Vivemos uma época de exceção que, naturalmente, se reflete no nosso estado emocional. Adultos e crianças, todos privados daquilo que nos reequilibra e dá energia: viagens, encontros com amigos, gestos de afeto, refeições em família, o convívio com colegas na escola. Resultado: mau humor e falta de paciência garantidos.
Pais e filhos juntos 24 horas por dia, sete dias por semana, num espaço fechado e com pouquíssimas oportunidades de «libertar pressão» não é tarefa fácil, mas há atitudes que ajudam a lidar com o desgaste. A psicóloga Diana Alves, professora da Faculdade de Psicologia e Ciências de Educação da Universidade do Porto, dá-nos algumas pistas para contornar os obstáculos e evitar derrapagens.
1. Aceitar o nosso estado emocional e reconhecê-lo junto dos filhos
«É natural que existam confrontos e discussões. Esta situação de pandemia tem um enorme impacto na nossa paciência. Pais e filhos andam cansados», explica, «Mas é importante retirar algum peso a estas discussões, e isso faz-se, antes de mais, aceitando o estado emocional em que nos encontramos e conversando com os filhos sobre isso.
Explicar-lhes que o isolamento em que todos vivemos há mais tempo do que esperávamos faz com que as nossas respostas às situações sejam agora mais intensas. Se compreendermos o outro, sentimo-nos menos magoado por ele.»
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2. Seguir uma rotina diária, com a consciência de que a rotina é outra
«Este é um ponto importante, pois as rotinas ajudam-nos a regular as emoções. Não será naturalmente a rotina que tínhamos, mas a possível e mais adequada às tarefas de cada elemento da família. Por exemplo, se dantes os pais estavam livres para se dedicarem totalmente ao trabalho quando os filhos estavam na escola, agora, com as aulas à distância, isso dificilmente acontecerá. Não podemos esperar que eles sejam completamente autónomos (pelo menos até uma certa idade), e o mais provável é que peçam o apoio dos pais uma ou outra vez.
Quando planificamos as nossas rotinas, devemos dar voz às nossas aptidões e prazeres, de forma a proteger e a respeitar a nossa personalidade. Se um dos pais não gosta especialmente de levar os miúdos ao parque e o outro não tem grande jeito para brincar ao faz-de-conta, se calhar, é melhor trocarem tarefas ou irem alternando, caso contrário, esses momentos vão exigir um esforço exagerado. E isso não vai ter bons resultados.»
3. Gerir a comunicação
«Aqui temos de ter em conta a forma como comunicamos uns com os outros e a comunicação que vem de fora. Esta, devido ao momento extraordinariamente tenso que atravessamos, é muito inquietante, pelo que é importante filtrá-la bem. Estamos mais vulneráveis e não temos momentos de lazer para renovar «oxigénio», e isso faz com que a informação que recebemos tenha muito impacto em nós. Quando, por exemplo, vimos as notícias na televisão em família e o tema se torna redundante e saturante, talvez seja melhor mudar de canal.
Quanto à comunicação «cá dentro», em família, os pais devem ter em conta que a interação das crianças e dos jovens com os seus pares é agora diferente da habitual. Mesmo que falem ao telefone ou recorram a outras tecnologias, não é a mesma coisa – as conversas são mais monitorizadas e menos espontâneas. A única comunicação presencial que têm é, na maioria dos casos, limitada aos pais. Podem aproveitar os passeios higiénicos para porem a conversa em dia, com calma e mais privacidade.»
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«As necessidades de comunicação com o exterior são diferentes nas várias faixas etárias. No caso dos adolescentes, os pais normalmente querem que, ao fim do dia, desliguem os computadores ou pousem o telemóvel, uma vez que já estiveram muitas horas em frente a um ecrã. Contudo, o facto de estarem juntos nas aulas à distância não significa que estabeleçam a comunicação que precisam de ter com os amigos.
Os pais devem ter em conta que esse tempo não substitui a hora do almoço no refeitório, os intervalos, as conversas no caminho para a escola. Eles precisam desses momentos de conversação extra-aula, com mais privacidade e cumplicidade, que, infelizmente agora tem de ser feita através desses meios tecnológicos.»
4. Garantir horas de sono
«Fechados em casa, não estamos a receber estímulos orgânicos a que estávamos habituados, e a luz dos ecrãs engana o cérebro dizendo-lhe que ainda não são horas de dormir. Por outro lado, o que se passa à nossa volta gera tensão e ansiedade e estamos impedidos de realizar as atividades de lazer que nos ajudam a carregar baterias. Os adultos não podem mandar os miúdos para a cama e ficar por aí. Eles também têm de ir!»
5. Pedir ajuda
«É inevitável que nos zanguemos e discutamos mais nesta altura. O importante é perceber o quão rápidos somos a ‘recuperar’ desses conflitos. Se percebermos que não conseguimos quebrar esses ciclos, que esses conflitos têm um grande impacto sobre nós e demoramos a ultrapassar a zanga, é de considerar pedir ajuda, seja a um psicólogo, a um terapeuta familiar ou até ao médico de família.»