1. Wanderer Songs/Cantares do Andarilho 

O título em inglês mostra a ambição internacional do projeto, que mistura músicos com experiências diversas em vários países. Na base estão as canções de José Afonso, especificamente as que ele cantou no histórico e derradeiro concerto de janeiro de 1983 no Coliseu dos Recreios. Pedro Afonso, filho do autor de Venham Mais Cinco, desafiou vários artistas para estas reinterpretações. O resultado final foi ganhando forma numa residência artística no Teatro Faialense, na Horta, Açores. Aí, Tiago Correia-Paulo (que assumiu a direção musical), PS Lucas, Lavoisier, Selma Uamusse, Nacho Vegas e, nos audiovisuais, Nástio Mosquito e Vic Pereiró honraram uma das grandes qualidades de José Afonso: a inovação e a busca livre de novos horizontes e soluções.  Casa da Música, Porto > 22 jan > Tivoli BBVA, Lisboa > 23 jan 

2. Franz Ferdinand 

O ano vai começar, para estes nossos velhos conhecidos escoceses, com álbum novo. The Human Fear, a lançar a 10 de janeiro, sucede a Always Ascending, de 2018 (ou seja, na longínqua era pré-pandemia). Alex Kapranos e companhia devem estar mais nervosos do que o habitual antes deste concerto na Aula Magna: é o primeiro da digressão europeia do novo álbum, que vai levá-los a mais 11 países antes de seguirem para América do Norte (onde a tournée termina a 15 de abril, em Toronto, Canadá). Em agosto estarão de regresso a Portugal para uma atuação em Paredes de Coura. Aula Magna, Lisboa > 14 fev 

3. Plutónio 

Foto: DR

Para muitos, ver Plutónio a esgotar duas noites na maior sala de espetáculos do País pode ser uma grande surpresa. Mas aí está ele, João Ricardo Azevedo Colaço, 39 anos, muitos deles passados no Bairro da Cruz Vermelha, em Alcabideche, luso-moçambicano mais conhecido como Plutónio. “Eu fui discriminado no País das Maravilhas/ Fama é uma bênção, mas também tem maldição/ Fiz muitos quilómetros, mas agora ‘tou a milhas/ Acelerei demais, mas não perdi a direção”, começa por cantar no disco duplo que lançou este ano, Carta de Alforria. Entre hip-hop, r’n’b e trap, tudo temperado com um balanço afro, Plutónio tornou-se um caso sério numa sonoridade que tem conquistado muito público em Portugal nos últimos anos. Estas noites serão de consagração e vistas como um merecido prémio pelo músico.  Meo Arena, Lisboa > 28 fev e 3 mar 

4. Godspeed You! Black Emperor 

Intensidade é o que se espera sempre de um concerto dos canadianos Godspeed You! Black Emperor, com momentos hipnotizantes, explosões controladas de ruído, longos temas em crescendo, fragmentos de melodias – aquilo, afinal, que distingue o género musical que eles ajudaram a impor, o pós-rock. Estes concertos vêm na sequência da edição, em outubro deste ano, do álbum No Title as of 13 February 2024 28,340 Dead – estranho título que faz uma referência direta ao número de palestinianos mortos em ataques de Israel entre 7 de outubro de 2023 e 13 de fevereiro de 2024.  Music Station, Lisboa > 1 mar > Casa da Música, Porto > 2 mar 

5. Joan As Police Woman 

Foto: DR

Mais uma digressão europeia que começa em Portugal. E, neste caso, num local pouco habitual nestes circuitos: o auditório do Museu do Oriente. É aí, e depois em Espinho, e talvez noutros palcos nacionais ainda por anunciar, que a inspirada escritora de canções americana Joan As Police Woman (nome artístico de Joan Wasser) apresentará os novos temas do álbum lançado este ano, Lemons, Limes and Orchids, e outros, mais antigos, de uma carreira que desde cedo encontrou em Portugal um público atento.  Museu do Oriente, Lisboa > 29 abr > Auditório de Espinho > 30 abr 

6. Pixies 

Foto: DR

Depois de muitas visitas aos palcos portugueses, desde os míticos concertos de 1991 nos Coliseus, já não se pode dizer que os Pixies se impõem por um efeito surpresa. Todos sabem ao que vão. E apesar de a banda americana andar em digressão com o novo álbum, The Night the Zombies Came, lançado em outubro passado, é certo que a festa na plateia vai acontecer sobretudo sempre que se ouvirem as canções mais antigas, como Where is My Mind?, Vamos ou Gouge Away.  Campo Pequeno, Lisboa > 10 mai 

7. King Gizzard and the Lizard Wizard 

A Europe Residency Tour 2025 dos australianos passa por Lisboa em três noites seguidas na mesma sala: o Coliseu dos Recreios. Os King Gizzard and the Lizard Wizard continuam a ter no seu ADN uma certa exuberância que os tornou uma banda especial e, muitas vezes, desconcertante. Não só conseguem editar discos a uma velocidade estonteante (desde 2010, lançaram 25, cinco dos quais em 2017 e outros cinco em 2022) como oferecem uma enorme panóplia de estilos musicais, normalmente na esfera do rock psicadélico, mas com muitas surpresas e desvios pelo caminho. Como não poderia deixar de ser, cada uma destas três noites terá uma setlist diferente. Coisa rara, senão inédita, na vetusta sala lisboeta. Coliseu dos Recreios, Lisboa > 18-20 mai 

8. Kylie Minogue 

Foto: EPA/Jalal Morchidi

Desde 2011 que a maior estrela pop australiana não fazia uma digressão tão longa e ambiciosa. E desde a sua estreia em palcos portugueses, em 2009, que não regressava a Portugal. Agora volta à mesma sala, a MEO Arena (então Pavilhão Atlântico), com a Tension Tour, baseada nos seus dois últimos e festivos discos: Tension (2023) e Tension II (2024). MEO Arena, Lisboa > 15 jul 

9. Beth Gibbons 

Beth Gibbons, a vocalista dos Portishead atua em Lisboa em julho para apresentar o seu primeiro álbum a solo, “Lives Outgrown”. Foto: DR

Lives Outgrown, a estreia em nome próprio e a solo de Beth Gibbons, está em praticamente todas as listas que têm sido publicadas dos melhores discos de 2024 (a revista americana Time considerou-o mesmo o melhor disco do ano). A inconfundível voz, grave e serena, da vocalista dos Portishead percorre aqui canções feitas com tempo, ao longo da última década, em que a cantora, que completa 60 anos já no próximo dia 4 de janeiro, reflete sobre a passagem dos dias, dos anos, as perdas e as aprendizagens possíveis. O mínimo que se pode esperar é uma noite de concerto intensa e bela no Coliseu. Coliseu dos Recreios, Lisboa > 16 jul 

À espera do verão 

Começam a desenhar-se os cartazes dos festivais. Alguns destaques 

10. Coala Festival  Hipódromo Manuel Possolo, 31 mai-1 jun Liniker, Djodje, Ney Matogrosso, Xande Canta Caetano 

11. Primavera Sound  Parque da Cidade, Porto, 12-15 jun A Garota Não, Anohni and the Johnsons, Beach House, Caribou, Charli xcx, Deftones, Floating Points, Fontaines D.C., Jamie xx, Kim Deal, Michael Kiwanuka, Parcels, Squid, TV On The Radio, Wet Legs 

12. Jardins do Marquês Jardins do Palácio do Marquês de Pombal, Oeiras, 29-30 jun, 6 e 9 jul  Cat Power, Gisela João, José González, Mayra Andrade, Mario Biondi, Paralamas do Sucesso 

13. AGEAS Cool Jazz  Hipódromo Manuel Possolo, Cascais, 4, 12, 17, 23 jul  Benjamin Clementine, Seal, Gilsons, Slow J 

14. NOS Alive  Passeio Marítimo de Algés, 10-12 jul  Olivia Rodrigo, Parov Stelar, Girl in Red, St. Vincent, Finneas, Kings of Leon, Future Islands, Foster the People, Amyl and the Sniffers  

15. Meo marés vivas  Vila Nova de Gaia, 18-20 jul Scorpions, Thirty Seconds to Mars, Os Quatro e Meia com Miguel Araújo 

16. Vodafone Paredes de Coura Paredes de Coura, 13-16 ago  Franz Ferdinand, Sharon Van Etten & The Attachment Theory, Jersey, Ana Frango Elétrico, Fat Dog, Black, Country New Road, Bar Italia 

17. Vilar de Mouros  Vilar de Mouros, 21-23 ago Da Weasel 

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É aborrecido estar sempre a falar de Trump, mas não há como evitar. Ele quer a Gronelândia, território autónomo da Dinamarca, e, se necessário, ameaça enviar as forças armadas para invadir a ilha. Seria uma nova guerra, e esta teria algo de peculiar: uma disputa entre dois membros da NATO. Que festim para Putin, Xi e Kim.

Para termos uma ideia, a Gronelândia é 24 vezes maior do que Portugal – uma extensão imensa, situada entre o Ártico e o Atlântico – e tem apenas 56 mil habitantes. Possui um Parlamento, um Governo e um primeiro-ministro, além do representante do Reino da Dinamarca.

Com uma população tão reduzida, a maioria vive na capital, Nuuk, a sul, num ambiente que funciona quase como um pequeno bairro, mas gelado. Todos se conhecem, todos se cumprimentam e todos se governam. Para invadir, bastaria enviar um pelotão de marines.

No entanto, há uma questão que Trump não respondeu: por que raio quer a Gronelândia, que sempre esteve lá, no mesmo sítio? Invoca razões de segurança nacional. Mas, a ser verdade, bastaria pedir ao seu parceiro da Aliança Atlântica para alugar algum espaço – algo que não falta naquele território.

É disto que Trump se alimenta: crises, insegurança, ameaças e intimidação. Mas sempre contra os seus parceiros, nunca contra Moscovo, Pequim ou Pyongyang. Não há ninguém que lhe administre um pouco de senso naquela cabeça aloirada?

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D ir-se-ia que o SIS (Serviço de Informações de Segurança), a atual secreta civil nacional, devia apresentar no seu logótipo a efígie de Pêro da Covilhã, muito provavelmente o espião mais destemido e profícuo que Portugal teve. “Poucos portugueses tiveram uma existência tão aventurosa como Pêro da Covilhã”, resume o jornalista e escritor Luís Almeida Martins, autor de 365 Dias com Histórias da História de Portugal e de História Não Oficial de Portugal (ambos com edição de A Esfera dos Livros), obras que servem aqui enquanto fontes. Chegaremos a uma longa viagem de missões secretas e perigosas de Pêro da Covilhã, do Magrebe e da Arábia ao Indostão, para terminar no interior de África.

A vida do rapaz que adotou como apelido o nome da cidade serrana de que era natural começou a mudar por volta de 1468, quando tinha uns 18 anos. Dono de uma desenvoltura que não passava despercebida aos olhares mais atentos, seria sucessivamente recrutado por um influente fidalgo andaluz, como espadachim, e pelo nosso rei D. Afonso V, para escudeiro. Não iria longe com este monarca: esteve a seu lado na invasão de Castela e na desastrosa Batalha de Toro, em 1476, ganha pelas tropas de Isabel e Fernando de Aragão, futuros Reis Católicos de Espanha. Caiu assim por terra a união ibérica que Afonso V ambicionava liderar, o que até o levou a casar-se com a sua sobrinha, D. Joana de Castela.

Pêro conseguiu identificar poderosos que conspiravam contra a coroa, como o duque de Viseu e o bispo de Évora

Com o rei D. João II, o sucessor de Afonso V, deu-se a grande reviravolta na vida de Pêro da Covilhã. “Mais lúcido e prático do que o pai”, nota aquele autor, o Príncipe Perfeito aproveitou os dotes deste homem de confiança para outros fins – espionagem e delicadas missões diplomáticas. Para começar, Pêro conseguiu identificar poderosos que conspiravam contra a coroa, como o duque de Viseu e o bispo de Évora. Também poliglota, seria depois incumbido de negociar tratados com dois reis berberes de Marrocos, no que foi bem-sucedido.

Já a caminho dos 40 anos, em 1487, receberia de D. João II a ordem para fazer a viagem que o celebrizaria. “No âmbito dos preparativos da descoberta do caminho marítimo para a Índia”, explica Luís Almeida Martins, o Príncipe Perfeito confiou-lhe a missão de “tentar alcançar o Indostão por terra e trazer informações úteis sobre o cobiçado país das especiarias”. Do mesmo passo, “informar-se-ia acerca do misterioso reino cristão do Preste João”, que se suspeitava situar-se na Etiópia, no Leste africano.

CATIVO DO “NÉGUS”?

Pêro partiu acompanhado de Afonso de Paiva, outro homem da confiança do rei, também fluente em árabe e por coincidência igualmente natural da Beira Baixa, no caso, de Castelo Branco. “Disfarçados de mercadores, seguiram por terra até Barcelona, onde embarcaram para o Egito, com escala em Nápoles e Rodes”, relata aquele autor. “Juntando-se a uma caravana, disfarçados de mercadores árabes, atravessaram a Arábia, passando por Medina e Meca – onde rezaram como muçulmanos –, e em Aden separaram-se, combinando encontro para daí a três anos à porta da cidadela do Cairo.”

Paiva fletiu então para a Etiópia e Pêro embarcou para a Índia, onde obteve informações que viriam a ser de grande utilidade para que, cerca de uma década depois, em 1498, Vasco da Gama e a sua frota fizessem a primeira viagem marítima entre a Europa e o subcontinente indostânico. De volta ao fio desta história: no local combinado para o reencontro, no Cairo, Pêro deparou-se, em vez de Paiva, com dois judeus portugueses, “que lhe contaram ter aquele morrido pouco antes, sem conseguir transmitir o que vira nas suas andanças”, narra Luís Almeida Martins.

Um dos judeus partiu então para Lisboa, com um relatório de Pêro dirigido ao rei, enquanto o outro o acompanhou de regresso à Índia, para arrecadar mais informações. Depois, talvez já cansado da terra indostânica, e “para colmatar a branca deixada por Paiva”, continua aquele autor, viajaria para a Etiópia, a fim de recolher notícias do Preste João. “Seria ali encontrado muito mais tarde, em 1521, já velho e rodeado de filharada, por D. Rodrigo de Lima”, que chefiava uma expedição em busca do misterioso reino cristão – o qual existia mesmo, mas tinha rito próprio e era liderado por um soberano africano a quem os súbditos chamavam “négus” (imperador).

Fontes coevas dizem que Pêro afirmou que aquele soberano nunca o autorizou a abandonar o território. Presume-se que tenha ali morrido por volta de 1530, com 80 anos, e, apesar dos arriscados serviços que prestou ao País, foi remetido a uma divisão secundária da História.

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Palavras-chave:

N o início do século XX, a Rua de São Roque, no casco histórico de Aveiro, passou a chamar-se Rua Antónia Rodrigues. Ainda lá está a placa justificativa da mudança toponímica: “A célebre Antónia de Aveiro que, fugindo de casa aos 15 anos, foi, vestida de homem, combater gloriosamente os Mouros em Mazagão, onde obrou prodígios de valor, conservando durante anos, com a sua virtude, o segredo do seu sexo.” Na sua obra Mulheres Aventureiras – Portuguesas nos Quatro Cantos do Mundo (ed. A Esfera dos Livros), a jornalista e investigadora Rosário Sá Coutinho considera a amazona aveirense “a nossa Joana d’Arc”, embora “sem o fervor religioso que movia a guerreira francesa de quatrocentos”.

Além da defesa da praça-forte, participava, destemida, nas “almogaverias”, ataques-surpresa e mortíferos às aldeias de mouros das redondezas

Esta heroína involuntária, como adiante se verá, nasceu em 1580. Tinham passado quase dois anos sobre a trágica derrota de Alcácer-Quibir, na qual morreu o rei D. Sebastião, solteiro e virgem. Na atribulada crise sucessória que se seguiu, o rei de Castela, Filipe II, seria designado rei de Portugal, sob o título de Filipe I.

Mas tais vicissitudes políticas por certo pouco importavam à família da menina de quem se fala, mergulhada em carências de toda a ordem. Sobretudo recorrendo ao cronista Duarte Nunes de Leão, contemporâneo de Antónia Rodrigues, e que a conheceu, Rosário Sá Coutinho conta que ela veio ao mundo num bairro pobre de pescadores, a profissão do pai, Simão Rodrigues. A mãe, Leonor Dias, “era dona de casa com muitos filhos, que as dificuldades da vida tornavam impossível criar”. Por isso decidiu “enviar Antónia para ir viver com uma filha que tinha em Lisboa”.

A pequena ficou então entregue aos cuidados da irmã mais velha, Inácia, que se casara com um carpinteiro naval e residia num cubículo, na capital. Como Duarte Nunes de Leão relatou, a “aspereza” e o “mau tratamento” de Inácia para com a irmã mais nova depressa surgiram. “À hora do almoço o marido da irmã entrava em casa vociferando impropérios”, replica Rosário Sá Coutinho. “Já vinha bêbedo, como de costume. Desancava a mulher e esta descarregava na pequena Antónia as suas frustrações.”

Até que um dia, “aproveitando uma ausência da irmã”, fugiu, com um punhado de moedas ganho em biscates e uma tesoura enferrujada. Na Baixa de Lisboa, o pequeno pecúlio chegou-lhe para comprar “um par de calças roçadas, uma camisa e um barrete”, conta a jornalista e investigadora. E, por “detrás de umas silvas”, deu-se a transformação: despiu o vestido que trazia, vestiu a roupa masculina e, com a tesoura enferrujada, desfez-se da melena loura, ajeitando o corte de cabelo ao dos grumetes.

Seguindo o seu plano, a adolescente dirigiu-se ao Cais da Ribeira, onde se deparou com um velho contramestre que escolhia grumetes para embarcar numa caravela. Identificou-se como António Rodrigues, inventou que já tinha servido numa nau chamada São Bartolomeu e, para seu espanto, foi contratada. Enquanto a Nossa Senhora do Socorro, a caravela em que embarcaria nesse mesmo dia, era carregada com trigo, soube pelo contramestre que o destino seria a praça-forte de Mazagão (atual El Jadida, em Marrocos). “Antónia nunca ouvira falar naquele lugar nem fazia ideia de onde ficava”, nota Rosário Sá Coutinho.

Expedita, não se atrapalhou no seu trabalho a bordo. “Ao fim do primeiro dia, parecia que tinha sido grumete a vida toda”, escreve aquela autora. Mas quando a embarcação fundeou em Setúbal, testemunhou, à noite, que o mestre e a tripulação desviavam parte do cereal para botes que se encostaram à caravela. Detetado o ilícito após a chegada à praça-forte, o “rapaz” confirmou-o às autoridades, identificando o mestre como autor do roubo. O governador, D. Diogo Lopes de Carvalho, entendeu, claro, que o grumete não podia voltar à caravela – “na primeira noite de mar” passaria a “pasto para peixes”. Ficaria como praça da guarnição de Mazagão.

MULHER DO POVO

“É assim, por uma reviravolta do destino, que Antónia Rodrigues se torna soldado” naquela praça-forte, conta Rosário Sá Coutinho. Cumpre bem todas as ordens que lhe são dadas e mostra-se exímia no manejo de armas. Impressionou de tal maneira o seu capitão que, ao fim de pouco mais de um ano, ascendeu à cavalaria, com direito a “soldo e mantimento”.

Além da defesa da praça-forte, participava, destemida, nas “almogaverias”, ataques-surpresa e mortíferos às aldeias de mouros das redondezas. Ou nas “entradas”, levadas a cabo para lhes roubar alimentos, cavalos, cabras e por aí adiante, e para a captura de mouros, depois vendidos como escravos ou resgatados pelos seus compatriotas a troco de cristãos ou de avultadas somas em dinheiro. “A estes desaforos”, escreve Rosário Sá Coutinho, “respondiam os mouros cercando a praça em grande número, armados até aos dentes, queimando as nossas colheitas e fazendo os portugueses passar um mau bocado”.

A jovem “acabou por resolver sozinha” os “inconvenientes da puberdade”, e era “entre os homens da companhia que tinha amigos, confidentes e mentores”, conta aquela autora. Tudo parecia correr bem – até que D. Beatriz, filha de um cavaleiro de Mazagão, se apaixonou perdidamente pelo sargento António Rodrigues e, na ausência de correspondência amorosa, caiu à cama doente, recusando alimentar-se. O governador coagiu-o então a casar-se com a jovem.

Sem alternativa, tinha de despir a carapaça com a qual teve artes, até ali, para enganar tudo e todos. Decidiu confessar a verdade ao padre de Mazagão, cujo espanto apenas podemos imaginar, e temeu o pior: “O castigo para tamanha ousadia podia muito bem ser a morte”, escreve Rosário Sá Coutinho. Mas os feitos militares em que se tinha destacado ao longo de cinco anos amenizaram a ira inicial das autoridades e levaram a que a urbe a amnistiasse. O governador só a obrigou a vestir-se como mulher.  

Ainda em Mazagão, casar-se-ia, em 1603, com um oficial, de quem teve um filho. Em recompensa pelos seus feitos, o rei Filipe II (I de Portugal) concedeu-lhe uma tença (pensão) vitalícia de “dez mil reis” por ano e, já em Lisboa, recebeu-a em audiência, aceitando o pedido de que o filho da ex-cavaleira entrasse ao seu serviço.

Terá morrido em 1641 ou 1642, com 61 ou 62 anos, e a sua figura sofreu um engavetamento histórico, que a degradação da placa toponímica referida no início deste texto metaforiza. Autor do romance A Amazona Portuguesa (ed. Saída de Emergência), inspirado em Antónia Rodrigues, Mário Silva Carvalho dirá à VISÃO: “Era uma mulher do povo e, por isso, não faz parte das narrações da História.”

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Rosa Serra nunca ouvira falar do corpo de enfermeiras paraquedistas quando uma colega de curso e de trabalho a inscreve, sem lhe dar cavaco, para prestar provas em Lisboa. “Tu és maluca?! Eu alguma vez era capaz de me atirar de um avião?!”, fora a reação inicial da jovem Rosa, ao ser desafiada para acompanhar não uma, mas duas amigas à capital, corria o ano de 1967.

Com 21 anos, a enfermeira natural de Vila Nova de Famalicão já havia descartado o trabalho no bloco operatório no Hospital de Santo António, que considerava demasiado monótono, mas convive bem com os dias agitados na urgência do São João, também no Porto. Aceita o repto “mais para conhecer Lisboa”, como viria a partilhar com Susana Torrão, muitos anos depois, num dos vários testemunhos destas corajosas enfermeiras recolhidos pela jornalista no livro Anjos na Guerra (Oficina do Livro, 2011).

Vai ao desconhecido, segue o instinto. Não está sequer a par de que as Forças Armadas andam a recrutar mulheres e pouco ou nada sabe da guerra nas colónias africanas, apesar de lá ter dois irmãos a combater. Em boa verdade, também não sentira especial vocação pela enfermagem quando decidiu seguir esse caminho. Escolheu-o porque lhe permitiria começar a trabalhar ao fim de apenas três anos de estudos.

Pragmática, Rosa termina o curso de enfermeira paraquedista em 1968, em Tancos, e no ano seguinte parte em missão para a Guiné-Bissau. A alferes não demora a perceber que, se quer ser útil num cenário de guerra, terá de controlar o medo e focar-se na estabilização e na retirada dos feridos das zonas de combate para os hospitais. Dá-se conta da importância da passagem prévia pela Ilha Terceira, nos Açores, onde cuidara de amputados, cegos e queimados, regressados à pressa da zona de conflito.

Em pequenos aviões ou de helicóptero, é chegar ao local da emergência, muitas vezes no mato, recolher os feridos (militares, civis e até inimigos), prestar os primeiros socorros e descolar o mais depressa possível. Por vezes, não consegue levar todos. Tem de fazer opções.

Com o tempo, Rosa ganha tal carapaça sempre que é chamada à linha da frente, que só mais tarde vem a saber que esteve debaixo de fogo. Segundo relata no referido livro, certo dia os militares mandam-na deitar-se sob o avião e ela, com medo de ser esmagada por eventuais destroços, senta-se antes numa das rodas, enquanto disparam contra eles sem que a enfermeira se aperceba. Noutro salvamento, o nevoeiro impede o piloto de aterrar o avião. Rosa pede-lhe para voar em círculos, à espera de uma aberta, e lá conseguem alcançar o ferido. Já na base, o piloto mostra-lhe uma bala cravada na asa, para surpresa dela. “Uma coisa que aprendi com os paraquedistas foi que um camarada nunca se deixa para trás, mesmo que arrisquemos a nossa vida”, justificaria a Susana Torrão.

“Fui percebendo que os homens perdem a capacidade de raciocinar perante os conflitos. E entendo que a percam… Porque, de um lado como do outro, se não matas, morres”

Depois da Guiné, a enfermeira passa por Luanda – onde, em 1961, se iniciaram as batalhas pela independência das colónias africanas –, mas é em Moçambique que conhece as maiores agruras da guerra. Destacada em 1973 para Mueda, no Norte, junto à fronteira com a Tanzânia, vive numa casa destinada a um pequeno corpo clínico, só com três enfermeiras, a 300 metros do quartel. A base militar não é mais do que um aeródromo e toda a área, que ronda o meio quilómetro quadrado, está sob constante ataque das forças independentistas. A colega que substituíra tinha sido atingida na cabeça, na véspera de ir embora (acabaria por sobreviver).

Muitas noites são passadas no abrigo construído à saída da tal casa. Como não há resgates noturnos, Rosa dispensa o camuflado e veste-se à civil depois do banho ao fim da tarde, para se sentir uma pessoa normal. É por isso que chega a ir assim vestida para o abrigo, tal como ela e as colegas se veem obrigadas a correr em pijama para o local seguro, quando os alarmes as acordam a meio do sono. Como sempre, para enganar o pânico, põe-se a conversar consigo própria.

“Vi a destruição humana a que se pode chegar (…) Fui percebendo que os homens perdem a capacidade de raciocinar perante os conflitos. E entendo que a percam… Porque, de um lado como do outro, se não matas, morres”, afirmaria, décadas mais tarde, uma das 46 enfermeiras paraquedistas que integraram este corpo pioneiro, o primeiro das Forças Armadas a incluir mulheres.

A ideia partiu de Isabel de Mello Rilvas, a primeira paraquedista portuguesa, que a propôs ao secretário de Estado da Aeronáutica, Kaúlza de Arriaga, ainda nos anos de 1950. À segunda tentativa, o general haveria de convencer António de Oliveira Salazar a avançar, num tempo em que a mulher era olhada em Portugal como mera dona de casa dedicada ao marido e aos filhos.

Além da guerra, as enfermeiras paraquedistas enfrentaram preconceitos enraizados na sociedade da época. As primeiras foram recrutadas em escolas religiosas, tinham de ser solteiras sem filhos e não podiam ter mais de 30 anos. Uma morreu em serviço, na Guiné, em 1973.

Se nos tempos da ditadura nunca foi oportuno divulgar as proezas destas militares voluntárias, com o 25 de Abril de 1974 interessava enterrar o quanto antes um passado ligado ao antigo regime. Mas não é que as enfermeiras paraquedistas tivessem estado no lugar errado à hora errada. Aconteceu precisamente o contrário.

Um par de meses antes da Revolução dos Cravos e do fim da Guerra Colonial, Rosa casou-se com um militar e pediu a demissão da Força Aérea. Hoje, aos 78 anos, vive na zona de Lisboa e está para lançar uma autobiografia (ed. Fronteira do Caos) sobre esses tempos em que diz ter testemunhado o melhor e o pior da natureza humana. Um livro escrito em nome da coragem e contra o esquecimento.

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Numa das principais praças da cidade de Belém, capital do estado brasileiro do Pará, destaca-se uma estátua, com quase sete metros de altura, do explorador e militar português Pedro Teixeira. No Brasil, por sinal, Teixeira é extensamente recordado, com o seu nome atribuído a artérias e navios, e com os seus feitos a inspirarem obras literárias, de escultura, de pintura e de cinema. Até o exército brasileiro tem um batalhão com o seu nome. Já em Portugal, há apenas uma rua com o seu nome, no Restelo, em Lisboa, e uma estátua sua, na terra natal, Cantanhede.

E, no entanto, Teixeira foi o descobridor do grande Amazonas: no século XVII, subiu o longuíssimo rio, com cerca de sete mil quilómetros de extensão (compete com o Nilo como o maior do mundo), da foz à nascente, e depois desceu-o, de regresso ao local de partida, numa expedição que tinha tudo para correr mal, mas que se revelou um êxito. Especialistas não têm dúvidas em considerá-la o maior feito de navegação fluvial que até hoje a História regista.

Teixeira “falava Tupi”, a língua dos índios, o que lhe dava uma “vantagem significativa” na convivência e no “hábito de lidar com os indígenas”

Os historiadores confrontam-se com informações contraditórias sobre o jovem Teixeira e quando chegou ele ao Brasil. A versão mais referida aponta a sua chegada em 1607, na casa dos 20 anos, descrevendo-o como de ascendência nobre, cavaleiro da Ordem de Cristo e moço-fidalgo da Casa Real. Estamos em tempos em que a mais rica colónia portuguesa, com importante participação no comércio do Atlântico, se viu, por isso mesmo, invadida por franceses, holandeses e ingleses, cujas embarcações proliferavam na foz do Amazonas.

Com registo histórico comprovado, Pedro Teixeira surge, em 1615, enquanto alferes, integrado numa expedição militar que rumou de Pernambuco ao Maranhão, próximo da fronteira com a floresta amazónica. A missão era de crucial importância: expulsar dali forças gaulesas, que, em 1612, tinham tomado posse do Maranhão, fundando uma dita França Equinocial. Os combates centraram-se na estratégica ilha de São Luís e, ainda em 1615, os franceses foram derrotados e postos em fuga.

No ano seguinte, já tenente, Teixeira acompanhou o capitão Francisco Castelo Branco na fundação de Belém, nas margens do rio Guamá, boca de entrada no grande Amazonas. Como observa Rafael Ale Rocha, historiador, escritor e professor na Universidade Federal do Amazonas, ele “tem importância” no aparecimento das duas capitais – São Luís e Belém – do que “veio a ser o estado do Maranhão e Grão-Pará” que, a partir de 1621, por decisão da coroa, ficou em exclusivo subordinado a Lisboa. Significou isto a separação da Amazónia do Brasil e a criação da chamada América Portuguesa.  

O percurso de Teixeira seguiu sempre em crescendo. Como capitão, acumulou vitórias militares sobre forças invasoras holandesas e inglesas, e chegou a pertencer a uma junta que governou Belém de forma interina. Em Gurupá, região próxima da foz do Amazonas, envolveu-se numa série de conflitos com tribos de índios, mas mudaria de política. Teixeira “falava Tupi”, a língua dos índios, o que lhe dava uma “vantagem significativa” na convivência e no “hábito de lidar com os indígenas”, diz Rafael Ale Rocha. Isto é: depois de os guerrear, tornou-os seus aliados, agora usando a arma das trocas comerciais, sendo os tupinambás o melhor exemplo disso mesmo. 

SECRETA “CARTA DE PREGO”

No início de 1637, chegaram ao forte de Gurupá dois frades franciscanos, seis soldados espanhóis e alguns índios, todos em estado deplorável. Encontrados numa pequena embarcação, traziam uma história milagrosa: eram os únicos sobreviventes de uma expedição castelhana que havia partido de Quito, Amazonas abaixo, e que fora atacada e dizimada por índios que os espanhóis chamavam de Los Encabelados.

Os náufragos seriam ouvidos pelo governador do Maranhão e Grão-Pará, Jácome Noronha, que ficou preocupado com um possível domínio espanhol do Amazonas a partir do Peru. Vivia-se o tempo da chamada União Ibérica, em que Portugal se encontrava sob o domínio filipino de Castela. Mas, com o pretexto de que os náufragos castelhanos manifestaram o desejo de regressar ao Peru, Jácome Noronha assumiu então o risco de empreender, sob sua responsabilidade, a viagem de subida e descida do Amazonas, em todo o seu curso. Viu nela uma oportunidade única de alargar a soberania portuguesa à maior parte da bacia amazónica. E para organizar, comandar e realizar a expedição não tinha ninguém melhor do que Pedro Teixeira. Para o efeito, nomeou-o capitão-mor e general de Estado, outorgando-lhe plenos poderes.

Durante mais de oito meses, Teixeira preparou homens e equipamentos para a perigosa viagem por um rio que ainda hoje tem associadas as últimas áreas terrestres inexploradas do planeta. Quando partiu de Gurupá a 28 de outubro de 1637, a expedição tinha uma dimensão impressionante: para lá dos oficiais que coadjuvavam Teixeira no comando, era constituída por cerca de 70 canoas (sendo 45 de grandes dimensões, necessitando de 20 remadores cada), 70 soldados portugueses e perto de 1 200 índios tupinambás, entre guerreiros e remadores, mais as suas mulheres e os seus filhos, num total que rondava as duas mil pessoas.

Em julho de 1638, Teixeira chegou à confluência dos rios Napo e do Ouro, na atual fronteira entre o Peru e o Equador. A expedição estava perto da nascente do Amazonas, na cordilheira dos Andes, e com Teixeira, à frente de um pequeno grupo dos viajantes, hão de fazer de mula, a cavalo ou a pé o caminho até Quito, onde chegam em novembro.

Ali, o explorador português entregou uma informação sobre a viagem e o respetivo roteiro para serem oferecidos ao vice-rei do Peru, D. Luís Cabrella e Bobadella. Mas a expedição incomodou os castelhanos. Foram logo designados dois jesuítas espanhóis para integrarem a viagem de regresso e anotarem tudo o que testemunhassem. Já em Madrid, houve propostas para que o Conselho das Índias punisse Jácome de Noronha por ter ordenado a expedição à revelia das autoridades espanholas, sugestões a que Filipe IV não deu seguimento.

Teixeira iniciou, em fevereiro de 1639, a viagem de regresso. A 15 de agosto atingiu o rio do Ouro. Aí abriu a “carta de prego” que trouxera desde a partida e, como Jácome de Noronha lhe ordenara, leu-a. Tal carta informou que Teixeira “em nome do Rei Felipe IV Nosso Senhor tomou posse pela Coroa de Portugal do dito sítio, e mais terras, rios, navegações, e comércios”. Pela “Coroa de Portugal”… Rafael Ale Rocha sublinha que, depois do ato, “os presentes foram inquiridos sobre se existiam oposições àquela posse, mas, apesar da presença dos dois jesuítas espanhóis na comitiva, ninguém se manifestou nesse sentido”. Acrescenta o historiador: “A ausência de oposição seria um elemento argumentativo importante nas querelas envolvendo as fronteiras luso-castelhanas na América”, que só acalmaram em 1750, com a assinatura do Tratado de Madrid.

A 12 de dezembro de 1639, a expedição de Pedro Teixeira chegou a Belém, dois anos e dois meses após a partida. Foi recebida em festa e, depois, em S. Luís do Maranhão, o explorador entregou ao governador, Bento Maciel Parente, os dados comprovativos da viagem. Pelos serviços prestados, seria nomeado governador e capitão-mor do Pará, em fevereiro de 1640, mas logo em maio de 1641 abdicou do cargo. Queria regressar à metrópole, já com a monarquia portuguesa restaurada, com a aclamação de D. João IV. Não o conseguiu: morreria em Belém, em junho de 1641.

Fica sabido porque o Brasil recorda e estuda Pedro Teixeira. Mas não se percebe porque é um ilustre desconhecido em Portugal. E, como desculpa, não serve a alegação de que a historiografia brasileira se “apropria” de relevantes figuras portuguesas…

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Palavras-chave:

No último quartel do século XIX, quando as principais potências europeias se lançaram na corrida à ocupação de África, Portugal viu-se também envolvido nessa movimentação. Não porque fosse uma grande potência como o Reino Unido, França ou a Alemanha, mas porque alegava ter direitos históricos ao seu quinhão. A verdade é que o contacto dos portugueses com África remontava já ao século XV. O facto é que algumas zonas do que viriam a ser as colónias de Angola e Moçambique eram desde há muito regidas por governadores nomeados por Lisboa, sendo travadas guerras contra os soberanos locais. Escusado será dizer que nunca ninguém pediu a opinião destes acerca da ocupação das suas terras por europeus.

Chegou-se mesmo ao ponto de organizar, em 1884-1885, um congresso, em Berlim, durante cujos trabalhos os representantes das “potências” pegaram numa caneta e numa régua e traçaram no mapa as fronteiras da partilha geográfica de toda a África. Portugal achava-se com direito a que fosse reconhecida a sua soberania sobre uma vasta porção do continente, entre as costas de Angola e de Moçambique, englobando a Zâmbia e o Zimbabué atuais. Até se imprimiu e distribuiu um mapa onde essas terras estavam pintadas num tom rosado – o famoso Mapa Cor-de-Rosa, de que quase toda a gente já ouviu falar. Se os seus direitos foram de algum modo reconhecidos pelos parceiros e rivais, como sabemos que foram apesar de muitas reticências, isso ficou exclusivamente a dever-se, portanto, ao peso da História. 

Convém lembrar que, para justificar a ocupação e o saque de terras que não lhes pertenciam, os europeus inventaram todos os argumentos possíveis e imagináveis. O mais usado era o da sua “missão civilizadora” de terras selvagens. O escritor colonialista britânico Rudyard Kipling chamou mesmo a esta tarefa, apresentada como penosa, “o fardo do homem branco”.

Ora, antes de se colonizarem os territórios, era preciso primeiro explorá-los geograficamente e, depois, ocupá-los militarmente. Foi neste ponto que entraram em cena os exploradores portugueses Alexandre Serpa Pinto, Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens – isto para falar apenas de três deles, porventura os que a História não esqueceu de todo.

Um dia, ao passar por uma zona reivindicada pelos ingleses, junto do lago Niassa, decidiu arriar as bandeiras britânicas que encontrou

Destes, o que teve uma vida mais rocambolesca foi o primeiro. Serpa Pinto era um homem valente, mas que fervia em pouca água. Um dia, ao passar (com os seus carregadores, que transportavam fardos à cabeça) por uma zona reivindicada pelos ingleses, junto do lago Niassa, decidiu arriar as bandeiras britânicas que encontrou. Resultado: gerou um sério incidente diplomático que, empolado e acrescido de outros fatores, viria a desaguar num importante conflito com a Inglaterra. Decerto a leitora ou o leitor já ouviu falar do Ultimato de 1890, pelo qual os britânicos intimaram os portugueses a deixar para eles os territórios que ficavam entre Angola e Moçambique, sob pena de uma fragata de sua majestade britânica vir bombardear Lisboa. Este incidente desacreditou de tal forma a monarquia, que está na base da implantação da República, em 1910, mas isso é outro assunto.

Serpa Pinto nasceu em 1846 na região do Douro. Desde novo que sonhava com África, cuja paisagem seca mas colorida o fascinava. Foi em 1869 que teve o seu primeiro contacto com a terra dos seus sonhos, integrado, como oficial do exército, numa expedição contra um rebelde chamado Bonga. Mas foi em 1877, antes ainda do Congresso de Berlim, que entrou verdadeiramente na História, ao ser incumbido, com os oficiais da Armada Capelo e Ivens, de explorar a região compreendida entre as bacias hidrográficas do Congo e do Zambeze.

As coisas não podiam ter corrido pior, pois zangou-se com os companheiros e decidiu continuar sozinho (levando carregadores, entenda-se) até à costa de Moçambique. Não conseguiu chegar lá, mas atingiu Pretória, na África do Sul, e embarcou em Durban de regresso à Europa. No caminho, atacado pelas febres, foi salvo por uma família de missionários franceses, com a qual também se incompatibilizou. Voltaria ainda a África, como administrador, e foi então que arriou as tais bandeiras inglesas. Deixou todas as suas aventuras contadas no livro Como Eu Atravessei a África e morreu ainda novo, com 54 anos, na sua casa de Lisboa. Está um pouco esquecido, sim, e por isso o recordamos aqui.

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Palavras-chave:

João Rodrigues Cabrilho nasceu num dia impreciso de finais do século XV ou dos primórdios do século XVI. Mas, “perante os dados históricos verificados”, é “lícito concluir” que a naturalidade de Cabrilho está na pequena aldeia de Lapela, hoje pertencente à freguesia de Cabril, nas faldas da serra do Gerês (concelho de Montalegre). Quem o garante e escreve é o biógrafo João Soares Tavares, que investiga aquele conquistador e navegador há cerca de meio século, trabalho plasmado em quatro livros e numerosos artigos. Têm razão, pois, os habitantes de Lapela de Cabril, que há décadas a fio insistem em que uma das casas de granito da sua aldeia foi o berço do “descobridor da Califórnia”. Emenda-os o biógrafo: descobriu, sim, a costa da Califórnia.

Não foi fácil o trabalho de João Tavares. “Os historiadores nacionais pesquisados não revelaram grande apetência” por Cabrilho, nota. “Para alguns (…) não existiu, pois ignoram-no”, acrescenta. Só encontra uma razão para isso: Cabrilho deixou obra sob a bandeira de Castela. Sem alternativa nacional, calcorreou arquivos e bibliotecas de Espanha e da América hispânica para construir o puzzle do percurso da figura que logo o fascinou.

Cabrilho abandonou muito novo a sua aldeia natal, em busca de melhores condições de vida. Com grande probabilidade, juntou-se à multidão de jovens portugueses esperançados em obter lugar no primeiro navio que zarpasse para o “novo mundo” das ditas “Índias Ocidentais” (de Castela), aglomerando-se em Sevilha, onde na generalidade eram organizadas essas expedições espanholas.

A certa altura, explica João Tavares à VISÃO, o monarca de Castela, Carlos V, “viu-se obrigado a restringir o embarque”, interditando a aceitação de estrangeiros “na navegação das Índias”. Por isso, o biscateiro Cabrilho transformou-se em Juan Rodriguez, enganando assim a Casa da Contratação das Índias.

Fidedignos documentos da época desfazem quaisquer dúvidas sobre a nacionalidade portuguesa de Cabrilho e acerca do seu achamento

“Segundo seu testemunho”, nota o biógrafo, “embarcou em 1514” para o território então designado por “Castela do Ouro”, situado na região do atual Panamá. Em 1520, estava em Cuba – e, a partir daqui, o seu percurso encontra-se documentado, assinala João Tavares. Estava na casa dos 20 anos, integrou o grupo militar comandado por Pánfilo de Narváez, tornou-se perito no manejo da besta e participou na fase final da tomada daquela ilha por Castela. E começou a adquirir conhecimentos marítimos no porto de Carenas (atual Havana), no qual se reparavam os barcos e se preparavam as viagens e as expedições após a conquista de Cuba.

A seguir, o nosso Juan Rodriguez viu-se como peão de um conflito político entre o navegador e conquistador Hernán Cortés, enviado em 1519 para “pacificar” o México, e o governador de Cuba, Diego Velázquez. Cabrilho desembarcaria no México em abril de 1520, como besteiro do exército chefiado por Narváez, este com ordens de Velázquez para submeter e prender Cortés. A versão oficial é a de que Velázquez soubera das “atrocidades impostas aos nativos” pelos homens de Cortés. Mas “a principal razão seria o tesouro dos astecas extorquido por Cortés que também seduzia o apetite de Velázquez”, conta João Tavares.

Os dois exércitos enfrentar-se-iam em maio seguinte, e Cortés saiu vencedor da batalha. Juan Rodriguez mudou então de lado (para o do triunfador) e o biógrafo diz ter “fortes razões” para concluir que, para se distinguir de combatentes homónimos, ele juntou nesta altura ao nome a alcunha de “Cabrilho” (espanholizada para “Cabrillo”), inspirado no topónimo da sua região natal – Cabril. O exército de Cortés (que teve o cuidado de manter Carlos V informado sobre a conquista e a justificação do “empreendimento”) avançaria, de batalha em batalha (numa das quais Cabrilho ficou ferido), até à tomada, em 1521, de Tenochtitlán, a capital do império asteca (atual Cidade do México).

RICO E TRÁGICO

Cabrilho partiria depois, sob o comando de Pedro de Alvarado, à conquista da Guatemala e de outros territórios para o Sul. E enriqueceu. Foi um dos fundadores de Santiago de los Caballeros, a primeira capital da Guatemala, região que à época abarcava grande parte da América Central e o estado de Chiapas, do México. A coroa atribuiu-lhe uma dose generosa de terras, numa das quais seria encontrada uma mina de ouro, que o tornou um dos conquistadores mais prósperos da Guatemala. 

Ao mesmo tempo, transformou-se num exímio navegador de costa, o que não passou despercebido a Antonio de Mendoza, vice-rei da Nova Espanha (México). Em 1542, Mendoza atribuiu-lhe a missão de descobrir a costa do Norte do oceano Pacífico. Cabrilho será o almirante da armada de três barcos – San Salvador, La Victoria e San Miguel – que, a 27 de junho de 1542, larga de um porto mexicano que ele próprio achara e fundara. E, a 28 de setembro seguinte, descobre uma bela baía, que é hoje a da cidade californiana de San Diego. Mas continuaria a viagem para norte. “Descobre várias ilhas, descreve a morfologia da costa, o clima, os hábitos e a alimentação dos indígenas, relaciona-se com diferentes tribos, faz amizades”, conta João Tavares. “Somente depois da viagem de Cabrilho começaram a surgir mapas da costa da Califórnia.”

O navegador já não regressou ao porto mexicano de onde zarpara. Quando invernava numa ilha que descobriu durante a viagem para norte, e que batizara de Posesión (atual San Miguel), morreu a 3 de janeiro de 1543, na casa dos 40 anos e cerca de seis meses após a partida. “Como causa da morte é referenciada uma fratura resultante de uma queda que dera nessa mesma ilha quando aí desembarcou pela primeira vez, agravada pelas condições difíceis em que decorreu a viagem”, relata o biógrafo. Os seus companheiros, entre os quais se encontrava pelo menos um português, mestre António Correa, enterraram-no ali.

Sendo que fidedignos documentos da época desfazem quaisquer dúvidas sobre a nacionalidade portuguesa de Cabrilho e acerca do seu achamento, o estado da Califórnia instituiu, em 1935, o dia 28 de setembro como a data do descobrimento da sua costa pelo navegador luso. O governo de Salazar ofereceria àquele estado norte-americano uma estátua de Cabrilho, da autoria do escultor Álvaro de Brée, que em 1949 seria colocada numa falésia sobre a baía de San Diego. Devido à degradação que sofreu, essa estátua seria substituída pela que existe hoje, situada no mesmo local, feita pelo escultor Charters de Almeida, inaugurada em 1988 e financiada por uma filantropa norte-americana, Marion Reupsch, admiradora de Cabrilho.

A 28 de setembro de cada ano, a Califórnia comemora o descobrimento da sua costa, dramatizando, por exemplo, o desembarque do navegador português e dos companheiros na baía de San Diego, à semelhança do que aconteceu em 1542. Mas na historiografia nacional quem liga a isso, tirando o biógrafo de Cabrilho?…

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Palavras-chave:

“Escreva-me”, implora o vice-rei da Índia, Vasco Fernandes, numa carta enviada a Juliana Dias da Costa, em 1715. “Já passou muito tempo”, acrescenta o representante do rei D. João V no território colonial, admitindo que Portugal lhe deve muitos favores e sem omitir a esperança de que ela continue a interceder pelos interesses nacionais no coração do Império Mogol.

A influência desta devota católica portuguesa no reino muçulmano, que poucas décadas antes havia erguido o Taj Mahal e chegou a ser o mais rico do mundo na transição para o século XVIII, está documentada na correspondência trocada com os governantes do Estado Português da Índia. Já estes, nas comunicações com o rei, em Lisboa, apelidam-na de “procuradora”, alguém que, insistem, é necessário proteger e estimar. Da boa convivência com os vizinhos crentes do Islão, cujos domínios se estendem por quase todo o subcontinente indiano e por terras hoje pertencentes a Afeganistão, Bangladesh e Paquistão, depende o futuro dos enclaves ainda em mãos portuguesas naquelas latitudes, informam as mais altas esferas políticas da região.

O poder de Juliana junto do grão-mogol, o imperador, conhece o apogeu entre 1707 e 1712, quando reina Bahadur Shah I. É neste período, no ano de 1711, que ela escreve a única carta (conhecida) ao soberano de Portugal. Invocando Jesus Cristo e a graça do Espírito Santo, diz rezar pela glória do reinado de D. João V e alude às boas relações entre os dois impérios, recordando os presentes trocados. Rodrigo da Costa, antecessor de Vasco Fernandes no governo da Índia, logo sugere ao rei que a honre com uma resposta, “dado o bem que ela faz pelo Estado”, ao que D. João V acede.

Na zonado palácio onde vivem todas as mulheres da família, incluindo as várias esposas do imperador e o próprio, além de criadas e concubinas, é Dona Juliana, como passa a ser designada por decreto, a zeladora-mor

Religiosa e com conhecimentos de medicina, poliglota e diplomata, digna de confiança. Assim é descrita pelas escassas fontes históricas (embora em seis línguas) que se debruçam sobre o papel improvável de Juliana Dias da Costa, elevada a governanta do harém do grão-mogol a partir do momento em que o príncipe Muazzam, também conhecido por Shah Alam, sobe ao trono como Bahadur Shah I. Nesta zona do palácio onde vivem todas as mulheres da família, incluindo as várias esposas do imperador e o próprio, além de criadas e concubinas, é Dona Juliana, como passa a ser designada por decreto, a zeladora-mor.

Um relato impressivo desse tempo é retirado do diário de missão de um nobre enviado pela Companhia Holandesa das Índias Orientais para negociar acordos comerciais. Ao aproximar-se da cidade de Laore, ao encontro de Bahadur Shah I, ele é primeiro recebido por D. Juliana, que ora se desloca em elefantes, ora em charretes luxuosamente ornamentados, sempre escoltada por soldados, os estandartes com a cruz de Cristo a vermelho e branco bem visíveis.

Ao longo de mais de dois meses, entre dezembro de 1711 e fevereiro de 1712, John Joshua Ketelaar, o nobre em causa, é presenteado com oferendas e banquetes faustosos, providenciados por D. Juliana em nome do imperador. Seguindo os conselhos da portuguesa, que, segundo escreve, nada aceita para ela, retribui a gentileza a vários elementos importantes da corte mogol. É também ela quem lhe indica o dia do encontro com Bahadur Shah I. Os acordos são selados, mas antes de estar tudo assinado, morre o imperador. Ketelaar ouve outra mensagem sensata da anfitriã, no sentido de se precaver, uma vez que as mudanças de poder costumam ser atribuladas.

Juliana sabe do que fala, ou não tivesse testemunhado a ascensão do então príncipe Muazzam, após derrotar dois irmãos no campo de batalha. Já o pai deles, o imperador Aurangzeb, tinha aniquilado toda a concorrência familiar ao trono, para não ser contestado. Apesar de um fervoroso do Islão, escritos de missionários jesuítas garantem que cultivava uma tolerância para com os cristãos, que aumentaria ainda mais com a chegada do filho ao poder. Tradicionalmente, os mogóis também já mantinham boas relações com os portugueses, que se tornariam ainda melhores.

Exílio O imperador Aurangzeb, que acusou o filho Muazzam de traição e o condenou ao desterro, onde Juliana terá mostrado a sua lealdade ao príncipe

Bahadur Shah I oferece a D. Juliana terras, um salário mensal e o palácio que pertencera a um dos tios mandado executar pelo pai, Aurangzeb. O grau de proximidade é tal que a nomeia depositária da coroa, atribuindo-lhe a responsabilidade de a passar ao sucessor. É por isso que ela consegue demovê-lo, por exemplo, de entregar o controlo da frota naval a um francês, o que poderia constituir uma ameaça para Portugal, ou fazê-lo revogar o imposto que recaía sobre os não muçulmanos – tal como mais tarde, já com outro imperador, evitará um incidente diplomático, ao obter autorização para uma armada portuguesa atracar no porto neutro de Surrate, a fim de resgatar um barco capturado por árabes, quando, na verdade, a frota já havia zarpado de Goa com esse destino e propósito.

Na correspondência com os vice-reis da Índia, nunca fica explícito se Juliana é uma espécie de “agente infiltrada” ou apenas alguém no lugar certo à hora exata, por sinal com sangue português. Este é um dos muitos mistérios por desvendar sobre esta mulher com muitas pontas soltas: como foi ela ali parar e assumir um cargo de topo na corte mogol, tendo ainda servido mais alguns imperadores após a morte de Bahadur Shah I, com direito a um par de meses na prisão durante uma das tais transições de poder atribuladas?

De escrava a enviada por um padre católico, passando por ter chegado através de um pai ou de um marido médicos ou da mãe que teria ido servir no harém ainda no tempo de Aurangzeb, há várias versões que a História conserva turvas. Uma muito recorrente sugere que, a dado momento, Juliana fica encarregada de cuidar do jovem príncipe Muazzam, nunca o tendo abandonado durante os anos em que o pai, Aurangzeb, o reteve num exílio forçado, acusando-o de conspirar contra si, sendo ela depois recompensada por tamanha prova de lealdade.

O livro Juliana Nama, da autoria de um ex-diretor do Museu Nacional de Nova Deli e de um arquivista, publicado na Índia em 2017, após mais de 30 anos de investigação, avançou, pela primeira vez, que os uniu um amor mantido em segredo. Certo é que não é sequer consensual quando e onde na Índia nasceu ou morreu Juliana Dias da Costa (possivelmente 1732 ou 1734, no segundo caso) nem quem foram os seus pais – da mesma forma que ninguém conhece o lugar em que foi sepultada.

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Palavras-chave:

Juliana Dias da Costa: A governanta do harém


Devota da fé cristã, nascida algures na Índia, era influente junto do imperador mogol, então o reino mais rico do mundo, fiel ao Islão. Enquanto se correspondia com D. João V e com os vice-reis dos territórios portugueses no Índico, andava de elefante escoltada por soldados muçulmanos e foi presenteada com um palácio. Uma história de amor? LEIA AQUI

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Em 1542, descobriu a costa da Califórnia, feito que o Estado norte-americano comemora todos os anos. Mas a historiografia nacional votou-o ao esquecimento. O seu biógrafo só encontra uma explicação: o navegador deixou obra sob a bandeira de Castela. LEIA AQUI

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À data da sua morte, em 1900, este explorador tinha ficado na sombra de Capelo e Ivens, antes de a sua imagem ter sido recuperada, já no século XX. LEIA AQUI

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O descobridor, em todo o seu curso, do que é tido como o maior rio do mundo até dá nome, no Brasil, a um batalhão do exército. Já em Portugal, o protagonista do maior feito de navegação fluvial da História é um ilustre desconhecido. LEIA AQUI

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A enfermagem não a entusiasmava e muito menos desejava saltar de paraquedas, mas seguiu o instinto até aterrar em África, a tempo de resgatar militares, civis e até inimigos da frente de combate. Alferes num corpo pioneiro nas Forças Armadas, escondido por Salazar e enterrado pelo 25 de Abril, esteve debaixo de fogo sem se dar conta, correu de pijama para o abrigo ao som das sirenes e fez jus ao lema de não deixar ninguém para trás – a não ser quando não tinha escolha. LEIA AQUI

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Eis o relato da vida de uma mulher que se disfarçou de homem, foi grumete de caravela, bravo oficial-cavaleiro em Mazagão e que uma investigadora compara à guerreira francesa de quatrocentos. Tudo para acabar fechada numa gaveta da História. LEIA AQUI

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Como agente secreto de D. João II, descobriu-lhe inimigos internos, negociou por ele com reis berberes e, sobretudo, infiltrou-se por terrana Índia, disfarçado de mercador árabe, recolhendo informações valiosas para a futura viagem de Vasco da Gama. Morreu na Etiópia – descartado. LEIA AQUI