A China está a cometer uma “grave violação dos Direitos Humanos” ao expandir a todo o Tibete uma campanha de recolha de ADN, incluindo amostras de crianças, apontou hoje a organização Human Rights Watch (HRW).
O relatório, que se baseia em informações publicadas pela imprensa chinesa e em documentos governamentais, indicou que a campanha reuniu já amostras genéticas de pelo menos meio milhão de pessoas, em apenas um município do Tibete.
As autoridades começaram a recolher ADN em massa em julho de 2019.
“A recolha do ADN de cada residente em localidades no Tibete é significativa não apenas em termos de preocupações sobre consentimento ou privacidade, mas representa também mais um avanço na gestão precisa da população pelo governo”, lê-se no relatório.
“Não há evidências publicamente disponíveis a sugerir que as pessoas podem recusar participar [na campanha] ou que a polícia tem provas credíveis de conduta criminosa que justifique a recolha dos dados”, frisou a HRW.
As autoridades chinesas defenderam a campanha como uma ferramenta de combate ao crime, mas a organização de defesa dos Direitos Humanos alegou que constitui uma ameaça aos direitos de privacidade individual.
“A justificação das autoridades não parece constituir um propósito legítimo e proporcional que atenda ao melhor interesse das crianças”, disse o relatório.
Em meados de 2019, o departamento de segurança pública tibetano lançou um concurso público para a construção de um banco de dados de ADN a nível regional.
A HRW identificou sete municípios da região, inclusive na parte oeste do Tibete, onde a campanha está a decorrer.
De acordo com um artigo publicado pela imprensa estatal em maio de 2019, o departamento de segurança pública da cidade tibetana de Chamdo iniciou uma campanha de um ano para recolher impressões digitais e amostras de sangue dos moradores, para armazenagem num banco de dados da polícia, visando “ajudar as autoridades a capturar fugitivos”.
O relatório da HRW disse que foram reunidas amostras de pelo menos meio milhão de pessoas no município.
O documento identificou vários artigos que mencionaram a recolha de dados de crianças de até 5 anos de idade. Um artigo publicado em abril indicou que a polícia recolheu amostras de sangue de crianças num jardim-de-infância da vila de Nimu.
A imprensa oficial chinesa descreveu a campanha de recolha de ADN como uma forma de “fortalecer o sistema de governação social de base”.
Não é a primeira vez que há informação sobre a recolha de dados biométricos de tibetanos. A unidade de investigação Australian Strategic Policy Institute revelou, em 2020, que as autoridades chinesas ofereceram exames físicos gratuitos com o propósito de recolher sangue, em 2013, e que expandiram o programa para o resto do país em 2017.
Com cerca de três milhões de habitantes, o Tibete é uma das regiões chinesas mais vulneráveis ao separatismo, com os locais a argumentarem que o território foi durante muito tempo independente até à sua ocupação pelas tropas chinesas em 1951.
Pequim considera que a região, que tem uma área equivalente ao dobro da Península Ibérica é, desde há séculos, parte do território chinês.
A China proíbe diplomatas e jornalistas estrangeiros de entrarem na região, exceto em visitas organizadas pelas autoridades ou pelo departamento de propaganda do Partido Comunista Chinês.
Os turistas estrangeiros que visitam o Tibete têm de fazê-lo em grupo e acompanhados por um guia.
Desde 2008, quando vários protestos contra o Governo chinês abalaram a região, as autoridades chinesas têm reforçado as políticas repressivas, visando reduzir a influência do líder político e espiritual dos tibetanos, o Dalai Lama, que Pequim acusa de ter “uma postura separatista”, e que vive exilado na vizinha Índia, na sequência de uma frustrada rebelião contra a administração chinesa, em 1959.
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