Paris acordou hoje de pantanas com a reviravolta teatral no caso DSK: de repente, um do jornais mais cotados dos EUA e do mundo, o New York Times, cita fontes do gabinete do Procurador de Nova Iorque, Cyrus Vance, pondo em dúvida a credibilidade moral da alegada vítima na acusação de crime sexual que pesa contra o antigo director geral do FMI – que era também, até essa data, considerado quase como o vencedor socialista das eleições presidenciais francesas de 2012. A empregada da limpeza do hotel Sofitel, que a 14 de Maio último afirmou ter sido alvo de uma tentativa de violação por Dominique Strauss-Kahn, e de ter sido forçada, violentamente, a um acto de sexo oral, era dada até ontem como uma imigrante modesta com uma vida impecável. O New York Times, precisamente, mobilizou seis do seus melhores repórteres, durante quinze dias, para vasculhar cada recanto da vida desta viúva guineense de 36 anos, empregada modelo do Hotel Sofitel e mãe de uma adolescente de 15 anos, brilhante aluna num liceu do Bronx. O inquérito concluiu que ela era imaculada.
Ora, segundo o Procurador, ela teria já evocado um caso de violação para obter o seu visto para os EUA, alegação que teria depois abandonado; depois, cerca de cem mil dólares teriam circulado pela sua conta bancária, em somas diversas provenientes de vários pontos dos EUA, o que levanta suspeitas de branqueamento de dinheiro; por fim, a alegada vítima teria telefonado a um prisioneiro nos EUA, condenado por tráfico de droga, para evocar com ele a possibilidade de obter uma indemnização de DSK.
Tal como houve inúmeras dúvidas sobre a eventual culpabilidade de DSK quando o caso rebentou, há agora também uma reacção dubitativa quase instintiva às revelações do NYT, procedentes do gabinete do Procurador. Como é possível que esta mulher, sob vigilância permanente a polícia desde as 15h de 14 Maio, tenha conseguido telefonar a um prisioneiro sem que as autoridades o ignorassem até agora? As contas bancárias dela não foram logo verificadas? O dossier de imigração não foi escrutinado? E como poderia o próprio inquérito do NYT, com tantos repórteres no caso, não levantar nenhuma lebre?
Estas perguntas ficam prudentemente sem resposta até hoje de tarde: às 16h30, hora de Lisboa, começa uma sessão no tribunal, pedida pelo Procurador Cyrus Vance. Só aí se saberá se ele retira a acusação, ou se pede apenas mais tempo para investigar a credibilidade da alegada vítima.
Até à hora da sessão no tribunal, os comentadores franceses mantêm-se numa expectativa prudente: é que a eventualidade de uma reabilitação de DSK embaralha de tal modo, de novo, o jogo político em França, que ninguém ousa entrar em especulações antecipadas.