Há quem lhes chame “o petróleo da era tecnológica”. A procura mundial por “terras raras”, ou metais raros, tem vindo a crescer de forma exponencial, tendo atingido os 7 mil milhões de euros em 2021. Segundo o Rare Earths Metals Market Outlook, divulgado esta semana, este é um negócio que irá crescer a um ritmo de 9,1% ao ano até 2030, altura em que atingirá 15 mil milhões de euros.
O mesmo estudo refere que a Europa será, dentro de alguns anos, o segundo maior mercado destes minérios – logo a seguir à região da Ásia/Pacífico – devido aos dois grandes depósitos que foram encontrados recentemente na Suécia e na Noruega.
Há cerca de três semanas, a empresa mineira sueca LKAB descobriu a maior reserva de minérios raros da Europa. As primeiras previsões apontam para um depósito com cerca mais de mil milhões de toneladas destes metais. Esta semana, as autoridades norueguesas divulgaram ter encontrado uma concentração “substancial” de minérios no fundo do mar do Norte, que vão desde o cobre ao magnésio, e, também, uma grande quantidade de metais raros.
Ultimamente, estes metais têm vindo a conhecer uma procura cada vez maior, pois são essenciais para o fabrico de muitos aparelhos e tecnologias usadas nos dias de hoje, como os lasers, as baterias dos carros elétricos, os microprocessadores, os magnetos potentes usados nos aparelhos médicos, nas torres eólicas para produção de energia verde, entre muitos outros.
Devido à importância que têm para as novas tecnologias e para a transição energética, os metais raros estão a tornar-se uma das frentes de batalha da geopolítica mundial. O crescimento exponencial do lado da procura irá criar problemas graves na cadeia de abastecimento, tal como já tem vindo a acontecer ao longo dos últimos anos, e gerar tensões geopolíticas cada vez maiores. Tal como definiu a LKAB, logo após a descoberta na Suécia, “grande dependência da China para o abastecimento destes minérios aumenta a vulnerabilidade da indústria europeia”.
Desde os anos 90, a China conseguiu criar quase um monopólio mundial destes minérios. Atualmente, 98% dos metais raros usados na Europa e 79% dos utilizados nos EUA são importados deste país asiático. A China que tem cerca de um terço das reservas conhecidas, quase todas concentradas na região de Xinjiang e na Mongólia, mas controla mais de 85% da sua refinação a nível mundial.
Ao longo dos anos foram feitas várias tentativas para combater a supremacia chinesa deste mercado, sobretudo pelos EUA, cujo departamento da Defesa se manteve muito próximo e interessado na descoberta feita no Brasil, em 2011, de vários depósitos destes minerais na Serra dos Carajás, sudeste do Pará, pela empresa Vale (antiga Vale do Rio Doce). Mais tarde, o governo norte-americano financiou a Rio Tinto, uma empresa concorrente da Vale, na prospeção destes metais. No entanto, os jazigos encontrados nunca tiveram uma produção suficiente para poder competir com os chineses. Tem também vindo a financiar várias pesquisas na Austrália, um dos maiores produtores mundiais destes minérios.
Muitos governos, como o dos EUA, estão dispostos a financiar este processo para acelerar a sua “independência” dos metais raros chineses. A administração de Joe Biden tem vindo a disponibilizar fundos avultados para investigação e pesquisa de novas reservas destes minérios de forma a tornar os EUA um dos principais países no comércio de metais raros.
No início do ano passado, o presidente norte-americano veio a público reafirmar que deu ordens para que o seu governo “identifique e resolva” possíveis falhas nas cadeias de abastecimento, para que não haja escassez de “itens críticos” que possam, por um lado tornar a indústria mais vulnerável às tensões geopolíticas, entre os quais os metais raros.
“Não podemos andar atrás do problema. Precisamos evitar que haja interrupções nas cadeias de abastecimento”, disse Joe Biden na Casa Branca após ter assinado o documento, acrescentando que “construir resiliência significa aumentar a nossa produção de certos tipos de produtos na nossa casa ou trabalharmos mais perto dos nossos parceiros de confiança, países que partilham os nossos valores, de forma a que a nossa cadeia de abastecimento não possam ser usadas como armas contra nós”.
Com a descoberta destes dois importantes depósitos na Escandinávia, os poderes deste mercado poderão começar a mudar. A quantidade encontrada na Suécia é suficiente para abastecer o mercado mundial, mas ainda não existe capacidade de refinação para o fazer. Além disso, as leis europeias são muito apertadas em relação à extração de minérios, tal como reconheceu o CEO da LKAB, Jan Moström, que apelou para que os rigorosos processos de permissão para mineração na União Europeia possam ser acelerados para que a empresa traga estes materiais mais rapidamente para o mercado. “Se realmente queremos prosseguir com a transição verde, devemos encontrar maneiras de acelerar esse processo de forma bastante substancial”, justificou. Também na Noruega já se começaram a levantar preocupações ambientais por a mineração ser feita no fundo do Oceano, mais propriamente na região. Alguns grupos ambientalistas já vieram pedir para que a exploração seja adiada até que mais estudos sejam realizados de forma a entender qual o impacto que a mineração poderá afetar os organismos que vivem no fundo do mar. Existe “uma grande falta de conhecimento” sobre oceanos profundos, onde espécies novas e desconhecidas podem ser encontradas, disse o Instituto de Pesquisa Marinha da Noruega.
Este é um processo muito longo, como reconheceu o CEO da LKAB: “Se olharmos para outros projetos semelhantes de licenciamento, levaremos pelo menos dez a 15 anos até que possamos realmente começar a retirar os minérios e a fornecer as matérias-primas ao mercado”.
Começaram por ser chamados de terras raras, mas, atualmente são mais conhecidos por óxidos ou metais raros. Ao todo são 17 elementos químicos, dos quais 15 pertencem, na tabela periódica, ao grupo dos lantanídeos. Foram identificados e isolados pela primeira vez em 1787, na região sueca de Ytterby, perto de Estocolmo, pelo mineralogista Carl Arrhenius, sob a forma de óxidos, o que lhes deu, na altura, a designação de terras. E foram considerados raros, porque apenas eram encontrados na Escandinávia. Hoje em dia sabe-se que, com exceção do lantânio, são elementos bastante abundantes na crosta terrestre. O cério, por exemplo, é o 25º elemento que mais se encontra na superfície do planeta, com 68 partes por milhão. O túlio, aquele que é um dos mais raros entre os 17, existe em maior quantidade que a prata ou o mercúrio. No entanto, devido à sua difícil extração, continuam a chamar-se raros. Em 2021, de todos os metais extraídos do planeta, apenas 0,09% eram metais raros.