“I’ll make you an offer you can’t refuse.” Esta frase tem conotações inquietantes, na cinematografia mundial e, portanto, Luís Montenegro escolheu mal as palavras, ao garantir que vai fazer “uma proposta irrecusável ao PS”. Uma proposta que o PS não pudesse recusar sugeriria que a alternativa seria o “suicídio” das eleições, coisa que Pedro Nuno Santos foi o primeiro a admitir, esta semana, oferecendo-se, desde já, para as disputar: “Prefiro perder eleições a abdicar das nossas convicções” – uma frase de campanha que só lhe pode render votos. Mas, pouco depois, o líder do PS, procurando atingir um certo público-alvo, deu uma boa entrevista à CMTV. Aprendeu com os melhores: Cavaco Silva, numa era pré-redes sociais e profundo conhecedor dos hábitos de consumo noticioso da populaça, quase só dava entrevistas ao Correio da Manhã… E aí, lembrou que só haverá eleições “se o primeiro-ministro e o Presidente da República quiserem”. E assim reverteu o argumento de que só há eleições se o PS quiser, isto é, se chumbar o Orçamento. É que o chumbo do Orçamento não implica a queda do Governo, uma consequência que, segundo a narrativa corrente, e que Pedro Nuno procurou explorar, foi inventada por Marcelo Rebelo de Sousa em 2021/22, quando procedeu à sua primeira dissolução da Assembleia da República. Mas todos sabemos que não é bem assim. E até houve governos que caíram por documentos menos importantes terem sido rejeitados pela AR: Mota Pinto, em 1979, depois da rejeição das Grandes Opções do Plano (mesmo com o Orçamento aprovado) e José Sócrates em 2011, depois de ver rejeitado o PEC IV. E todos nos lembramos do drama das negociações para a aprovação do Orçamento para 2011, quando o PSD de Pedro Passos Coelho nomeou, como negociador, Eduardo Catroga. Na altura, sabia-se que Orçamento chumbado era sinónimo de crise política, muito antes de Marcelo ter feito jurisprudência nessa matéria.
Os argumentos de Pedro Nuno parecem sólidos: a direita ufanou-se de ter afastado a esquerda do poder, por isso não venham agora pedir batatinhas ao PS: a direita que se entenda. Pedro Nuno sabe perfeitamente – e Montenegro também sabe – que, se nesta altura do campeonato o Governo dependesse do voto favorável do Chega, o primeiro-ministro ficaria nas mãos de André Ventura, que obteria um triunfo sensacional. Nem por um momento passa pela cabeça de Montenegro “abdicar das suas convicções” nesta matéria. E Pedro Nuno Santos devia saber (mas não aceita…) que, assim como não há um bloco único da direita, mas várias direitas inconciliáveis, também não há, desde Mário Soares e do PREC, um bloco da esquerda, mas várias esquerdas com projetos de sociedade totalmente contraditórios. Sobra, depois, quer queiramos quer não, um bloco central moderado, equilibrado, ponderado e responsável que os portugueses têm repetidamente sufragado nas urnas e que se mostra muito mais resiliente do que noutros países europeus, com as consequências que se conhecem para esses países europeus… E este é um património português que a teimosia de líderes políticos demasiado ambiciosos e muito pouco conhecedores da História não deviam desbaratar.