A vida do Condestável é uma “prova de que, em qualquer situação, mesmo de carácter militar e bélica, é possível actual e realizar os valores e princípios da vida cristã”, afirmou bento XVI na homilia das cerimónias perante os milhares de peregrinos reunidos na Praça de São Pedro, muitos dos quais portugueses.
A parte do discurso proferida em português e dedicada ao novo São Nuno, Bento XVI recordou que durante a sua vida, Portugal veio a “consolidar a sua independência de Castela e estender-se depois pelos oceanos”, permitindo a “chegada do Evangelho de Cristo até aos confins da terra”.
“São Nuno sente-se instrumento deste desígnio superior” e assumindo o “serviço de testemunho que cada cristão é chamado a dar no mundo”, optou por uma “intensa vida de oração e absoluta confiança no auxílio divino”, salientou o Papa. Por isso, “embora fosse um óptimo militar e um grande chefe, nunca deixou os dotes pessoais” sobreporem-se à fé, “imitando Nossa Senhora de quem era devotíssimo e a quem atribuía publicamente as suas vitórias”, explicou Bento XVI, recordando que o Condestável, no fim da sua vida, se retirou para “o convento do Carmo por ele mandado construir”. Nesse sentido, “sinto-me feliz por apontar à Igreja inteira esta figura exemplar”, resumiu o Papa durante as cerimónias que religiosas, onde marcou presença vários portugueses, entre os quais o ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, e o chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, Valença Pinto. Durante as cerimónias, a mulher cuja cura do olho sustenta o milagre que permite o processo canónico, foi chamada para levar um dos símbolos de D. Nuno (a imagem, velas ou flores) que irão representar o Condestável, acompanhada do seu filho, Carlos Evaristo, e do presidente da Fundação da Batalha de Aljubarrota, Alexandre Patrício Gouveia. Nas cerimónias, concelebraram com Bento XVI e vários elementos da cúria romana, os cardeais Saraiva Martins e José Policarpo, o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. Jorge Ortiga, e os bispos José Alves (Évora), Antonino Dias (Portalegre), Vitalino Dantas (carmelita de Beja), o superior geral da Ordem do Carmo em Portugal, frei Agostinho Castro, além de outros sacerdotes. No guião da cerimónia, a Santa Sé classifica o Condestável como o “homem mais rico de Portugal” do seu tempo que “por amor de Deus fez-se pobre, inteiramente pobre” e “distribuiu todos os seus bens pela Igreja, pelos pobres, pela família e pelos antigos companheiros de armas”. “Só por ordem do rei é que deixou de andar pelas ruas a pedir esmola para os pobres” e “do que o rei lhe mandava para seu sustento, distribuía tudo o que podia pelos pobres, socorrendo e assistindo na agonia aos moribundos”, refere ainda o guião. Dos cinco novos santos, o Condestável é o único não italiano e também aquele que não está directamente relacionado com a fundação de uma instituição religiosa, embora a promoção da sua Causa tenha sido assumida pela Ordem do Carmo. Juntamente com o Beato Nuno, serão canonizados o sacerdote Arcangelo Tadini (fundador da Congregação das Operárias da Santa Casa de Nazaré), o abade Bernardo Tolomei (Congregação de Santa Maria do Monte Oliveto da Ordem de São Benito), Gertrude Comensoli (Instituto das Religiosas do Santíssimo Sacramento) e Caterina Volpicelli (Congregação das Servas do Sagrado Coração). Cavaco Silva “orgulhoso” com canonização O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, manifesta-se orgulhoso pela canonização, considerando o “forte Dom Nuno” como um exemplo para todos, em particular, para as Forças Armadas portuguesas. “O ‘forte Dom Nuno’, como lhe chamou Camões, é um exemplo para todos nós e, muito em particular, para as nossas Forças Armadas”, afirma o chefe de Estado, numa mensagem vídeo colocada na página da Internet da Presidência da República. Sublinhando o seu orgulho pela canonização de Nuno Álvares Pereira, “pelo que ela representa de reconhecimento do valor exemplar de um português heróico e ilustre”, Cavaco Silva diz ser hoje “um dia de alegria para todos os portugueses”. “A canonização de Nuno Álvares Pereira constitui um gesto que honra uma das figuras mais marcantes da nossa História, uma figura em que os Portugueses se revêem como símbolo de amor ao seu País, de defesa corajosa da independência nacional, de vontade de triunfar mesmo nas horas mais difíceis”, declara o Presidente da República. Na mensagem, Cavaco Silva recorda Nuno Álvares Pereira como um português que soube ser humilde, “o que o levou a retirar-se do gozo das grandezas mundanas em nome da fé que possuía”. Lembrando o seu epitáfio “As suas honras terrenas foram incontáveis, mas voltou-lhes as costas. Foi um grande Príncipe, mas fez-se humilde monge”, o chefe de Estado assinala que, de facto, Nuno Álvares Pereira “soube voltar as costas às honras terrenas que conquistara através de feitos heróicos”. “Mas não voltou as costas ao seu amor por Portugal, pois foi em nome desse amor que o Condestável comandou tropas em defesa da independência de uma nação ameaçada”, sublinha, manifestando-se certo que a canonização de Nuno Álvares Pereira ficará inscrito “na nossa memória colectiva e será motivo de orgulho e de alegria para todos os que amam o nosso País e a sua história”. “É um santo e um herói”, diz Paulo Portas Paulo Portas, que se encontra em Roma para participar nas cerimónias da canonização, afirmou que D. Nuno Álvares Pereira tem uma “dimensão religiosa” devido à sua fé, mas também “uma dimensão ética que é também contemporânea”, numa referencia à circunstância de o Condestável se ter despojado de “todas as honrarias” ainda em vida. Na opinião do líder centrista, na figura do Condestável “há também uma dimensão de patriotismo, até porque foi general do exército” português “pelo qual obteve vitórias essenciais para a independência nacional”. Por isso, salientou, “é um santo e um herói”. “Como eu acho que o patriotismo não é um valor em desuso na actualidade, estou aqui porque gosto e porque tenho muito empenho”, acrescentou. A vida do Santo Condestável Nascido a 24 de Junho de 1360, em Cernache do Bonjardim, D. Nuno foi chefe militar e, como Condestável do reino, foi determinante para a consolidação e futuro de Portugal, nomeadamente na crise de 1383-1385, aquando da luta pela independência contra Castela. Após a morte da mulher, e mais tarde, da filha, resolve em 1423 doar todos os bens aos pobres e recolher-se ao Convento de Nossa Senhora do Vencimento do Monte do Carmo, em Lisboa, que ele próprio mandara construir e onde morreria em 01 de Abril de 1431. Os seus restos mortais encontram-se na Igreja do Santo Condestável, em Lisboa, desde 1951, depois de terem sido trasladados por oito vezes. D. Nuno Álvares Pereira foi beatificado em 23 de Janeiro de 1918 pelo Papa Bento XV, que o declarou patrono das tropas em batalha. A sua canonização pelo Papa Bento XVI, hoje no Vaticano, culmina um processo reaberto em 2004 pelo Patriarcado de Lisboa, com base na cura considerada miraculosa da córnea de uma idosa que, em 2000, sofreu queimaduras com óleo a ferver.