“Devo dizer que a Guiné-Bissau, neste momento, passa por uma crise jamais vista. Nunca o país viveu uma situação tão complicada”, afirmou Rui Landim.
Seis meses depois da realização da segunda volta das presidenciais, em 29 de dezembro, ganhas por Umaro Sissoco Embaló num processo envolto em polémica, que culminou com a sua autoproclamação como Presidente em fevereiro e o seu reconhecimento pela comunidade internacional em abril, Rui Landim lembra que ainda está em curso um processo de contencioso eleitoral.
“É preciso que seja concluído o contencioso eleitoral para se passar à fase de validação, anotação pela suprema corte, a instância judicial máxima da Guiné-Bissau, que tem uma palavra a dizer”, afirmou Rui Landim, referindo-se ao Supremo Tribunal de Justiça.
Para o analista, Umaro Sissoco Embaló chegou à Presidência sem o cumprimento de “preceitos constitucionais que devem ser respeitados e observados”.
“É preciso dizer ainda que depois da tal autoproclamação, o Governo legítimo, constitucional, foi derrubado e para concretizar o derrube fez uso de homens armados, que tal como assaltaram o Palácio da República, assaltaram o Palácio do Governo, o Palácio da Justiça e fizeram cerco à Assembleia Nacional Popular”, afirmou.
A Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau declarou Umaro Sissoco Embaló vencedor das presidenciais do país, mas o resultado foi contestado pelo outro candidato, Domingos Simões Pereira, que considerou que houve irregularidades no processo e apresentou um recurso de contencioso eleitoral no Supremo Tribunal de Justiça, que até hoje não foi concluído.
Em fevereiro, Umaro Sissoco Embaló autoproclamou-se Presidente da Guiné-Bissau e demitiu o Governo do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), liderado por Aristides Gomes, nomeando um outro, constituído pelas forças políticas e movimento que apoiaram a sua eleição.
Em abril, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) reconheceu Umaro Sissoco Embaló como Presidente da Guiné-Bissau, bem como os restantes parceiros internacionais do país, incluindo União Europeia, União Africana, Nações Unidas e Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa.
“Estamos a viver um clima de golpe de Estado em curso, golpe de Estado por etapas e por isso não se pode encontrar uma solução. Não há condições para o diálogo”, afirmou Rui Landim.
Apesar do reconhecimento dos resultados eleitorais, a comunidade internacional insistiu na formação, até 22 de maio, de um Governo que respeitasse os resultados eleitorais das legislativas de março, ganhas pelo PAIGC, o que não aconteceu.
“Estamos a assistir a raptos de cidadãos, a ameaças de morte de cidadãos, para não dizer de deputados, raptos de deputados”, disse, recordando o sequestro e espancamento de um deputado que se mantém fiel a um acordo com o PAIGC, apesar de o seu partido político agora apoiar outra fação política.
Para Rui Landim, está a assistir-se a um “cortejo de abusos de poder”, a um “festival de repressão” como “nunca se viveu na Guiné-Bissau”.
“Creio que todos os guineenses sentem esta situação, ninguém tem segurança, todos são vulneráveis, porque estamos a falar de repressão com uso de homens armados, que a qualquer momento assaltam”, disse.
Salientando que há uma “deriva totalitária e autoritária” e que os “mais elementares direitos dos cidadãos estão a ser espezinhados impunemente”, Rui Landim prevê “consequências imprevisíveis”.
“A situação tende a piorar, porque os novos senhores do poder querem impor-se a todo o custo, mesmo que tenham de sacrificar vidas humanas com a cumplicidade da comunidade internacional”, concluiu.
Numa crise sem fim à vista, o parlamento da Guiné-Bissau vai reunir a plenária a partir de segunda-feira para definir que partido asseguram a maioria parlamentar, reivindicada pelo bloco que apoia o Presidente guineense e pelo bloco liderado pelo PAIGC.
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