<#comment comment=”[if gte mso 9]> Normal 0 21 false false false PT X-NONE X-NONE MicrosoftInternetExplorer4
É quase a sensação de voltarmos a uma casa da infância que conhecemos pelos cheiros, pelos tocares, pelos sons: basta iniciar-se o genérico dos filmes de Woody Allen, sempre com a mesma fonte de letra (Windsor), branca sobre fundo negro, e os clássicos do jazz somos “entrados”, todos os anos (com a idade de 77, o realizador continua ao ritmo de um filme por ano), nesta nuvem da nostalgia antecipada. Porque ainda nos há de fazer muita falta a desintoxicação de um Woody Allen anual. Ainda que o seu filme número 45 não seja típico: não há intelectuais, nem judeus, nem galeristas, nem artistas, nem gags, nem piadas, nem mulheres neuróticas… Mas há Cate Blanchett, absolutamente irrepreensível, desgastada, deprimida, pungentemente desvalida, desamparada, psiquicamente debilitada e frágil, deslocalizada do seu alto estilo de vida nova-iorquino para um casebre modesto em São Francisco, tão desprotegida, na sua pele quase translúcida, sujeita às inclemências da vida (que nunca se preocupou em ganhar) e às da câmara: aos intensos close-ups com que o realizador resgata a sua réstia de beleza. E apostamos, com margem de segurança confortável, que será uma das favoritas aos óscares. Este é o papel da sua vida: não admira que as actrizes façam fila para entrar nos seus filmes – e as cidades também. No início, Jasmine surge-nos como – aquilo a que os americanos chamam – uma “talkaholic” de avião, já na fase do seu downgrade, a aterragem, da zona Oeste do Central Park, onde o marido especulava à grande e à americana com trafulhices imobiliárias (os americanos fizeram logo um link para Bernie Madoff) até São Francisco, à casa pobre e desencantada da irmã adotiva, que a acolhe (Sally Hawkins, de Sonho de Cassandra, e que bem pode ser candidata a melhor actriz secundária). E aí tudo se passa como na peça de Tennesse Willliams (Um Eléctrico Chamado Desejo), ou no filme de Elian Kazan, com Vivien Leigh, no papel de Blanche Dubois. Uma mulher em frangalhos, que continua a viver na ilusão do esplendor do passado (que nos filmes nos são dados através de flashbacks periódicos e da música Blue Moon), entre o vodka e o xanax, entre as malas Vuitton, vestidos Hermés e a bata de recepcionista num dentista, peixe fora de água, naquela pobre habitação onde não falta um genro bruto e os amigos bêbados e dois sobrinhos que ela trata como brinquedos barulhentos que lhe estorvam o passo, e massacra-os com conversas de adultos, e nem parece distinguir-lhes os nomes… Na verdade, ela sempre dependeu da bondade de estranhos (como a frase que celebrizou Blanche Dubois), sempre voltou a cara para não ver o que não queria, e, no fundo, vive na tragédia de ter sido ela mesma a contribuir para o seu próprio infortúnio.
Blue Jasmine
De Woody Allen. Blue Jasmine, com Alden Ehrenreich, Alec Baldwin, Bobby Cannavale, Cate Blanchett, Michael Stuhlbarg, Peter Sarsgaard Sally Hawkins. Drama. 98 min. EUA. 2013
<#comment comment=”[if gte mso 9]> <#comment comment=”[if gte mso 10]>