É grande incógnita do próximo ano: como será governado Portugal? A solução encontrada será capaz de durar quatro anos? As sondagens sugerem que o receio de Marcelo Rebelo de Sousa de entrarmos numa fase de miniciclos políticos pode confirmar-se daqui para a frente. Num especial de antevisão de 2022, o OLHO VIVO analisa os cenários de governação e os desafios que cada um deles coloca aos protagonistas políticos.
“O principal desafio político para 2022 é não irmos a votos duas vezes no ano, e não estarmos em eleições novamente a partir de Setembro. Pela primeira vez, podemos mesmo não ter um desfecho claro após uma dissolução do Parlamento, já que todas as outras sete dissoluções as eleições trouxeram uma clarificação”, antecipa Mafalda Anjos, diretora da VISÃO.
Essa incógnita pode não ter resposta fácil na noite de 30 de janeiro, uma vez que as sondagens sugerem que há uma probabilidade baixa de maioria absoluta do PS e ainda mais no caso do PSD. Quem vencer terá de fazer acordos e, com as pontes à esquerda fragilizadas e distâncias ideológicas entre os partidos do “centrão”, isso pode não ser fácil de alcançar.
É isso que explica a dramatização que António Costa e Rui Rio têm feito, centrando a campanha num apelo ao voto útil. “Aquilo que António Costa tenta fazer é afastar-se da Geringonça de uma forma que ainda não tínhamos visto”, aponta o jornalista Nuno Aguiar. “Ele procura dizer que a única forma de termos um governo à esquerda é com uma maioria absoluta do PS ou perto disso. Pessoas que queiram um governo de esquerda em Portugal têm de votar PS ou então será o PSD a governar.”
Filipe Luís, editor de política da VISÃO, concorda com essa leitura. “António Costa diz que, se os portugueses querem a continuidade do sucesso das políticas aplicadas pela Geringonça, desta vez, têm de votar no PS, depois de PCP e BE terem precipitado a queda do Governo”, aponta. “E, se perder e ficar em 2.º lugar, não contem com ele para repetir 2015: vai-se embora. Ou seja, vai dramatizar e apelar ao voto útil…”
As sondagens também mostram que o apetite dos portugueses por uma maioria absoluta pode estar a mudar. Nuno Aguiar sublinha que isso é mais um sinal de que “a estratégia de PCP e BE está a revelar-se errada”. “A última sondagem do Expresso mostra que a percentagem de portugueses favoráveis a uma maioria absoluta disparou face a 2019. Para eleitores do PS, ela chega a 61%”, refere. “O BE e PCP que parecem ver em António Costa um líder descartável do PS têm agora os próprios eleitores socialistas a defenderem uma maioria absoluta.”
Mafalda Anjos está pouco otimista em relação ao sucesso dessa estratégia do PS. O Parlamento está demasiado partido para dar mais de metade dos deputados aos socialistas. “Acho altamente improvável de ser conseguida a maioria absoluta que António Costa veio pedir. As maiorias absolutas com a atual fragmentação política são hoje praticamente impossíveis. Sobretudo depois de seis anos de grande desgaste, e também porque o PSD está em clara ascensão nas sondagens.”
Para resolver este impasse, o ideal para o PS seria que outros parceiros menos exigentes se afirmassem eleitoralmente. Isso permitiria maior previsibilidade na altura de votar os orçamentos, sem ter de recorrer à direita. Uma espécie de cenário ideal para os socialistas. “O primeiro-ministro, se voltar a ganhar, vai fazer tudo para se manter no lugar. Sem maioria absoluta, deseja que o PAN (e o Livre) sejam suficientes para uma maioria parlamentar. Senão, vira-se para os parceiros de 2015, novamente. E, caso eles continuem tão intransigentes como na discussão do Orçamento, não terá dúvidas ao falar com o PSD”, prevê Filipe Luís.
Mafalda Anjos considera que António Costa se está a deixar prender num canto. “António Costa está a manter a estratégia de privilegiar a esquerda como parceiros prioritários. Mas parece-me um erro estratégico, devia deixar todas as hipóteses em de conversas à esquerda e à direita em aberto. Derrubou o muro de Berlim de um lado e construiu do outro, à direita. Agora devia derrubar o muro da direita mas não está a fazê-lo, hostilizando Rio Rio”, afirma a diretora da VISÃO.
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