Quando Donald Trump visitou Louisiana, no início do mês passado, foi recebido com uma surpresa inesperada. Naquela manhã, Billy Nungesser, vice-governador do estado, vestira-se a pensar na chegada do Comandante-em-chefe. Assim, com o presidente e as câmaras noticiosas como testemunhas, e ainda no aeroporto, Nungesser levantou alegremente a perna da calça para revelar um par de meias: cada tornozelo tinha o rosto de Trump, com um tufo de falsos cabelos loiros ondulando na brisa. Num ápice, aquelas meias bizarras tornaram-se virais e foram cobertas por um punhado de notícias. O caso foi obviamente aproveitado por Stephen Colbert, que não perdeu a oportunidade de o mencionar no The Late Show.
Para Erica Easley, toda a atenção vale a pena, pelo menos ao início. Easley é a fundadora da Gumball Poodle, uma pequena empresa sediada em Los Angeles que se lembrou daquele design cabeludo durante as últimas eleições.
“Aquele desenho tornou-se realmente viral, muito mais do que qualquer coisa que tenhamos experimentado antes”, disse, sobre os efeitos da foto de Nungesser. Os pedidos de encomenda começaram a disparar e, num instante, as meias Trump estavam na lista de best-sellers da Amazon para meias masculinas.
Passou mais ou menos uma semana antes que a responsável da Gumball Poodle notasse que algo estava errado. Dezenas de revendedores, a maioria dos quais parecia ser chinês, tinham ripostado com o que parecia ser uma imitação, vendida por uma fração do preço original de 30 dólares (qualquer coisa como 26 euros, valor que incluía ainda um pente minúsculo, para pentear o cabelo das meias – e tudo feito nos EUA).
A piorar o cenário, a Amazon escolhera uma das meias fradulentas como padrão, tirando a Gumball Poodle de cena. Enquanto isso, outros revendedores sacaram as fotos de Easley e fizera as suas próprias listas das mais vendidas, tudo muito mais barato.
É verdade que Easley fizera de tudo para proteger o seu negócio exatamente daquele tipo de ataque. O design fora patenteado nos EUA e o logótipo, que está gravado na parte inferior das meias, é uma marca registada.
Além disso, a Gumball Poodle está inscrita no registo de marcas da Amazon, ferramenta que a empresa fornece às marcas para proteger sua propriedade intelectual. Mas Easley descobriu rapidamente que as proteções da Amazon não eram suficientes, e acusou-a de ignorar sistematicamente os pedidos de ajuda – só removeu as falsificações depois de a Wired, que conta a história, denunciar o caso.
“A Amazon proíbe estritamente a venda de produtos falsificados e investimos fortemente em fundos e energia da empresa para garantir que nossa política seja seguida”, disse então Maxine Tagay, porta-voz da Amazon, em comunicado.
Falso, mas não pouco
A Gumball Poodle não está sozinha. “Há milhares de outros proprietários de marcas que enfrentam o mesmo tipo de ataque diariamente”, diz James Thomson, ex-funcionário da Amazon e sócio da Buy Box Experts, uma empresa que presta consultoria a vendedores da Amazon, apontando-lhe o dedo: “A Amazon tem de facto um problema com falsificações.”
A falsificação é uma indústria em expansão de milhões de milhões de dólares e custa às empresas em todo o mundo outros milhares de milhões, por ano. O seu crescimento foi impulsionado pela ascensão do comércio eletrónico, que um relatório do governo realçou ter levado a uma mudança fundamental no mercado de produtos falsificados.
Esse relatório, publicado no ano passado pelo gabinente de contas do governo, descobriu que o volume e a variedade dos produtos falsificados apreendidos pelos funcionários cresceram ano após ano, e é cada vez mais difícil distinguir as imitações das reais. Também observa que mercadorias fraudulentas são vendidas em diversas plataformas de comércio eletrónico.
Perante isto, a administração Trump sinalizou que quer levar a questão mais a sério. Em abril, o presidente pediu aos departamentos de Justiça, Comércio e Segurança Interna que recomendassem possíveis correções regulatórias e legislativas para lidar com falsificações em mercados de terceiros.
Mas, na Amazon, as falsificações podem ser devastadoras, em parte devido à grande escala do site. Metade de todas as vendas de comércio eletrónico dos EUA é da Amazon, e o site também é onde cerca de metade de todas as pesquisas de produtos na web começam. Não são muitas as empresas que podem evitá-lo. E se se afastarem, ainda correm o risco de deixar outros vendedores conseguirem mais relevância para as suas marcas.
Outro problema é a forma como a Amazon é projetada. Ao contrário do eBay, Etsy e de outros mercados online, uma única listagem de produtos da Amazon pode apresentar ofertas de dezenas de vendedores independentes. A empresa usa um algoritmo para decidir quais as mercadorias que devem ser o padrão, com base em fatores como preço e velocidade de envio. Ganhar essa distinção, conhecida como “Buy Box”, dá aos vendedores uma enorme vantagem. Os clientes podem “adicionar ao carrinho” ou “comprar agora” seus produtos com um único clique, enquanto os outros ficam ocultos atrás de um menu suspenso. A ideia é permitir que os consumidores façam uma compra rapidamente, sem precisar peneirar todas as opções similares. Mas o sistema, dizem os especialistas, também facilita a infiltração de falsificações nas mãos dos consumidores.
Durante anos, fabricantes de todos os tipos de produtos, desde alças de elevação de móveis e sandálias hippies a cabos eletrónicos e almofadas de crianças, reclamaram publicamente sobre versões falsificadas dos seus produtos na Amazon. Alguns tentaram encontrar uma solução na lei. Por exemplo, há três anos a Apple processou um parceiro da Amazon por causa de falsos cabos de carregamento de iPhone e outros itens falsificados. Mas, na barra do tribunal, alguns juízes já decidiram que a Amazon não é responsável pelas falsificações vendidas na sua plataforma, argumentando que não é a vendedora.