A provocação tem o intuito de alertar os pais para o facto de que ter uma criança no quarto em frente a um ecrã não significa que esteja em segurança. Entregar-lhe um ecrã – seja um tablet, telemóvel ou computador – com acesso à internet é dar-lhe a oportunidade de ir pelo mundo fora, sem restrições, e, muitas vezes, inconsciente das ameaças. É por isso que Cristiane e Tito de Morais, do projeto Agarrados à Net, deixam um alerta: os pais têm de ser pais sempre.
«É preciso perceber que abrir uma conta numa rede social em nome do seu filho, deverá implicar tempo para acompanhá-lo, a família tem de estar offline e online. Se não deixo o meu filho à solta nas ruas de uma cidade vou deixá-lo à solta no mundo online?», questiona Cristiane.
Os pais têm de ser pais SEMPRE
A edição de abril da VISÃO Júnior destaca o artigo As Armadilhas das Redes Sociais, no qual são explicados às crianças e jovens os «truques» altamente eficientes com que as redes, videojogos, apps e outras plataformas nos mantêm agarrados ao ecrã – das notificações em modo de vibração que nos fazem levar a mão ao telemóvel dezenas de vezes por dia aos vídeos que se sucedem ininterrupta e infinitamente.
«Quem nunca perdeu mais tempo do que queria a ver reels ou vídeos no Facebook Watch? Os ecrãs são sugadores de tempo precioso», alerta Tito de Morais, «Hoje já não conseguimos viver sem eles, mas temos de ter atenção e usá-los de forma saudável.»
A culpa não é do seu filho…
Se isto acontece a nós, adultos, a probabilidade de os mais novos ficarem agarrados aumenta. E isso deve-se não a pura teimosia, mas, em parte, ao facto de a zona do cérebro responsável pelo controlo dos impulsos, regulação emocional e tomada de decisões ainda não estar completamente desenvolvida, como explica o psicólogo Pedro Hubert na edição de março. «Só pelos 24 ou 25 anos temos o córtex pré-frontal totalmente formado, o que propicia o vício não só às redes sociais, mas também ao jogo.»
E se convencê-los a desligarem-se é difícil, «pedir-lhes para pensar antes de partilharem algo, por exemplo, é pedir-lhes o impossível. É por isso que os pais têm de ser o córtex pré-frontal dos filhos e ensiná-los a desenvolver o pensamento crítico, ajudá-los a resolver problemas e a antever consequências», aconselha Cristiane Miranda.
Só pelos 24 ou 25 anos temos o córtex pré-frontal totalmente formado, o que propicia o vício não só às redes sociais, mas também ao jogo
A decisão de «desligar» torna-se ainda mais difícil quando entram no jogo ferramentas altamente eficientes criadas com o objetivo de captar a nossa atenção, e assim se forma a tempestade perfeita, muita vezes materializada aí por casa com birras e discussões.
A economia da atenção
«Temos de ter consciência de que quando não pagamos por um produto, é porque somos nós o produto. No caso das redes sociais, estamos a falar de uma economia da atenção», aponta Tito de Morais. Ou seja, a nossa atenção é a mercadoria.
Daí que o tempo que estamos em frente a um ecrã, onde pululam anúncios publicitários e sugestões de páginas, seja precioso para quem usa as redes. Este é um dos pontos que, numa linguagem acessível, explicamos na edição de abril da VISÃO Júnior, que já pode comprar aqui.
É verdade que somos sempre livres de desligar e voltar à «vida real», apesar de não precisarmos de estatísticas e métricas para perceber que estamos mais agarrados do que gostaríamos ou deveríamos. «Basta olhar para as mesas nos restaurantes, onde as crianças pequenas já têm um ecrã à frente, que os pais usam para as entreter enquanto jantam ou lhes dão comida», nota Cristiane.
Mas não falamos apenas de crianças, sublinha, recordando uma situação ocorrida na Alemanha, em 2018, quando a associação de nadadores-salvadores alemã apelou aos pais e avós para largarem os smartphones enquanto as suas crianças estivessem na água, num ano em que, até agosto, já tinham morrido mais de 300 pessoas afogadas, fazendo a ligação entre os acidentes e o uso dos telemóveis.
Alerte os seus filhos para os perigosos ‘5 C’
- conteúdos (aquilo que partilham e os conteúdos a que são expostos)
- contactos (as pessoas com quem se contacta na net não são amigos, mas estranhos
- comportamentos (aqui cabem, por exemplo, o cyberbulling e os abusos sexuais)
- copyright (devemos ter atenção aos direitos de autor dos conteúdos que usamos e partilhamos)
- comércio (quando estamos online expomo-nos a publicidade e fornecemos informações valiosas sobre nós)
Fale com eles, explique-lhes cada um destes pontos e tente estar mais presente durante os períodos em que eles estão ligados. «No início, até podem achar aborrecido se lhes propuser jogarem um videojogo juntos, mas eventualmente acabarão por achar piada. E mesmo que não goste ou sequer saiba jogar, fique só a vê-los jogar e a comenta. Eles vão gostar de sentir que os pais se interessam por essa parte da sua vida», garante Tito de Morais.
A ideia fundamental é manter um certo controlo sobre o uso que os mais novos fazem destes canais, para os manter seguros. Cristiane recorda o caso exemplar de uma criança que, sozinha no quarto, estava a ser vítima de um predador sexual enquanto os pais, por perto, a chamavam para jantar.
«Mas não queremos que os pais sintam que a culpa recai totalmente sobre eles ou sobre os filhos, o problema é que as redes estão desenhadas para nos agarrarem. Contudo, se estivermos informados, podemos tomar melhores decisões», sublinha Tito de Morais.
Usar as redes de forma positiva
Em vez de os criticar por usarem redes como o Tik Tok, o Instagram ou o Snapchat, desafie-os a usá-las de uma forma positiva. Explore as plataformas com eles e descubram bons exemplos. Pode, por exemplo:
- encorajá-los a seguir pessoas/páginas com mensagens positivas e a procurar comunidades online que os façam sentir apoiados
- ajude-os a priorizar ligações online com pessoas que conhece e com quem se dá bem, como familiares e amigos e a evitar contactos com desconhecidos
- incite-os a participar em iniciativas que os motivem a exercer a sua cidadania (ativismo ambiental, associações de apoio a animais, associações de estudantes, etc)
3 desafios para toda a família
Não há como negar que as redes são sugadores de tempo. Façam-se a pergunta: «Se eu tivesse mais tempo livre durante o dia, aproveitava para fazer o quê?» Dificilmente a resposta seria «ver vídeos de cãezinhos e danças engraçadas». Então, que tal experimentar estes três gestos simples que podem ajudar a afastar-se dos ecrãs?
1. Desliguem o autoplay (passagem de vídeos ou músicas ininterruptamente) nas plataformas e apps que oferecem essa possibilidade, como o Youtube.
2. Quando pegarem no telemóvel, ponham o despertador para daí a 30 minutos, altura em que deverá pousá-lo.
3. Definam uma hora, uma manhã, tarde ou dia da semana para se manter offline.
4. Deixam os telemóveis na sala ou cozinha quando se forem deitar (comprar um despertador pode ser uma boa alternativa)
Encontra mais informação e dicas aqui e aqui.
Agradecimentos: Cristiane Miranda e Tito de Morais/Agarrados à Net
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VISÃO Júnior de abril de 2023
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