O João, com 18 anos, frequentava o curso de enfermagem, algo por que sempre lutara e que lhe exigiu muito trabalho e médias elevadas. Com esta profissão, um dia, poderia ajudar todas as pessoas doentes, inválidos e idosos.
Ora, certo dia, teve um horrível pesadelo. Algo de muito invulgar lhe acontecera: queria levantar-se e não conseguia… Só com uma bengala o poderia fazer. Chamou os pais, mas ninguém respondeu. Gatinhou até ao deles e apercebeu-se que não havia ninguém. Vai à garagem buscar a bengala do seu avô.
Ao sair de casa constata que só havia arranha-céus, fábricas a lançarem fumo e detritos tóxicos nos rios e algumas até no solo. Nem queria acreditar no que via. Olhou o espelho e viu-se um velho. Tudo estava em destruição. Como a idade já lhe pesava, e a suas pernas negavam-se a movimentar-se, a bengala passou a ser a sua grande amiga. Além desta incapacidade física, juntou-se o desgosto pela ausência dos pais A vida para ele tornou-se sufocante.
De repente, lembra-se que era enfermeiro e decidiu que ainda podia fazer alguma coisa por quem ainda sobrevivia num mundo sem qualidade. Preparou-se o melhor que pôde, chamou um táxi e passados alguns minutos estava no hospital onde tinha trabalhado.
Apenas abriu a porta para se dirigir ao seu local de trabalho, viu uma diferença abismal!… Espaços modernizados, informatizados, cheios de sensores para identificação de tudo, mas onde faltava a alegria e a gentileza dos seus amigos. Perguntou, questionou, indagou…mas as informações que obteve não o satisfizeram. Não havia nada a fazer naquele lugar onde o amor e o carinho são tão necessários, mais do que os medicamentos, os exames radiológicos ou as intervenções cirúrgicas!
E agora? O que é que ele, homem decadente, que não podia sequer deslocar-se sem a sua bengala, poderia fazer para ser útil àqueles que ali tentavam recuperar a sua saúde? Dirigiu-se a sua casa e não conseguiu dormir naquela noite. Num dos seus sonhos, uma fada segredou: “Torna-te útil. Ainda não é tarde. Vai até lá e conta histórias, lê para aquelas pessoas, crianças e velhinhos. A leitura e o diálogo vão ajudá-los aos seus tratamentos e tu vais sentir-te alguém. Vais voltar a ser um jovem que tanto queria tratar o mundo”.
E assim foi. O João deixou de usar a bengala. Agora as suas mãos estão sempre ocupadas com livros ou com gestos que acompanham as histórias. E não é que rejuvenesceu!…