Se hoje o telefone de José Vieira da Silva tocasse e do outro lado António Costa lhe dissesse: “para o próximo Conselho de Ministros quero que tragas um decreto-lei para aprovarmos o direito a desligar”, o ministro do Trabalho não tem dúvidas de qual seria a sua resposta. “Pedia adiamento”, avançou em tom de brincadeira Vieira da Silva no encerramento das comemorações do centenário do Ministério do Trabalho, Solidaridade e Segurança Social.
E o que é isto do direito a desligar? Em França está consagrado na lei desde 1 de janeiro e basicamente é a fixação de que os trabalhadores têm o direito a não atender chamadas, responder a emails ou mensagens enquanto estão fora do seu horário de trabalho, seja à noite ou de férias.
Este direito a desligar ganha força numa altura em que, como lembrou o ministro – durante uma conversa/entrevista com o diretor do Público David Dinis, que marcou o encerramento do centenário – a “conetividade veio transformar a produtividade global da economia de forma muito pesada”.
Vivemos um tempo em que, em grande parte das profissões, o estar permanentemente ligado em rede faz com que se trabalhe fora de horas, se atenda telefonemas durante as férias, se responda a um email de madrugada.
Mas como lembrou Vieira da Silva, o facto de hoje ser possível resolver “remotamente um problema que surgiu quando já não estávamos a trabalhar ou quando estamos fora” é algo que deve ser olhado como uma vantagem.
E não tem dúvidas de que este direito a desligar será a breve prazo “um direito de cidadania”. “Eu sou favorável a uma reflexão profunda que se oriente no sentido da regulação dessa liberdade”, diz alertando para a necessidade de se definir normas “com a tal perspetiva da flexibilidade, de não se transformar em regras de tal forma rígidas que se venham a perder as vantagens”.
Numa conversa descontraída, que durou mais de uma hora, o ministro do Trabalho teve também tempo para deixar as suas dúvidas sobre a ideia de um rendimento básico incondicional. Para Vieira da Silva esta pode ser a “resposta à robotização”, mas tem “sentimentos cruzados” sobre esta matéria e aponta “mais riscos do que vantagens”. Porque para ele “o trabalho continua a ser a forma mais democrática para se garantir o acesso a bens”, Vieira da Silva assume que esta ideia de uma prestação atribuída a cada cidadão como condição base, sem outro critério, é “uma ideia perturbadora”. E é por isso que “fratura dentro das próprias famílias políticas”, com defensores na direita e na esquerda e críticos em ambos os lados também.