Não há nenhum cenário em que o bastonário dos advogados conceda um recolher obrigatório ou proibições à circulação, sem que seja decretado o Estado de Emergência. “Isto não parece minimamente constitucional”, reage Luís Menezes Leitão às medidas anunciadas em Conselho de Ministros para a Área Metropolitana de Lisboa (ao fim-de-semana) e para os concelhos de risco elevado e muito elevado (todos os dias, a partir das 23:00).
Das duas uma – diz, em entrevista ao Irrevogável: “Ou o combate à pandemia justifica um Estado de Emergência e são tomadas medidas nesse sentido (e eu não nego que a situação seja séria) ou então não se justifica e não podem ser tomadas estas medidas”.
Na Lei de Bases da Proteção Civil e na Lei da Saúde Pública, evocadas pelo Executivo para justificar estas restrições, não encontra “nenhuma aplicação à situação” e alerta para o perigo do sucessivo desrespeito pelo texto constitucional criar um “precedente muito perigoso”, com “a Constituição a deixar de ser o fundamento do poder político”. “Corremos o risco de sair desta pandemia perdendo todos os nossos direitos, liberdades e garantias”, alerta.
Também não olha para a Comissão Técnica – criada pelo Governo com a presença da Provedoria de Justiça e a Procuradoria-Geral da República – para revisão do quadro jurídico em contexto pandémico com esperança. Preocupa-o ver nesta comissão duas entidades “que têm poder para fiscalizar a constitucionalidade das leis”. Ou seja, se estão a participar no debate, “quem suscitará as questões problemáticas em termos em termos constitucionais?”, pergunta o bastonário.
Na entrevista à VISÃO mostra-se também apreensivo com a falta de condições nos tribunais portugueses para cumprir as regras sanitárias e o consequente aumento dos casos de Covid dentro dos tribunais; afirmando que conhece situações de escritórios que tiveram de fechar portas por terem todos os advogados infetados.
“É preciso julgar nas quatro linhas e não nas claques”
Sobre a detenção recente do colecionador de arte Joe Berardo e do seu advogado, André Luiz Gomes, por burla qualificada, fraude fiscal e branqueamento de capitais, Luís Menezes Leitão mostrou-se receoso de que “estejamos a recorrer a detenções para interrogatórios em relação a pessoas que nem sequer vão ficar em prisão preventiva”. “Não havia motivo nenhum para que a pessoa não fosse notificada, em vez de passar três dias na prisão”, aponta.
E chama a atenção para a importância de salvaguardar sempre o direito de presunção de inocência: “é a mesma coisa que, num estádio de futebol, termos pessoas a apoiar uma equipa e no campo essa equipa sai flagrantemente derrotada. O que interessa é a decisão do próprio processo. O que se concretiza em julgamento”. Para concluir: “é preciso julgar nas quatro linhas e não nas claques”.
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