Aguardava por esta notícia com um misto de sensações. O meu lado quase à beira de um ataque de nervos, em clausura forçada, teletrabalho e com a prole em casa, queria ver estes quatro seres agitados, barulhentos e devoradores de despensas que são os meus filhos daqui para fora, lá nas suas escolinhas onde reinam os abençoados professores. O meu lado ponderado e racional, esse, claro que sabia que não existia qualquer tipo hipótese para que tal acontecesse agora.
Tal como em meados de março encerrar as escolas foi a decisão mais difícil de todas, reabri-las será ainda mais complicado. A saúde pública está em primeiro lugar e falta ainda segurança para famílias, alunos, professores e toda a comunidade. É preciso perceber que, quando o tema é o ensino, falamos de 2 milhões de alunos, desde o pré-escolar até às universidade. Um universo gigantesco de muitos potenciais assintomáticos – um enorme ameaça invisível que faz capa desta edição da VISÃO – que poderão fazer disparar a propagação do vírus se regressarem à sua vida normal, onde o distanciamento social é praticamente impossível.
As medidas anunciadas hoje são equilibradas, sensatas e já eram expectáveis. Todas as intervenções dos últimos dias, do Primeiro-Ministro ao Presidente passando pelo Ministro da Educação, já o indiciavam. Sem grandes surpresas, soube-se hoje que os alunos do ensino básico já não vão regressar às escolas ao longo de todo o terceiro período. Os meus dois rapazes, portanto, estão condenados a ficarem em casa (e eu a trabalhar com eles por aqui). Todos os exames foram abolidos e os miúdos terão agora de descobrir a velhinha Telescola, na RTP Memória, como complemento do trabalho de ensino à distância que os professores vão fazer. Se dúvidas houvesse – e eu não as tinha – sobre o sentido (e a necessidade) de ter um canal público de televisão, ficam agora todas desfeitas.
Quanto aos alunos do secundário, onde está a minha filha mais velha, terão de esperar pelo mês de maio para se reavaliar se existem condições de segurança para voltarem às escolas. A acontecer, o ensino presencial será reduzido ao mínimo e será sempre com uso de máscara obrigatório para todos. E o ano letivo será empurrado mais para a frente (até 26 de junho), para que os exames possam ser feitos, na primeira fase, de 6 a 23 de julho. Naturalmente, os professores e restante pessoal escolar que pertençam a grupos de risco terão de ser protegidos ou dispensados.
É preciso perceber que as aulas, essas, em qualquer dos casos, vão continuar. À distância ou não, os miúdos vão ter de estar a trabalhar e a aprender. É evidente que as desigualdades sociais ficarão mais expostas: nem todas as famílias estão em pé de igualdade para fazer face a este desafio, tanto em termos de acesso tecnológico como de disponibilidade para apoiar as crianças.
Como mãe de 4 (e com formação germânica, que nestas coisas dá algum jeito), atrevo-me a dar alguns conselhos práticos para sobreviver ao resto da quarentena com os filhos em ensino à distância:
1 – Responsabilizar sempre os miúdos, seja qual for a sua idades. Explicar que esta é uma situação excecional ditada por necessidades maiores, e que também eles são chamados a contribuir com a sua parte.
2 – Não os menorizar, nunca. As crianças são bem capazes de perceber estas mensagens, e têm uma capacidade de adaptação bem maior do que a nossa. É evidente que os pais devem acompanhar e apoiá-los no que necessitem para encarrilar, mas não devem fazer de pombos correios entre os professores e os alunos.
3 – É fundamental procurar manter, ao máximo, as rotinas, os horários e as tarefas que sempre tiveram antes.
4 – Os professores devem entregar os horários, fichas e trabalhos diretamente aos miúdos, como se estivessem na sala de aula. Eles têm de perceber que estas são as suas tarefas, que lhe chegam agora de outras formas – mail, grupos de whatsapp, escola virtual, o que seja.
5 – Todo o trabalho escolar deve ser feito por eles, sozinhos, e não pelos pais – algo que aliás sempre defendi também para os TPC. Não são os pais que andam na escola, são os filhos. Apenas os que, com condições especiais, precisavam de orientação antes devem continuar a mantê-la.
6 – É preciso dar-lhes espaço e tempo de estudo sossegado – e de preferência longe dos pais. E privacidade também, para falarem com os colegas, socializarem e estarem “cara a cara” nem que seja pelas redes, e não apenas a falar por mensagens.
7 – Ajuda mostrar-lhes alguma cenoura à frente do nariz. Portam-se bem e poderão jogar playstation ao fim de semana. Têm boas avaliações e ganham o direito a, quando a quarentena acabar, fazer uma festança de arromba em casa com todos os amigos. E os castigos também: quem não se empenha, perde o acesso ao Tik tok e ao Instagram. Não há nada mais doloroso para teenagers… e eficiente.
8 – Devemos dar-lhes espaço para descobrirem outras coisas, explorarem novos gostos, terem tempo para desenvolverem hobbies. Lá por estarem em casa, não têm de estar sempre ocupados a estudar.
9 – E para os pais, (alerta de ironia) recomendo a ioga, que ensina a aguentar desconforto e sofrimento com um serenidade e até mesmo com um sorriso. E a meditação. E banhos de imersão. Isto para não se entregarem a calmantes, drogas e álcool.
Vai ser uma longa viagem até Agosto, ó se vai… Mas como costumo dizer, fomos nós que os fizemos, agora temos de ser nós a aguentá-los. E pelo caminho, aproveitar este processo para os ajudar a tornarem-se melhores seres humanos. Levá-los a descobrir novos interesses e envolvê-los em projetos de solidariedade. E, claro, no final disto tudo, depois de estarmos fechados com crianças em casa três meses, é fazer uma estátua aos professores… que, como todos já percebemos à força da Covid-19, deviam ter um lugarinho no céu!