O projeto vai ser liderado por Alexandre Vaz. Com formação em Engenharia e Gestão Industrial pelo Instituto Superior Técnico, e com um MBA da Universidade Nova de Lisboa, já exerceu funções de consultor na Boston Consulting Group e de diretor senior na Oracle. Em janeiro de 2014 assumiu o cargo de diretor executivo na Liquid Data Intelligence, tendo integrado ainda o conselho consultivo da CIONET .
Em entrevista à VISÃO, refere que a Mercedes pretende ser mais do que uma fabricante de automóveis e assumir-se como uma marca líder em serviços de mobilidade.
Porque escolheram Lisboa?
Lisboa esteve em competição com outras cidades europeias, nomeadamente com Barcelona e com Londres. A escolha prendeu-se com vários fatores, sendo o mais importante a disponibilidade e a qualidade dos nossos programadores e engenheiros, além de termos boas escolas de engenharia pelo país.
Paralelamente, Lisboa está neste momento a viver um “boom” de tecnologia e inovação, quer através das “startups”, quer através da Web Summit, o que atrai pessoas, sejam portugueses que estejam no estrangeiro que queiram voltar, ou mesmo estrangeiros que queiram viver em Portugal. Obviamente, o facto de ter uma localização fantástica ajuda, pois estamos ligados em todo o lado.
O facto dos salários em Portugal serem mais baixos não pesou na decisão?
Nunca. Os argumentos discutidos foram os que referi, mantendo sempre como fator crucial a qualidade dos portugueses. Se fossemos pelos salários, teríamos optado por concentrar a atividade num país da Europa de Leste, onde a mão-de-obra é tradicionalmente mais barata.
O centro de competências é o único ponto onde a Mercedes vai desenvolver as soluções digitais, ou vai trabalhar em parceria com outros “hubs”?
Existem algumas equipas em todo o mundo, mas a ideia é este centro ser o principal. Vamos começar a trazer competências e diversas áreas para Lisboa, para podermos crescer a partir daí. Teremos de estar coordenados com essas pequenas equipas, mas para já a ideia é que este seja o principal “hub” de tudo o que é digital, tanto para a Mercedes como para a Daimler.
Têm prevista a contratação de cerca de 120 pessoas até ao final de 2018…
Exato. Começámos a recrutar e as primeiras pessoas estão a entrar neste momento. Queremos rapidamente ter connosco 120 pessoas, quem sabe mais nos próximos anos.
Que características procuram nos novos funcionários?
A ideia é contratar sobretudo pessoas da área da programação. Queremos pessoas que tenham capacidade e gosto para aprender, que tenham flexibilidade e gosto por enfrentar um desafio destes, que é transformar uma empresa de automóvel tradicional na nova geração do que terá que ser a indústria automóvel e da mobilidade. Procuramos pessoas que se interessem por tudo o que há de mais inovador no mundo e que queiram embarcar nesta aventura.
Em Portugal há mão-de-obra especializada para este projeto?
Sem dúvida. Isso nunca será um problema. No início, as pessoas terão de passar algum tempo em Estugarda para conhecerem a casa, mas a partir daí queremos ser independentes e começar a formação em Lisboa. O primeiro passo passa pela criação do “One Web”, um website único para todos os países onde a Mercedes está presente…
Acreditamos que todos os sites da Mercedes a nível mundial têm de ser repensados. O projeto “One Web” pretende fazer isso, dar um novo visual e novas funcionalidades a todos os sites da Mercedes. Hoje em dia, a maneira como compramos um carro já não é como há uns anos. Antigamente, as pessoas iam umas cinco a seis vezes a um “stand” antes de comprar, hoje vão uma, uma e meia.
Todo o processo de decisão está muito concentrado online, então a ideia é dar a melhor experiência possível a qualquer interessado num carro da Mercedes, desde procurar o carro a configurá-lo. Existem muitos serviços que se podem mostrar e oferecer aos consumidores e a ideia é refazer todos os sites, para termos uma oferta integrada e consistente em todos os países.
É nesse projeto que a Mercedes vai concentrar as suas atenções nesta primeira fase?
A ideia é começarmos por aí, depois queremos explorar outras ideias. Quando falamos em desenvolvimento digital, neste caso estamos a falar em todas as plataformas que estão à volta do carro e isso passa pelos websites da Mercedes. Pode passar também pelas aplicações móveis como a “Mercedes Me”, ou seja, tudo o que ajude um (potencial) cliente.
O segundo objetivo passa precisamente por desenvolver as funcionalidades da “Mercedes Me”. Hoje em dia o telefone está sempre connosco. O que a “Mercedes Me” faz agora é fornecer-nos informações sobre o carro, permitir abrir as portas à distância e ainda estacioná-lo.
Depois há muitas coisas que queremos fazer que já estão a ser discutidas, mas ainda não podemos revelar. Mas o objetivo passa por transformar a experiência de uma “app” da Mercedes numa “app” de mobilidade, que nos ajude a ir do ponto A para o ponto B.
O carro como bem pessoal parece estar a cair em desuso. Há empresas a trabalharem em carros autónomos. Faz parte dos planos do centro desenvolver estes serviços, tendo em conta essa ideia de apoiar a mobilidade?
Sim, no que diz respeito ao “software” que está dentro do carro. A Mercedes não é apenas os carros, é também os serviços do “MyTaxi”, da “Car 2 Go”, da “Car Sharing”. Ou seja, a empresa, mais do que um fabricante de automóveis está cada vez mais a transformar-se num prestador de serviços de mobilidade.
Este é um mundo novo. As pessoas vão ter menos carros próprios, mas isso não quer dizer que haja menos veículos. No fundo, a ideia é fornecer um serviço integrado, qualquer que seja a necessidade das pessoas. A aposta nos produtos tecnológicos é cada vez mais essencial para o futuro do setor. São completamente críticos. Em Portugal, esta realidade ainda não é assim tão óbvia ,mas já vemos em muitas cidades do mundo o uso do “car sharing”.
Nas grandes cidades, as pessoas já podem pensar no que será mais importante: ter o automóvel ou ter um serviço que permita usá-lo. É uma realidade com que temos de viver, há que aproveitar a oportunidade de oferecer um serviço que responda a essas tendências.
Todos estes serviços vão ser desenvolvidos neste centro?
Podem ser. Temos de crescer rapidamente, trazer tudo o que pudermos, no bom sentido, para Lisboa. Sem dúvida que a minha visão passa por podermos desenvolver todas as plataformas que liguem o “puzzle” da mobilidade.