“CHEGA alcança pela primeira vez 20% das intenções de voto”. É este o título da notícia do Folha Nacional, órgão de comunicação do Chega, publicada no dia 30 de novembro. No corpo do artigo, com pouco mais de 500 caracteres, diz-se que o partido “atingiria cerca de 20%”. Não se faz acompanhar de um gráfico, como é habitual nestes casos, e o resultado do Chega é o único em que se dá um resultado aproximado e não o exato. O PSD surge com 26,2% e o PS com 24,9%; “nesta sondagem da Aximage, com cerca de 6,9% de indecisos, a IL alcançaria os 5,6%, o Livre 4% e a CDU 3,4%”, lê-se ainda.
A Aximage depositou a sondagem na ERC, como obriga a lei, no dia 29 de novembro, mas a entidade reguladora não a tornou imediatamente pública no seu site, como é prática habitual, porque “a sondagem tem outros resultados cuja divulgação não foi identificada”, diz a ERC em resposta a perguntas da VISÃO, pelo que a sua divulgação só se deu hoje, 14 de dezembro, 15 dias mais tarde, cumprindo uma deliberação de 2009 sobre a “possibilidade de consulta pública das sondagens e estudos de opinião depositados na ERC”.
Consultando a sondagem, lê-se, então, que os “cerca de 20%” do Chega correspondem a 19,5% (uma subida de 1,43% face aos resultados nas últimas Legislativas). Numa publicação no X (ex-Twitter), o deputado Pedro Frazão já havia admitido um arredondamento para cima – prática singular, quando se divulgam sondagens, e que não foi seguida para os outros partidos (PS, por exemplo, ficaria com 25% e IL, com 6%).
Igualmente incomum é a publicação apenas parcial da sondagem, que foi muito além das intenções de voto nos partidos, em eventuais legislativas. Aliás, a primeira pergunta do inquérito é uma avaliação dos líderes partidários, mas nem o Folha Nacional nem os deputados André Ventura e Pedro Frazão (que fizeram publicações no X sobre os “20%” da intenção de voto) divulgaram esta parte, que revela que Ventura é, aos olhos dos portugueses, o líder com pior atuação nos 30 dias anteriores: 35% diz que o líder do Chega tem atuado “muito mal” e 24% “mal”, para uma apreciação negativa total de 59%; 23% avalia “bem” e 9% “muito bem”, para um total positivo de 32%. Os restantes não têm opinião.
Nesta avaliação, Luís Montenegro tem uma avaliação negativa de 37% e positiva de 52%; Pedro Nuno Santos, 50% negativa e 39% positiva; Nuno Melo, 45% negativa e 29% positiva; Rui Rocha, 39% negativa e 33% positiva. Os restantes líderes partidários não foram avaliados.
André Ventura surge em primeiro lugar nas respostas à pergunta “Do conjunto dos líderes partidários da oposição, qual aquele que teve a intervenção mais marcante, nos últimos trinta dias?”. No entanto, a julgar pelos resultados da avaliação dos líderes nos 30 dias anteriores, a maioria considera que foi marcante pela negativa. Pedro Nuno Santos, o segundo líder mais impopular, ficou também em segundo nesta pergunta.
Maioria acredita que a sua segurança e da sua família está “igual”
Numa questão sobre se o País está mais inseguro, 38% dos inquiridos responderam que estava “muito pior” e 23%, “pior”, 28% que está “igual”, 6%, melhor e 2%, muito melhor. A pergunta é enquadrada numa aparente sugestão de maior criminalidade: “No último mês foram noticiados sucessivos episódios de criminalidade, de violência urbana, especialmente na área metropolitana de Lisboa. Pensando em geral, diria que em matéria de segurança e de insegurança o país no seu conjunto está hoje:”.
Esta “perceção” de insegurança é mais baixa quando a sondagem aponta ao círculo próximo do inquirido. À pergunta “E pensando em si e na sua família diria que em matéria de segurança e de insegurança se sente hoje:”, 46% responde que está “igual”; 32% diz “pior” e 12% “muito pior”, ao passo que 7% diz “melhor” e 2%, “muito melhor”.
A grande maioria, contudo, defende que “as Forças de Segurança precisam de mais meios e de mais autoridade para o cumprimento das suas missões” (82%). A proposta do Chega de “reforçar a autoridade da polícia” conta com o apoio dos portugueses: 37% concorda e 25% concorda totalmente; 17% discorda e 14% discorda totalmente.
A sondagem revela ainda que 56% dos inquiridos defendem a demissão da ministra da Saúde, como exigido por PS, Chega e BE, na sequência das mortes ocorridas durante a greve do INEM.
Finalmente, quanto à “iniciativa do CHEGA de revisão constitucional para redução do número de deputados”, 37% concorda e 31% concorda totalmente, com 13% a discordar e 8% a discordar totalmente.
Este resultado não foi publicado pelo Folha Nacional, mas isso não impediu André Ventura e Pedro Frazão de usarem o dado para “demonstrar” que os portugueses concordam com o Chega quanto à redução do número de deputados, em publicações no X, com a publicação de uma imagem sem qualquer informação técnica da sondagem, além do nome da empresa responsável.
A não publicação da ficha técnica com os preceitos exigidos pela lei, aliás, já se tinha verificado na notícia publicada pelo Folha Nacional. O jornal escreveu apenas que “Esta sondagem consistiu em cerca de 800 entrevistas efetivas em todo o território nacional, tendo um erro máximo de 3,5%” (não foram “cerca de 800”, foram exatamente 800, e o erro máximo “é de + ou – 3,5%”, segundo a Aximage).
De acordo com a Lei nº 10/2000, “a publicação de sondagens de opinião em órgãos de comunicação social é sempre acompanhada das seguintes informações: a denominação da entidade responsável pela sua realização; a identificação do cliente; o objeto da sondagem de opinião; o universo alvo da sondagem de opinião; o número de pessoas inquiridas, sua repartição geográfica e composição; a taxa de resposta e indicação de eventuais enviesamentos que os não respondentes possam introduzir; a indicação da percentagem de pessoas inquiridas cuja resposta foi ‘não sabe/não responde’, bem como, no caso de sondagens que tenham por objeto intenções de voto, a percentagem de pessoas que declararam que se irão abster, sempre que se presuma que as mesmas sejam suscetíveis de alterar significativamente a interpretação dos resultados; sempre que seja efetuada a redistribuição dos indecisos, a descrição das hipóteses em que a mesma se baseia; a data ou datas em que tiveram lugar os trabalhos de recolha de informação; o método de amostragem utilizado e, no caso de amostras aleatórias, a taxa de resposta obtida; o método utilizado para a recolha de informação, qualquer que seja a sua natureza; as perguntas básicas formuladas; a margem de erro estatístico máximo associado a cada ventilação, assim como o nível de significância estatística das diferenças referentes aos principais resultados da sondagem.”
Desta longa lista de requisitos obrigatórios, o Folha Nacional só publicou o nome da empresa de sondagens, o número de inquiridos e a margem de erro.
A ERC, em resposta à VISÃO, diz que não recebeu nenhuma queixa sobre eventuais irregularidades na publicação deste inquérito, mas vai analisar o caso. “Relativamente à divulgação da sondagem identificada no pedido de informação (Folha Nacional, 30 de novembro de 2024), a ERC esclarece que não se identificam ao momento entradas de queixas, pelo que será a mesma apreciada pelos serviços da ERC, ao abrigo da Lei das Sondagens, no âmbito do acompanhamento regular efetuado à publicação de estudos de opinião.”