Quando era criança, Miguel Mateus, 50 anos, sonhava ser violinista. Começou a tocar violino na igreja próxima de casa dos pais, mas acabou por não conseguir estudar música e realizar esse sonho. Mais tarde, já adolescente, visitou a oficina de um violeiro e “apaixonou-se pela anatomia do instrumento”, recorda.
E, então, pensou: “Porque não tornar-me um luthier?”, conta-nos, na Oficina dos Violinos, que abriu no Porto há quase 30 anos e que, além de ser um ateliê, é também uma loja de venda e aluguer de instrumentos de corda.
Mas, afinal, o que é um ‘luthier’? É um artesão especialista na construção, reparação e ajuste de instrumentos musicais de cordas. Miguel costuma dizer que “um luthier é como um alfaiate, porque sabe fazer um fato [neste caso, um violino] à medida de cada um”.
O seu ofício necessita de combinar a arte de marcenaria (o trabalho com madeira) com conhecimentos de música. E não há muitas pessoas a fazê-lo em Portugal. Aliás, nem sequer existe uma escola onde se aprenda a construir violinos, violas de arco ou violoncelos.
Miguel teve de aprender sozinho, com a ajuda de alguns especialistas (como o luthier inglês, John Nabok) e através de cursos que fez em Itália e em Inglaterra.
Mais tarde, conheceu a mulher, Filipa, que, apesar de ser formada em Física, se apaixonou pelo arco que é necessário para que estes instrumentos de corda deem música.
“O arco é como a extensão do braço”, diz-nos. Depois de ter frequentado um curso em Lausanne, na Suíça, onde aprendeu a construir e a reparar um arco, Filipa tornou-se uma archetier (palavra francesa que significa construtora de arcos).
Miguel e Filipa Mateus tornaram-se, assim, dos poucos casais (senão o único) a construir instrumentos de corda no seu ateliê, no Porto – que mais parece uma oficina, cheia de moldes, pedaços de madeira, serrotes, martelos, canivetes e pincéis!
Um violino é feito com dois tipos diferentes de madeira: abeto ou ácer. Pode demorar dois meses a ficar pronto, porque tudo é feito à mão: do corte da madeira (para formar o corpo do violino, a parte da frente e de trás) aos furos na voluta, à pestana e ao cavalete que vai segurar as cordas, à colocação da alma (um pauzinho, com cerca de quatro centímetros, que é o meio de transporte do som do tampo superior para as costas), até ao verniz com o qual se pinta o instrumento.
Já Filipa demora duas semanas a construir o arco, feito com crinas (caudas de cavalo), sobretudo, de animais que vivem em ambientes frios e ao ar livre, como na Sibéria e na Mongólia. A vara que segura o arco é feita de madeira de Pernambuco.
Miguel e Filipa dizem que, tal como nas histórias de Harry Potter, em que as varinhas escolhem os mágicos, também “os arcos escolhem os músicos, porque estes podem ser mais ou menos flexíveis”. E, como o violino, também a vara e o arco são feitos à mão, com muita, muita paciência.
Este artigo foi originalmente publicado na edição n.º242 da VISÃO Júnior