De quatro em quatro anos há um desporto que “invade” os ecrãs e nos deixa de olhar fixo. Ou porque não percebemos as regras ou porque ver mulheres e homens atrás de uma pedra achatada a varrer o gelo nos parece algo de estranho. Falamos de curling, um deporto originário da Escócia e que remonta ao séc. XVI (1511), mas que só quase 100 anos depois teve direito a nome quando a palavra curling foi pela primeira vez utilizada num poema.
A cada quatro anos, os Jogos Olímpicos de Inverno, este ano em Pyeongchang, na Coreia do Sul, dão a conhecer os desportistas mais conceituados nos desportos no gelo. As velocidades vertiginosas do bobsleigh (os trenós que descem pistas cheias de curvas), as acrobacias dos snowborders, os saltos de esqui que desafiam as leis da física, as corridas de esqui com atletas cheios de endurance ou as piruetas exuberantes da patinagem no gelo. E depois há… o curling.
Onde verbos como enrolar (curl), varrer (sweep) e deslizar (slide) fazem parte do vocabulário dos jogadores, assim como as palavras casa (house), vassoura (broom), sapato deslizante (shoe slider) ou linha de partida (hog line).
É quase paralisante ver um jogo de curling. Ficamos a olhar e a tentar perceber o que se passa naquele retângulo de gelo (curling sheet) com quatro círculos lá à frente. Explique-se: na casa, assim se denomina, há um círculo central (chamado button) e três anéis concêntricos pintados de cores diferentes. E o que é que acontece? Bem, duas equipas de quatro jogadores lançam pedras de granito polidas (rocks) em direção à casa. Ganha mais pontos quem tiver mais pedras junto do círculo central (button) da casa em cada volta de lançamentos (end) depois de cada equipa atirar as oito pedras. Um jogo tem dez voltas (ends).
Esta é a explicação simplificada, depois há toda uma técnica para tirar as pedras da equipa adversária do caminho, varrer a superfície com a vassoura para ajustar a velocidade e/ou a direção da pedra, a maneira como se lança. Há quem lhe chame o “xadrez do gelo”, tal a complexidade e a concentração dos jogadores (curlers).
Pedra sobre pedra
O curling faz 20 anos como desporto oficial dos Jogos Olímpicos de Inverno, a primeira vez foi em Nagano, no Japão. É um desporto que começou por ser praticado na Escócia e Canadá (levado por emigrantes escoceses) e que, depois, chegou aos EUA, Suíça e Suécia (também introduzidos por escoceses), Hoje é jogado um pouco por toda a Europa, Japão, Austrália ou Nova Zelândia.
Em Portugal ainda não.
E se a vassoura, primeiro feita de madeira, agora já adaptada às modernas tecnologias e produzida com fibra de carbono e com pêlos de porco ou cabelo de cavalo na ponta, ou as solas dos sapatos com teflon (um material que não causa atrito e é impermeável) que permitem deslizar na pista são pormenores que todos olham com curiosidade, a pedra (rock) não desperta menos intesse.
A forma achatada, feita de granito e com uma pega na parte superior, tem, claro de ser homologada pela federação mundial da modalidade. Pesa entre 17kg e 20kg e uma circunferência máxima de 91,4 centímetros. E de onde vêm as pedras? Da Escócia, naturalmente. Todas as que estão a ser usadas nos jogos da Coreia do Sul provêm de uma pequena ilha não habitada chamada Aisla Craig, a cerca de 16 km da costa escocesa. A ilha não é mais do que o resto de um vulcão extinto que tem um tipo de granito perfeito para as pedras de curling. A grande maioria da pedras usadas no curling, um pouco por todo o lado, provêm de Aisla Craig, embora também haja outro fornecedor no País de Gales. Cada pedra dura cerca de 30 anos ( duas toneladas de granito chegam para 10 anos de produção) e custa cerca de €480.
Doping?
O curling é jogado por equipas femininas ou masculinas e, pela primeira vez nuns Jogos Olímpicos, foram introduzidos os pares mistos. E foi aqui que, para já, parece ter caído a nódoa. O russo Alexander Krushelnitski, vencedor da medalha de bronze juntamente com a sua mulher Anastasia Bryzgalova, acusou positivo num controlo antidoping para a substância meldonium, a mesma que levou à suspensão da tenista russa Maria Sharapova, em 2016.
Vários atletas mostraram-se surpreendidos porque, referiu um deles: “Estamos a falar de uma modalidade em que temos de ser muito precisos. Não consigo imaginar que tipo de drogas podemos usar no curling … é muito difícil acreditar”
Dmitry Svishchev, presidente da federação russa de curling, confirmou que os atletas foram testados em 22 de janeiro antes partirem para a Coreia do Sul e que os testes foram negativos. “Conheço estes atletas há muitos anos. Só um louco tomaria substâncias proibidas antes de umas Olimpíadas. É uma história estranha que levanta muitas perguntas.”
Recorde-se que há 168 atletas russos a competir em Pyeongchang, mas sob bandeira neutra, devido a suspensão do Comité Olímpico russo por envolvimento num esquema de doping institucional no país durante os Jogos de Sochi, em 2014.