Decorria o longínquo ano de 2015 quando uma simples denúncia anónima, feita no portal da Procuradoria-Geral da República, serviu de tiro de partida para uma das maiores investigações sobre corrupção a envolver políticos em cargos públicos ‒ a Operação Tutti Frutti. A investigação arrastou-se devido à sua complexidade, com queixas de falta de meios pelo caminho, situação a que a então procuradora-geral da República, Lucília Gago, deu resposta com a criação, em 2023, de uma equipa a trabalhar no caso em exclusividade (cinco inspetores da Polícia Judiciária e cinco magistrados do Ministério Público).

Ao fim de dez anos, o MP formalizou a acusação: 60 arguidos (49 pessoas e 11 entidades), incluindo atuais e ex-deputados, presidentes de junta, vereadores e altos responsáveis do PSD e do PS, são acusados de um total de 463 crimes: corrupção ativa e passiva, prevaricação, abuso de poder, tráfico de influência, branqueamento de capitais, burla qualificada, falsificação de documentos e recebimento indevido de vantagem.

Na lista, não surgem os nomes mais sonantes, Fernando Medina e Duarte Cordeiro. O ex-presidente da Câmara de Lisboa e ex-ministro das Finanças chegou a ser constituído arguido, no ano passado, mas o MP, apesar de lhe apontar comportamentos “que se desviam e atropelam as normas que enquadram o exercício das funções públicas”, diz não ter ficado demonstrada “a prática de factos suscetíveis de integrar os crimes de corrupção ativa e passiva, inicialmente referenciados, nem do crime de prevaricação”.

O ex-ministro do Ambiente e da Ação Climática, durante anos uma das figuras mais poderosas do PS, dedicou umas linhas no Facebook ao facto de não ter sido acusado. “Ficou clarificado o que sempre disse. Não há nada que me surpreenda no que me diz respeito e só lamento o tempo que demoram estes processos a concluírem as suas investigações. Relembro que nunca fui sequer ouvido. Depois de anos a lidar com especulação e suspeita, fico finalmente livre.” As suspeitas contra a deputada social-democrata Margarida Saavedra foram também arquivadas.

Mas há pesos-pesados entre os acusados. Nomes que vão fazer mexer as Eleições Autárquicas, a decorrer em setembro ou outubro.

Há crimes e crimes

A lista do MP conta com três presidentes de juntas de freguesia de Lisboa do PSD – Luís Newton, Fernando Braamcamp e Vasco Morgado – e com as ex-presidentes de junta do PS Ana Sofia Figueiredo e Inês Drummond (que entretanto se tornou vereadora sem pelouro da Câmara de Lisboa, cargo a que renunciou ao ser conhecida a acusação). Luís Newton acumulava o cargo à frente da Junta da Estrela com o de deputado à Assembleia da República, mandato que decidiu suspender para não “atingir o Governo”. Outro deputado da Nação envolvido é Carlos Eduardo Reis, igualmente do PSD, que anunciou a suspensão, a contragosto, do mandato no fim deste mês (mas não a do cargo de vereador, que ocupa na Câmara de Barcelos). “Retiraram-me a confiança política ao dizer que não tenho condições para continuar a ser deputado do grupo parlamentar. Estão a entregar a escolha dos deputados ao Ministério Público, a trocar a presunção de inocência pela presunção de culpa. A minha opinião é que deveria continuar, mas até ao final deste mês suspenderei as minhas funções no grupo parlamentar”, disse.

Ângelo Pereira, vereador social-democrata na Câmara de Lisboa, com os pelouros da Higiene Urbana, Proteção Civil e Desporto, é outro acusado que decidiu suspender o mandato. A lista de figuras mais influentes fica completa com Rodrigo Gonçalves, membro do conselho nacional do partido e dirigente histórico do PSD de Lisboa, Rui Paulo Figueiredo, antigo assessor de José Sócrates, conhecido como “o espião do Governo” nas supostas escutas a Cavaco e José Guilherme Aguiar, vereador da Câmara de Gaia.

O envolvimento de altos quadros do PSD e do PS na Operação Tutti Frutti está a causar um notório desconforto nos dois partidos e a baralhar as contas para as autárquicas, sobretudo tendo em conta que alguns dos acusados têm tido responsabilidades na escolha dos candidatos. E já há demissões na máquina autárquica do PSD – Ricardo Almeida, coordenador autárquico da Distrital do Porto, acusado de um crime de abuso de poder, foi o primeiro dirigente de órgãos partidários a deixar-se cair na sequência da Operação Tutti Frutti.

O julgamento em tribunal vai longe, mas o político já começou. Várias figuras de proa do PSD apelam à demissão dos suspeitos de corrupção e manifestam-se contra a sua inclusão nas candidaturas às autárquicas. Um deles foi Hugo Soares, líder parlamentar e secretário-geral do PSD: “Nenhum presidente de junta acusado em crimes de relevância será candidato pelo PSD”, garantiu. Mas sublinhou que Ângelo Pereira, por exemplo, está “apenas” acusado de recebimento indevido de vantagem, o que não o deve impedir de se manter como presidente da comissão política distrital do PSD Lisboa e de estar envolvido na escolha de candidatos.

Alexandra Leitão, líder parlamentar do PS e candidata à Câmara de Lisboa, também garantiu que não dará luz verde a que qualquer candidato acusado entre na sua lista, ainda que tenha desvalorizado a acusação à socialista Inês Drummond, por ser um crime de prevaricação e não de corrupção.

As autárquicas ainda estão a largos meses de distância. É muito tempo para as nuances fazerem o seu caminho.

Os tubarões

As mais importantes figuras acusadas na operação

Sérgio Azevedo
É quem está acusado de mais crimes – 51 –, incluindo corrupção ativa e passiva, prevaricação, branqueamento de capitais e tráfico de influência. O MP diz que o ex-deputado do PSD usou o seu poder na concelhia de Lisboa para indicar candidatos autárquicos do seu círculo. Uma vez eleitos os autarcas, Azevedo receberia contrapartidas dos contratos assinados pelas juntas de freguesia.

Luís Newton
Deputado do PSD e presidente da Junta de Freguesia da Estrela, Lisboa, desde 2013, é acusado de dez crimes (cinco de corrupção passiva e cinco de prevaricação) devido a alegados contratos que o terão beneficiado a si e a pessoas próximas.

Carlos Eduardo Reis
Igualmente deputado do PSD, além de vereador na Câmara de Barcelos, responde por 22 crimes, na qualidade de empresário que terá beneficiado de ajustes diretos abusivos.

Fernando Braamcamp
Ao presidente da Junta de Freguesia do Areeiro, em Lisboa, eleito pelo PSD, são apontados 39 crimes de corrupção passiva, quase todos relacionados com a contratação de serviços de várias empresas para a junta.

Vasco Morgado
Presidente da Junta de Freguesia de Santo António, também em Lisboa, são-lhe atribuídos 27 crimes, a maioria de corrupção passiva.

Em 2024, Gisela João percorreu muitos palcos a festejar os 50 anos do 25 de Abril com canções (a maioria de José Afonso): A Morte Saiu à Rua, Vejam Bem, Que Amor Não me Engana, mas também Acordai, de Fernando Lopes Graça, e Inquietação, de José Mário Branco. Em 2025, essas versões (tocadas e construídas com os músicos Carles Rodenas Martínez e Luís “Twins” Pereira) dão corpo ao quarto disco de estúdio da fadista nascida em Barcelos em 1983, Inquieta.

Acha que uma canção pode mudar as nossas vidas – para não dizer “o mundo”?

Acho, acho mesmo. Olhem para mim… Isso aconteceu comigo. Até diria mais “a poesia” do que simplesmente canções. Interessa-me sempre mais a história que estou a contar, as palavras, do que o modo muito perfeitinho de cantar. E acredito que o que estamos a dizer pode mudar vidas. A poesia mudou a minha vida.

Para chegar às canções que estão neste disco houve um trabalho de procura, motivado pelos 50 anos do 25 de Abril e o mote da liberdade, ou foi uma coisa mais afetiva e pessoal?

Este disco é um belo exemplo daquelas coisas que “têm de ser” e nem sabes bem porquê. As coisas que mais nos encantam na vida, o amor e a arte, serão sempre supermisteriosas. Este disco nasce sem ser esperado, planeado. Eu estava, aliás, a gravar outro, a que vou voltar em breve. Mas quando fiz os concertos das comemorações do 25 de Abril, percebi que não me sentia bem se aquelas canções ficassem só por ali. Pensei: “Preciso de gravar estas músicas!” Até podia ser só para mim, para ficar um registo.

E a escolha das canções?

Foi feita para os concertos. A Grândola e o Depois do Adeus teriam sempre de estar lá, fazem parte da História de Portugal, não só da música. Eu, depois da pandemia, achei mesmo que ia ser feliz a fazer outras coisas, que não fazia sentido continuar na música. E, de repente, percebi que com estas músicas estava, também, a cantar a minha liberdade. Na Balada do Outono [de José Afonso] há aquela parte: “… que eu não volto a cantar.” E isso falou muito comigo. Porque nos últimos anos essa era uma frase diária na minha vida. 

A maioria das canções no disco são do José Afonso…

O Zeca Afonso é o meu artista favorito, no meu País. Da forma completa como ele é: música, poemas… Era incrível. Faz parecerem simples coisas que são complexas. Em miúda ouvia muito Zeca Afonso. Quando pensei nestes concertos achei sempre que ia ter muito mais músicas do José Mário Branco e do Sérgio Godinho e, lá está, às vezes não interessa tanto o que achamos que queremos, precisamos mesmo é de outros caminhos, e é por aí que temos que ir.

Só uma canção do disco não tem a letra original, Que Força É Essa, do Sérgio Godinho, que cantou na versão recente da Capicua. As canções também são organismos vivos…

Ainda estava a preparar os concertos e um dia percebi que todas as canções à minha frente eram de homens. Isso deixou-me furiosa. Mesmo tendo noção de que os tempos eram outros. Lembrei-me de que nesse mesmo ano, no Dia da Mulher, a Capicua tinha lançado a sua versão do Que Força É Essa, o que me deixou muito feliz. E decidi cantá-la, com autorização da Capicua e do Sérgio, claro.

Das dez versões presentes no disco, só uma foi gravada ao vivo: Inquietação, de José Mário Branco

Estas canções salvaram-na desse afastamento que sentia em relação à música?

Sem dúvida. Sinto que estas canções fizeram parte da libertação do meu povo, da nossa História, mas não me falam só da liberdade política em tempos de ditadura, falam-me da minha própria liberdade, diária. Andei muitos anos a correr e precisava de parar um bocado. Este disco empodera-me muito.

Acha que há fado neste Inquieta?

Não acho, tenho a certeza. Para mim, o fado é muito mais do que a forma, do que as regras das estrofes e das músicas. O fado é uma forma de vida, de sentir a vida. Que passa muito por empatia, pelo sentir do outro, pelo sentido de comunidade. Em qualquer coisa que eu faça, o fado estará lá.

Palavras-chave:

As funcionalidades e melhorias trazidas por soluções como a Inteligência Artificial (IA) do Copilot e o ChatGPT estão cada vez mais a entrar na rotina dos utilizadores, que confiam nos assistentes para executar as tarefas mais repetitivas e mundanas, libertando tempo para as que exijam maior destreza mental. Agora, um estudo liderado por investigadores da Microsoft e feito em parceria com a Universidade de Carnegie Mellon revela que uma dependência e confiança excessiva nestes modelos podem impactar negativamente a capacidade de pensamento crítico e levar à deterioração de capacidades cognitivas.

O Windows Central cita um parágrafo do trabalho, no qual se lê que “uma grande ironia da automação é que ao mecanizar tarefas rotineiras e deixar as exceções para o utilizador humano, estamos a privar o utilizador das oportunidades rotineiras de praticar o seu julgamento e fortalecer a sua musculatura cognitiva, deixando-o atrofiado e mal preparado quando as exceções surgirem”.

O estudo teve em conta cenários de utilização de IA no ambiente de trabalho e revela que os trabalhadores que usavam estas ferramentas no quotidiano mostravam mais dificuldades em lidar com cenários onde tivessem de usar o pensamento crítico.

Alguns utilizadores nas redes sociais, nomeadamente no Reddit, têm levantado preocupações semelhantes, havendo relatos como “perdi algumas células cerebrais” ou “posso ver que o ChatGPT vai tornar-nos mais burros à medida que usamos IA sem pensar e sem usar o cérebro”. Outra consequência negativa que tem vindo a ser discutida é a perda de criatividade e de pensamento crítico, com os utilizadores a virarem-se, por exemplo, para o ChatGPT para obter satisfação e respostas imediatas.

De acordo com uma notícia avançada pelo Jornal de Notícias, João Rogério Silva, conselheiro nacional do Chega e principal rosto partido em Oliveira do Hospital, está acusado de montar uma emboscada após uma eleição para a liderança da Concelhia.

O conselheiro nacional do Chega foi acusado pelo Ministério Público (MP) de crimes de dano e ameaça agravada, em março de 2023, contra um militante que também se candidatou à liderança da Concelhia de Oliveira do Hospital, António José Cardoso. De acordo com a acusação, Cardoso encontrava-se a conduzir o carro da empresa em que trabalhava, entre Oliveira do Hospital e Mangualde, quando foi abalroado por outro veículo, onde seguia o principal rosto do partido na região. O agressor terá depois saído do carro e desferido “várias pancadas com força” no automóvel, com o militante ainda lá dentro. Silva estaria armado com um pedaço de mangueira e uma faca, que utilizou para ameaçar Cardoso, prometendo matá-lo. “Enquanto João Silva se encontrava com a faca na mão proferiu a seguinte expressão, em tom sério e ameaçador dirigida a António Cardoso ‘vou-te matar’, tendo de imediato passado com a faca junto ao seu pescoço, simulando o gesto do crime”, pode ler-se na sentença citada pelo JN. António Cardoso apresentou queixa na GNR de Oliveira do Hospital.

O MP abriu uma acusação formal contra o conselheiro nacional do Chega, tendo como base testemunhos da vítima, fotografias do automóvel danificado e algumas mensagens trocadas entre os dois envolvidos. João Silva deverá mesmo ser julgado pelo crime, dado que o prazo de 20 dias para início da fase de instrução já expirou.

De acordo com uma publicação interna no portal do Chega, também citada pelo JN, João Silva terá admitido que cometeu “um tresloucado ato”, incentivado por Paulo Seco, presidente da Distrital de Coimbra. “Foi ele que me impulsionou, encorajou e incentivou a cometer o ato”, lê-se.

Em resposta ao JN, Seco refere que só teve conhecimento do caso “por intermédio de grupos da internet” e que nunca afastou Silva da Concelhia por esse motivo. No entanto, o presidente da Distrital de Coimbra, admitiu ao jornal português que chegou a fazer uma participação ao Conselho de Jurisdição do Chega contra António Cardoso, por este o ter acusado de ser o impulsionador do crime, o que significa que o partido, com conhecimento do caso – manteve Silva no cargo que ocupava.

Em maio de 2019, Iya Patarkatsishvili, filha de um bilionário georgiano, e o seu marido, Yevhen Hunyak, compraram uma mansão em Londres por mais de 32 milhões de libras – cerca de 38 milhões de euros. Situada numa das ruas mais tranquilas de Notting Hill, a propriedade, de nome Horbury Villa, parecia ser perfeita para o casal, possuindo diversas comodidades, como uma piscina, spa, ginásio, cinema e adega de vinhos.

No entanto, tudo mudou quando foi descoberta uma enorme infestação de traças no isolamento da casa. De acordo com o casal, a praga de insetos era tão grande que era recorrente avistar traças em objetos como escovas de dentes, toalhas e copos, bem como encontrar frequentemente peças de vestuário danificadas. Hunyak refere que chegava a matar entre 10 e 35 traças por dia. O casal acabou por contratar uma empresa de controlo de pragas que descobriu a origem do problema no isolamento do teto. Os trabalhos de substituição do mesmo custaram cerca de 270 mil libras – mais de 320 mil euros.

O caso levou o casal a processar o antigo proprietário e agente imobiliário William Woodward-Fisher. Ao decidir a favor de Patarkatsishvili e o marido, na passada segunda-feira, o juiz, Justice Fancourt, considerou que o antigo dono da Horbury Villa fez “declarações fraudulentas” e “ocultou uma grave infestação de traça da roupa no isolamento da casa” antes da venda. No entanto, o juiz acredita não ter existido, por parte de Woodward-Fisher, a intenção consciente de “tentar enganar os eequerentes. Ele simplesmente queria vender a casa e seguir em frente”, lê-se no acórdão. Agora, para além de a propriedade voltar a ser responsabilidade do antigo dono, o casal vai também recuperar a maior parte dos custos com as obras e receber “indemnizações substanciais”.

De acordo com o acórdão, a praga de traças terá sido inicialmente identificada em 2018 pela mulher de Woodward-Fisher, na sequência de grandes obras de construção na propriedade. Na altura, terá sido solicitada a ajuda de especialistas na eliminação da praga, que não foi bem sucedida. 

O Concorde já tinha quebrado a barreira do som e conseguia voar a velocidades Mach 2, ou seja, a 2180 km/h. No entanto, para conseguir este feito, o avião emitia um ruído explosivo que podia quebrar janelas, assustar animais de estimação e gado, e levar a vários tipos de destruição de propriedade no solo, pelo que as tentativas de aviação comercial a estas velocidades foram proibidas pelos reguladores. Agora, a Boom Supersonic revela ter conseguido um voo a quebrar a barreira do som e com a vantagem de não ter produzido o chamado ‘sonic boom’ (choque sónico ou estrondo sónico, em tradução livre) percetível a partir do solo.

Em março de 2024, o XB-1 cruzou os céus pela primeira vez. Depois, em outubro, surgiu a promessa de se atingirem velocidades supersónicas. Agora, há duas semanas, a empresa fez um voo a velocidades de 1,22 Mach, ou seja, quase 1500 km/h. Durante este voo, foram colocados microfones no solo para detetar o ruído e confirmou-se que o ‘estoiro’ característico não foi ouvido. O XB-1 conseguiu quebrar a barreira do som três vezes neste trajeto, com o diretor executivo Blake Scholl a congratular-se: “Isto confirma as nossas crenças: viagens supersónicas podem ser baratas, sustentáveis e confortáveis para quem está a bordo e para quem está no solo”, cita o New Atlas.

A Boom Supersonic quer desenvolver um novo avião para fins comerciais, o Overture, com base nestes conhecimentos e vai usar um sistema de propulsão proprietário, o Symphony, para atingir estas velocidades silenciosamente.

A escolha do design e do hardware permite que o XB-1 consiga quebrar a barreira do som quando está acima dos 30 mil pés (9144 metros) de altitude. É nesta altitude que ocorre um fenómeno, graças às mudanças na densidade do ar e temperatura, conhecido por Mach cutoff, ou seja, no qual a onda de choque produzida pelo voo ‘ressalta’ e dissipa-se na atmosfera.

A tecnologia atual, nomeadamente os controlos de voo automatizados, a modelação atmosférica e os motores mais eficientes, permite que empresas como a NASA, a Lockheed e a Boom façam um uso prático e desenvolvam aviões mais silenciosos, mais rápidos e mais sustentáveis.

A Boom Supersonic já tem 130 unidades do Overture encomendadas pela Japan Airlines, pela United Airlines e pela American Airlines. A empresa espera produzir 66 aviões anualmente a partir da Overture Superfactory, nos EUA.

Começou, em 2000, como uma iniciativa para celebrar o centenário da morte de Eça de Queirós, uma das muitas figuras literárias da (ou que passaram pela) Póvoa de Varzim. Mais ao correr dos anos, o Correntes D’Escritas afirmou-se como o mais importante festival literário do País, com fortes ecos no universo ibero-americano. E se hoje começa a ter rivais à altura, com o surgimento de outros encontros de escritores em outras localidades, mantém o prestígio e a centralidade no ano editorial. E, sobretudo, a capacidade de apresentar um programa cultural que se multiplica em busca de novos públicos.

Em 2025, na sua 26.ª edição, o Correntes D’Escritas, promovido e organizado pela Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, chega aos 25 anos de promoção do livro e da leitura com muitos motivos de interesse. São 100 convidados europeus, africanos e sul-americanos que partilham as línguas portuguesa e espanhola (e, este ano, também a galega), com 30 estreantes.

Além dos destaques referidos abaixo, as propostas passam pela artes plásticas, com exposições de Alfredo Cunha, Daniel Mordzinski e Olga Santos, e outras dedicadas a Camilo Castelo Branco (nos 200 anos do seu nascimento) e Luísa Dacosta. E pelo folclore, com o projeto ReViraVerso, que procura interpretar velhos temas com novas palavras roubadas à poesia contemporânea.

1. Hélder Macedo e Onésimo

O escritor Hélder Macedo. Foto: Lucília Monteiro

São duas homenagens, cada uma à sua maneira, a figuras com forte ligação ao Correntes D’Escritas. Depois de várias participações, Hélder Macedo regressa à Póvoa de Varzim para a Conferência de Abertura (dia 19, às 15h, no Cine-Teatro Garrett). O catedrático emérito do King’s College de Londres evocará o autor de Os Lusíadas nos 500 anos do seu nascimento, numa intervenção intitulada Luís de Camões: conhecer não ter conhecimento. Já Onésimo Teotónio Almeida, único totalista das 26 edições, é homenageado na revista deste encontro de escritores, também chamada Correntes D’Escritas, com textos de amigos, estudiosos e leitores.

2. ‘Ut pictura poesis’

A Coluna Partida, de Frida Kahlo

Diziam os romanos que a poesia era como a pintura, valorizando a capacidade dos poetas de criar imagens e inaugurando uma tradição de descrição de obras de arte nos poemas. Surpreendendo todos os convidados, as mesas de escritores do Correntes deste ano não terão os seus motes em frases ou versos, mas em pinturas bem conhecidas dos últimos séculos. Claro que cada autor poderá, como sempre acontece, seguir o seu caminho, mais próximo ou distante do tema proposto. Mas o ponto de partida será sempre visual, na companhia de Frida Kahlo, Gustave Courbet, Edvard Munch, Hieronymus Bosch, Júlio Pomar ou Paula Rego.

3. Da língua espanhola

Ariana Harwicz. Foto: DR

Dar a conhecer a riqueza das literaturas que se escrevem em espanhol (e, dentro de Espanha, também em galego, catalão ou basco) tem sido uma das grandes mais-valias do Correntes, com centenas de autores já convidados. Este ano, da América do Sul vêm representantes das novas gerações: a argentina Ariana Harwicz e o venezuelano Rodrigo Blanco Calderón, ambos com livros acabados de editar em Portugal. Do país vizinho, há uma embaixada maior: o ensaísta Antonio Monegal, a romancista Marta Perez-Carbonell, também com novos títulos entre nós, e as poetas Amalia Bautista e Yolanda Castaño.

4. Tradução e educação

Foto: DR

O Correntes tem vindo a alargar o seu programa cultural, com propostas para públicos muitos diversos. Uma das novidades do ano passado, reforçada este ano, é o encontro de tradutores, coordenado pelo alemão Michael Kegler, que convidou, entre outros, Harrie Lemmens, Guilherme Pires, Alda Rodrigues, Margarida Vale de Gato, Odile Kennel, Gisela Casimiro, Inês Pedrosa e Nuno Quintas. Com curadoria de Raquel Patriarca, também volta a realizar-se a formação creditada para professores, este ano com a sugestiva designação: O Encontro como Ponto de Partida, Talvez de Chegada em Escala de Pausa Curta. Há, ainda, oficinas de Amélia Muge, Ricardo Fonseca Mota e Sandra Barão Nobre.

5. Patrícia Melo e outros lusófonos

A escritora brasileira Patrícia Melo é um dos autores de língua portuguesa que se destacam no programa. Foto: DR

Foi convidada na edição de 2021, que se realizou exclusivamente online por causa da pandemia, mas só este ano está, pela primeira vez, na Póvoa de Varzim. A escritora brasileira Patrícia Melo, autora de uma celebrada obra, com muitos matadores, tiros e crimes, mas também retratos citadinos e femininos, é um dos autores de língua portuguesa que se destacam no programa, nomeadamente dos que representam toda a lusofonia. Do Brasil, regressa ainda Ignácio de Loyola Brandão, a que se juntam Alexandre Vidal Porto ou Rafael Gallo. Da África de expressão portuguesa, destaquem-se as presenças dos moçambicanos Bento Baloi e Mélio Tinga, os angolanos Ana Paula Tavares e Ondjaki e o cabo-verdiano Germano Almeida.

6. Novos livros

O Correntes é um festival de muitos escritores e livros, com 30 lançamentos previstos no programa. É o verdadeiro arranque editorial do ano, com uma enorme oferta de novos romances, ensaios e poemas. Uma das surpresas é a estreia literária da cantautora Luísa Sobral (na foto). Depois de um livro infantil, sai o seu primeiro romance, Nem Todas as Árvores Morrem de Pé, passado na Alemanha dividida do pós-guerra. Contos Suicidas, de Fernando Pinto do Amaral; Escrevo por Vingança à Morte, de Cláudia Lucas Chéu; Ódio, de José Manuel Fajardo; Três Mulheres na Cidade, de Lara Moreno, e Cartografia, de Minês Castanheira e Raquel Patriarca, são alguns dos outros lançamentos.

7. E o vencedor é…

Em anos ímpares, o Prémio Literário Casino da Póvoa, o maior galardão associado ao Correntes D’Escritas, é dedicado à poesia. A decisão caberá, este ano, ao júri constituído por Ana Paula Tavares, João Gobern, Margarida Ferra, Maria de Lurdes Sampaio e Ricardo Marques, que selecionaram 11 livros finalistas, assinados por Adília Lopes, Andreia C. Faria, Bernardo Pinto de Almeida, Eucanaã Ferraz, João Luís Barreto Guimarães, João Melo, Jorge Gomes Miranda, Luísa Freire, Nuno Júdice, Paulo Tavares e Ricardo Gil Soeiro.

Correntes D’Escritas > Vários locais da Póvoa de Varzim > 15-22 fev > programa completo aqui

A 30 de junho de 2019, o então 45º Presidente dos EUA fez história ao encontrar-se com o ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un, em Panmunjom. O encontro não deu em nada, exceto muita euforia mediática e vagas promessas de paz. Curiosamente, horas antes de se encontrar com o líder da dinastia estalinista, Donald Trump sobrevoou parte daquilo que se designa há sete décadas como a zona desmilitarizada (DMZ) da península. Comentário que lhe terá saído ao ver os bosques e a área virgem, altamente minada, ao longo do paralelo 38: “Isto tem um enorme potencial para se fazerem condomínios fantásticos!” Já no ano anterior, em Singapura, os dois dirigentes conheceram-se pessoalmente e, na conferência de imprensa que se seguiu, a Casa Branca divulgou um vídeo promocional de quatro minutos, intitulado A Story of Opportunity, sobre as vantagens que o regime de Pyongyang teria em abdicar do seu arsenal bélico e investir, por exemplo, no turismo. Trump fora previamente informado de que o reino eremita dos Kim tinha “belas praias” e que podia ser uma “Riviera”.

Alvos As posições de Trump sobre a Gronelândia, o Panamá, Gaza e Guantánamo revelam que a sua política externa assenta sobretudo nos negócios e nas ameaças

Nos últimos dias, a “diplomacia do imobiliário” ganhou novos contornos com a proposta do antigo empresário da construção civil de converter a Faixa de Gaza num território sob tutela dos Estados Unidos da América e de a transformar numa estância balnear de luxo ‒ “para todo o mundo”. Pormenor: esta “Riviera do Médio Oriente” seria erguida sobre os escombros acumulados desde o início do conflito entre Israel e o Hamas, a 7 de outubro de 2023, e os dois milhões de palestinianos que ainda vivem no retângulo de 360 quilómetros quadrados, junto ao Mediterrâneo, teriam de procurar abrigo em outras paragens. As reações foram imediatas e de repúdio. O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, afirmou ser “essencial evitar qualquer forma de limpeza étnica” e sublinhou que uma “paz duradoura exige progressos claros, irreversíveis e permanentes para (…) o fim da ocupação [israelita] e o estabelecimento de um Estado palestiniano independente, com Gaza como parte integrante”. Os países árabes manifestaram idêntica posição, incluindo os que são aliados tradicionais de Washington, e advertiram que jamais aceitarão uma tal deportação que pode desencadear mais uma crise de proporções inimagináveis na região. O líder da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, afirmou que os direitos dos seus compatriotas “não são negociáveis”, nem se encontram “à venda”.

Exemplos históricos de invasões e ocupações dos EUA

IMPERIALISMO LIBERTINO

Em declarações ao New York Times, Janina Dill, diretora do Instituto Oxford para a Ética, a Lei e os Conflitos Armados, garante que os EUA, a cumprirem-se as intenções do líder republicano, estariam a violar as convenções de Genebra e a cometer um “crime contra a Humanidade”. Outros académicos partilham da mesma opinião e recordam que o Tribunal Internacional de Justiça já por duas vezes reconheceu Gaza como parte integrante de um futuro Estado palestiniano ‒ aliás, já reconhecido por 146 dos 193 países que integram a ONU. “Trump está apenas a querer normalizar a violação ou a propor que se violem os princípios basilares da lei internacional. (…) Se passarmos a viver num mundo em que as conquistas são normalizadas e as regras legais são postas de lado, viveremos num planeta completamente diferente, que será também incrivelmente perigoso para os americanos”, alerta a académica. Nada que preocupe o homem que deveria ser o “líder do mundo livre” ‒ expressão que vem do início da Guerra Fria ‒ e que continua a assinar diariamente dezenas de memorandos e decretos presidenciais que estão a provocar uma crise constitucional a nível doméstico e uma vaga de indignação nos cantos mais remotos do planeta.

Depois de já ter retirado os EUA da Organização Mundial de Saúde, do Conselho de Direitos Humanos da ONU e do Tratado de Paris sobre o Clima, Trump decidiu, a 7 de fevereiro, impor sanções financeiras e restringir vistos aos funcionários, procuradores e magistrados do Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede em Haia (Países Baixos), por “abuso de poder” e “atacarem indevidamente” os Estados Unidos da América e Israel. Uma medida logo condenada por 79 dos Estados-membros do organismo que começou a funcionar em 2002 e tem por objetivo perseguir e julgar os responsáveis por crimes de guerra, genocídio e lesa-humanidade. António Costa, presidente do Conselho Europeu, foi uma das personalidades que não hesitou em tomar posição, em Bruxelas, ao lado de Tomoko Akane, a juíza japonesa que preside ao TPI: “Sancionar o TPI ameaça a independência do Tribunal e mina o sistema de justiça penal internacional.”

Recorde-se que, em 2020, Trump tomou uma iniciativa similar, que visava particularmente Fatou Bensouda, a então procuradora do TPI, que investigava denúncias de crimes de guerra cometidos no Afeganistão e nos territórios palestinianos ocupados. As retaliações contra a jurista gambiana também não foram um caso inédito. No início do século, a Administração de George W. Bush ameaçou utilizar todos os meios ao seu alcance caso algum cidadão dos EUA fosse indiciado pelo TPI e John Bolton, na altura secretário-adjunto para as questões de Segurança Internacional, e depois embaixador dos EUA na ONU, chegou a afirmar que Washington tinha planos de contingência para intervir militarmente nos Países Baixos e resgatar algum soldado norte-americano que estivesse detido em Haia.    

Na primavera de 2004, em plena guerra contra o terrorismo global e na sequência das invasões do Afeganistão e do Iraque, George W. Bush foi muito claro: “Não somos uma potência imperial, mas uma potência libertadora.” Atualmente, Donald Trump já nem se dá ao trabalho de negar o caráter messiânico do Colosso [Ascensão e Queda do Império Americano (Temas e Debates)], título de uma das obras mais conhecidas do historiador Niall Ferguson. A antiga vedeta televisiva assume com toda a naturalidade que os seus desejos são como ordens. No início desta semana, tanto na entrevista que deu à Fox News como na conferência de imprensa em que apareceu, reiterou que os palestinianos terão de abandonar Gaza e que o Egito e a Jordânia os devem acolher. Problema: o general Abdel Fattah El-Sisi, o Presidente do Egito e “ditador favorito” de Donald Trump ‒ expressão do inquilino da Casa Branca, em 2019 ‒ não está pelos ajustes. E o monarca do reino hachemita, em que metade da população é de origem palestiniana, ainda menos. Abdullah II reuniu esta terça-feira com o Presidente norte-americano e, à hora a que esta prosa está a ser escrita, não se conhece qualquer cedência de parte a parte. Como é habitual, Trump encarrega-se de gerir as narrativas e fez saber que está disposto a cancelar todos os apoios norte-americanos a Amã e ao Cairo. Como agora se diz, uma “lógica transacional” ‒ que só pode ser descrita como chantagem. O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, agradece e prepara o fim da trégua com o Hamas. O governo de Telavive, uma coligação constituída por ultranacionalistas e fundamentalistas religiosos, é quem mais beneficia com as teses de Trump e com o ultimato que este fez ao movimento de resistência islâmica, exigindo a libertação de todos os reféns até ao meio dia de sábado, 15. E o que sucederá ao território pisado e conquistado pelo faraó Tutemés, por Nabucodonosor II, por Alexandre Magno, por Saladino e por Napoleão, caso isso não aconteça? “Vai ser o inferno”, assevera o governante mais alaranjado do mundo, ou seja, a “Riviera do Médio Oriente” volta a ser a maior prisão a céu aberto do planeta e acabam-se os planos e o dinheiro para a reconstruir ‒ qualquer coisa como 53 mil milhões de dólares, segundo um relatório divulgado por António Guterres na última terça-feira.

INUNDAÇÕES E DITADORES

Claro que o anúncio da ONU se perdeu entre os anúncios permanentes e iconoclastas do homem que pretende desmantelar o Ministério da Educação e a USAID (a agência de ajuda aos países em desenvolvimento criada por John F. Kennedy, em 1961), que já está a purgar o Pentágono e todo o setor da Justiça, e que não se poupa a esforços para despedir os funcionários que ponham em causa a ordem trumpiana ou expulsar os “maiores criminosos” que entraram de forma irregular na terra que já foi do Tio Sam. Com o precioso auxílio de Elon Musk (empresário que se já se comporta como vice-rei das Américas), de Stephen Miller (cruzado anti-imigração e vice-chefe de Gabinete) e de Russ Vought (ideólogo anti-woke responsável pelo Departamento de Gestão e Orçamento), o 47º Presidente tem todas as condições para continuar a sua (contra) revolução para devolver a grandiosidade aos EUA. O que quer que isso signifique. Trump promete uma nova Era de Ouro equivalente à Gilded Age, a época do capitalismo selvagem e dos multimilionários que monopolizavam a riqueza e ditavam as regras do poder, entre o fim da guerra civil (1865) e a afirmação do país como uma potência global (no início do século XX).

Ao suspender leis anticorrupção, ao dizer que o Golfo do México passa a chamar-se Golfo da América, ao impor taxas alfandegárias de 25% às importações sobre o aço e o alumínio, ao decretar o regresso das palhinhas de plástico ‒ porque as de papel “às vezes explodem” ‒, ou ao revelar a libertação de um professor norte-americano (Mark Fogel) que cumpria uma pena de 14 anos na Rússia, Trump e a sua equipa cumprem uma política comunicacional que tem por objetivo neutralizar adversários e críticas. Steve Bannon, o ex-estratega-mor do Presidente, chamou-lhe a estratégia da inundação ‒ flood zone. Com múltiplas notícias e iniciativas, verdadeiras ou falsas, com ou sem ligação entre si, o efeito de hiperatividade, de saturação, de caos, está garantido. 

Vamos a um exemplo. Quem se lembra ainda da recente promessa de colocar 30 mil migrantes em Guantánamo? O absolutismo de Donald Trump e a desinformação ‒ não só nas redes sociais ‒ fazem com que poucos se questionem sobre a exequibilidade de uma tal medida. No final da passada semana, a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, informou que o plano já esta em curso e que os primeiros voos com “largas dezenas” de indocumentados tinham já aterrado na maior ilha das Caraíbas. Nem foi preciso explicar que há a forte possibilidade de se tratar de mais uma clara violação às convenções de Genebra e à lei internacional, como defendem vários académicos e organizações de direitos humanos. Os  “homo economicus” do Presidente estão dispostos a tudo, até a omitir que a famosa base norte-americana, com 117 quilómetros quadrados, não tem sequer capacidade para acolher tantos “criminosos estrangeiros”, por falta de instalações apropriadas. A não ser que seja erguida, à pressa, uma cidade de tendas. O que não parece razoável, nem possível, nos terrenos disponíveis e adjacentes à enorme baía de águas profundas. Há duas décadas, quando o complexo atingiu a sua lotação limite, com 800 prisioneiros suspeitos de terrorismo e seis mil militares e respetivas famílias, Washington teve de raspar o erário público. Segundo uma investigação da NPR, a rádio pública, os contribuintes têm de pagar, pelo menos, 380 milhões de dólares por ano.

Trump quer que Gaza seja a “Riviera do Médio Oriente”, desde que haja quem pague
a reconstrução: 53 mil milhões de dólares,
segundo António Guterres

Criada em 1903, na sequência da guerra entre Espanha e Estados Unidos da América, que ditou o fim do império colonial de Madrid, esta é a prisão mais cara do mundo. Em 1934, o governo de Havana aceitou subscrever um novo contrato de arrendamento, por tempo indeterminado e no valor de 3800 euros anuais. Com a chegada ao poder dos revolucionários barbudos, liderados por Fidel Castro, o cheque no montante atrás descrito deixou de ser cobrado. Barack Obama e Joe Biden quiseram fechar o complexo penitenciário na mais antiga base militar dos EUA, fora do seu território continental. Os republicanos não o permitiram e cerca de 15 “combatentes inimigos”, alegadamente responsáveis pelos atentados do 11 de Setembro, continuam num limbo legal e sem destino à vista. Para Trump não há problema. Guantánamo é apenas uma das sete centenas de bases militares norte-americanas espalhadas pelo mundo (ver infografia). O importante, no entender do Presidente, é que a América continua a ser a “nação indispensável” e ele possa dispor de todas as ferramentas para negociar e impor a sua lei. Tom Engelhardt, autor de A Nation Unmade by War (Uma Nação Desfeita pela Guerra, em tradução livre), defende que os EUA vivem numa “era do absurdo”, em que a desordem alastra. O economista Branko Milanovic diz o mesmo por outras palavras: “Não há absolutamente nada que se possa oferecer aos ditadores para que abandonem o poder.”

Palavras-chave:

1812 – Canadá
James Madison (1809-1817)

O Reino Unido tenta impor um bloqueio comercial aos EUA e Washington inicia uma guerra com a antiga metrópole que dura seis anos. Os soldados de James Madison ocupam Toronto e várias outras localidades canadianas (que integram a então colónia britânica), tropas inglesas incendeiam a Casa Branca. Os grandes perdedores do conflito são as populações indígenas, que perdem parte das suas terras ancestrais.

1818 – Flórida
James Monroe (1817-1825)

O 5º Presidente dos EUA considerava ter o inalienável direito de alargar as fronteiras do seu jovem país e de expulsar das Américas as potências europeias (dando origem à doutrina com o seu apelido). Além de ter conquistado mais de 115 mil km2 ao império britânico, mandou invadir a Flórida (colónia de Espanha). Madrid acaba por reconhecer a anexação e recebe 5 milhões de dólares.

Donald Trump: Quero, posso e mando!

1845 – Texas
John Tyler (1841-1845)

Fervoroso defensor da doutrina Monroe e do “destino manifesto” do seu país, o 10º Presidente tentou contrariar a influência do Reino Unido no Pacífico (quis apoderar-se do Havai) e terminou o seu mandato com a invasão do Texas. O México entrou depois em guerra com os EUA e, em 1948, derrotado, perde mais de metade do seu território (incluindo a Califórnia, o Nevada e o Utah).

1867 – Ilhas Midway
Andrew Johnson (1865-1869)

O 17º Presidente dos EUA, que se instala na Casa Branca após a morte de Abraham Lincoln, é recordado pelo melhor negócio da história: a aquisição do Alasca à Rússia. No entanto, no mesmo ano, Washington consolida a sua presença no Pacífico, com a ocupação do pequeno mas estratégico arquipélago de Midway.

1893 – Havai
Grover Cleveland (1893-1897)

Aproveitando-se das rivalidades na monarquia indígena havaiana, os EUA apoiam um golpe palaciano contra a rainha Lili’uokalani e invadem o arquipélago. É instaurada uma república fantoche e o território acaba por ser anexado por Washington em 1898.  

1898 – Porto Rico/Cuba/Filipinas
William McKinley (1897-1901)

Depois de décadas de escaramuças fronteiriças com o império espanhol, os EUA aproveitam o afundamento de um seu couraçado, o USS Maine, na baía de Havana, para declarar guerra ao governo de Madrid. Em três meses e meio, as tropas de Washington conquistam todas as províncias espanholas nas Caraíbas e no Pacífico: Cuba, Porto Rico, Filipinas, Samoa, Guam. Antes de ser assassinado por um anarquista, McKinley enviou, no verão de 1900, cinco mil marines para a China, que participaram na batalha de Pequim.

1903 – Panamá
Theodore Roosevelt (1901-1909)

O antigo militar e aventureiro que combateu em Cuba e foi vice-presidente de McKinley prosseguiu as políticas expansionistas e foi também decisivo na afirmação dos EUA como uma potência global. É ele o obreiro da intervenção militar que permitiu a independência do Panamá (separando-se da Colômbia) e a construção do canal a ligar o Atlântico e o Pacífico. Paradoxalmente, foi o primeiro norte-americano a receber o Nobel da Paz, em 1906.

1915 – Haiti/Ilhas Virgens/República Dominicana
Woodrow Wilson (1913-1921)

O 28º Presidente dos EUA, antes de envolver o seu país no primeiro conflito mundial, manteve as políticas dos seus antecessores e deu novo ímpeto às guerras das bananas – as sucessivas intervenções militares no continente americano. As Caraíbas foram um alvo privilegiado: Washington até convenceu a Dinamarca a vender-lhe as ilhas Virgens, por 25 milhões de dólares.

1947 – Micronésia/Palau/Marianas/Marshall
Harry Truman (1945-1953)

Logo no final da II Guerra Mundial, os EUA encarregaram-se de ocupar militarmente os dois principais derrotados do conflito: a Alemanha e o Japão. Só à custa do extinto Império do Sol Nascente, os EUA apoderaram-se de vários arquipélagos do Pacífico que continuam sob a sua tutela.

1965 – Vietname
Lyndon Johnson (1963-1969)

Os Presidentes Eisenhower e Kennedy começaram por enviar “conselheiros militares” para a península da Indochina. Mas seria o 36º inquilino da Casa Branca a dar ordem de marcha a dezenas de milhares de marines para combater numa guerra que só terminou em 1975, de forma inglória e humilhante para Washington, no consulado de Richard Nixon. Com este último, o conflito estendeu-se igualmente ao Laos e ao Camboja.

1988 – Honduras
Ronald Reagan (1981-1989)

Ao longo do século XX, os EUA invadiram este país da América Central em nove ocasiões. A mais recente ocorreu em março de 1988, a pedido do governo de Tegucigalpa, devido às interferências e às incursões, em território hondurenho, dos sandinistas nicaraguenses.

1989 – Panamá/Iraque/Somália
George H. W. Bush (1989-1993)

A quatro dias do Natal, o 41º Presidente dos EUA deu luz verde à Operação Justa Causa e, em cinco semanas, tudo ficou resolvido: Manuel Noriega, o general e Chefe de Estado panamenho, antigo colaborador da CIA que se convertera num barão do narcotráfico, foi capturado e julgado num tribunal da Flórida, sendo condenado a 40 anos de prisão. A Administração Bush, sob mandato das Nações Unidas, interveio também no Iraque (após Saddam Hussein invadir o Koweit) e na Somália.

1999 – Ex-Jugoslávia
Bill Clinton (1993-2001)

Após os fiascos da Somália e do Ruanda (1994), o 42º Presidente dos EUA empenha-se na queda do regime de Slobodan Milosevic e, para proteger as minorias albanesas e muçulmanas do Kosovo, forças norte-americanas e da NATO bombardeiam Belgrado, a capital sérvia, e instalam-se no território que declararia a independência em 2008.

2001 – Afeganistão/Iraque
George W. Bush (2001-2009)

Na sequência dos ataques de 11 de setembro, a Administração Bush lança a guerra global ao terrorismo, afasta os talibãs do poder em Cabul, declara Irão, Iraque e Coreia do Norte como o “eixo do mal” e acusa Saddam Hussein de possuir “armas de destruição em massa”. Desde a entrada da CIA e das tropas norte-americanas no Afeganistão, os EUA gastaram 14 biliões de dólares e provocaram 4,5 milhões de mortos.

2011 – Líbia/Síria/Iémen
Barack Obama (2009-2017)

Nove meses após instalar-se na Casa Branca, o 44º Presidente recebeu o Nobel da Paz, mas os seus dois mandatos demonstraram que não era um pacifista. Em 2011, os EUA e a NATO bombardearam a Líbia e permitiram o linchamento de Kadhafi. Em 2014, a Primavera Árabe estava enterrada, com a renovação de várias ditaduras no Médio Oriente e no Norte de África, enquanto as tropas norte-americanas se envolviam cada vez mais, a partir de 2014, nos conflitos sírio e iemenita.