O longo poema épico A Divina Comédia demorou doze anos a ser escrito pelo florentino Dante Alighieri (1265 – 1321). Obra exemplar dos valores medievais, que tinham Deus no centro da existência e defendiam a vida humana como uma árdua peregrinação para atingir a salvação, descrevia essa difícil viagem através do Inferno e Purgatório até à chegada ao Paraíso. Leonardo Frigo anda há apenas quatro anos em peregrinação artística pelo Inferno: violinista e diplomado em restauro, artista-artesão radicado em Londres, ele tem-se dedicado a pintar esse primeiro ‘capítulo’ não em telas brancas mas em instrumentos de cordas. E a série batizada como Dante Alighieri – Inferno conta já com 33 violinos e um violoncelo pintados, um projeto iniciado a pensar nas celebrações do 700º aniversário da morte de Dante, assinalado em 2021.
“O meu trabalho nasce de uma pesquisa profunda, enraizada na minha paixão pela leitura, pela arte, particularmente pela obra prima de Dante. O Inferno de Dante inspira-me desde criança, e posso dizer que me ensinou a imaginar e a sonhar”, refere Frigo. Cada instrumento por si pintado corresponde a um Canto específico. Em todos, estão presentes padrões intrincados, símbolos medievalistas e figuras-chave retiradas da obra fundadora da literatura italiana.
O processo de trabalho é semelhante ao de qualquer obra, efetuada em suportes mais tradicionais: Leonardo Frigo retira anotações de cada Canto da Divina Comédia, e empreende uma busca por símbolos, nomes e ilustraçõesque possam contar visualmente a história narrada por Dante. “Quando o desenho final fica claro na minha mente, estou pronto para começar a pintura à mão, com tinta negra, na superfície do violino. O instrumento é, depois, envernizado e instalado numa base própria”, descreve o seu autor. Cada violino é ainda acompanhado por um texto descritivo, em idioma italiano e inglês. Os instrumentos assim pintados podem resultar como uma escultura para mera contemplação ou cumprirem as funções de qualquer instrumento musical, serem tocados (os preços de venda começam, respetivamente, nas 3600 e 4600 libras, segundo dados do site do artista).
Dante não foi a única inspiração usada para pintar os violinos, que já estiveram patentes em várias exposições em Itália, Grã-Bretanha e Coreia do Sul. Leonardo Frigo tem trabalho feito a partir de iconografia inspirada em Pompeia (a cidade italiana desaparecida devido à erupção do Vesúvio no ano 79 d.C.), nos Sete Pecados Capitais (avareza, gula, inveja, ira, luxúria, preguiça e soberba) e ainda nos célebres concertos para violino e orquestra de António Vivaldi, As Quatro Estações. Quanto à Divina Comédia, é de recordar que a obra de Dante inspirou grandes artistas de séculos passados: Sandro Botticelli pintou a sua visão em O Inferno XVIII (1490), William Blake deixou uma série extraordinária de desenhos, parte dos 102 que lhe foram pedidos em 1825, e Salvador Dalí criou 100 pinturas surrealistas inspiradas pelo poema épico de Dante a partir de 1957. Competição forte…