Uma equipa de investigadores conseguiu captar diversos sons produzidos por peixes que povoam o recife de coral da Indonésia. Para os cientistas, a cacofonia de sons representa boas notícias: significa que o recife, profundamente afetado pela pesca, está a regressar ao seu estado natural.
Muitos dos sons nunca tinham sido registados antes, e os cientistas continuam sem saber a origem de alguns deles – mas a paisagem sonora é, para os investigadores, fonte de muitas informações sobre a saúde dos corais.
Além disso, o som é vital para a sobrevivência dos recifes, uma vez que muitas das espécies de peixes e crustáceos que habitam nestes habitats passam a primeira parte das suas vidas em mar aberto, e usam depois o som, entre outros sinais, como uma espécie de farol para encontrarem o caminho para o recife.
No entanto, “este processo é comprometido quando a degradação destrói as paisagens sonoras”, explicam os cientistas, no estudo que foi publicado no Journal of Applied Ecology. “Como tal, a recuperação acústica é uma componente funcionalmente importante da recuperação do ecossistema.”
Com isso em mente, a equipa utilizou gravações acústicas captadas nos recifes de coral da Indonésia (alvo de um dos maiores projectos mundiais de restauração de recifes de coral) para testar se a restauração bem sucedida dos recifes e das comunidades de vida marinha é acompanhada por uma paisagem sonora restaurada.
O recife foi alvo de um projeto que, há três anos, procura recuperar os ecossistemas dos recifes após estes terem sido devastados pela pesca com explosivos – uma técnica ilegal em muitos países que envolve o uso de pequenas bombas caseiras para atordoar ou dizimar todas as espécies marinhas que se encontram numa certa área.
Compararam posteriormente as gravações captadas com outras feitas em recifes saudáveis, degradados pela pesca e restaurados. E descobriram que os habitats restaurados tinham uma paisagem sonora quase tão vibrante como os que nunca tinham sido afetados, enquanto os recifes mais degradados se mantinham, em comparação, muito mais silenciosos.
Os resultados, que podem ser ouvidos no vídeo abaixo do jornal britânico The Guardian, são motivo de grande entusiasmo para os investigadores.
“Trabalhar com o som subaquático dos recifes de coral tem sido muitas vezes bastante miserável. Temos ouvido os recifes a entrar em silêncio à medida que se degradam. Mas este local de restauração foi emocionante e inspirador, porque a mudança estava a ir na direção oposta”, explica Tim Lamont, da Universidade de Exeter, no Reino Unido, e principal autor do estudo.
“Além disso, ao ouvirmos as horas e horas de gravações, continuámos a descobrir sons que nunca tínhamos ouvido. Alguns eram um pouco familiares, mas outros não fazíamos a mínima ideia do que eram. Era um verdadeiro sentido de aventura e descoberta”, continua.
Quatro hectares de área de recife foram reabilitados pelo programa Mars Coral Reef Restoration Project. Trabalhando em estreita colaboração com comunidades locais, o projeto passa por selecionar áreas afetadas e que precisam de restruturação e, em combinação com outras técnicas de restauro, implantar aí “estrelas de coral” – estruturas hexagonais feitas a partir de materiais naturais que estabilizam o solo oceânico e servem de base ao crescimento dos corais.
Após alguns anos, estas estruturas tornam-se parte integrante dos corais e contribuem para a criação de um habitat viável às espécies marinhas.
Apesar destes esforços, Lamont realça que “a restauração não é uma solução que significa que não temos de nos preocupar com todas as ameaças aos recifes do mundo”, tais como a crise climática e a poluição das águas. “Se não abordarmos estes problemas mais vastos, as condições para os recifes tornar-se-ão cada vez mais hostis, e eventualmente a restauração tornar-se-á impossível”, diz, num comunicado da Universidade de Exeter.
“O nosso estudo mostra que a restauração dos recifes pode realmente funcionar, mas é apenas parte de uma solução que deve incluir também uma ação rápida sobre as alterações climáticas e outras ameaças aos recifes em todo o mundo”, acrescenta.
A Indonésia faz parte do chamado Triângulo de Coral, que também inclui áreas marítimas da Malásia, Filipinas, Papua Nova Guiné, Timor-Leste e Ilhas Salomão. A área tem quase 600 espécies diferentes de corais, e é habitat para inúmeras espécies animais: seis das sete espécies de tartarugas marinhas, e mais de duas mil espécies de peixes, de acordo com a WWF.
No entanto, os recifes de coral são dos ecossistemas mais ameaçados do mundo. Um estudo de 2018 do Instituto Indonésio de Ciências concluiu que mais de um terço dos recifes de coral da Indonésia se encontra em mau estado, e apenas 6,5% estão em “excelente” estado.
O Relatório Especial sobre o aquecimento global de 1,5 ºC, do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, alerta que a maioria (entre 70% a 90%) dos recifes de coral de água quente que existe atualmente está condenada a desaparecer, mesmo que o aquecimento global seja limitado a 1,5 ºC.
Além de constituir uma perda incalculável para a biodiversidade, o desaparecimento dos recifes afetaria a vida de milhões de pessoas. De acordo com o Mars Coral Reef Restoration Project, 100 milhões de lares são protegidos de ondas e tempestades devido aos recifes e seis milhões de pessoas ligadas à indústria da pesca a nível global dependem destes ecossistemas.