Recentemente, diferentes países do Norte da Europa resolveram criar o conceito de Dieta Nórdica e posteriormente a Nova Dieta Nórdica (NDN). Este conceito foi desenvolvido em 2004 pelos principais chefs nórdicos que assinaram o Manifesto por uma Nova Dieta Nórdica (NDN) e mais tarde impulsionado por embaixadores e políticos destes países (Dinamarca, Finlândia, Ilhas Faroé, Gronelândia, Islândia, Noruega e Suécia). O programa foi lançado pelo Conselho Nórdico de Ministros com um orçamento de 3 milhões de euros para 3 anos. É definitivamente um projeto político-económico de base científica, baseado em quatro princípios fundamentais: saúde, potencial gastronómico, sustentabilidade e identidade nórdica. Enfatiza a vida selvagem, a produção local, os produtos frescos e o sabor e sugere que o modo de comer deste padrão alimentar, onde os frutos e vegetais estão presentes bem como os produtos de produção biológica e os alimentos apanhados em estado selvagem proveniente do bosque ou dos lagos em estado puro, não processados, são os alimentos a ser incentivados. Este modelo pretende contrapor-se ou apresentar-se como a alternativa do Norte ao modelo alimentar do Sul da Europa e que é conhecido como Dieta Mediterrânica (DM).
Tal como a Organização Mundial de Saúde sugere, são dois padrões alimentares saudáveis e desejáveis. Mas muito diferentes na minha opinião. Ao contrário dos padrões alimentares do norte da europa, mais ou menos recentes, ou pelo menos apresentados recentemente e ainda pouco estudados, a DM cresce e desenvolve-se nas sociedades mediterrânicas clássicas dos Impérios Cartagineses, Gregos ou Romanos, debaixo de uma enorme pressão populacional e ambiental. Ou seja, muita gente para alimentar e secas frequentes intercaladas com cheias ocasionais, precisamente os tempos que correm atualmente. Todo o mapa do mediterrâneo foi sempre desenhado pela luta contra o clima agreste, as cheias, as secas ou pragas e a fuga e adaptação das populações a novos lugares. Basta abrir a Bíblia ou ler os historiadores do mediterrâneo, desde Políbio a Fernand Braudel. Neste contexto de fuga e adaptação é necessário um modelo alimentar que seja adaptativo ao meio ambiente, que cozinhe o que existe localmente, muitas vezes à base dos vegetais locais, mas que combine de forma adequada a produção semi-industrial e massificada que se pode armazenar e transportar (azeites, massas, leguminosas secas, queijos, vinho) com a produção fresca e sazonal (frutas, hortícolas, ervas aromáticas…). Só assim se pode alimentar muitas bocas. Foi esse o trunfo da Dieta Mediterrânica. Um modelo alimentar destinado a alimentar muita gente combinando o processado com o fresco e adaptando, adaptando… ao clima, ao súbito aumento populacional, à necessidade de produzir nos dias de boas colheitas para os dias maus. Enfim, um modelo de grande inteligência popular que esteve na base da construção do modelo cultural europeu e da fundação da nossa democracia e que hoje tentamos preservar como património cultural da Humanidade.
Este padrão alimentar que, entretanto, foi estudado e considerado promotor da saúde é também um promotor dos alimentos do mediterrâneo, como o azeite, o tomate, a amêndoa, o vinho, o pão, as massas, a fruta e os hortícolas. E da economia do Sul. Por isso, não admira que quem queira vender salmão, arenque, óleo de colza, framboesas e cogumelos selvagens e uma gastronomia e turismo sustentado neste modelo económico-cultural questione agora a Dieta Mediterrânica, a ciência por detrás do seu sucesso e promova a Dieta Nórdica como apanágio de uma alimentação com a ciência de qualidade do seu lado, saudável, amiga da natureza e sustentável e sem lóbis do agroindustrial por detrás. Infelizmente, os bosques e os poucos lagos do norte da Europa ainda imaculados não vão chegar para uma população faminta que foge do calor tórrido provocado pelo aquecimento global em África e procura comida e paz na Europa. Agora, como há milhares de anos, a história no mediterrâneo repete-se e o modelo de alimentação mediterrânico ou a Dieta Mediterrânica cá estará para tentar dar a ajuda possível em tempos de crise.