A questão da qualidade do sono e da sua importância na vida dos mais novos é das matérias mais referidas em espaços desta natureza. No entanto, dada a sua relevância parece-me justificado que também lhe dediquemos alguma atenção.
Para além da experiência que, provavelmente, muitos de nós teremos, um estudo recente da responsabilidade da Universidade do Minho revelou que das mais de quinhentas crianças e adolescentes participantes, dos 9 aos 17, cerca de 72% dorme menos do que seria recomendável para as suas idades. Umas das principais causas apontadas é a presença de aparelhos como computadores, tablets ou smartphones no quarto.
Estes dados não são surpreendentes, estão em linha com os de muitos outros trabalhos, e sustentam algo que todos sabemos mas negligenciamos, a qualidade do sono é um dos mais importantes contributos para o bem-estar geral, incluindo a vida escolar.
Neste contexto, gostava de recordar um trabalho relevante de 2013 realizado em Inglaterra que evidenciava o impacto negativo que a falta de rotinas de sono equilibradas, por exemplo horário estável para deitar, por, pode ter na qualidade de vida e bem-estar das crianças com reflexo ainda nos processos de aprendizagem.
Um outro trabalho, este realizado nos Estados Unidos, no qual foram seguidos durante seis anos cerca de 11 000 crianças mostrou uma forte relação entre alterações no sono e a emergência de problemas diversos no comportamento das crianças.
Também em Portugal vários estudos, designadamente da responsabilidade da Professora Teresa Paiva, mostram realidades com os mesmos contornos.
Reportando-nos a conclusões desses trabalhos também se verifica que mais de metade dos adolescentes envolvidos evidencia comportamentos de sonolência e hábitos de sono de baixa qualidade e insuficientes. No entanto e apesar do que já se sabe sobre estas questões, creio poder afirmar-se que não são tidas em conta em muitos dos nossos contextos familiares.
Um olhar mais atento, por exemplo nas grandes superfícies comerciais, revelará certamente como muitas crianças, mais pequenas ou maiores, se arrastam penosamente pela mão dos pais em horários já não aconselhados, não sendo raro o espectáculo de um tão inoportuna quanto justificada birra.
As investigações neste universo indiciam que a falta de qualidade nos padrões e hábitos de sono estará também associada a factores como stresse familiar sendo que tem vindo a registar-se um aumento de alterações nos comportamentos e na demonstração, por exemplo, nas salas de aula, de indicadores de sonolência.
Não vivendo tempos fáceis poderemos admitir o peso de situações de instabilidade familiar mas creio que deveremos estar particularmente atentos a factores decorrentes dos estilos de vida, da consistência das rotinas na vida dos mais novos ou, como se referia no primeiro estudo a ausência de regulação no acesso e utilização das novas tecnologias no período da noite, em particular durante o tempo que já deveria ser destinado ao sono.
Recorde-se ainda que o quotidiano de muitas crianças e adolescentes é marcado, já falei disso em texto anterior, por uma sucessão de actividades incluindo a vida escolar e que segundo alguns trabalhos quase 50% das crianças e adolescentes até aos 15 anos terá computador ou televisão no quarto para além, evidentemente, do telemóvel à mão.
Não é, pois, difícil perceber que durante o tempo que deveria ser dedicado ao sono, com duração ajustada e assim reparador, muitas crianças e adolescentes estarão em frente de um ecrã e sem regulação familiar. Conheço algumas situações em que os pais estão mesmo confiantes em que a criança dorme quando, na verdade, está no seu quarto em animada interacção com um qualquer dispositivo.
Por tudo o que se conhece fica claro que este tipo de funcionamento não pode deixar de se reflectir nos comportamentos durante o dia. São frequentes as queixas e pedidos de ajuda relativos a sonolência continuada, distracção, comportamentos de irrequietude ou instabilidade e, naturalmente, a emergência de problemas no rendimento escolar.
Neste quadro ainda acontece que os comportamentos e dificuldades escolares das crianças são, por vezes, repito por vezes, remetidos com alguma ligeireza para apreciações que os associam a problemas como hiperactividade ou défice de atenção quando, na verdade estarão mais ligados aos hábitos e padrões de sono como a investigação e o testemunho de muitos profissionais sustentam.
Face a tudo isto seria mesmo importante que esta matéria fosse considerada seriamente e que se reforçasse a chamada de atenção dos pais e o apoio à sua acção junto dos filhos numa tarefa que nem sempre é fácil.
A experiência revela que muitos pais desejam e mostram necessidade de alguma ajuda ou orientação nestas matérias.
(Texto escrito de acordo com a antiga ortografia)