Uma viagem a Marte dura, pelo menos, dois anos. Com um período de viagem tão longo a probabilidade de um dos astronautas precisar de se submeter a uma intervenção cirúrgica aumenta consideravelmente. O que levanta a questão: como fazer uma cirurgia no Espaço?
Nos últimos 18 meses, a GMV, a Universidade Católica de Lovaina, Bélgica, e o Instituto de Medicina e de Fisiologia Espacial de França têm vindo a trabalhar numa solução para as intervenções cirúrgicas espaciais. Desse estudo resultou o desenho de uma arquitetura-conceito para viagens espaciais de maior duração.
A solução, que dá pelo nome de Study On Assisted Surgery for Space Exploration (SASPEX), acaba de ser apresentada à Agência Espacial Europeia (ESA).
À primeira vista, a telemedicina poderia ser encarada como uma solução a ter em conta – mas o consórcio responsável pelo projeto SASPEX logo tratou de afastar essa hipótese: «Nestas missões, as comunicações não têm a mesma fiabilidade que aquelas entre a Terra e a Estação Espacial Internacional (ISS) ou os vaivéns, e os atrasos da chegada do sinal tornam a telemedicina inviável. A única solução é tornar a tripulação o mais autossuficiente possível neste campo, dotando-a de capacidades para solucionar o máximo possível de emergências médicas expectáveis no contexto espacial», explica José Luís Freitas, Responsável pelo Desenvolvimento de Negócio Aeroespacial da GMV em Portugal, em comunicado.
Tendo em conta que a telemedicina não é solução, os peritos do SASPEX propõem que, pelo menos, um dos membros de uma equipa de astronautas tenha qualificações ou domine os rudimentos para uma cirurgia.
A par de um elemento qualificado como cirurgião, o consórcio elencou ainda um conjunto de ferramentas que deverão estar disponíveis, no caso de ser necessário fazer uma cirurgia num vaivém. Eis a descrição apresentada pelo comunicado da GMV: bases de dados sofisticadas que são conhecidas por “expert systems” e que poderão ser usadas para a consulta e apoio à decisão de quem presta os cuidados médicos; equipamentos robóticos e sensores inteligentes que executam diferentes procedimentos cirúrgicos de forma autónoma; simulação da microgravidade e dos efeitos causados nos órgãos; sistemas de imagiologia e impressoras 3D que ajudam a criar próteses; e recurso à realidade aumentada e à realidade virtual para o treino de quem tem de proceder à cirurgia.
Este conjunto de ferramentas foi definido com o propósito de superar alguns dos constrangimentos verificados no Espaço: «Nas missões mais longas, prestar cuidados médicos sob o efeito da microgravidade, isolamento, espaços confinados, e a impossibilidade de evacuar um doente para um sítio onde possa receber tratamento mais especializado, adiciona muita dificuldade ao que poderia ser simples na Terra», sublinha José Luís Freitas.
Infeções, lesões musculares e problemas oftalmológicos são as maleitas que os investigadores que participaram no SASPEX apontam como sendo as que têm maior probabilidade de exigir uma intervenção cirúrgica no Espaço.