“Chega? Não reduza a questão, quero uma uma solução de centro-direita alargada em Portugal [para o PSD regressar ao poder]”. A frase é de Rui Gomes da Silva que, esta semana, foi o convidado do Irrevogável, podcast de entrevista da VISÃO.
O advogado e político português falava sobre o presente e o futuro da política portuguesa, considerando que esta é a única forma de o PSD “não ser surpreendido” e “desaparecer, mais cedo ou mais tarde”. “O sistema partidário já mudou em todo o lado na Europa, menos em Portugal. Isso significa que, mais cedo ou mais tarde, vamos ser surpreendidos por essa alteração do sistema partidário. Das duas, uma: ou o PSD ganha a dianteira dessa alteração ou, então, um dia destes, acordamos e o PSD já foi ultrapassado pelos partidos à sua direita ou que disputam o mesmo espaço político… e vai desparecer”, afirma.
Segundo Rui Gomes da Silva – o histórico militante do PSD, ex-ministro dos Assuntos Parlamentos e Adjunto no governo de Pedro Santana Lopes –, os sociais-democratas “não podem” ‘fechar a porta’ a coligações com os partidos da direita, e isso inclui CDS e… Chega. “O PSD não pode definir limites, tal como António Costa não definiu, quando fez acordos com o Bloco de Esquerda e PCP…”
“O problema é se o Chega, qualquer que seja um próximo resultado eleitoral, não aceite as ‘linhas laranjas’ [porque ‘vermelhas’ só no futebol, diz], agora, o PSD autoexcluir o Chega, no atual quadro político, um partido com quase 15% dos votos nas sondagens. Não faz sentido! Estarmos, hoje, preocupados com três ou quatro senadores, por o que diz um jornal ou uma televisão, acho que não faz sentido e acho, também, que o pior favor que fizeram a Luís Montenegro foi terem obrigado o líder do PSD a fazer aquela declaração em que ele diz que, após as eleições, não fará nenhum acordo com o Chega”, diz.
Questionado sobre se essa aproximação do PSD ao Chega pode pôr em causa as conquistas do 25 de Abril, Rui Gomes da Silva é taxativo: “Não acredito que as pessoas envolvidas [no Chega] sejam menos democratas do que eu. E há muitos vice-presidentes do PSD que defendem essa aproxição ao Chega”, garante.
Luís Montenegro? “O PSD precisa de líder carismático”
Em entrevistas anteriores, Rui Gomes da Silva já afirmou que Luís Montenegro “não tem carisma” para ser líder do PSD. No Irrevogável, a opinião manteve-se. “Digo eu [que Luís Montenegro não tem carisma] e diz toda a gente”, refere, considerando, que, neste momento, o atual presidente do PSD “parece mais preocupado em ganhar o próximo Congresso [do partido] do que o governo”. Sinceramente, não me parece este caminho para ganhar as eleições”, sublinha.
Luís Montenegro não tem carisma. Parece mais preocupado em ganhar o próximo Congresso [do partido] do que o governo
Rui gomes da silva
O antigo deputado e ex-ministro critica a estratégia da atual direção do PSD, considerando que um líder carismático – como Francisco Sá Carneiro ou Aníbal Cavaco Silva – estaria, hoje, a falar ao país, de forma muito clara, dizendo que ‘com este projeto vou ganhar as eleições’, e não estaria preocupado em preparar o Congresso e a permanência na liderança do partido”. “Se não conseguissem, assim, ganhar as eleições, então, estaria à procura de soluções de entendimento, como as que, no passado, aconteceram com o CDS. [Com o Chega] a situação, atualmente, não é muito diferente do que as do passado”, destaca.
“Acho que o PSD tem de fazer o seu caminho, dizendo aos portugueses o que eles querem ouvir em relação a uma alternativa. Não é dizer, como tenho ouvido nos últimos dias, ‘vocês já trabalharam, agora é a nossa vez’, porque então não era preciso fazer um programa eleitoral… É o argumento menos político e destruível que conheço”, realça.
Rui Gomes da Silva também censura ainda “o atual formato” eletivo do PSD, defendendo “a introdução de ‘primárias’, a exemplo dos Estados Unidos da América, para a escolha de um nome para a corrida às eleições legislativas”. “As ‘primárias’, mais ano menos ano, vão entrar na política portuguesa. Esta seria a melhor forma do PSD escolher o nome para concorrer ao cargo de primeiro-ministro”, sublinha.
“A IL um BE com cartões de crédito”
O almoço entre Luís Montenegro e Rui Rocha deixou Rui Gomes da Silva indisposto… O advogado confessa que “não gostou” deste encontro, pois, considera, “o PSD não tem nada a ver com um partido como a Iniciativa Liberal”.
“O PSD tem de se aproximar de partidos com que se identifique… A IL? Estamos apenas a perder tempo a falar com um partido destes, que mais parece o Bloco de Esquerda das Avenidas Novas ou do Passeio Alegre, um BE com cartões de crédito na carteira… É isso que vamos querer para o PSD? Um acordo com um partido que depois, internamente, vamos ter de andar a discutir tudo e mais alguma coisa, porque as pessoas não se identificam com aquela agenda fraturante?”, questiona.
A IL? Estamos a perder tempo com um partido que mais parece o Bloco de Esquerda das Avenidas Novas ou do Passeio Alegre, um BE com cartões de crédito na carteira
Rui Gomes da Silva
Rui Gomes da Silva reforça o desejo de ver o PSD próximo de CDS e Chega e pede “um primeiro passo” nesse sentido, já nas próximas Europeias, que se realizam em junho de 2024. “Proponho, como primeiro passo, que o PSD escolha uma figura unânime no centro-direita para apoiar nas próximas eleições europeias… como Cecília Meireles, por exemplo”, diz.
Ele próprio “não está disponível” para ir nas listas do Chega, assegura.
‘Espinha na garganta’. A queda do governo de Santana Lopes
“Percebemos, hoje, passados estes 19 anos, que, em 2004, não aconteceu nada [que justificasse a dissolução da Assembleia da República e a queda do governo de Pedro Santana Lopes]. O Presidente Jorge Sampaio tentou tudo para que Pedro Santana Lopes não fosse indicado [como primeiro-ministro] (…) e, partir desse momento, estava ‘montado’ o cenário que levaria à dissolução [da Assembleia da República], bastando, para tal, arranjar uma primeira oportunidade…”.
Rui Gomes da Silva não esquece o ‘cartão vermelho’ dado por Jorge Sampaio ao governo de Pedro Santana Lopes do qual fazia parte. O ex-ministro afirma que “o que se passou nessa ocasião foi um golpe de estado constitucional de quem [Jorge Sampaio], querendo fazer as pazes com o seu partido (…), quis dar o poder ao Partido Socialista. Tudo isso foi feito para José Sócrates chegar ao poder”, sublinha.
De acordo com Rui Gomes da Silva, os casos protagonizados pelo atual governo de António Costa “são mais graves” [do que em 2004], mas refere que “continua a ser coerente” e que, por isso, considera que “o facto de um ministro ser irascível, arrogante, tudo aquilo que conhecemos de João Galamba (…), não coloca em causa o regular funcionamento das instituições”. “Pela experiência que tenho, acho que não há razões para a dissolução da Assembleia da República”, conclui.
Para ouvir em podcast: