Imagina uma sala às escuras. Na mesa há massa branca (uma espécie de plasticina) e uma venda para os olhos. Antes de entrarem na sala, todos os alunos foram convidados a escolher um ramo de árvore (os professores recolheram apenas os ramos que já estavam caídos no chão).
São 21 alunos do 1.º ao 9.º ano (há uma menina cega e outra que vê muito pouco). A ideia é criarem uma escultura. «Qual é a diferença entre uma escultura e uma peça normal?», pergunta Rui Chafes ao grupo. «A diferença está na originalidade, no significado que lhe colocamos. Uma escultura é um reflexo do mundo interior de alguém», esclarece.
E para que quer Rui Chafes colocar um grupo de alunos a fazer uma escultura numa sala às escuras? «O professor e diretor pedagógico Pedro Coragem convidou-me para fazer um workshop (uma espécie de aula em que experimentas fazer alguma coisa) de escultura e eu não tive qualquer dúvida. Queria que as crianças percebessem a necessidade de sentirem o seu mundo interior e de desacelerarem do mundo exterior. No fundo é o que eu procuro fazer para o meu trabalho, também. E, por outro lado, terem o conhecimento em relação ao mundo dos colegas que não veem – e com quem convivem diariamente aqui na escola».
No escuro e no silêncio os alunos são convidados a olhar para dentro. «Fechem os olhos e concentrem-se. Não há pressa. Quem são vocês? Vejam que paisagem surge dentro de cada um. A escultura não está fora, está dentro de nós. Há dúvidas?». Uma menina pergunta: «podemos fazer o que quisermos?». «Sim, vocês fazem o que quiserem, o que está dentro de vocês», tranquiliza Rui Chafes.
Durante a hora e meia de experiência, foi colocado o som do mar no computador, alfazema a passar pelos narizes e ervas a serem queimadas pelos professores. Todos os sentidos são estimulados, menos a visão. Porquê? Porque a visão é aquela que nos distrai mais daquilo que temos dentro.
Rui Chafes nunca foi professor e não tem qualquer experiência com crianças para além daquela de ser pai de três rapazes. Mas está claramente contente com a sua primeira vez. «Eles não sabiam o que ia acontecer e abriram-se ao desconhecido. E o desconhecido era essencial para esta experiência. Estou espantado, porque nesta hora e meia eles estiveram muito concentrados, uns a fazer coisas minúsculas e outros a fazerem objetos maiores. Isto prova que o nosso mundo interior não tem escala. A escala só existe no espaço físico. E para a criança foi tão importante fazer a coisa pequenina como foi importante para a outra criança fazer a peça maior. Todos eles foram muito decididos e avançaram rapidamente para aquilo que queriam fazer.»
E afinal, o silêncio não existe? «O silêncio não existe, é uma ficção. O silêncio é feito de tudo à volta, que, neste caso, foram os pavões, as vozes no recreio, as máquinas fotográficas». Então para que serve o silêncio? Segundo o escultor, é lá que vive a nossa voz interior e quando calamos tudo à nossa volta, conseguimos perceber melhor quem somos.