Será certamente uma das notícias do ano no mundo do empreendedorismo – depois de ter criado e afundado uma das maiores startups de sempre, o empreendedor israelo-americano Adam Neumann está de volta com uma nova startup chamada Flow. O grupo de capital de risco Andreessen Horowitz (a16z), um dos maiores do mundo e um dos mais respeitados em Silicon Valley, anunciou o seu maior investimento semente (seed investment) de sempre nesta nova empresa, que já está avaliada em mais de mil milhões de dólares. Além dos valores envolvidos, há mais motivos para que o regresso de Neumann seja digno de notícia – mas esta história exige um pouco de contexto.
A ascensão e a queda de Neumann
Adam Neumann fundou, em 2010, a WeWork, uma startup focada no ramo imobiliário empresarial. A proposta da empresa era relativamente simples – comprava edifícios, remodelava-os, transformava-os em espaços modernos de escritórios partilhados, e alugava-os a empresas. O aparecimento da WeWork coincidiu com a afirmação da cultura de escritórios modernos e apelativos que as grandes tecnológicas americanas ajudaram a definir, numa altura em que o empreendedorismo a nível global e os trabalhadores remotos começaram a expandir-se de forma mais notória. Além do lado ‘cool’ dos espaços da WeWork, a empresa explorava um modelo flexível – era possível alugar um espaço inteiro durante um largo período de tempo ou era possível simplesmente alugar uma secretária por um mês. Juntou-se, como se diz na gíria, a ‘fome à vontade de comer’ e a WeWork transformou-se num dos maiores símbolos do empreendedorismo americano moderno.
Como resultado da expansão agressiva da empresa – chegou a comprar imóveis 38 países e a ter mais de quatro milhões de metros quadrados de imobiliário para alugar –, a WeWork captou a atenção e o dinheiro de muitos investidores. No seu auge, a startup chegou a estar avaliada em 47 mil milhões de dólares, tornando-a numa das maiores startups de sempre a nível global.
Mas foi quando a empresa iniciou esforços para entrar na bolsa de valores através de uma oferta pública inicial (IPO na sigla em inglês) que começou a derrocada da WeWork e de Adam Neumann. Quando a empresa submeteu o prospecto obrigatório (S1 filling, em inglês) para a entrada em bolsa, na qual revelava qual a situação financeira e os riscos para o negócio no futuro, rapidamente se percebeu que havia mais mediatismo no negócio da WeWork do que resultados sólidos.
Estamos em 2019 e a empresa tinha perdido cerca de 1,9 mil milhões de dólares no ano anterior – aos quais se juntavam mais 900 milhões de dólares só nos primeiros seis meses desse ano. Como salienta a publicação CNBC, um analista da empresa MKM Partners estimava que a WeWork estava a perder entre 150 a 200 milhões de dólares por mês (!) e que a tal ritmo, só teria capital próprio para sobreviver a mais seis meses de operação.
A partir destas revelações, a WeWork entrou numa espiral negativa: os dados assustaram os investidores, que exigiram mais informações à empresa, informações essas que vieram provar que o negócio da startup não era tão sólido e rentável como muitos acreditavam ser, o que levou à desvalorização da WeWork (para dez mil milhões de dólares) e a um maior escrutínio da sua gestão.
À turbulenta entrada em bolsa, na imprensa americana multiplicaram-se as histórias que mostravam que existia um espírito de culto ao líder na empresa, uma cultura de “trabalha muito, festeja ainda mais”, episódios de sexismo e abusos contra funcionários e gestão duvidosa de dinheiro, como a aquisição de aviões privados e até de uma empresa que faz piscinas com ondas.
Perante tudo o que tinha à sua frente, o conselho de administração da WeWork pressionou Adam Neumann a abandonar a liderança da startup – algo que aconteceria ainda em 2019. Apesar de ter saído pela porta pequena face às suas ambições (queria ser a primeira pessoa do mundo com uma riqueza de um bilião de dólares e queria que a marca WeWork fosse muito além do imobiliário), Neumann acabou por sair com um acordo bem chorudo: estima-se que tenha recebido perto de mil milhões de dólares pela saída da empresa.
WeWork 2.0?
Cerca de três anos depois da queda com estrondo de Adam Neumann, o empreendedor está de volta com a Flow, a sua nova startup. Ainda são escassos os detalhes sobre esta nova empresa, mas segundo o The New York Times está novamente relacionada com o setor imobiliário – mas desta vez residencial. A empresa já terá cerca de 3.000 apartamentos em cidades como Miami, Atlanta e Nashville.
E Adam Neumann não volta apenas com uma nova startup – volta logo com um novo unicórnio (jovem empresa avaliada em mais de mil milhões de dólares). Isto porque a Flow conseguiu 350 milhões de dólares do fundo de investimento Andreessen Horowitz ainda antes de lançar o produto/serviço, algo que o jornal americano diz que acontecerá em 2023.
Segundo o fundo de investimento a16z, Adam Neumann é “um líder visionário” e esta aposta multimilionária é feita por considerarem que o mercado imobiliário residencial precisa de uma disrupção – diz o comunicado que atualmente é dominado por aquisições de longo termo que limitam as pessoas nos objetivos das suas carreiras ou arrendamentos de curto prazo que limitam as pessoas na sua vivência social.
Segundo a Andreessen Horowitz, “só projetos com tamanhos objetivos têm a oportunidade de mudar o mundo”.