Facto número 1 – o Planeta está a aquecer e a vida será gradualmente mais complicada para os nossos filhos e netos se nada mudarmos. Facto número 2 – as populações continuam a crescer nas grandes cidades e ao seu redor. Facto número 3 – cada vez que se constrói um edifício e se ocupa uma zona verde está a ser criado um efeito de calor dentro da cidade porque se impermeabiliza o solo e, logo, este deixa de ‘evaporar’, fenómeno de evaporação que permitiria o efeito de arrefecimento. A não reposição de uma zona verde acaba por provocar temperaturas perfeitamente anormais nas cidades e um calor permanente, com a necessidade de um consumo energético gigantesco e os respetivos impactos na camada de ozono, como explicam os princípios elementares difundidos por ambientalistas e arquitetos paisagistas.
Vem isto a propósito da mais recente iniciativa da Noocity, start-up portuguesa cuja atividade se centra precisamente em criar pequenos oásis no centro das cidades em forma de hortas comunitárias e que criou um programa específico para empreendimentos residenciais, uma vez que até agora estava mais focado em edifícios de escritórios.
Partindo da constatação que o desenvolvimento sustentável dos edifícios é uma preocupação crescente dos promotores imobiliários, tanto nas construções novas como nas existentes, a Noocity criou um programa que permite aos edifícios ganhar pontos em certificações relativas ao “valor verde” dos edifícios, valorizando o imóvel. Tem também o outro lado mais lúdico e até terapêutico ao criar um espaço de ‘desaceleração’ e relax, promovendo e fortalecendo os laços entre os moradores do prédio.
A promotora Avenue, que detém vários empreendimentos em Lisboa e no Porto para o segmento superior, estreou este novo conceito, não tanto pela certificação ambiental, pois já detém as máximas para os seus projetos, mas precisamente por estimular o convívio no condomínio.
“O nosso produto foi especialmente concebido e desenhado para ser instalado numa superfície pavimentada ou em cimento e, de facto, a maioria dos nossos projetos estão em coberturas ou em terraços. É, na verdade, onde a nossa proposta ganha argumentos. Se fosse no chão, obviamente que continuaria a ser válida (e temos bastantes argumentos para a continuar a defender), mas as coberturas e os terraços são de facto uma área imensa, pouco aproveitada, nos prédios que enchem as cidades. Hoje em dia podemos ter alguma competição por espaço através dos painéis solares, mas eu diria que nem é bem uma competição, pois temos projetos em que as hortas coabitam com os painéis solares”, para sublinha à Visão José Ruivo, sublinhando que esta área improdutiva, para a qual ninguém olhava, torna-se assim uma área de convívio, uma área de abundância, de verde, com os diversos benefícios que isso traz, o qual o maior de todos é a redução das emissões de carbono nas cidades. “Ou seja, se em cada prédio houvesse uma horta na cobertura ou terraço comum, a temperatura da cidade reduziria consideravelmente.
As hortas urbanas são fáceis de instalar e não impactam a estrutura do edifício, além de terem um custo reduzido e uma longa duração – as camas de cultivo têm uma garantia de cinco anos e uma durabilidade esperada de mais de dez anos.
Da parte da Avenue já se começa a notar o efeito interação criado pela horta comunitária da Noocity instalada em março deste ano no condomínio de luxo 5º Porto.
“Queríamos fomentar o espírito de comunidade dentro do condomínio e um tema à volta do qual as pessoas se juntassem. As hortas é algo bastante original no sentido em que se podem, de facto, ligar as pessoas a algo que é a terra, ver as coisas a crescer, juntar as crianças. Sentimos que há uma adesão crescente, a ideia funcionou para servir este propósito”, confirma Aniceto Viegas, CEO da Avenue.
José Ruivo reforça: “A experiência tem superado imenso as expectativas… Foi preciso chamar as pessoas para a horta, mas assim que elas começaram a ir, começaram a trazer outros vizinhos, outras pessoas e hoje o dia de animação da horta no 5º Porto é participado por adultos, crianças, pessoas que não se conheciam… O 5º Porto tem a particularidade de ter muitos condóminos estrangeiros que encontram ali uma oportunidade de conhecerem as pessoas que vivem ao lado delas. Tudo isso é muito gratificante porque está completamente alinhado com a nossa visão”.
No caso do 5º Porto, a Avenue reservou a área que estava destinada a terraço comum “e que se localizava na cobertura de uma garagem, num terreno um bocadinho atípico, uma vez que a entrada do terraço fica a uma cota ligeiramente superior”, explica Aniceto Viegas.
Instalada a horta comunitária, a Noocity assegura a sua manutenção com a deslocação, uma vez por mês, de um dos seus técnicos. “Só para perceber se é preciso fazer alguma coisa que os próprios condóminos não tenham feito, garantir que está tudo bem, levar plantas para repor aquelas que se vão retirando, etc. Depois, há um propósito de educação, ou seja, de ensinar as pessoas a cultivar pois muitas pessoas sentem este apelo de cultivar a sua própria horta, mas não sabem”, realça José Ruivo, acrescentando que há quem se anime e acabe também por comprar uma mini-horta para instalar na sua própria varanda.
Para dar impulso ao negócio, a Noocity solicitou à Sonae Sierra, no final do ano passado, um estudo onde é avaliado o impacto deste tipo de produto na certificação dos três principais sistemas que promovem uma construção mais sustentável: BREEAM, LEED e WELL. Estas certificações são atribuídas a construções novas e já existentes e analisam vários pontos (que variam de acordo com o sistema), tais como os materiais e recursos, energia, inovação, eficiência hídrica, utilização do solo e ecologia, poluição, entre outros. O estudo concluiu que as soluções da Noocity têm um impacto positivo nos edifícios avaliados, tanto na fase de conceção e construção, como na fase de funcionamento.
A Noocity tem já vários projetos implementados a nível empresarial . O programa Liga-te à Terra soma cerca de uma centena de projetos e, entre outros, teve a adesão de empresas como a Microsoft, Accenture e Farfetch. Ao nível de cliente final, a startup regista mais de 2000 hortas urbanas vendidas.