É impossível entrarmos nesta nova geladaria, no rés do chão de uma casa de 1903 na Rua Senhora da Luz, na Foz do Porto, e não nos determos a olhar para o teto e as paredes. Tudo é uma tela de pinturas datadas de 1960, da autoria de Costa Carvalho, descobertas durante as obras de recuperação deste espaço (a cargo do designer de interiores Paulo Lobo), onde outrora funcionou um talho e uma loja de lingerie. “Foi uma surpresa. Tudo isto estava tapado”, aponta António Vieira, o chefe de cozinha do Wish, no Porto, e do UVA by Calém, em Vila Nova de Gaia, que há muito planeava abrir uma geladaria.  

A paixão pela confeção de gelados nasceu há cinco anos, quando António Vieira comprou uma pequena fábrica nos arredores do Porto. Desde então, tem apurado receitas e inovado nos sabores, para os servir nos seus restaurantes e também a pedido de outros chefes. “Complementam-se com a cozinha. A confeção de um gelado é um balanceamento entre açúcares e frutos. Cada um tem uma receita própria”, diz.  

A Segreti do Chef tem mais de 80 sabores no seu portfolio, embora a loja disponha de 24 variedades que vão rodando nas vitrinas. Aos habituais baunilha, morango e chocolate juntam-se, entre outros, caramelo salgado (um dos mais procurados), amarena, bergamota, ricota com figo, açaí com banana ou maracujá, além dos sazonais – por estes dias, há maçã assada, dióspiro e romã.

“A experimentação é constante. O segredo da receita está no equilíbrio entre leite, natas e fruta de boa qualidade”, salienta António Vieira. Além de ser servido em copo (€3, dois sabores) ou cone (€3,90, três sabores), este gelado pode ser saboreado num invulgar crepe enrolado num cone de baunilha ou num waffle (€5) e coberto com ingredientes à escolha: pistácio, amendoim torrado, coco, marshmallows, peta zetas… O objetivo de António Vieira é franchisar a marca e levar a Segreti do Chef a outras zonas do País.

Os frescos descobertos nas paredes e no teto datam de 1960

Segreti do Chef > R. Senhora da Luz, 121, Porto > T. 22 318 5337 > seg-dom 10h-19h  

É quase impossível falhar a entrada do Grand Hotel Açores Atlântico, na marginal de Ponta Delgada, junto às Portas do Mar. As arcadas da fachada distinguem este edifício histórico da cidade. O guardião da porta deste cinco estrelas é o jovem trintanário Hugo Miranda, que de sorriso rasgado dá as boas-vindas aos hóspedes. A hospitalidade açoriana há de sentir-se ao longo da estada e a herança marítima transparece a cada canto. “As pessoas vivem muito a história do hotel, inspirada na Empresa Insulana de Navegação, fundada em 1871 pelos proprietários”, destaca o diretor, Jorge Xavier, chegado há unidade há pouco mais de um mês.

Do hotel, partimos a pé à descoberta de Ponta Delgada, com paragens sugeridas no Museu Carlos Machado, nas Portas da Cidade e na Igreja Matriz de São Sebastião. De carro, num fim de semana prolongado, pode explorar-se a ilha de São Miguel, a maior dos Açores, com toda a calma.

A todo o vapor

Das varandas dos quartos virados para o mar arregala-se a vista, com o imenso espelho de água do Atlântico. Ao mesmo tempo, apreciam-se os mergulhos no pesqueiro, nome dado pelos locais à piscina natural das Portas do Mar, localizada do outro lado da avenida, junto ao porto onde também atracam os navios de cruzeiro. O hotel até tem uma apetecível piscina interior de água quente, mas dar um mergulho de mar, estando a tão curta distância, é coisa a que poucos hóspedes resistem.

Os 140 quartos, de várias tipologias, estão decorados com gosto, numa combinação de madeira escura e pormenores originais, como a estrutura de veludo em verde-sálvia que serve de cabeceira e se repete na parede oposta, melhorando a insonorização e, por conseguinte, a qualidade do sono, já beneficiada pela superioridade dos têxteis de cama.

Por onde quer que se passe, do hall de entrada ao sexto andar, sucedem-se as memórias da Empresa Insulana. Maquetas de navios, mapas, um escafandro, retratos antigos e outros objetos da vida a bordo integram a decoração da autoria de Paulo Lobo, contando a história dos navios, portos e viagens feitas pela companhia marítima.

Sugere-se um percurso com início no piso 1, onde está o restaurante Balcony, aberto ao público. Depois, subir ao sexto andar e vir descendo até ao segundo, deixando o rés do chão para o final. Aqui, a ondulante escadaria central do hall faz sonhar com glamorosas viagens de paquete, assim como o ritual de ir tomar uma bebida ao final da tarde no Vapore Bar e Lounge. Fica uma curiosidade: no início do século passado, a chegada do navio da Insulana aos portos açorianos designava-se como Dia de São Vapor, e era uma festa. Que assim seja a estada no Grand Hotel Açores Atlântico, onde todos são bem-vindos a bordo.

Grand Hotel Açores Atlântico > Av. Infante D. Henrique, 113, Ponta Delgada, São Miguel > T. 296 302 200 > a partir de €180

Viajar no prato

O Balcony, restaurante do hotel, merece uma visita por si só

Os jantares vínicos acontecem duas vezes por ano, em março e em novembro. Consecutivamente esgotados, convidam a uma viagem enogastronómica sempre diferente, com um menu especial e um produtor vinícola convidado. “Muitas vezes começam e terminam nos Açores, mas vamos a outras regiões, aliando muito daquilo que é o nosso produto local. Têm um quê de vinho, produto e cultura e implicam uma investigação profunda”, diz o chefe de cozinha, José Gala. Nesta edição, viajou-se pelo Tejo, ao sabor de ostras, salicórnia e algas, peixe seco, codorniz, coelho, marmelada e café da ilha Terceira. Para acompanhar, os vinhos de influência atlântica da Quinta do Chocapalha, “arintos com frescura, um branco com mais madeira, um tinto feito com castelão”, explica o chefe de sala, Acácio Oliveira, que criou a carta de vinhos do Balcony com base na diversidade. Tem cerca de 150 referências “e algumas coisas pelas quais marcamos a diferença, caso dos vinhos sem álcool e dos sem sulfitos”.

Foto: DR

O Balcony serve jantares à carta ou com menu de degustação. “É uma cozinha de sabor com identidade, um fine dining de conforto. Os Açores têm muitos produtos, chamamos a atenção para isso, depois vamos ao que o País também tem de bom”, diz o chefe. No final de novembro, a nova carta há de trazer outros sabores, “mas há coisas que não retiramos, como o nosso arroz cremoso feito com as algas do Faial”, garante o chefe. Nos vinhos, Acácio Oliveira vai incluir “o orange wine e o primeiro espumante certificado dos Açores, 100% arinto brut nature de 2017”. Seg-dom 19h-22h > menus de degustação €75 a €150 (inclui um copo de vinho, escolhido pelo sommelier, para acompanhar cada um dos pratos), suplemento de vinhos €15

Ainda o jornal Público não tinha chegado às bancas e já o artigo assinado por António Costa, José Leitão e Pedro Silva Pereira circulava pelos WhatsApp dos socialistas. O texto “em defesa da honra do PS” era a machadada final na fragilização de Ricardo Leão enquanto líder da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) do PS. Disso ninguém tinha dúvidas. Na véspera, uma reunião da concelhia de Lisboa do PS, a propósito do Orçamento do Estado, tinha revelado as divisões em torno das polémicas declarações de Leão que, como presidente da Câmara de Loures, aprovou uma recomendação do Chega para retirar casas municipais a pessoas que se tenham envolvido nos desacatos que ocorreram após a morte de Odair Moniz, um cidadão negro baleado pela PSP na Cova da Moura. O desconforto com a aproximação ao discurso do Chega era maioritário nas hostes socialistas, mas havia também muitos dispostos a entender as razões do autarca de Loures e a desvalorizar o que disse. O ataque de António Costa foi a gota de água.

Queridos inimigos António Costa com Pedro Nuno Santos (e Francisco Assis). Relações entre líder e ex-líder foram sempre tensas

De manhã cedo, Pedro Nuno Santos já tinha a carta de demissão de Ricardo Leão. Mas, mais uma vez, decidiu deixar o anúncio nas mãos de Leão, sempre com o intuito de não fragilizar o partido. Leão só anunciou que deixava a liderança da FAUL perto da hora de almoço. Antes de o fazer, Duarte Cordeiro, talvez a pessoa mais influente na máquina do partido em Lisboa, falou à VISÃO para arrasar António Costa. “Acho o artigo arrogante e desnecessário”, disse Duarte Cordeiro, dando voz aos que em surdina se indignavam não só pela forma como o antigo secretário-geral, de uma penada, fragilizava Ricardo Leão e Pedro Nuno Santos (em relação ao qual havia no texto uma alusão velada ao seu alegado “taticismo” na gestão desta polémica) mas também pelo modo como Costa baseava o seu argumentário sobre a matriz humanista do PS nas políticas de integração e imigração, quando o tema nunca tinha sido levantado por Ricardo Leão.

Mas se a intervenção de António Costa feria de morte o líder da FAUL, o parágrafo mais mortífero do artigo era dirigido a Pedro Nuno Santos. “Quando um dirigente socialista ofende gravemente os valores, a identidade e a cultura do PS, não há calculismo taticista que o possa desvalorizar. É esse legado do Partido Socialista que sentimos agora o dever de recordar e defender. Em defesa da honra do PS!” Estas palavras davam gás à ideia de que a defesa da matriz socialista e a demarcação de Pedro Nuno em relação a Ricardo Leão tinham sido pífias. Mais: acusavam o líder do PS, que conquistou o partido a clamar sobre as suas convicções, de se ter enredado no pragmatismo da tática política.

Uma “vendetta” de Costa?

Contactados pela VISÃO, nem António Costa nem Pedro Silva Pereira quiseram falar sobre as razões que os levaram a assinar um texto tão arrasador, numa altura em que o partido ainda está a lamber as feridas do processo que levou Pedro Nuno Santos a decidir abster-se no Orçamento do Estado. Mas nos bastidores socialistas não faltam teses sobre as motivações dos autores. Um deles, José Leitão, foi apoiante de José Luís Carneiro nas diretas contra Pedro Nuno e tem um histórico nas políticas de integração, por ter sido alto-comissário para a Imigração e Minorias Étnicas entre 1996 e 2002, havendo quem atribua a isso a forma como o texto se debruça tanto sobre esse aspeto, que nem constava das declarações de Ricardo Leão. Já Pedro Silva Pereira ficou fora das listas para o Parlamento Europeu graças a Pedro Nuno Santos, que quis uma renovação completa nas últimas europeias. E terá esse capital de queixa.

Mas por que razão o indigitado presidente do Conselho Europeu entraria na polémica, a cerca de um mês de iniciar funções em Bruxelas? “É o perfil do Costa”, vai-se apontando entre socialistas, notando que mesmo sem ter pretensões de voltar à liderança “quer controlar o partido”. Essa é uma parte da explicação. A outra passa por uma relação tensa e nunca completamente resolvida entre António Costa e Pedro Nuno Santos, que começou no Congresso da Batalha, quando uma moção setorial apresentada por Pedro Nuno quase se confundia com uma moção de estratégia e levou o então secretário-geral a frisar que ainda não tinha “metido os papéis para a reforma”, e teve o seu culminar no momento em que o então ministro das Infraestruturas desafiou o primeiro-ministro, emitindo um despacho que na prática definia a localização do novo aeroporto de Lisboa, quando Costa estava em Madrid e sem qualquer articulação entre os dois. Este texto seria, pois, nessa tese amplamente difundida entre os socialistas, mais uma pequena vendetta de António Costa, que é conhecido por “nunca esquecer o que lhe fazem”.

Pedro Nuno não se revia nas palavras de Ricardo Leão, mas não podia esquecer-se de que o autarca liderava uma das estruturas mais importantes do partido

Certo é que a polémica de Ricardo Leão apanhou Pedro Nuno Santos no pior momento. Quando rebentaram as declarações de Leão a defender que se retirassem casas camarárias “sem dó nem piedade” a quem tivesse cometido atos de vandalismo, o debate do Orçamento do Estado na generalidade ia a meio e, nos corredores do Parlamento, o desabafo mais recorrente entre os socialistas era a vontade de “encerrar este capítulo depressa”. Ao optar pela abstenção, Pedro Nuno evitou uma crise política, mas tem agora de encontrar uma fórmula (nem sempre óbvia) para aparecer como responsável, mas não como líder de uma bancada que suporta o Governo. No meio desse equilíbrio, lidar com as declarações do autarca de Loures era tudo aquilo de que Pedro Nuno Santos não precisava. E, efetivamente, apesar da insistência dos repórteres que o apanharam à saída do Parlamento, conseguiu esquivar-se a comentar a quente Ricardo Leão.

O assunto, dizia-se no Largo do Rato, era para “ser gerido com pinças”. Pedro Nuno Santos não se revia nas palavras de Ricardo Leão, mas não se podia esquecer de que Leão era o líder de uma das estruturas mais importantes do partido, apoiado por Duarte Cordeiro (próximo de Pedro Nuno) e o militante socialista que lidera a autarquia com mais peso na área de Lisboa (Sintra é encabeçada pelo independente Basílio Horta). Fragilizar politicamente Ricardo Leão estava fora de questão. Sem agenda pública durante o fim de semana, o secretário-geral do PS decidiu que só falaria do tema na segunda-feira, quando os jornalistas o confrontassem com isso durante uma visita ao bairro do Zambujal, na Amadora, na sequência da morte de Odair Moniz.

Antes que Pedro Nuno Santos falasse, Alexandra Leitão fez um tweet explicando que a Câmara de Loures nunca poderia seguir a recomendação do Chega por motivos legais. “Determinar a aplicação de penas acessórias a quem comete crimes, mesmo após o trânsito em julgado, é uma opção exclusiva do legislador e, mesmo assim, muito limitada pela Constituição”, explicou Leitão, já depois de o ex-ministro da Educação João Costa e dos deputados Isabel Moreira, Filipe Neto Brandão e Cláudia Santos (que escreveu um artigo duríssimo contra Leão no jornal do PS Ação Socialista) terem arrasado as palavras do líder da FAUL.

Mas se as críticas a Ricardo Leão subiam de tom no espaço público, nos bastidores socialistas a condenação não era propriamente unânime, mesmo que vários socialistas contactados pela VISÃO tenham recusado dar a cara por essa defesa. “A posição [de Ricardo Leão] é mais comum entre autarcas socialistas do que se possa pensar”, dizia então à VISÃO um destacado socialista, defendendo a importância de o PS ter um discurso que afaste a ideia de qualquer facilitismo na atribuição de apoios sociais.

Alexandra Leitão atacada

“Não foi feliz, mas não era preciso fazer esta tempestade”, comentava um dirigente do PS Lisboa, que não se sentia incomodado pelas palavras de Leão, mas revelava incómodo pelos ataques feitos ao líder da FAUL. “O secretário-geral exigiu recato aos que têm acesso aos media, mas os mais próximos foram exigir a cabeça do Leão”, criticava, numa alusão à forma como Pedro Nuno Santos atirou aos críticos da sua liderança durante a discussão sobre o Orçamento do Estado.

Alexandra Leitão ficou debaixo da linha de fogo, apesar de ter feito intervenções (primeiro na rede social X e depois na CNN) essencialmente jurídicas, sem um ataque político a Ricardo Leão. Foi criticada tanto por pedronunistas, que entenderam que a sua intervenção pôs pressão sobre o líder do PS, como pelos que defendiam Ricardo Leão como “um grande autarca”. E resolveu não voltar a falar publicamente do assunto. Na verdade, Alexandra Leitão é uma das mais leais apoiantes de Pedro Nuno e o seu afastamento de António Costa é público e notório desde que, depois de ter conquistado a maioria absoluta, Costa deixou Leitão fora do elenco governativo e esta recusou ser sua líder parlamentar.

Mariana Vieira da Silva que, sendo costista, faz hoje parte do núcleo duro de Pedro Nuno, não hesitou em demarcar-se de Ricardo Leão no programa que tem na Renascença com o social-democrata Duarte Pacheco, que aí declarou solidariedade ao socialista. Mariana Vieira da Silva defendeu mesmo que Leão fizesse uma “reflexão” sobre as suas condições políticas (antes da sua demissão). Apesar de ser (juntamente com Alexandra Leitão) uma das hipóteses que Pedro Nuno Santos tem para uma candidatura à Câmara de Lisboa, esta demarcação não lhe valeu o coro de críticas nem a pressão interna a que nos últimos dias foi sujeita Alexandra Leitão.

Outros pedronunistas como Pedro Delgado Alves, Marina Gonçalves ou Maria Begonha optaram por não se pronunciar sobre o caso. E Ascenso Simões, que apoiou Pedro Nuno, fez uma defesa de Ricardo Leão em moldes que pareceram um ataque a quem, como Alexandra Leitão, se demarcou da posição do autarca de Loures. “Leão não é um autarca fora da lei como alguns dos seus camaradas quiseram fazer acreditar nos últimos dias. Leão tem é a realidade do seu lado e, se nada fizer, um dia teremos Loures, Amadora e outros concelhos governados pela extrema-direita”, escreveu Ascenso Simões no seu Facebook.

Crise interna na FAUL: e agora?

O caso Ricardo Leão teve uma implicação prática: suscitou uma crise interna que era tudo aquilo de que Pedro Nuno Santos não precisava e que, em certa medida, baralha o calendário que tinha definido. O líder socialista queria concentrar-se nas autárquicas assim que o Orçamento do Estado fosse aprovado (coisa que acontecerá no final deste mês), e tudo levava a crer que anunciasse os candidatos a Lisboa e Porto nessa altura. A demissão de Ricardo Leão não ajuda. É certo que não seria o líder da FAUL a escolher o candidato à Câmara de Lisboa, mas Ricardo Leão teria sempre uma palavra na feitura das listas e ter a Federação a meio de um processo de eleições internas não é bom. Mais: o processo de escolha do sucessor de Leão pode levar a divisões.

Miguel Prata Roque anunciou logo que é candidato à FAUL, ainda antes de Pedro Pinto de Jesus (o vice-presidente de Ricardo Leão) ter oportunidade de o fazer. E nos bastidores há movimentações para encontrar outro nome, com mais projeção nacional, para fazer face a Prata Roque. Algo que poderá não se revelar fácil, uma vez que Carla Tavares (próxima de Leão e antiga autarca da Amadora) está como eurodeputada, assim como Marta Temido, que abandonou recentemente a liderança da concelhia de Lisboa para rumar a Bruxelas, e Duarte Cordeiro tem feito saber que enquanto durar o processo da Operação Tutti Frutti não quer estar na política ativa.

Alexandra Leitão Líder parlamentar interveio de forma muito crítica, arrasando, do ponto de vista jurídico, a ideia da retirada de casas em Loures Foto: Marcos Borga

Miguel Prata Roque e Pedro Pinto já estiveram juntos no secretariado da FAUL da JS, que Pinto viria a liderar, num momento em que Prata Roque preferiu dedicar-se à carreira académica e ao trabalho no Tribunal Constitucional. Desde aí, Pedro Pinto tem andado sempre pelas estruturas partidárias, tendo sido assessor de António Costa na Câmara de Lisboa e presidente da Gebalis, nomeado por Duarte Cordeiro. Prata Roque fez carreira fora da política, mas foi também assessor de Costa no Parlamento Europeu e seu secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros. “Um tem vida, o outro tem partido”, resume uma fonte do PS Lisboa, que gostava de encontrar uma terceira via, notando que “a estrutura é muito cacicada” e que será difícil ao comentador Prata Roque encontrar apoios. “Não basta aparecer na televisão.”

Entre os que apoiam Prata Roque defende-se que a vantagem da candidatura é precisamente a de tirar o partido da lógica aparelhística, notando que Pedro Nuno Santos tem, desde a JS, criado à sua volta um núcleo duro composto essencialmente por pessoas que são funcionários do partido ou trabalham em gabinetes. “É algo que afunila o PS”, comenta um socialista, que vê na forma como uma figura como Ricardo Leão chegou à liderança da FAUL um sinal desses tempos. “É uma figura que não tem a dimensão de outros líderes da FAUL”, nota a mesma fonte, recordando que por aí passaram nomes como António Costa, João Soares, Jorge Coelho, Edite Estrela ou mesmo Joaquim Raposo.

Miguel Prata Roque apoiou Pedro Nuno Santos nas últimas diretas, mas está longe de ser um pedronunista. Na JS, estavam em polos opostos da barricada: Pedro Nuno mais à esquerda, Prata Roque mais ao centro. Mas o tempo no Governo aproximou-os e ajuda a explicar o apoio nas diretas.

Há, contudo, outra consequência do caso Ricardo Leão: um debate interno sobre como lidar com o Chega. Se figuras como Isabel Moreira ou Alexandra Leitão têm defendido abertamente que essa disputa se faz no campo das convicções e da demarcação total, há quem (sobretudo nas estruturas locais) note a necessidade de ter um discurso consonante com o ar dos tempos, que dê mais respostas às questões que a imigração suscita e que não deixe ao partido de André Ventura o monopólio de um discurso sobre a exigência na atribuição de apoios sociais.

Se as críticas a Ricardo Leão subiam de tom, no espaço público, nos bastidores do PS a condenação não foi propriamente unânime

“O combate à extrema-direita não se faz só com declarações, faz-se com políticas concretas (…) É assim que se combate a extrema-direita, resolvendo os problemas dos portugueses”, disse Pedro Nuno Santos na reação ao texto de António Costa, repudiando a insinuação de qualquer taticismo. “Se há político em Portugal que não é tático sou eu”, insistiu.

Em Setúbal, um distrito onde a extrema-direita tem crescido, a discussão já deu frutos. André Pinotes Batista, líder da Federação de Setúbal, pediu a Nuno Mascarenhas (presidente da Câmara Municipal de Sines) e a Patrícia Gaspar (antiga secretária de Estado da Administração Interna) para prepararem um plano de intervenção a nível local para as migrações, a tempo das próximas autárquicas, como avançou o jornal Público.

De resto, Eurico Brilhante Dias, ex-líder parlamentar do PS, também já veio defender “uma reflexão” sobre esta questão, notando que “há problemas com o Estado Social e da relação da classe média com o Estado Social” que obrigam o PS a ter uma posição sobre o tema e a dar-lhe respostas que não passem pela divisão entre a classe média, os pobres e os muito pobres.

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Já quase tudo foi dito e escrito sobre a futura Administração Trump, que toma posse a 20 de janeiro. Portanto, basta-nos repisar a matéria dada. Não é normal que o homem mais rico do mundo seja escolhido para liderar um ministério com o pomposo nome de “Departamento para a Eficácia Governamental”, inventado para cortar cerca de dois biliões de dólares no erário público – quase um terço do orçamento ainda em vigor. Como Elon Musk gosta de se armar em engraçadinho e agora até acha que consegue fazer rimas como se fosse um rapper, escreveu na rede social de que é proprietário que a sua nomeação é uma forma de “desmantelar o excesso de burocracia”, “reestruturar as agências federais” (entenda-se eliminá-las) e “cortar nas despesas inúteis”. Em suma, tem um “mandato para acabar com a gigantesca regulamentação que em nada contribui para o bem comum”. Como? “Bem comum”? Estará ele a falar da humanitas, uma das virtudes que Cícero, na Roma Antiga, considerava indispensável na política da república e que também significava “amor pelo próximo”? Não, não vamos acreditar que o dono da X e da Space X conhece a obra e os ensinamentos do filósofo que viveu um século antes de Cristo. Logo ele que faz gala em “ser pragmático” e “não perder tempo” com idiotices históricas ou “leis absurdas”. Sim, estamos a falar do omnipotente e prepotente patrão da Tesla que, por exemplo, possui uma fábrica na Alemanha em que os funcionários são perseguidos por estarem de baixa médica. Ficção? Antes fosse.

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Neste ano da graça de 2024 d.C. tivemos a estreia da milionária superprodução Megalópolis, filme há muito sonhado por Francis Ford Coppola, e agora a chegada do blockbuster de Ridley Scott Gladiador II (estreia-se nesta quinta, 14, em Portugal).

O primeiro escolhia o imaginário, o contexto e rituais do Império Romano como metáfora para uma distopia futurista, com Nova Iorque a transformar-se em Nova Roma. Gladiador II é mais uma declinação, com todo o potencial tecnológico disponível hoje (há, mesmo, uma versão para as salas IMAX), do fascínio pelas histórias sobre os gladiadores, com uma obediência rigorosa às regras dos filmes made in USA que pretendem arrecadar milhões de dólares em todo o mundo.

De onde vem este encanto, sempre renovado, da nossa civilização por acontecimentos e histórias que se passaram há mais de dois mil anos? Porque é que o império da Roma Antiga nos atrai tanto, ao ponto de, em mais de um século de história do cinema, os filmes sobre gladiadores serem praticamente um subgénero cinematográfico (dentro dos filmes épicos históricos)?

Parte da resposta a estas perguntas talvez seja dada neste novo filme de Ridley Scott, quando a personagem Macrinus (num excelente desempenho de Denzel Washington) diz algo como “a violência é uma linguagem universal”. Macrinus parece ser, de início, uma espécie de Jorge Mendes (o influente empresário de futebol) do mundo de negócios dos gladiadores, mas vai-se revelando uma personagem de ambição desmedida, chegando à batalha final, clímax do filme, contra o (super) herói Hanno (Paul Mescal). Explica Macrinus que escolhe os seus melhores gladiadores baseado em três critérios: potencial de entretenimento, força bruta e raiva acumulada.

As plateias do século XXI, afinal, continuam a seguir, com entusiasmo, o que se passa na arena do Coliseu: combates sangrentos, luta pela sobrevivência, superação dos mais fracos contra os mais fortes, heroísmo e sacrifício. No fundo, somos os mesmos Homo sapiens sapiens de há dois mil anos… A grande diferença – e é mesmo muito grande – é que hoje já não lançamos humanos aos leões para gáudio da multidão de espectadores ululantes; civilizadamente, encenamos essas narrativas de violência extrema em salas de espetáculos. E Ridley Scott caprichou nessa enc5/enação. Obedecer ao rigor histórico desses espetáculos no Coliseu de Roma já é suficientemente impressionante, mas o realizador britânico de 86 anos acrescentou tubarões (que nunca existiram nas recriações de batalhas navais) e inventou um assustador guerreiro montado num enorme rinoceronte…

A queda dos impérios

Gladiador II remete para acontecimentos verdadeiros do Império Romano, mas criando uma trama ficcional, naturalmente cheia de liberdades. Tudo gira à volta de Hanno/Lucius, encaminhado para a concretização de uma missão, regressado às origens depois de viver com os “bárbaros” na Numídia (no Norte de África, correspondente à atual Argélia e parte da Tunísia, território que fez parte do império comandado por Roma).

Esse motor da narrativa é ficcional, e obedece à regra de ouro de qualquer épico histórico: dar ao espectador um herói com quem se pode identificar, em lutas impossíveis contra tudo e todos. Mas os irmãos imperadores Geta (Joseph Quinn) e Caracalla (Fred Hechinger) foram personagens históricas reais, num período particularmente caótico e sanguinário da História da Roma Antiga (uma qualidade destes filmes é fazer-nos mergulhar, curiosos, nos episódios históricos verdadeiros e documentados). O general romano Marcus Acacius (interpretado pelo ator chileno Pedro Pascal) – que prepara um golpe contra os imperadores e está envolvido com Lucilla (Connie Nielsen), que foi realmente filha do imperador Marco Aurélio – é totalmente ficcionado.

“A violência é uma linguagem universal”, diz Macrinus, personagem interpretada por Denzel Washington

O nosso fascínio pela era romana não virá só da violência e dos seus rituais de poder. Sabemos bem que muito lhe devemos, e ainda hoje os sinais do seu poder nos assaltam aqui e ali, num aqueduto, numa ponte, na beleza de cerâmicas que sobreviveram até aos nossos dias… Se a impressionante força do império que se espalhou por milhares de quilómetros consegue ainda arrebatar-nos, também somos seduzidos pela sua espetacular decadência e pelo seu final.

Num período em que é difícil encarar o futuro com otimismo e quando vemos uma luta de superpotências e uma rearrumação geoestratégica – com os EUA a darem sinais de decadência e uma progressiva afirmação da China no horizonte –, olhamos, talvez, com uma renovada curiosidade para quaisquer ecos das quedas de grandes impérios que pareciam indestrutíveis.

Gladiador II > De Ridley Scott, com Paul Mescal, Pedro Pascal, Denzel Washington, Connie Nielsen > 148 min.

Joe Biden, 46.º presidente dos Estados Unidos, parabenizou esta quarta-feira o presidente eleito, Donald Trump, numa reunião que decorreu na Sala Oval da Casa Branca, residência oficial do chefe de Estado americano. Esta foi a primeira vez que o republicano regressou à Casa Branca desde que saiu da presidência do País, em 2020.

Donald Trump, presidente eleito para um segundo mandato, disse esta quarta-feira esperar a transição “mais tranquila de sempre” de poder na Casa Branca. “A política é difícil e muitas vezes não é um mundo muito agradável, mas hoje é um mundo agradável e estou grato”, disse o republicano, no início da reunião com Joe Biden na Sala Oval.

No encontro de pouco menos de duas horas, o Presidente cessante dos Estados Unidos “sublinhou a sua opinião de que o apoio contínuo dos EUA à Ucrânia” é do “interesse de segurança nacional” para os EUA, segundo o conselheiro de segurança nacional de Biden, Jake Sullivan, em conferência de imprensa.

Trump tem questionado a ajuda militar dos EUA à Ucrânia perante a invasão russa, iniciada em fevereiro de 2022, e garantiu que acabará com a guerra “em um dia”, apesar de não especificar como.

“Bem-vindo de volta”

Depois de vencer as eleições de 2016 contra a democrata Hillary Clinton, o republicano Trump reuniu-se com o então Presidente dos EUA, Barack Obama (2009-2017), durante 90 minutos. Na altura, Trump disse que a reunião era “uma grande honra”, mas pouco depois voltou a insultar o seu antecessor nas redes sociais.

“Bem, senhor Presidente eleito e antigo Presidente, Donald, parabéns. Espero que tenhamos, como já disse, uma transição suave”, disse Biden. O líder cessante assegurou ainda que a sua equipa se certificará de que Trump tem tudo o que precisa para tomar posse a 20 de janeiro de 2025 e acrescentou: “Bem-vindo de volta”.

Trump tomou então a palavra para dizer: “A política é difícil e é muitas vezes um mundo complicado, mas hoje é um bom dia neste mundo. Estou muito grato pelo facto de a transição estar a decorrer de forma tão tranquila e espero que assim continue”.

 

Trump não recebeu Biden na Casa Branca em 2020. Não queria, não aceitava os resultados, e nem sequer apareceu na sua posse nas escadarias do Capitólio. Pelo contrário, o veterano Biden deu as boas-vindas a Trump, felicitou-o pelo seu regresso e até brincou com a ideia de que estava a ponderar candidatar-se em 2028.

É uma verdade indiscutível que o presidente dos EUA já não tinha condições físicas e cognitivas para desempenhar o cargo. Foi afastado à força, quando poderiam ter feito tudo isso com algum decoro e decência, e muito antes. Agora, sairá de cabeça erguida, calmamente, quando chegar o dia 20 de janeiro de 2025.

A sua gentileza contrasta com o estilo de Trump. Biden irá para a sua casa de praia descansar e, certamente, criar uma fundação ou um centro que homenageará todo o seu percurso político. Nunca ninguém, nos EUA, permaneceu na vida política ativa durante tanto tempo. Ele é o António Costa americano.

É esse serviço público, muitas vezes polémico e embaraçoso, que Biden levará orgulhosamente na sua lapela. Num extraordinário gesto de gentileza, a Medalha Presidencial da Liberdade, a mais alta condecoração civil americana, deveria ser atribuída a Biden por Trump. Só lhe ficava bem!

Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.