Chocada: é a palavra que melhor define o estado de espírito de Isabel Moreira quanto à ideia, entretanto abandonada, de obrigar toda a população a instalar a app StayAway Covid, diz a constitucionalista e deputada do PS ao Irrevogável, o programa de entrevistas políticas da VISÃO. “Chocou-me que um governo do Partido Socialista, do partido da liberdade, apresentasse uma proposta de lei que torna obrigatório o descarregamento de uma aplicação num dispositivo que podemos ou não ter, dependendo da nossa opção e da nossa capacidade financeira, o que gera desigualdade.”
Mais grave, acrescenta, “entrega a todo o tipo de polícia a possibilidade de fiscalização dessa obrigatoriedade, com coimas de 500 euros”. “É inadmissível num Estado de Direito a polícia sem mandado poder fiscalizar um cidadão. É inconstitucional. Implica uma intromissão na minha esfera privada absolutamente grotesca. No dia em que a polícia pudesse pedir-me o telemóvel sem mandado judicial, eu preferia ser arrastada pelas ruas. Não ia acontecer comigo de certeza.”
Apesar de considerar esta proposta “um erro político crasso”, Isabel Moreira não deixa de elogiar António Costa nestes tempos de Covid. “O primeiro-ministro tem sido excecional a lidar com a pandemia. Deve ser tenebroso ser-se primeiro-ministro num momento destes, e ao mesmo tempo de uma enorme dignidade e responsabilidade ter-se esse cargo. Não podíamos ter melhor primeiro-ministro à frente dos destinos do País nesta altura.”
Populismos de direita e de esquerda
Para as presidenciais, a deputada do PS decidiu apoiar João Ferreira, do PCP, “contra populismos”. “A corrupção vai ser um tema central nas presidenciais. Infelizmente está a crescer o discurso, falso, em Portugal segundo o qual somos um país extremamente corrupto, que a corrupção é o problema principal. Os factos não dizem isso. Esse discurso populista está na linha do crescimento de uma área política que quer destruir o melhor da democracia representativa.” O Partido Comunista, diz, “tem sido um tampão a movimentos inorgânicos inimigos da democracia”.
E Ana Gomes, do seu PS? “Não quero denegrir candidaturas à esquerda, mas por alguma razão não a apoiei. Em matéria de justiça e de luta contra a corrupção, considero que tem posições populistas e violadoras do Estado de Direito.”
Mas o seu adversário – não, inimigo – é a nova direita populista. “Essa direita quer o retrocesso, as trevas. Quer que as mulheres percam os seus direitos. Acha que ensinar a igualdade é uma ideologia. Fomenta o racismo. A extrema-direita é a minha inimiga principal neste momento.”
Quanto ao Orçamento do Estado, Isabel Moreira ataca o Bloco de Esquerda. “O PS esteve sempre de boa-fé e o BE foi apresentando propostas para ganhar palco. Neste momento, não há absolutamente nada que justifique o BE inviabilizar o Orçamento do Estado. O orçamento não retira uma única conquista social. Pelo contrário, avança em termos sociais.”
Apelidando o discurso de Catarina Martins de “desesperado”, a deputada faz um apelo ao BE: “Já não digo que vote a favor, mas que ao menos, para salvar a face, se abstenha.”
O seu discurso sem meias-palavras, e muitas vezes afrontando o próprio partido, tem dado a Isabel Moreira a aura de enfant terrible do PS, que ela assume, ainda que garanta não ser a única. “É verdade que sinto muita liberdade para dizer o que penso. Admito que há qualquer coisa nas minhas circunstâncias pessoais, familiares, e o facto de me dedicar a causas que geram muitas paixões, que levam a que eu seja apetecível em termos de opinião pública.”
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