A criança tem o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre questões que lhe digam respeito e de ver essa opinião tomada em consideração. Este direito está consagrado no artigo nº 12 da Convenção sobre os Direitos das Crianças, o documento adoptado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989, e ratificado por Portugal um ano depois.
Ouvir o que nos têm a dizer sobre a sua vida e o mundo que as rodeia é essencial para a garantia dos direitos das crianças. Esta escuta ativa, defende Francisca Magano, diretora de Políticas de Infância e Juventude da UNICEF Portugal, deve acontecer no dia a dia, ao invés de se limitar a momentos cruciais ou críticos, como no caso de um divórcio, em que os filhos são ouvidos nos tribunais.
«Devemos escutá-las, discutir assuntos em família e perguntar-lhes a sua opinião, pois é dessa forma que desenvolvem sentido crítico e aprendem a olhar para o mundo que os rodeia.» Obviamente, as suas opiniões não devem ser encaradas como ‘lei’, mas devem ser tidas em conta, com maior ou menor peso, em função da sua idade e da sua maturidade. E não esqueçamos: as crianças aprendem pelo exemplo, e antes de tudo o mais, pelo que veem e ouvem em casa.
Francisca Magano recorda um projeto desenvolvido em parceria com uma autarquia no qual foi pedido às crianças para tirarem fotografias daquilo que encontravam no caminho para a escola e que não lhes agradava.
«Uma delas referiu as paragens de autocarro. Queixou-se de que não eram protegidas e que, por isso, tanto as crianças como os adultos que esperavam pelo transporte, ficavam à chuva. Ora, isto é resultado de uma visão atenta do mundo. E uma criança atenta tem mais competências para entender os seus direitos e defendê-los.» Neste caso, os seus e os dos outros, incluindo adultos.
E recorda um outro episódio, passado numa escola da capital, por altura do início da guerra na Ucrânia. Uma aluna explicava que a colega ucraniana que, entretanto, tinha chegado à escola, não estava a ter muitas dificuldades de integração porque a colega russa estava a ajudá-la e traduzia o que lhe diziam. «Esta é uma grande lição para todos nós.» Porque, afinal, uma participação cívica para a democracia baseia-se em princípios básicos como a justiça e a igualdade.
Se não promovemos competências sociais, elas vão ficar em falta. Como vamos depois pedir-lhes para, aos 18 anos, fazerem uma escolha consciente e informada do curso que vão seguir, se antes nunca promovemos o sentido crítico e a escolha consciente?
O desenvolvimento destas competências resulta de um esforço que deve ser feito em casa, na escola e nas autarquias. «O mundo é quase adultocêntrico», refere, «mas devemos ouvir as crianças. E elas têm muito a dizer-nos e a ensinar-nos.»
Para a diretora de Políticas de Infância e Juventude da UNICEF, não há que ter medo de lhes dar liberdade para se exprimirem, pois «a defesa dos direitos dos mais novos não é incompatível com o exercício dos direitos dos adultos. As crianças precisam de construir o mundo com os adultos.»
O que preocupa as crianças?
Quisemos saber de que mais se queixam as crianças no nosso país, e a resposta faz-nos pensar. «Violência doméstica e bullying na escola», aponta Francisca Magano. «A violência continua a ser um dos grandes desafios.»
A saúde mental e a violência na internet também preocupam os mais novos. «É importante que pais, cuidadores e professores fiquem atentos a isto. Estamos a dar realmente atenção às suas preocupações? Perguntamos-lhes regularmente como se sentem? As questões de saúde mental sempre fizeram parte da vida das crianças e dos adolescentes, mas temos de lhes dar atenção – e tempo!»
Ao contrário do que possamos pensar – quando os vemos tanto tempo online e «enfiados» nos telemóveis -, o que se passa na internet também preocupa as crianças, que referem sentir-se pouco seguras no espaço virtual. «Falam muito da discriminação e da violência a que ali assistem», refere. A partilha não consentida de conteúdos privados, por exemplo, é outro problema.
«É importante educá-las para a relação com a internet, mas em vez de confrontá-las, perguntar-lhes a opinião. Por exemplo, numa conversa informal, abordar o tema do direito à privacidade nas redes sociais, e perguntar «O que achas disto?»
Como promover a participação cívica dos seus filhos e ajudá-los a lutar pelos seus direitos?
Dê-lhes espaço (e tempo) para exprimirem a sua opinião
Não receie perder o controlo da situação
Os direitos das crianças não são incompatíveis com o exercício da parentalidade.
Garanta que têm acesso a informação apropriada
Nem sempre os meios de comunicação social disponibilizam conteúdos informativos adequados à infância. Ajude-os a procurá-la nos diversos canais.
Mostre-lhes as várias maneiras como podem organizar-se para lutar pelo que consideram justo
Na escola, por exemplo, os delegados de turma e as associações de estudantes dão voz às crianças e jovens na própria organização e dinâmica escolar. Uma criança que aprende a participar está mais protegida.
Promova uma educação baseada na empatia, na igualdade e sentido de justiça
Lembre-se de que as crianças aprendem pelo exemplo. O que veem e ouvem em casa é o primeiro patamar para a formação de uma consciência cívica