça que é feita cada vez mais em praça pública…
Tantos, tantos assuntos e os nossos deputados não acharam nada melhor para analisar do que a questão da liberdade das mulheres de burca. Onde, senhores? Onde?
Francamente, não entendo esta questão e sobretudo não entendo por que carga de água é ela levantada pelo individuo que, se for PR, prende todos os ilegais (já o estou a ver de cassetete a fazer patrulhas…) e cujo maior sonho é colocar todos os muçulmanos fora de Portugal.
Ora, nesse caso, para quê legislar sobre burcas? Ou os manda embora ou os despe. As duas coisas é que não!
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.