Toda a gente sabe que os elevadores são uma invenção diabólica. São claustrofóbicos, provocam falta de ar, às vezes param, despenham-se com as pessoas lá dentro. Ou entalam-nas nas portas automáticas, ou demoram imenso tempo a fechar quando o perseguidor vem no encalço. Ou estão ocupados ou então cabe sempre mais um e ainda é pior, provocam os constrangimento dos seus ocupantes, porque dentro de pequenos armários se vêem quebradas as distâncias socialmente convencionadas. Ainda por cima, são mono-maníacos, só sobem e descem, nunca andam para os lados, e queixam-se os nutricionistas, estimulam a imobilidade e ajudam à obesidade.
Enfim, já são maus que cheguem. Mas para os argumentistas não há nada de mais conveniente – e mais estereotipado também: a técnica consiste em encurralar as personagens num espaço fechado e depois tipificá-las. Num thriller de terror, os elevadores são particularmente úteis, porque metade da tensão já está encontrada à partida.
Com argumento da ex-estrela em ascenção Hollywood, Shyamalan (que depois de Sexto Sentido e A Vila se tornou estrela bastante cadente), o filme é realizado por John Erick Dowdle, que há dois anos assinou Quarentena, que consistia basicamente em encurralar também uma equipa de televisão, uns bombeiros e toda a vizinhança de um condomínio num prédio assombrado com um vírus demoníaco – mas aí vigorava outro vírus que assolou o cinema de terror que foi a estética Blair Witch Project que continua a parir os seus sempre muito proveitosos filhotes.
Aqui, a narrativa é puramente convencional, embora metade das imagens sejam, à semelhança de tantos outros filmes do género, supostamente captadas por câmaras de vigilância do elevador. Há um grupo de pessoas que não se conhecem, presas dentro de um elevador. Procede-se rapidamente à tipificação das mesmas: a rapariga elegante, a velhota rezingona, o segurança inexperiente, o rapaz sensato e recatado e o chato – que neste caso é um vendedor de colchões que leva o tempo maçar os outros e a entoar a música do elevador que diz qualquer coisa como “não se sentem debaixo da maceeira”…Claro que este põe-se mesmo a jeito e é o primeiro a ser morto. Porque o filme vai progredindo neste sentido: de cada vez que há sobressaltos, sustos, falta de luz, e aqueles barulhos que costumam acontecer nos filmes de terror e nas casas assombradas, alguém aparece inexplicavelmente morto. E os restantes ocupantes do elevador são também inexplicavelmente e potencialmente culpados. Entra em cena um polícia, e à boa maneira de Agatha Christie, no Crime do Expresso Oriente, cada um pode ter um motivo, cada um pode ser o assassino. E até aqui o whodunit funciona.
Até que um dos vigilantes das câmeras de vigilância vem com umas teorias parvas sobre o diabo à solta, e exemplifica isso deixando propositadamente cair no chão uma torrada. Se o diabo andar por aquele edifício da Filadélfia, a parte da geleia cairá sempre para baixo. Manias do diabo, gosta de chatear e sujar o soalho.
O mais frustrante do filme é que a explicação estúpida do segurança é a que vinga. Assim, também eu. Arma-se todo um esquema, desenvolve-se a situação, amarra-se um nó. Até aí tudo bem, como diria Aristóteles, o difícil é desatá-lo. Já não se esperava nenhuma saída à Houdini, mas também o Diabo é um alvo fácil, tem as as cosats demasiado quentes nestes filmes medíocres. Quando os argumentistas já não sabem o que fazer , inventam uns fantasmas, uns demónios ou coisa assim. Ou sejam, invocam os Deus Ex-Machina do costume. Desta vez, um Diabo Ex-machina, para os desembrulhar, a eles mesmos, da situação.