Pode ser pouco comum, mas a detenção de André Luiz Gomes – o polémico advogado de Joe Berardo – está longe de constituir um episódio inédito na Justiça portuguesa. Não faltam, aliás, exemplos de advogados enlaçados pelas malhas da lei, por práticas profissionais irregulares em nome próprio ou dos seus clientes. As suspeitas que recaem sobre André Luiz Gomes, que dirige o escritório Luiz Gomes & Associados, braço-direito jurídico de Joe Berardo há quase 30 anos, são apenas o caso mais recente.
Foi detido na passada terça-feira, no âmbito da megaoperação levada a cabo pelo Ministério Público (MP) e pela Polícia Judiciária que investiga os prejuízos de cerca de mil milhões de euros provocados à Caixa Geral de Depósitos, Novo Banco e BCP. A investigação acredita que André Luiz Gomes terá tido papel preponderante no esquema que permitiu a Joe Berardo obter estes empréstimos, e depois dissipar dinheiro e o património para escapar ao pagamento dos mesmos. É, por isso, um dos 11 arguidos do processo.
Lex: braço-direitos por linhas tortas
Os processos judiciais mais mediáticos em Portugal, nos últimos anos, têm contado, sem exceção, com advogados do lado improvável da história. São os casos de José Santos Martins e Jorge Barroso, figuras centrais do processo da Operação Lex, que tem como protagonistas, entre outros, o antigo juiz do Tribunal da Relação de Lisboa, Rui Rangel, e o presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira. José Santos Martins é apontado pela acusação como “testa-de-ferro” de Rangel, sendo-lhe imputada a prática dos crimes de corrupção passiva para ato ilícito, corrupção ativa para ato ilícito, abuso de poder, falsificação de documentos, fraude fiscal e branqueamento de capitais. Já o colega Jorge Barroso, advogado e assessor de Luís Filipe Vieira, está acusado neste processo de recebimento indevido de vantagem. Em causa, o facto de ter tentado obter informação privilegiada de um processo fiscal que envolvia a empresa do filho do presidente do Benfica.
Marquês: o amigo do amigo
A longa narrativa da Operação Marquês também não dispensa a presença de, pelo menos, um advogado como cabeça-de-cartaz. Gonçalo Trindade Ferreira, advogado de Carlos Santos Silva, o amigo de José Sócrates, tornou-se pedra basilar dos movimentos que, durante anos, a investigação acompanhou, e que levaram o ex-primeiro-ministro até ao banco dos réus. Gonçalo Trindade Ferreira foi acusado no processo de quatro crimes de branqueamento de capitais e falsificação de documento. Entre vários ilícitos, é-lhe atribuída a autoria de um contrato de arrendamento fictício do famoso apartamento de Paris, entre Santos Silva e José Sócrates, que, diz a acusação, pretendia comprovar que o apartamento localizado na capital francesa pertencia, de facto, a Santos Silva. Durante as buscas domiciliárias à casa do advogado, os investigadores da Operação Marquês descobriram 200 mil euros guardados num cofre, quantia que Gonçalo Trindade Ferreira sempre garantiu pertencer a Santos Silva
E-Toupeira: o advogado encarnado
O processo E-Toupeira tem, entre outras coisas, abalado os pilares da Justiça, colocando em perspetiva a fragilidade das instituições (e das pessoas que nelas colaboram). O advogado Paulo Gonçalves é, neste caso, a figura central. O arguido é acusado pelos crimes de corrupção ativa e violação de segredo de justiça, e, neste caso, até viu o cliente (a SAD do Benfica) escapar das acusações que lhe eram imputadas. Segundo a acusação do MP (confirmada pelo Tribunal de Instrução e pela Relação), Paulo Gonçalves terá corrompido o oficial de justiça José Augusto Silva. O advogado teria oferecido bilhetes para jogos do Benfica a troco de informações em segredo de Justiça sobre processos judiciais que envolviam o clube e os seus rivais.
O nome de André Luiz Gomes entra agora na lista. O advogado de Joe Berardo foi ouvido na terça-feira pelo juiz Carlos Alexandre, e está a dormir nos calabouços da PJ. Joe Berardo terá a oportunidade de ser ouvido pelo magistrado amanhã. O facto das acusações se terem dado no âmbito da sua atividade profissional coloca-o também na mira da Ordem dos Advogados – que deverá abrir, em breve, um inquérito de averiguações ao caso, como já adiantou a VISÃO.