Em comunicado, o Centro Nacional de Cibersegurança (CNCS) afirma que o exercício decorreu na sexta-feira nas suas instalações.

Além do CNCS, participaram na ação a Comissão Nacional de Eleições (CNE), a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), a Lusa — Agência de Notícias de Portugal, o Gabinete de Cibercrime do Ministério Público e a Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna.

Na ação foi definido como cenário “uma série de incidentes associados a campanhas de desinformação”, como disseminação de sondagens fraudulentas, documentos e notícias falsas e apropriação de ‘templates’ de órgãos de comunicação social.

Perante os vários cenários, as diferentes entidades envolvidas “demonstraram estar empenhadas, tendo sido várias as atividades de colaboração na efetiva preparação da cibersegurança dos atos eleitorais”.

“Ficou demonstrado existir um conhecimento amplo das competências de cada uma das entidades em relação às demais e ficou demonstrada a consciência da necessidade de colaboração”, destaca.

Segundo o CNCS, foram também realçadas dificuldades relacionadas com a “sensibilização dos partidos políticos para as questões da cibersegurança”, o que “aumenta o risco”.

 

SPC // EA

Palavras-chave:

Em comunicado enviado à agência Lusa, a estrutura sindical acusou hoje o Governo de desperdiçar a oferta pública na educação pré-escolar “para promover” as entidades privadas.

“A Fenprof exige que o Ministério da Educação avalie as reais necessidades a nível local, no que respeita à educação pré-escolar, sinalizando a oferta pública disponível, tanto ao nível de equipamentos, como recursos materiais e humanos, de forma a garantir que, na implementação da universalidade da educação pré-escolar, a oferta pública seja a primeira prioridade do Estado”, salientou a organização sindical, na mesma nota.

Segundo a Fenprof, o Governo foi ao longo dos anos “aprovando medidas de favorecimento às Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) e ao setor lucrativo” que foram transformando a educação pré-escolar e a creche “num mercado apetecível”.

“É incompreensível que o Estado continue a desbaratar dinheiro em soluções que retiram às crianças a possibilidade de ingressarem em jardins-de-infância públicos gratuitos, onde está garantida a igualdade de oportunidades no acesso à educação pré-escolar “, criticou a estrutura sindical.

A Fenprof lembrou que isto acontece numa altura em que já se encontra “legislada e consolidada a universalidade da frequência” para as crianças de quatro e cinco anos e aprovada em Assembleia da República para as de três anos.

“O que temos é a assinatura de um acordo que visa promover a designada rede solidária em detrimento da rede pública”, afirmou a organização sindical, segundo a qual essa forma de agir contraria a Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar e a Constituição da República.

De acordo com a Fenprof, “o Estado está a desperdiçar os seus recursos humanos e físicos enquanto financia IPSS”, sem exigir “a equiparação das condições de trabalho”.

AYR // EA

Lusa/ Fim

A campeã mundial Argentina tinha anunciado uma digressão pelo país asiático de 18 a 26 de março, durante a qual deveria defrontar a Nigéria, de José Peseiro, na cidade de Hangzhou, e a Costa do Marfim, em Pequim, seleções que são as finalistas da Taça das Nações Africanas.

No entanto, a ausência de Messi, que não saiu do banco, num jogo dos norte-americanos do Inter Miami frente a uma seleção local de Hong Kong, no domingo, causou indignação nos adeptos, com a organização a reembolsar parte do valor que tinham pago pelos bilhetes.

O ‘astro’ argentino, que tinha falhado o jogo anterior devido a lesão, acabou depois por jogar 30 minutos num amigável no Japão, o que agravou o descontentamento.

“Muitos adeptos de futebol solicitaram informações sobre o jogo de Messi em Pequim. Após verificação (pelos nossos serviços), Pequim não está atualmente a planear organizar o jogo em que Lionel Messi deveria participar”, declarou a Associação de Futebol de Pequim, o organismo que supervisiona o futebol na capital chinesa, já depois de ter sido confirmado que o jogo em Hangzhou também não se realizaria.

Elementos ligados à seleção argentina declararam que em causa estão questões burocráticas, que nada têm a ver com a ausência de Messi em campo no jogo disputado em Hong Kong

AJO // AJO

Os meios de comunicação alemães afirmam ter por base informações de círculos de segurança alemães e deputados, embora o Ministério do Interior e a polícia tenham afirmado, quando questionados, que não queriam fazer previsões sobre a evolução dos fenómenos migratórios.

Desde o início da guerra, em fevereiro de 2022, chegaram à Alemanha 1,1 milhões de cidadãos ucranianos.

Segundo a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), há 3,7 milhões de pessoas deslocadas internamente na Ucrânia e cerca de 5,9 milhões de ucranianos fugiram do país, procurando refugio noutros países europeus.

O líder do partido da oposição alemão, União Democrata-Cristã (CDU), Roderich Kiesewetter, afirmou ao jornal alemão que, com o senado norte-americano a bloquear a ajuda à Ucrânia, a Europa é mais responsável do que nunca pelo destino do país.

Para Roderich Kiesewetter, os Estados que apoiam agora a Ucrânia teriam de aumentar significativamente a ajuda militar face à hesitação dos Estados Unidos da América (EUA).

“Se não alteramos a estratégia de apoio à Ucrânia, no pior cenário possível, um êxodo em massa e uma expansão da guerra aos países da NATO, será muito mais provável. Por isso, 10 milhões de refugiados é uma estimativa baixa”, afirmou.

Já o investigador em migração, Geral Knaus, partilha da mesma avaliação, ao assinalar que, “se a Ucrânia perder a guerra, muito mais de 10 milhões de refugiados poderão chegar à União Europeia”.

“Já é hoje o maior movimento de refugiados na Europa desde os anos 1940”, enfatizou.

Apesar dos atuais problemas da Ucrânia na guerra, face à falta de munições e o impasse nas frentes de combate, o Governo alemão acredita que o país tem meios militares e financeiros para manter a defesa e estabilidade até ao final deste ano, indica o jornal diário.

 

SPC // EA

 

“A greve foi suspensa porque houve um acordo negociação de aumentos salariais de 10%” disse à Lusa Luis Trindade, da direção do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul.

A greve que foi suspensa, na sequência deste acordo, teria início hoje e estava marcada por tempo indeterminado, com a exigência de “aumentos salariais dignos” a integrar o leque de reivindicações, a par do “pagamento do trabalho suplementar”, “melhores condições de trabalho”, “cumprimento integral do Acordo de Empresa” e “contra o encerramento e restrições dos serviços de cafetaria e bar nos comboios”.

No comunicado em que anunciou a greve, o sindicato referia que “apesar dos problemas reiterados com a concessão do serviço de cafetaria e bar nos comboios de longo curso [Intercidades e Alfa Pendular] ao longo dos anos a CP optou por voltar a concessionar este serviço a privados através de um contrato de milhões assinado em 2023 com a Newrail, recusando internalizar o serviço e integrar os trabalhadores nos seus quadros”.

A estrutura sindical assinala que “em 2024 o contrato com a Newrail foi renovado por um período mínimo de 3 meses e um máximo de 6 meses”, indicando que em 2023 “os valores atribuídos à Newrail tinham como objetivo pagar os salários em atraso aos 130 trabalhadores e normalizar o serviço de cafetaria e bar nos comboios”.

Neste momento está a decorrer um concurso internacional para a concessão da exploração do serviço, mas tal não constituiu “impedimento que se negociassem aumentos” salariais, referiu Luís Trindade.

LT (ALN) // EA

“Fontes médicas informaram que 25 cidadãos foram mortos e outros ficaram feridos quando a ocupação bombardeou casas no centro e no norte de Rafah desde a noite passada”, afirmou a agência noticiosa oficial palestiniana Wafa.

A agência disse ainda que os navios de guerra israelitas, localizados no Mediterrâneo, estão a “disparar fortemente” sobre a costa da província de Rafah.

Israel anunciou na sexta-feira planos para alargar a sua ofensiva militar a Rafah, na fronteira com o Egito, mas acrescentou que a operação incluiria a retirada prévia de civis.

“É impossível atingir o objetivo de guerra de eliminar o Hamas e deixar quatro batalhões em Rafah”, frisou um comunicado do gabinete do primeiro-ministro de Israel.

Em Rafah encontram-se 1,3 milhões de palestinianos, cinco vezes mais do que a população habitual, os ataques na região intensificaram-se nos últimos dias e existe o receio de um ataque terrestre israelita.

A guerra entre Israel e o Hamas provocou até agora na Faixa de Gaza quase 28.000 mortos, pelo menos 67.500 feridos e 8.000 desaparecidos, na maioria civis, de acordo com o último balanço das autoridades locais.

O conflito originou também quase dois milhões de deslocados (mais de 85% dos habitantes), mergulhando o enclave palestiniano sobrepovoado e pobre numa grave crise humana, com toda a população afetada por níveis graves de fome que já está a fazer vítimas, segundo a ONU.

AYR (MYMM // PDF) // EA

 

Palavras-chave:

Vamos chamar as coisas pelos nomes. Na linguagem escrita, essas coisas assumem a forma de @, *, …, ! e #. No registo sonoro, “cobrem-se-se” com um “Piiiiiiiii” as vocalizações que causam impacto pela carga emocional associada e aquela que despertam em quem as ouve. Daí que não lhes chamemos palavras, mas palavrões. Rimam com “parvalhões” e outras, mais impactantes, que também terminam em “ões” (“cab…”, “cul…”). Logo aqui se percebe o poder evocativo do que não é dito e se imagina, ou vem à mente, de forma espontânea. 

A força das palavras tabu 

Do “abracadabra” ao “vai-te f…”, as palavras interditas, ou consideradas tabu, parecem possuir propriedades extraordinárias, que lhes conferem poder. É esse o caso quando elas se soltam da boca, de modo enfático se sem pudor, em inúmeras ocasiões: do típico linguajar no trânsito, que alivia frustrações, aos impropérios que atenuam a dor se a gente se aleija, passando pelo momento em que a equipa de que somos adeptos ganha (ou perde; os palavrões saem da boca na mesma, talvez com nuances de tom).

Com frequência, os “mimos” que se dirigem a potenciais adversários parecem ganhar, qual Pinóquio, vida própria e aparecer sem pedir licença, até mesmo em contextos solenes e ou ditos civilizados. 

Por vezes, apoiamo-nos nestes ‘companheiros’ como numa bengala, durante conversas banais, outras vezes são eles, os palavrões, que nos ‘atraiçoam’ e revelam o nosso discurso interno, com as suas pequenas e grandes angústias (veja-se a sinopse do podcast “Isso não se diz”, do comediante Bruno Nogueira, nas palavras do próprio, no Instagram: “É essencialmente um senhor com um microfone à frente a embirrar com situações.”)

De onde vem a força destas palavras feias e expressões pejorativas, que tanto visam afugentar quem não se deseja ter pela frente como se afiguram uma via privilegiada para fazer pontes, até as mais improváveis, e satisfazer necessidades de pertença? 

A Psicologia do obsceno 

As palavras grosseiras que nos vêm à cabeça e que, em boa parte das vezes, das vezes, fazemos questão de libertar (“saiu-me”, “atirei-lhe à cara”, “disse-o com todas as letras”), dizem muito sobre o nosso funcionamento mental e emocional, mas também acerca dos códigos de organização social. 

É uma história antiga que começa, invariavelmente, a partir do momento em que se aprende a falar, a perguntar e a reproduzir o que se ouve sem noção do impacto causado. Os “grandes” (os adultos) podem rir-se e abordar a situação de uma forma criativa ou indignar-se, castigar e repreender (há algumas décadas, prometiam por pimenta na língua se a criança repetisse o “calão” usado pelos mais velhos, por exemplo). Qualquer que seja a reação, envolve emoções intensas, sintetizadas num palavrão ou numa expressão que o inclua, e dificilmente se esquece. 

Essas memórias emocionais acompanham-nos pela vida fora e vão sendo modificadas com as experiências de cada um, na relação com os pares e a cultura (como esquecer as letras de músicas disruptivas que acompanharam a adolescência ou se associam a circunstâncias biográficas?).

Na Era Vitoriana, perturbações neurológicas como a Síndrome de Tourette deixavam envergonhados – e estigmatizados – alguns dos pacientes que tinham tido o “azar” de alguns verem os tiques e vocalizações repetidas e frequentes manifestarem-se sob a forma de coprolalia (ato involuntário de  dizer palavras obscenas que afeta uma em cada dez pessoas com a condição).

No início do século passado, este foi um tema de eleição para a Psicanálise. Sigmund Freud reconheceu o caráter ambíguo das palavras e a sua ligação simbólica a conteúdos latentes e vetados pela mente consciente em abono da aceitação social. Daí a importância das piadas, do humor, que permitiam disfarçar a expressão de sentimentos agressivos e outros, censuráveis, se ditos de forma explícita.

O seu colega e amigo húngaro, Sándor Ferenczi, viria a publicar um artigo sobre palavras obscenas, sublinhando a sua qualidade erótica. No seu entender, os desejos primitivos infantis, recalcados no período de latência (fase do desenvolvimento sexual que precede a puberdade) e transferidos para a linguagem, deviam ser explorados e chegar à consciência, através da nomeação desses vocábulos que, tantas vezes, levavam à punição (a boca da qual saiam pensamentos impuros).  

A importância do contexto

Muita coisa mudou, sobretudo no final dos anos 1960, mas não o suficiente, pelo menos na comunidade científica, como atesta um artigo publicado há dois anos no European Journal of Psychotherapy and Counseling, em que se defende que o uso de linguagem profana poderia acrescentar valor aos processos terapêuticos, lamentando que ainda seja tabu e gere controvérsia. O tema é complexo e está longe de resumir-se à gramática.

Na vida mundana, “o contexto e a interação verbal são essenciais para perceber se é uma estratégia de agressividade ou de violência verbal face ao interlocutor”, observa Isabel Roboredo Seara, investigadora do Centro de Linguística da Universidade NOVA de Lisboa, acrescentando: “Quem não avaliou já como hostil o ‘você’ em determinado contexto?”

A coordenadora do grupo de investigação DIGITHUM, integrado no Laboratório de Educação à Distância e eLearning (LE@D) da Universidade Aberta , onde é professora, traz à conversa um artigo do  linguista francês Patrick Charaudeau, sobre violência verbal e detalha: “Se usarmos palavras como m****, preto, cretino, p*** ou sacana de forma isolada elas podem não terão um efeito ofensivo, mas se as dirigimos a alguém com a intenção de rebaixar ou estigmatizar, já têm um valor de ofensa e de insulto.” 

Isabel Roboredo Seara, investigadora do Centro de Linguística da Universidade NOVA de Lisboa e professora na Universidade Aberta

Curiosamente, o carinho também pode entrar na equação. “Basta pensar num amigo que não se via há longa data. O valor do epíteto ‘meu sacana, há quanto tempo não te punha a vista em cima!’ é amigável.” Já os enunciados interrogativos, que podem veicular uma função crítica, ela pode ser agravada com um apelativo “Isto são horas de chegar, seu palerma?” Ou seja, “não se pode atribuir, a priori, um grau de violência às palavras, ele depende dos contextos, da perceção e da descodificação feita pelo destinatário”. 

Os palavrões podem incluir-se numa categoria mais vasta, a dos insultos, mas pode diferenciar-se deles pela qualidade da dinâmica estabelecida (e que pode ser de aceitação e consentimento, por exemplo). Haverá hoje mais propensão para usar os palavrões como armas de arremesso? 

“Com a utilização exacerbada de dispositivos digitais, qualquer um se pronuncia sobre qualquer assunto, há mais exposição e polémica”, reconhece a docente, mas mesmo tendo em conta a disseminação de conteúdos e comentários pouco refletidos, “provavelmente não existe mais violência verbal, mas esta tem mais visibilidade”.

A normalização do interdito: WTF e sucedâneos

“Nós somos pensados pela linguagem, ela molda-nos”, avança o Sérgio Luís de Carvalho, mestre em História Medieval pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e com obras publicadas nas áreas do romance, da investigação histórica e da literatura infantojuvenil.

Após estudar as origens e as histórias associadas à arte de maldizer, publicou o Dicionário de Insultos (Planeta). Embora tenha encontrado centenas deles, “os palavrões não chegaram a uma dezena”, faz saber o autor, mencionando os clássicos “bardam****” e “vai para o c******”. Este último terá surgido nos Descobrimentos: “Nas caravelas, o vigia tinha a missão ingrata e dolorosa de subir ao mastro, até à ponta, correndo o risco de cair, mas o termo vem do latim ‘caralio’, que significa pau grande.”

Sérgio Luis de Carvalho, historiador e autor de vários livros de investigação histórica e literatura infantojuvenil

Embora sejamos seres racionais, conferimos um poder mágico aos palavrões, que gravitam, de um modo geral, em torno dos mesmos temas: “São as pragas e os maus olhados, ligados à morte, que se desfazem com antídotos verbais, e as palavras e expressões que envolvem sexo e genitais, que são a maioria”. Lembrando que “ninguém, ao martelar o dedo sem querer, exclama ‘que aborrecimento!’”, o autor fala no poder catártico das asneiras (ou daquilo que podemos apelidar de “dizer caralhadas”). 

Os significados do léxico que usamos crescem connosco. E podem, até, ganhar uma conotação inteiramente nova: “Há dois séculos, o pecado de sodomia era o pior de todos, o das bestas; hoje, ser bestial não é insulto, é elogio.” De resto, é frequente ouvir de alguém propenso a instabilidade emocional que, em função do seu estado de espírito, os outros passam de “bestial a besta”.  O impacto de um palavrão ou asneira (termo ligado ao asno, ou burro) mede-se em função do grau de interdição do seu uso, remete para assuntos marginais e incide nos medos mais íntimos.

Se o “vai-te f…”, o “vai para o c…” e afins evocam o sexo, os interditos e o estigma, já o ofensivo “filho da puta” ou “da mãe”, remete para um tempo em que no registo dos filhos nascidos fora do casamento só constava o nome da progenitora, que era olhada de lado, bem como a sua descendência. Hoje não é assim, mas o efeito bélico persiste. “O antigo Presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, referia-se aos bastardos do Continente”, recorda Sérgio Luís de Carvalho.

Nos tempos que correm, receber um comentário que envolva “putice” pode ser motivo de orgulho, da mesma forma que “a importação massiva de anglicismos” permite, entre pares, que se tratem potenciais parceiras por “cabra” (“bitch”), antigamente associada à presa, “alguém que vive na dependência sexual de outro, remetendo para as questões raciais.” 

Na cultura americana, “motherfucker” não é palavrão e “black” também não, ao contrário de “nigga” (N word), termo depreciativo usado no passado pela organização terrorista Ku Klux Klan. Por cá, a neutralidade da palavra “negro” contrasta com a carga associada a “preto” que, no século 19, era um termo paternalista e desqualificante (“o trabalho é bom para o preto”, “tá quieto, ó preto”).

Nas redes sociais, o uso de palavrões normalizou-se, com novas conotações e, porventura, foi-se tornando aceitável. O ‘fuck’ banalizou-se a tal ponto que a sigla WTF (c’um c******!) até pode dar nome a tarifários de telemóvel. A este respeito, o professor e romancista evoca a famosa cena do filme O Sol do Futuro, de Nanni Moretti, em que os senhores da Netflix declinam o projeto do protagonista, por carecer do “momento WTF”.

4 PONTOS FORTES DAS PALAVRAS ‘FEIAS’, ou as virtudes dos palavrões

À luz dos estudos de neurociência e de linguística, os termos que antes eram um sinal de má \educação – e motivo de exclusão social – parecem ter conquistado uma aura de aceitação e de legitimidade. E até lhe reconhecem vantagens:

Um analgésico para a dor 

Não precisa de experimentar o desafio do balde de gelo para se certificar de que a primeira reação seria soltar impropérios como se não houvesse amanhã para minimizar o desconforto associado ao choque térmico. Há muito que a Ciência revelou que a mente só consegue focar-se numa coisa a cada instante e que, diante de dois estímulos, uma toma primazia. Após vários anos a estudar o efeito do palavreado rude na perceção da dor, o psicólogo inglês Richard Stephens, da Universidade de Keele, avançou uma explicação: a resposta de ataque-ou-fuga gerada na situação geradora de stresse anula a ligação entre medo da dor e perceção da mesma. Uma pista útil que também se aplica aos momentos que precedem as grandes competições e combates. Não é por acaso: produzir vocalizações com impacto, por exemplo, como nos rituais tribais, aumenta os batimentos cardíacos e prepara o corpo para a ação, reduzindo a sensação de dor.

Inteligência social 

Usar termos pejorativos não é, como se pensava, sinónimo de ser pobre em vocabulário, antes um indicador de fluência verbal. A conclusão é de um estudo liderado pelo psicólogo americano Timothy Jay que aplicou dois testes, com a duração de um minuto cada, numa amostra de 49 universitários (34 mulheres): no primeiro, era preciso elencar o maior número de palavras iniciadas por três letras; no segundo, as letras eram as mesmas letras, a diferença era serem pedidos palavrões. Quem teve melhor desempenho na primeira tarefa também obteve pontuações altas na segunda, algo que os investigadores atribuíram à inteligência social dos participantes.

Enfatizar mensagens 

Tenham, ou não, alguma carga agressiva ou violenta associada, a tendência atual é o uso indiscriminado dos palavrões (os f******, m**** e p***). Mais do que insultar, chamam a atenção ou são um recurso frequente para reforçar uma ideia numa conversa ou debate. No início do ano, um artigo do The Guardian dava conta disso mesmo. Depois do célebre momento televisivo (programa Today, da BBC Radio 4) em que a jornalista britânica Mishal Husain praguejou sete vezes em menos de um minuto, na entrevista ao Secretário do Interior James Cleverly, o jornal britânico contactou académicos e chegou à conclusão de que havia menos tabu e novas funções nestes vocábulos. Entre elas, vincar um ponto (“quem nunca?”). Elon Musk o fez. Ele e tantos outros, comuns mortais prontos a imitar o que seja eficaz, em matéria de comunicação.

Código de acesso para partir ou ficar

Não é preciso atirar cocó ao adversário ou marcar o território – como fazem os nossos antecessores, os amigos primatas – para o afastar ou agredir. Basta mandá-lo para aquela parte e o cérebro encarrega-se de imaginar o que é verbalizado. Atirar ao ar palavras fortes num momento de grande tensão impede que se passe ao ato, ou seja, que a pessoa tenha condutas a quente, com consequências desastrosas. Dizer asneiras à boca cheia é, por isso, um escape para a carga agressiva (destrutiva) e tem ainda a vantagem de estimular a coesão num grupo, satisfazendo a necessidade de pertença (sentir que está entre os seus). 

“O uso dos palavrões pode ser muito eficaz no combate à dor”

Entrevista a Emma Byrne, cientista britânica e autora do livro Dizer Palavrões Faz Bem (Planeta)

O que o motivou a escrever sobre as palavras com carga pejorativa?

No início da minha carreira de investigadora, em ciência da computação e inteligência artificial, dei-me conta de que os cérebros humanos – e os cérebros dos animais, de um modo geral – são muito mais interessantes e complexos do que qualquer coisa que possamos fazer em computadores.

O que faz com que os palavrões sejam apelativos e usados com frequência?

Há um elemento intrigante que tem a ver com a dor ou, pelo menos, com a necessidade de evitá-la. Ao estudar o assunto, descobri que o uso dos palavrões pode ser muito eficaz no combate à dor e fiquei absolutamente fascinada.

O que se passa no cérebro ao usarmos termos e expressões com carga emocional?

As respostas físicas aos palavrões incluem coisas como aumento da frequência cardíaca ou da condutância da pele, ou seja, o quanto transpiramos. Essas reações sinalizam que o nosso corpo se prepara para lutar ou fugir. É possível que os palavrões funcionem, preparando-nos para sermos realmente resilientes.

Isso significa que dizer impropérios é adaptativo? 

É difícil ter certeza dos resultados evolutivos de qualquer fenómeno porque não podemos replicar essa evolução (em experiências científicas). No entanto, não creio que fossemos capazes de cooperar enquanto espécie se não tivéssemos esta forma eficaz e não violenta de expressar sentimentos.

Porque é tão tentador recorrer a palavras que têm significados pejorativos? 

Os motivos para praguejar e usar palavrões são pessoais e altamente dependentes do contexto em que são ditos. Há de tudo, desde o desejo de responder a algo que causa dor ou frustração até ao de provar que se faz parte de um dado grupo social.

O que pode dizer acerca do uso de palavrões entre amantes, por exemplo? 

Por mais frustrante que seja a pouca investigação feita sobre palavrões e intimidade, sou levada a suspeitar que não vamos querer usar os termos da gíria médica quando estamos a fazer coisas íntimas com alguém de quem gostamos.

O que mudou desde que escreveu o livro até agora?  

No Reino Unido, pelo menos, atenuaram-se as atitudes em relação aos palavrões que envolvem partes do corpo ou funções corporais. Penso que há mais consciência do poder que certos palavrões têm, de funcionar como armas e causar danos reais,como os insultos sobre a cor da pele ou a sexualidade das pessoas.

Como estão a tornar-se um lugar-comum, vão deixar de ter importância?

Estou confiante de que vai sempre haver lugar para os palavrões, mesmo que o vocabulário do que consideramos como tal mude. Interrogo-me se os últimos anos não nos deram, a todos, uma enorme vontade de dizer impropérios!