É um projeto singular de quem tem orgulho numa vida feita de livros. É, por isso, uma casa de papel, que tanto veste as roupas de um escritório pessoal, como as de uma livraria. Nas traseiras da Avenida de Roma, em Lisboa, chama-se de “Os Livros do Jorge” e tem todos os livros que Jorge Reis-Sá já escreveu e editou.

Pela sua diversidade, é o melhor retrato de um percurso que, para o bem e para o mal, como reconhece, toca em vários territórios: a edição, a poesia, a prosa e o ensaio.

Na prateleira dos livros acabados de chegar está Prado do Repouso, volume em que recolhe 25 anos de poesia. Não se trata de uma poesia reunida, antes de um olhar sobre a sua produção poética, arrumada em função das várias vozes que foi explorando.

Inclui ainda um texto em prosa, dedicado ao seu pai, que rima com alguns dos poemas que não poucas vezes refletiram sobre a paternidade e a orfandade. Como acontece com os seus títulos mais recentes, assim como as reedições dos mais antigos, leva a chancela da sua nova editora, A Casa dos Ceifeiros, que criou sobretudo para se publicar, embora também já tenha lançado títulos de Eucanaã Ferraz, Fernando Pessoa, Cory Taylor e Françoise Sagan.

Mais do que recordar duas décadas e meia de versos, Prado do Repouso pode revelar-se uma despedida, já que deixou, há alguns anos, de sentir o impulso da poesia, andando hoje mais pela prosa. Um dos seus últimos livros de histórias curtas, A Hipótese de Gaia, recebeu aliás o Grande Prémio de Conto Branquinho da Fonseca da APE, em 2023, e para o futuro estão previstos muitos outros projetos. Todos de gestação lenta, uma marca da sua criação literária.

À semelhança do editor (foi fundador das Quasi, passou pela Ulisseia, colabora com a Imprensa Nacional Casa da Moeda e o Museu de História Natural e da Ciência da Universidade do Porto), o escritor, nascido em Vila Nova de Famalicão, em 1977, gosta de construir cada livro com tempo.

O meu percurso como escritor está tolhido pelo meu percurso editorial. Quer isto dizer que o meu trabalho é ser editor e só depois escrevo. Nos tempos atuais, ao não teres um compromisso com a escrita e com tudo o que lhe está associado, dificilmente consegues vingar

jorge reis-sá

No posfácio a esta poesia reunida, que assinala 25 anos de percurso poético, fala em lápides e não dá como certo que a poesia continue. É o fechar de um ciclo?

Muito provavelmente. Em 2009, organizei com o Rui Lage uma antologia de poemas portugueses, com 2152 páginas (ainda não esqueci o número) que me obrigou a ler se não toda, muita da poesia do século XX. Li coisas muito boas, outras menos boas, algumas más: foi uma overdose de versos e de poesia.

Ainda em 2009 escrevi os sonetos do livro Mulher Moderna que lancei em 2011, mas desde então devo ter escrito uma meia-dúzia de versos. Chegava ao poema e ficava tolhido, ainda hoje fico. Lembrava-me de tanta coisa que tinha lido que ficava assoberbado. E mantém-se. Não sei muito bem o que hei de fazer, como continuar uma ideia, como escrever poesia. É claro que outras coisas meteram-se pelo caminho e não ando a forçar.

Diz-se muitas vezes que antes de se ser escritor (ou poeta) é preciso ser-se um bom leitor. Haverá limites para essa curiosidade e aprendizagem do Outro?

Não há limite, ler poesia é um vício que faz bem. O problema foi mesmo a overdose, muito em pouco tempo. Não tive oportunidade de ser permeável às afinidades eletivas, aprofundar o que verdadeiramente queria ver, conhecer e pensar melhor. Não houve o ler e o responder com escrita própria.

Não houve síntese nesse processo?

Exato. Houve uma compreensão muito grande e forte que fez com que ficasse sem pé. E nunca mais o recuperei. Mas também não estou preocupado com a recuperação desse pé.

Mas houve um tempo em que a poesia era um exercício diário?

Não direi diário, mas houve um altura em que a poesia era o centro da minha escrita, o principal. Ou seja, na literatura e no que eu podia podia escrever, interessava-me mais um trabalho poético do que ficcional, ou no campo da crónicas e do ensaio, que entretanto também desenvolvi. O livro de 2009 desconstruiu esta relação e a poesia começou a ficar relegada para outro sítio.

Ainda no posfácio, refere-se a 2009 como o ano mais complicado da sua vida…

E foi, com o fecho das Quasi e a mudança para Lisboa com tudo o que isso acarretou, além de muitas outras questões pessoais. Mesmo os poemas do livro Mulher Moderna, escritos em sucessivas viagens de comboio, são uma projeção: eu não queria ser aquele sujeito poético quando tivesse a sua idade (cerca de 40).

Outro lugar-comum diz que os momentos difíceis são mais propícios à escrita e à poesia…

Não concordo nada com essa ideia. Há uns anos, um amigo escritor passou por uma dificuldade pessoal muito forte e eu disse-lhe para aproveitar para escrever, mesmo não acreditando no conselho. E a resposta dele só reforçou a minha convicção: “Tu bem sabes que não se escreve no meio da tempestade, só depois”. Quando se vive momentos complicados, não há poesia ou ficção que te salve. Apenas tens de os ultrapassar.

Nesta poesia reunida inclui os primeiros poemas. Quando se deu a sua aproximação à poesia?

A minha “história” enquanto escritor de versos começa no 7.º ano, quando, por preguiça, em vez de uma redação, escrevi um poema. Começava: “Se eu pudesse mudar o mundo…” [risos]. Tive um “Elevado” com “e” maiúsculo, porque também os havia em minúsculo [risos]. Foi um impulso que se associou à conquista da mulher amada, transformando-se depois numa forma de olhar e trabalhar com o mundo.

Ganha depois um prémio em 1998…

… que me dá um apoio para publicar um livro. Saiu fraco, como seria de esperar. Uma vez perguntaram ao Manuel António Pina se publicaria agora (na altura da entrevista) o seu primeiro livro e ele respondeu: “Não, ainda bem que o publiquei quando estava a começar.” É uma frase lapidar sobre muitos primeiros livros, que só fazem sentido no momento em que surgem.

Esse primeiro livro reforçou a relação com a poesia?

Sim, muito. E a ele seguiu-se o encantamento com a descoberta de mais poetas, novos versos, outras personalidades literárias. Neste âmbito, a edição também foi muito importante. O primeiro poeta maior que conheci pessoalmente como editor foi o António Ramos Rosa, uma figura encantadora a vários níveis.

Prado do Repouso – A Casa dos Ceifeiros, 320 pp, 19,95 euros

Ao olhar para estes 25 anos que pontos de viragem encontrou?

A organização do livro espelha um pouco as várias fases da minha poesia. Começa com uma voz de juvenilia, representada pelos volumes mais imberbes, muito devedores da leitura de Eugénio de Andrade, mais líricos e metafóricos, sobre o amor e o mar.

Por volta de 2003/2004, começo a escrever uma poesia mais discursiva e narrativa, com histórias lá dentro, que desemboca em Biologia do Homem, aquele que considero ser o meu primeiro livro. Foi a descoberta um sujeito poético mais confessionalista, ligado às minhas circunstâncias, quase terapêutico, o que foi muito importante para mim.

Quando esse momento se esgotou, escrevi uns textos em que me aproximava quase de um teatro em verso. Nos poemas mais recentes há talvez um regresso ao confessionalismo. São vozes diferentes que, ao correr dos anos, fui conseguindo identificar. E a consciência das suas diferenças permitiu-me arrumar esta poesia reunida.

O editor também ajudou nessa reflexão?

Vai ajudando. Quando uma pessoa também é editor tem uma consciência um pouco mais aguda do que faz. E eu acumulo ainda outra dimensão: edito-te. Há vários casos semelhantes na nossa poesia, como também há poetas-editores que nunca publicaram nas suas chancelas. Mas ao editar-me sei que não vou ter o crivo de outro editor. Por isso, quando estou a escrever ou a preparar um livro tenho de me pôr noutra pele para tentar compreender se aquilo faz ou não sentido (incluindo o de editar).

Nunca procurou publicar noutras editoras que não a sua (Quasi e A Casa dos Ceifeiros) ou naquela em que trabalhava (Ulisseia)?

Na poesia, não. Na prosa essa possibilidade ou opção surgiu naturalmente. Também é preciso ter a noção de que do ponto de vista editorial seres publicado é quase um favor que te fazem. Ninguém entra na edição de poesia para fazer dinheiro ou a pensar que vai iniciar um negócio. Não estamos a falar de mercado. E por conhecer bem o mercado não me sinto à vontade de perguntar a um editor se quer publicar a minha poesia.

A prosa foge a essa dinâmica?

Sim, tem uma dinâmica de mercado diferente e há até uma dimensão de marketing e de venda do livro e do autor que faz com que seja bom ter um editor. Além disso, na prosa, até certa altura, senti que precisava de um editor, alguém que lesse o original e me sugerisse cortes ou alterações. Mas também na prosa, há cerca de 8 ou 9 anos, depois de publicar A Definição do Amor, talvez por um certo desencanto, percebi que não valia a pena.

Porquê?

Porque o meu percurso como escritor está tolhido pelo meu percurso editorial. Quer isto dizer que o meu trabalho é ser editor e só depois escrevo. Nos tempos atuais, ao não teres um compromisso com a escrita e com tudo o que lhe está associado, como ir a eventos, fazer lançamentos, participar em encontros literários, dificilmente consegues vingar.

Hoje escrever não é só escrever?

Não é só escrever. Como editor também o sei. Dizendo-o meio a brincar, os escritores que agora vendem verdadeiramente livros são pessoas que passam metade do dia a escrever e a outra metade a dizer que escreveram. Ou a fazer projetos paralelos e a construir uma carreira. Nada do que digo é pejorativo, não estou a criticar, quando muito tenho alguma inveja disso, pois é um percurso que eu talvez pudesse ter feito, mas que por várias razões não aconteceu.

É uma profissionalização da escrita?

É precisamente isso. Há cerca de 15 anos, na altura dos blogues, escrevi um texto que teve um feedback brutal justamente porque era uma resposta às pessoas que diziam que não dava para viver da escrita. E já na altura defendia que viver da escrita não era escrever um romance e ficar sentado.

Também passava por o promover, escrever um peça de teatro, um ensaio para uma revista, um conto, etc, etc. O que não era possível há 15 anos, e continua a não ser possível hoje, é ser lírico a viver da escrita. Muita gente acusou-me de me estar a vender ao mercado.

A Casa dos Ceifeiros surge como resposta a essa realidade que tão bem conhece?

Sim. É a minha editora, na qual edito e me edito. Em relação aos meus livros, edito-os até de uma forma obsessiva, na medida em que cada livro demora anos a ser preparado. Andei a pensar no Prado do Repouso durante, pelo menos, três anos. Com A Hipótese de Gaia passou-me o mesmo, a que acrescentei muitos elementos extra, como fotografias, árvores genealógicas ou outras curiosidades. E faço-o também como um divertimento.

Ter uma editora para publicar os seus livros é assumir um espaço de liberdade?

Totalmente. É possível controlar tudo: a capa, o tipo de letra, o papel. Depois não vende nada, mas o processo passa todo por mim. É criar um projeto editorial que também é um projeto de escrita. Por vezes, pode começar por uma capa, noutras, pelo texto.

Sentiu que o Grande Prémio do Conto Branquinho da Fonseca da APE que recebeu, em 2023, com A Hipótese de Gaia legitimou a opção da auto-publicação?

O prémio foi muito importante por duas razões. Por um lado, revelou uma validação dos pares, o que para mim foi importante justamente por eu ser muita coisa. As pessoas da escrita acham que sou editor, as da edição veem-me como escritor, uns acham que sou biólogo e por aí em diante.

Por outro lado, também legitimou o processo de que tenho vindo a falar, de ter o controlo de tudo. E é curioso que, na sua justificação, o júri destacou a organização do livro, a sua lógica. Acredito que, em qualquer área artística, se nota quando és pertinente e relativamente obsessivo e quando és mais gratuito.

A Hipótese de Gaia é um dos muitos livros de prosa – romances, contos, ensaios – que tem publicado. A poesia não se ressentiu com o surgimento da prosa?

As primeiras tentativas de prosa a sério são de 2001, mas nunca ofuscaram a poesia. Na altura em que a poesia ainda era o centro do que eu escrevia, sempre que me desvia ela está ali ao lado. Na verdade, eu sentia que, na poesia, sabia o que estava e o que queria fazer no meio das lutas poéticas do início do século XXI. Hoje até percebo que, do ponto de vista estético, estava de um lado que não era o meu.

Em que sentido?

Vou parecer um velho a falar, mas não sei se a oposição entre lirismo e confessionalismo ainda faz sentido, não acompanho tanto o que se faz agora. Mas no início do século XXI era uma oposição forte. Era até mais fácil arrumar alguns poetas em cada lado.

Em antologias que organizei acho que fiz isso com facilidade, só que não me inclui. Eram duas formas de olhar o mundo, de editar, de ler e pensar a estética literária que se opunham, até com bastante polémica. E a principal diferença entre as Quasi e, digamos para simplificar, a Averno era justamente a forma como se via a edição de poesia.

Nas Quasi achávamos que a poesia era só uma, como dizia o João Cabral do Nascimento. E isso quer dizer que, enquanto editores, não professávamos uma estética. O outro lado achava, com toda a legitimidade, o contrário, que tudo o que não seguisse a estética escolhida devia morrer. Eu só não concordava com uma coisa.

Com o quê?

Com a agressividade usada contra quem publicava com outros critérios. Todos têm o direito a publicar. Não acho que se deva cancelar por motivos estéticos. E a diferença passava também pelas opções editoriais, como as capas. As da Quasi apresentavam-se berrantes. A ideia era “vamos pôr a poesia ao lado dos outros livros”, fugindo a uma lógica de gueto, que, sublinho mais uma vez, é totalmente legítima.

Mas onde é que a sua poesia ficava no meio dessa polémica?

Essa é a questão. Apesar do que nos diferenciava nas nossas opções editoriais, olho para a minha poesia e vejo-a mais próxima da do Jorge Gomes Miranda, Manuel de Freitas ou João Miguel Silva. Apesar da amizade e da ligação editorial que tinha com o Valter Hugo Mãe ou do Jorge Melícias, não partilhava a poesia deles, mais metafórica e imagética. A minha poesia navegava mais pelo quotidiano.

Para quem veio de uma forte influência do Eugénio de Andrade, o encontro com o quotidiano foi uma revolução?

Não sei se foi uma revolução, porque foi tudo muito natural. Sinto que foi mais um encontro, a descoberta da minha voz. O Vasco Ferreira Campos, um poeta que desapareceu mas que tem um livro de que gosto muito, O Coração Sabe, dizia: “Na poesia tens de ser honesto”. A honestidade, em poesia, é um conceito com muitas nuances. Julgo que ele não se referia apenas à dimensão confessional, mas também à honestidade que te leva a escrever o que é natural em ti, sem forçar o que pode ser mais conveniente.

Mas como surgiam os poemas dessa fase? Da observação do dia?

Era sempre uma construção, como se estivesse a escrever um conto. Tinha uma ideia para um verso, para uma situação, para uma história e o poema nascia a partir daí. Os poemas tinham algum, pouco, trabalho de correção, mas tinham muito trabalho prévio à escrita. Pensava muito sobre o que queria escrever ou sobre a lógica do poema.

Nunca foi um poeta de impulsos?

Não. Sempre tive um caderno para anotar um ou outro verso, para fixar uma ideia, mas o poema era elaborado sobretudo na cabeça, juntando peças e encontrando um fio condutor. Se calhar a poesia foi-se afastando porque deixei de pensar nessa construção. Os poemas mais recentes tentam recuperar essa dimensão de narrativa, sempre a partir de situações concretas. A poesia para mim sempre foi uma coisa que requer muito tempo.

A prosa é mais fácil de pensar enquanto se escreve?

Nem por isso. A prosa também é um trabalho demorado. Ainda assim, sei perfeitamente quando estou a escrever prosa e quando estou a escrever poesia, mesmo quando esta é narrativa. O processo é sempre o mesmo, pensar longamente, mas a forma de entrar na prosa e na poesia são diferente. Não sei explicar muito bem.

Tanto num caso, como no outro, não sei se consigo estar à altura das expectativas que essa longa reflexão prévia cria. Mas quero sentir que pus no livro todo o trabalho possível que estava ao meu alcance. De outra forma, o livro torna-se, como disse há pouco, gratuito e sem sentido.

Há algum verso seu que resuma a sua abordagem à poesia?

O Jorge Luis Borges dizia que qualquer poeta medíocre tem dois versos bons. Eu também [risos]. No meu caso são: “Vou para casa esquecer que parti”. Escrevi para um sujeito poético que não sou eu, nem para as minhas circunstâncias. Mas é um verso que me diz muito. No início da Quasi, o Valter e eu falávamos muito de poesia.

A certa altura ele argumentava que poemas com a palavra casa são fáceis, porque é uma palavra, uma imagem e um espaço com muito significado. E tinha razão. É uma palavra linda que carrega tudo o que somos. E associá-la à ideia de alguém que quer esquecer que um dia partiu agrada-me particularmente.

Sempre tive um caderno para anotar um ou outro verso, para fixar uma ideia, mas o poema era  elaborado sobretudo na cabeça, juntando peças e encontrando um fio condutor

jorge reis-sá

A Google revela que o Android 15 vai chegar aos smartphones Pixel elegíveis nas próximas semanas, sendo que os restantes fabricantes terão de aguardar alguns meses. Antes disso, a tecnológica vai disponibilizar o código fonte para que os programadores possam começar a preparar as suas aplicações e assegurar a compatibilidade.

Entre as novidades do Android 15 estão um Private Space – uma porção do sistema operativo protegida para guardar informação sensível; a possibilidade de guardar as combinações de apps a partilhar ecrã para um acesso mais rápido; e a opção de fixar a barra de ferramentas permanentemente no ecrã.

O Android 15 vai estar disponível no Android Open Source Project, que dá aos programadores a informação e código necessários para criar versões personalizadas do Android OS. Esta versão vai permitir mais opções para melhorar a compatibilidade das aplicações e acessórios, com a Google a anunciar melhorias numa série de áreas, incluindo na experiência de utilizador, privacidade e segurança.

A Google vai organizar séries educativas chamadas Spotlight Weeks onde irá aprofundar temas técnicos com os programadores. Matthew McCullough, vice-presidente do Product for Android Developer, afirma que “o Android 15 continua a missão de construir uma plataforma privada e segura que ajuda a melhorar a produtividade, ao mesmo tempo que dá novas capacidades de produção de apps bonitas, experiências de media e câmara superiores e uma experiência de utilizador intuitiva, particularmente em tablets e dobráveis”, cita o Tech Crunch.

Numa outra publicação no blogue, a Google revela que que há também novas funcionalidades a chegar ao Android:

– Descrições detalhadas de imagens – o TalkBack, que lê o ecrã para pessoas cegas ou com pouca visão, vai ser alimentado por modelos do Gemini para fornecer descrições mais detalhadas das imagens;

– Circle to Search aplicado às músicas – identificar imediatamente a música que está a tocar, sem ter de sair da aplicação, invocando o Circle to Search;

– Ouvir páginas web – é possível ouvir as páginas abertas no Chrome, definindo a velocidade de dicção, tipo de voz e idioma;

– Expansão do sistema de alerta de sismos nos EUA, com tecnologia que fornece também dicas sobre o que fazer depois do terramoto;

– Explorar novas cidades com o Google Maps no relógio com Wear OS – descarregar um mapa para o telefone e depois ter acesso imediato a partir do relógio, para orientação sem ter de tirar o telefone do bolso, além de pesquisa de destinos por voz.

Prolongando a estação das Feiras do Livro, que animaram o país de norte a Sul, a Festa do Livro da Amadora tem a sua 9.ª edição nos dias 13, 14 e 15, na Biblioteca Municipal Fernando Piteira Santos, na Amadora.

Além de conversas, espetáculos, oficinas e um jantar literário, o encontro integra ainda as comemorações do 45.º aniversário da Amadora a concelho, o primeiro criado depois do 25 de Abril.

A festa arranca a 13, às 18 e 30, com uma conversa com Ana Markl e Hélder Gomes, seguida de um debate sobre “Criatividade e Humor em Tempos de Censura”, com Rui Cardoso Martins, Rita Taborda Duarte e Sara Figueiredo Costa. À noite, a partir das 20 e 30, o espetáculo “Sinfonia da Natureza” de Miguel Berkemeier.

A 14, o dia começa com a cerimónia de Entrega do Prémio Literário Orlando Gonçalves, às 11 e 30, com duas mesas com escritores à tarde: “Literatura Jovem Adulto”, com Daniela Rebocho, Diogo Simões e Raquel Almeida, às 16; e “Literatura e Redes Sociais”, com Bruno Leão, Filipa Fonseca Silva e Rita da Nova, às 17.

No último dia, 15, um debate sobre Banda Desenhada, com Filipa Beleza, Joana Afonso e Sandy Gageiro, às 16, e outro sobre Literatura Lusófona Atual, com Rafael Gallo, Tatiana Salem Levy e Luís Ricardo Duarte, às 17.

Entretanto, a Feira do Livro do Porto, uma iniciativa da câmara municipal, prolonga-se até ao próximo domingo, 8, nos jardins do Palácio de Cristal, com uma intensa programação cultural.

Poeta homenageado este ano, Eugénio de Andrade será ainda lembrado nas Quintas de Leitura, a 5, às 22, no Auditório da Biblioteca Almeida Garrett, com a participação de Pedro Mexia, Ana Zanatti, António Durães, Francisca Bartiotti e Emília Pimentel, entre outros.

Nas conversas entre escritores e artistas, também na biblioteca, destaque para “Descobrir Terreno”, com José Luís Peixoto, Marta Pais Oliveira e Daniela Dias Carvalho, a 6, às 17; “Rente ao Dizer”, com Teresa Lim, Mónica Garcez e Daniela Brito, a 7, às 15; ou “Sinédoque – Piano, Poesia e Outras Simbioses, com Ivo Canelas e João Vasco”, dia 8, às 15.

Nos concertos, refiram-se as participações no ciclo “É a Música, Este Romper do Escuro”, sempre às 19, na Concha Acústica, de Nunca Mates o Mandarim, a 4, Milhanas, a 5, Lina_, a 7, e Amélia Muge e Sopa de Pedra, a 8. Pelo Lago dos Cavalinhos passam ainda, às 11, Novas Trovas do Cancioneiro do Porto, a 7, e Luís Ribeiro com “A Invenção da Ficção”, a 8.

Em Lisboa, regressa também a Festa do Livro de Belém, promovida pela Presidência da República, e a APEL, de 5 a 8, nos Jardins do Palácio de Belém, em Lisboa. Participam 68 editores e livreiros, em 122 bancas,  representando 227 marcas editoriais.

Palavras-chave:

Estou em Viseu, num território de 12 hectares, onde para quer que caminhe e olhe vejo carvalhos (muitos com escaravelhos conhecidos como vacas loiras, indicadores de um lugar saudável), escuto águias e falcões acima de mim, e sinto com os pés um pequeno riacho de água límpida e saborosa que ainda corre durante o verão quente de 2024. Este território é nutrido por um casal guardião (e suas duas crianças) há cerca de 5 anos, e o seu projeto é conhecido por Origens. Começou com uma herança de família e tem crescido todos os anos com a compra de novos territórios para preservar o património natural que aqui existe.

Sinto alegria no meu coração quando, ao voltar para a minha caravana, olho para o pôr do sol e vejo as primeiras estrelas. E senti a vontade de escrever o primeiro de uma série de artigos sobre o caminho regenerativo que é fundamental acontecer em todos os lugares, territórios e comunidades, de Portugal, Europa e Mundo! No entanto, por decisão editorial e minha, este artigo vem agora trazer um pouco do que está por detrás do que eu e o Nuno da Silva temos a partilhar e tem sido publicado aqui na Visão a cada 15 dias.

Felizmente já há algum caminho feito em Portugal, com diversos projetos (como a Horta FCUL ou a Herdade do Freixo do Meio) focados nos sistemas socio-ecológicos (envolvendo a permacultura, agricultura regenerativa ou sintrópica, entre outras), fundos de investimento de impacto (como a 3XP Global) a apoiar projetos que vão além de reduzir impactos negativos e compensações através de algumas benfeitorias sociais ou ambientais, ou fundações (como a Fundação Terra Agora) que querem devolver à Terra o território e capacitar guardiões locais para desenvolverem o lugar de uma forma que se criem condições que as comunidades locais e os seus territórios prosperem.

Este ano (2024), a regeneração (com o tema da economia regenerativa trazida pelo John Fullerton) foi tema central da conferência da Business Council for Sustainable Development – Portugal. Por outro lado, a Presidência Belga da UE solicitou um primeiro estudo sobre como evoluir as suas políticas e apoios financeiros para ir além da sustentabilidade, e começar a enveredar por um caminho regenerativo. Ao nível da formação destas temáticas em Portugal, a Universidade Católica do Porto, com a Pós Graduação em Sustentabilidade e Regeneração, já refere o conceito de regeneração e tem criado curiosidade nos seus participantes por um aprofundamento neste tema. Na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, estão abertas inscrições para uma pós-graduação sobre como Transcender a Sustentabilidade, na direção do Desenvolvimento Regenerativo, que é a capacidade de pensarmos, sermos e agirmos mais alinhados com os sistemas vivos, permitindo uma maior viabilidade das organizações e sistemas às quais pertencem.

Num outro formato, e em forma de celebração, durante Setembro, entre os dias 11 e 15, irá decorrer um grande encontro em Ponte de Lima, designado de Gathering of Tribes, onde participarão vários dos promotores nacionais e mundiais de projetos regenerativos, como empresas, ecoaldeias, projetos agroecológicos, turismo rural, coworking, educação, artisticos, entre outros. O objetivo é estarem juntos, partilhar experiências e cocriarem um futuro regenerativo.

Einstein deixou-nos um alerta importante: tentar encontrar soluções no mesmo nível de paradigma de pensamento que criou os problemas, não é uma possibilidade válida. Temos tentado fazer isso durante as últimas décadas e temos criado apenas uma maior crise sistémica, que cresce no espaço (afastando cada vez para mais longe as externalidades negativas) e no tempo (vivendo de um crédito que deveria ser o sustento e prosperidade das futuras gerações). O Stockholm Resilience Institute, instituição reconhecida mundialmente, já declarou em 2023, num estudo, que sem transformar o paradigma societal em que vivemos não vamos atingir mais de 11 dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em 2030, e nem mesmo em 2050. Por outro lado, a tentativa de atingir os 17 ODS, mantendo o business as usual, só nos irá levar a ultrapassar mais barreiras planetárias (atualmente já ultrapassamos 6 das 9 consideradas), como levará outras para zonas bem vermelhas (e perigosas), habitando nós numa Terra bem fora da zona operacional segura para a humanidade.

No entanto, como qualquer sistema vivo, emergem diversas tentativas de fazer o sistema ver-se a si próprio e de o capacitar a evoluir. Recentemente, foram criados e promovidos os Objetivos do Desenvolvimento Interior, que tem como propósito tornar claro que sem mudança interna não iremos atingir nenhuma sustentabilidade, muito menos regenerar os diversos sistemas dos quais fazemos parte.

Os povos indígenas contam que o afastamento da cultura ocidental da relação com a natureza, não só adoeceu os nossos corpos e espíritos, como nos afastou de uma forma de pensar, ser e agir alinhada de como os sistemas vivos realmente funcionam. E que esse afastamento é o que tem causado a crise sistémica e planetária onde nos encontramos. A citação de Gregory Bateson de que “Os principais problemas do mundo se devem à diferença entre a forma como a natureza funciona e a forma como as pessoas pensam” torna nítida esta tensão e suas consequências.

O conceito de pensamento de sistemas vivos surgiu nas décadas de 1950 e 1970, com pioneiros como Ludwig von Bertalanffy, que introduziu a Teoria Geral dos Sistemas em 1968. Outros pesquisadores, como Gregory Bateson e Howard T. Odum, integraram cibernética e ecologia. Nos anos 1970, o Instituto de Santa Fé tornou-se importante para estudos de sistemas complexos, e Fritjof Capra destacou-se com o livro “A Teia da Vida” (1996). Recentemente, autores como Daniel Wahl (“Design de Culturas Regenerativas”) e Leen Gorissen (“Natural Inteligence”) forneceram visões contemporâneas, promovendo uma profunda integração entre sistemas naturais e humanos. Daniel Wahl apresenta no seu livro um diagrama que torna bem claro e distintivo o que no dia-a-dia reduzimos a ações sustentáveis e não sustentáveis, dando-nos uma maior resolução e compreensão dos diferentes níveis existentes, permitindo uma maior reflexão sobre onde (e de/para onde) estamos a agir.

Ilustração de Design de Culturas Regenerativas, Bambual 2020

A ilustração mostra as diferentes mudanças de perspetiva à medida que nos movemos do business as usual (em baixo) para uma cultura regenerativa (acima). A maioria das ações das grandes organizações na Europa está no nível convencional, dado que seguem as legislações nacionais e europeias, ou o trend do mercado, como a não utilização de determinados componentes tóxicos ou não poder descarregar poluentes nos rios ou exportá-los para países com legislações mais fracas do ponto de vista de saúde humana e ambiental. Algumas organizações vão mais além implementam melhorias que tornam mais eficientes os produtos, ou a utilização de uma maior percentagem de material reciclado, entre outros. A sustentabilidade, atualmente, perdeu a sua força de pensar na consequência dos atos presentes nas próximas sete gerações, deixando-lhes um mundo viável, para a mera capacidade de sustentar o que existe (zero impacto negativo, ou pelo menos compensados por outros impactos positivos).

O objetivo de culturas regenerativas transcende e inclui sustentabilidade. O design restaurativo visa reconstruir a autorregulação saudável em ecossistemas locais, e o design reconciliatório dá o passo adicional de tornar explícito o envolvimento participativo da humanidade nos processos da vida e na união entre natureza e cultura. O design regenerativo cria culturas capazes de contínuas aprendizagens e transformações em resposta, e antecipação, à mudança inevitável. Culturas regenerativas salvaguardam e aumentam a abundância biocultural para as futuras gerações da humanidade e para a vida como um todo.

Carol Sanford e o Regenesis Group têm aprofundado, ao longo de mais de 40 anos, formas de promover a evolução de pensamento em comunidades de prática, quer comunitárias quer em organizações. Carol Sanford apresenta quatro paradigmas que podem ser utilizados para melhor compreendermos e distinguirmos os diferentes pensamentos, formas de ser e ações que vemos atualmente no mundo à nossa volta. O primeiro paradigma de pensamento, Extração de Valor, permite aos líderes o direito de maximizar os recursos humanos e materiais, utilizando trabalhadores como partes de uma máquina com foco em contratos transacionais e gerir comportamentos adequados. O segundo paradigma, Combate à Desordem, aplica o método científico para reduzir problemas, tratando as pessoas como entidades mecânicas que necessitam de intervenções externas para melhorar o desempenho, priorizando padrões e promovendo boas práticas. O terceiro paradigma, Fazer o Bem, fundamenta-se em normas culturais e morais para determinar o valor do trabalho, focando-se na filantropia, voluntariado e impacto positivo, com ênfase na restauração ambiental e conservação dos sistemas sociais e/ou naturais. O quarto paradigma, Evoluir Capacidades/Regenerar a Vida, promove o desenvolvimento contínuo das capacidades das organizações, seus colaboradores e ecossistemas, incentivando comunidades e indivíduos a serem saudáveis e evoluírem, potenciando a sua essência única.

Sinto-me contente por fazer parte de um movimento em Portugal, que reflete, testa e evolui a sua forma de pensar, ser e agir de uma forma mais alinhada com os sistemas vivos.

Para ancorar, no momento presente está a ser lançada a cooperativa Lúcida, que tem como objetivo promover o evoluir destes paradigmas de pensar, ser e agir nas comunidades e organizações em Portugal. Desde 2020 que os seus cooperantes promoveram na Europa mais de 5 cursos na área do Desenvolvimento Regenerativo e capacitando mais de 60 praticantes que vivem atualmente em Portugal, fora os restantes 110 participantes espalhados pela Europa.

Tal como o impulso da Vida é permanente, tendo já ultrapassado 5 extinções em massa, é nosso papel conseguir evitar a 6ª extinção em massa, e apoiar a humanidade, em relação com o planeta Terra, a evoluir para um novo equilíbrio dinâmico, alinhado com a forma como a Vida opera neste planeta.

Onde há vida, há esperança e vontade!!!

Palavras-chave:

Liderado pelo paleontólogo português Pedro Mocho, do Instituto Dom Luiz da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, o estudo que acaba de ser publicado na revista científica Communications Biology resultou na descoberta de uma nova espécie de dinossauro saurópode que viveu em Cuenca, em Espanha, há 75 milhões de anos.

Os fósseis do Qunkasaura pintiquiniestra fazem parte de um conjunto de mais de 12 mil recolhidos desde 2007 7 durante as obras para a instalação das vias do comboio de alta velocidade (AVE) Madrid-Levante, uma das coleções de vertebrados fósseis mais relevantes do Cretáceo Superior da Europa.

“O estudo deste exemplar permitiu-nos identificar pela primeira vez a presença de duas linhagens distintas de saltassauroides na mesma localidade fóssil. Um destes grupos, denominado Lirainosaurinae, é relativamente conhecido na região ibérica e caracteriza-se por espécies de pequeno e médio porte, que evoluíram num ecossistema insular. Ou seja, a Europa era um enorme arquipélago composto por várias ilhas durante o Cretáceo Superior. No entanto, Qunkasaura pertence a um outro grupo de saurópodes, representado na Península Ibérica por espécies de médio-grande porte há 73 milhões de anos. Isto sugere-nos que esta linhagem chegou à Península Ibérica muito mais tarde do que outros grupos de dinossauros”, explica Pedro Mocho, investigador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Processo de restauração de parte dos restos de Qunkasaura. @GBE-UNED

O Qunkasaura pintiquiniestra destaca-se por ser um dos esqueletos de saurópode mais completos encontrados na Europa – inclui vértebras cervicais, dorsais e caudais, parte da cintura pélvica e elementos dos membros.

Os dinossauros não-avianos da Península Ibérica são um grupo historicamente pouco compreendido, como explica, em comunicado, a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, acrescentando que a descoberta, pela morfologia única da espécie, oferece novas perspetivas sobre o grupo.

O Qunkasaura é identificado como um representante dos saltasaurídeos opisthocoelicaudinos, presentes no hemisfério norte (Laurásia). O nome é o resultado de várias referências geográficas e culturais próximas à jazida de Lo Hueco: “Qunka” refere-se à etimologia mais antiga do topónimo da área de Cuenca e Fuentes, “Saura” alude ao feminino do latim saurus (lagarto), mas também homenageia o pintor Antonio Saura, e “pintiquiniestra” faz referência à gigante “Rainha Pintiquiniestra”, personagem de um romance citado em Dom Quixote de la Mancha de Cervantes.

É mesmo possível ter o melhor de dois mundos? A Microsoft acredita que sim, motivo pelo qual continua a apostar no formato 2 em 1 com o Surface Pro 11, prometendo combinar o desempenho de um portátil com a flexibilidade de um tablet. Sendo este um dos novos modelos Copilot+PC, desenvolvidos para tirar maior partido da IA, as grandes novidades estão no interior.

Desempenho e ‘inteligência’

Ao contrário do que aconteceu em gerações anteriores, com a Microsoft a disponibilizar versões do Surface Pro equipadas com processadores Intel e outras com processadores de arquitetura ARM, desta vez, a gigante tecnológica aposta todas as suas fichas na segunda categoria. O processador Snapdragon X, que chega em duas versões (Plus, de 10 núcleos, e Elite, de 12 núcleos) promete um desempenho ultrarrápido, além de impulsionar as funcionalidades de IA do Windows 11.

O modelo que experimentámos tem um processador Snapdragon X Elite e ecrã OLED: pormenores que, em combinação com 16 GB de RAM e 512 GB de armazenamento interno, fazem o preço ‘escalar’ para 1829 euros – e, não, esta não é a versão mais cara. Na versão de entrada, com preços a começar nos 1229 euros, o processador é trocado pela versão Plus e o ecrã passa a LCD.

O desempenho é, aliás, uma categoria onde não temos grandes queixas. O Surface Pro 11 ‘brilha’ no que toca à produtividade, com as aplicações que usamos para trabalhar a abrirem rapidamente, mantendo o bom desempenho em modo multitarefa. O mesmo se aplica à navegação online, em particular, no Edge, onde o nosso hábito de ter demasiados separadores abertos não fez ‘mossa’. Mas deixamos um aviso à navegação: existem aplicações que ainda não têm versões compatíveis com sistemas de arquitetura ARM, o que se pode traduzir em falhas ou, então, em programas que simplesmente não funcionam.

Num dispositivo concebido principalmente para a produtividade e criatividade, os jogos são uma questão complicada. Com isto não queremos dizer que é impossível jogar no Surface Pro 11, e até nos conseguimos divertir com alguns títulos mais causais, mas está longe de ser uma alternativa à experiência num computador dito convencional.

A IA é outra das grandes apostas da Microsoft, com funcionalidades como o Cocriador no Paint, legendas em tempo real ou efeitos para otimizar as videochamadas, às quais se juntam a inclusão do Copilot no Windows, com direito a uma tecla dedicada no teclado que acompanha o Surface 11 Pro. Note-se, no entanto, que as capacidades do assistente estão, para já, ‘limitadas’ às da versão online.

Apesar do potencial que apresentam, a utilização nem sempre se revelou tão prática (ou eficaz) quanto o esperado. Por exemplo, com o Cocriador, o Paint ganha um ‘ajudante’ criativo, gerando imagens a partir de desenhos e descrições de texto. A criatividade do sistema pode ser ajustada consoante as suas preferências e há até a possibilidade de adicionar efeitos de estilo. No entanto, os resultados nem sempre são convincentes, sobretudo quando puxamos o nível de criatividade ao máximo.

Surface Pro 11 - Cocriador Paint
Os resultados obtidos através do Cocriador podem ser, por vezes, estranhos quando o nível de criatividade está no máximo.

Nos Efeitos de Estúdio para as vídeochamadas podemos encontrar algumas opções úteis, como ajustes na luminosidade e no desfoque do ‘pano de fundo’, ou o enquadramento automático, que segue os movimentos do utilizador. Por outro lado, a opção concebida para fazer com que os nossos olhos se mantenham alinhados com a câmara nem sempre funcionou durante os nossos testes. Os filtros criativos ajudam a dar um toque certamente diferente às chamadas, mas podem não ser a melhor opção para ocasiões em que o ‘tom’ é mais profissional.

Na maioria dos casos, as legendas em tempo real funcionam como prometido, mas ainda não é possível aproveitar totalmente a funcionalidade de tradução para outras línguas além de inglês. Note-se também que, embora faça parte do leque de funcionalidades anunciadas, a Recall (ou Lembrança, em português), que funciona como uma espécie de ‘memória fotográfica’ do Windows 11, ainda não está disponível.

OLED? Oh wow!

Por fora, contamos com o design e qualidade de construção que a Microsoft já nos habituou. Equipado com uma estrutura em alumínio que lhe dá um aspeto elegante, o Surface Pro 11 é leve, mas sem ser frágil. O suporte Kickstand traz mais flexibilidade à experiência, permitindo ajustar facilmente a posição e alternar entre diferentes modos de utilização. Apesar das opções de conectividade física mais limitadas, a unidade SSD continua a ser amovível, o que facilita a sua substituição.

O novo ecrã OLED oferece uma ótima experiência de visualização, seja para o trabalho como para o lazer. As cores são vibrantes sem serem artificiais, o que é importante para quem planeia dedicar-se a tarefas mais criativas. Apreciamos também o bom nível de contraste e a profundidade dos tons de preto. O brilho também se destaca pela positiva e a taxa de atualização de 120 Hz torna a navegação dinâmica. 

Clique nas imagens para ver o Surface 11 Pro com mais detalhe

O ecrã responde rapidamente aos toques, mas sentimos uma versão tátil do Windows 11 requer um tempo de habituação. É certo que algum nível de otimização para este modo de utilização, porém não ao ponto de tornar a experiência tão eficiente quanto num tablet ‘a sério’.

Aqui, acessórios como o estilete Surface Slim Pen e o teclado/capa (vendidos separadamente) são quase indispensáveis, apesar do preço elevado. Por exemplo, a versão do teclado já acompanhada pelo estilete custa 329,99 euros. Ter um teclado físico assegura uma escrita muito mais confortável e até consideramos que esta opção deveria estar incluída no pacote…

Surface Pro 11 acessórios
Teclado Flex para o Surface Pro acompanhado pelo estilete Surface Slim Pen

Por fim, deixamos uma nota relativamente à autonomia. Nos testes de desempenho o Surface Pro 11 conseguiu alcançar mais um pouco mais de 14 horas de autonomia. Num cenário de trabalho mais intenso, os valores descem, rondando, em média, oito horas. O carregamento é rápido e eficiente, ajudando a dar aquele ‘boost’ de energia nos momentos em que mais precisamos.

Tome Nota
Surface Pro 11 – €1829
microsoft.com/pt-pt

Benchmarks Benchmarks PCMark 10 Applications: 10523; Word 6405; Excel 19425; PowerPoint 9158; Edge 10762 • 3DMark: Wild Life 16049  • Night Raid 22 861 • Solar Bay 9808; Time Spy 1835 • Geekbench 6 Single/Multi 2045/12574 • GPU 20731 • Geekbench ML 2874 • Final Fantasy XV (FHD, Standard) 3688 • Cinebench 2024 Single/Multi 103/552 (MP 5.38x) • Autonomia (PCMark 10 Applications) 14h20 min

Ecrã Excelente
Produtividade Muito Bom
Criatividade Muito Bom
Autonomia Muito bom

Características Ecrã OLED PixelSense Flow de 13” (2880 x 1920) • CPU Snapdragon X Elite (12 Núcleos); GPU Qualcomm Adreno; NPU Qualcomm Hexagon • RAM LPDDR5x de 16 GB; SSD de 512 GB • Wi-Fi 7; Bluetooth 5.4 • 2x portas USB-C/USB4 • Windows 11 • 287x209x9,3 mm; 895 g 

Desempenho: 4
Características: 4
Qualidade/preço: 3

Global: 3,7

1. Cama de Gato

Kurt Vonnegut 

Reedição de um clássico capaz de despertar e desconcertar até o mais fleumático dos leitores banhistas, Cama de Gato é uma parábola sobre o fim do mundo que, como é usual nos livros de Kurt Vonnegut, ressoa de uma maneira ou de outra na contemporaneidade. Agilidade narrativa, cenas absurdas, cenários bizarros, humanismo e humor ácido, há de tudo nesta história do jornalista Jonas, engolido pela baleia da sua investigação sobre a catástrofe atómica de Hiroshima: ele acabará na fictícia ilha de San Lorenzo, onde encontra a próxima arma de destruição apocalíptica, com o enigmático nome de gelo-nove, e a religião ilegal do bokonismo…  Alfaguara, 288 págs., €19,95 

2. Eu Canto e a Montanha Dança

Irene Solà 

Há livros transformadores que se leem num par de horas. É o feliz caso desta obra de uma poeta e artista plástica catalã nascida em 1990, que resiste à catalogação estilística fácil e ao esquecimento. Eu Canto e A Montanha Dança é uma viagem intensa e jubilosa ao mundo rural, que nada tem que ver com a leveza do campo imaginado na modorra das segundas casas. Irene Solà avança por um mundo “primogénito” e misterioso nos Pirenéus catalães, carregado de mitologias, como a que funda um episódio inicial: o camponês Domènec é fulminado ao meio “como se fosse um coelho” por um raio, quando tentava libertar um bezerro numa cerca, cumprindo a profecia local de que, a cada dez anos, alguém assim encontra o seu fim. Os narradores deste acidente são as nuvens, elementos de um coro polifónico inusitado que inclui humanos, bruxas, cogumelos trombetas-dos-mortos, ursos e até montanhas dotadas de vozes filosóficas (que, aqui, têm ilustrações subtis). Que bom que o mundo ainda é um lugar profundo.  Cavalo de Ferro, 192 págs., €16,45 

3. A Maior Mulher Moderna do Mundo

Susan Swan 

É Olga Tokarczuk que prefacia esta “autobiografia” ficcional sobre uma mulher que desafia as leis patriarcais apenas com o seu aspeto físico: é uma “giganta de sangue quente, vivípara e conífera”, contando mais de dois metros de altura num mundo despreparado para figuras não normativas; logo, disposto a atitudes anãs. Baseado numa história verídica, o livro, maravilhoso, faz-nos escutar Anna Swan a retratar o seu quotidiano desproporcionado com desassombro e tragicomédia. E se ela revela o fenómeno dos freak shows do século XIX, é também e curiosamente, sublinha a autora agraciada com o Nobel, uma emancipada por via da celebridade.  Tinta-da-China, 464 págs., €23,90 

4. Pobres Criaturas

Alasdair Gray 

Perguntar-se-ão os mais indolentes, perdão, os mais céticos, se vale a pena ler uma história que já se viu adaptada ao ecrã de cinema. Bem, perderiam uma leitura desopilante, que explora a narrativa além dos créditos finais, traz mais ambiguidade sobre o que depois acontece à protagonista aventureira e apresenta uma organização lúdica do objeto-livro, que aqui inclui ilustrações e apontamentos gráficos, cartas dos personagens, rodapés, curiosidades, alfinetadas, anotações fictícias. Uma parafernália narrativa para recriar irreverentemente um velho mito: a criação, e a educação sentimental e intelectual, de Bella Baxter, rapariga de 25 anos criada com partes de criaturas falecidas.  Cultura Editora, 320 págs., €18,50 

No início deste Verão faleceu o grande teólogo alemão Jürgen Moltmann com 98 anos. Philip Yancey diz que o dia da sua morte é uma das ironias da história, pois este antigo soldado, quando ainda era adolescente partiu “na mesma semana em que o mundo comemorou o 80º aniversário do Dia D, a invasão das tropas aliadas no Norte de França e que viria a garantir a derrota do seu país na II Guerra Mundial”. Para reforçar ainda mais esta ironia, Moltmann – que é reconhecido como “o teólogo cristão mais lido dos últimos 80 anos” – fica lembrado pela sua “teologia da esperança”, que desenvolveu num campo de prisioneiros de guerra.

Aos dezasseis anos Moltmann queria ir para a universidade e formar-se em física quântica, mas o sonho foi interrompido subitamente quando toda a sua turma foi convocada para o serviço militar no apoio às baterias antiaéreas que defendiam Hamburgo. Foi nessa altura que ficou chocado com as hordas da aviação aliada que bombardeou a cidade provocando quase 40 mil baixas só de civis.

O jovem Moltmann tomou contacto pela primeira vez na vida com os horrores da guerra. Viu os seus colegas e amigos serem trucidados e queimados e ele próprio só conseguiu sobreviver agarrado a um pedaço de madeira num lago cercado pelo fogo. Rodeado de cadáveres questionou-se: “Onde está Deus?”, “Por que razão estou vivo?”

Chegado à linha da frente percebeu claramente que os mancebos recrutas alemães mal treinados eram atirados para o teatro de guerra apenas como carne para canhão, a fim de adiar por mais algum tempo a derrota final nazi.

Por isso rendeu-se aos britânicos e passou o resto da guerra como prisioneiro. Quando o Terceiro Reich acabou Moltmann observou com grande tristeza como alguns prisioneiros alemães colapsaram, devido à perda da esperança, e por causa disso adoeceram e morreram.

Sem formação religiosa o jovem tinha levado para a guerra apenas poemas de Goethe e obras de Nietzsche, mas isso não lhe devolveu esperança.

Entretanto, quando estava preso recebeu um exemplar do Novo Testamento e Salmos oferecido por um capelão americano. Um dia leu: “Se subir ao céu, lá tu estás; se fizer no inferno a minha cama, eis que tu ali estás também” (Salmo 139:8).

Afinal Deus poderia estar presente naquele lugar escuro? Não tinha o próprio Jesus clamado no Calvário: “Meu Deus, por que me desamparaste?” Por fim Moltmann entendeu que Deus estava presente por detrás do arame farpado, mas também encontrou esperança, a mesma que mais tarde o levou a desenvolver a sua “teologia da esperança”.

Portanto, foi enquanto prisioneiro de guerra que Moltmann descobriu a fé. Mais do que isso, descobriu um Deus solidário que se faz presente no sofrimento humano e que nele desencadeia a esperança. Ela não é só a última a morrer, é sobretudo uma força poderosa que nos mantém vivos.

Foi a esperança da libertação que transformou a vida quotidiana de Moltmann naquele campo de prisioneiros, estimulada pela fé num Deus que prometeu fazer novas todas as coisas. Ele observou atentamente a humanidade dos trabalhadores escoceses do campo e até um cerejeira dar flor. Às vezes as pequenas coisas fazem-nos entender que afinal a vida vale a pena.

A teologia de Moltmann debruça-se sobre o Deus que se faz presente no sofrimento e a sua promessa de um futuro melhor. Ele pensava que, se Jesus tivesse vivido durante o Terceiro Reich, muito provavelmente teria sido enviado com outros judeus para as câmaras de gás.

Numa frase, o autor de O Deus Crucificado expressa o grande período entre a Sexta-Feira Santa e a Páscoa. Na verdade, é um resumo da história humana, entre o passado, o presente e o futuro: “Deus chora connosco para que um dia possamos rir com ele”.

Não foi só Moltmann que soube transformar a sua visão de Deus e do mundo quando mergulhado em situação de desespero. Também o neuropsiquiatra austríaco Victor Frankl o fez. O facto de ter estado prisioneiro num campo de concentração nazi levou-o a desenvolver a Logoterapia, a terapia do sentido da vida.

É que a vida pode e deve ter sempre um sentido.

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Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.

Rodrigo Areias recebe-nos na Quinta dos Encados, a sudeste de Guimarães, propriedade que o avô Armando adquiriu, onde se produz um vinho verde multipremiado. Do cimo do monte, vê-se vinha sem fim, na paisagem intensamente verde que caracteriza o Alto Minho.

Não muito longe dali, a freguesia da Nespereira, fica a Casa do Alto, onde Raul Brandão viveu e escreveu grande parte da sua obra. Foi essa proximidade geográfica e afetiva que provocou um fascínio inicial do realizador pela sua obra, que é tão local quanto universal.

Há muito que Rodrigo Areias faz de Guimarães o centro do seu mundo e também um importante polo de produção cinematográfica no país, através da produtora Bando à Parte, que conta com largas dezenas de filmes no catálogo.

O truque, segundo explica, é a detenção dos meios de produção e a formação de uma equipa fixa, com quem trabalha filme após filme. Não só nas suas próprias obras, como as de muitos outros, como Edgar Pêra, Eduardo Brito, Carlos Amaral ou Pedro Maia.

O próprio Rodrigo Areias também realizou uma dezena de longas, dos géneros mais diversificados, sendo que a última delas, O Pior Homem de Londres, foi produzida por Paulo Branco.

A Pedra Sonha dar Flor baseia-se em A Morte do Palhaço, mas passa por diferentes livros de Raul Brandão, com grande fidelidade ao texto. É um filme de narrativa difusa, com grande profunidade literária  e filosófica, que ganha coerência através de elementos cinematográficos.

A começar pela fotografia de Jorge Quintela, que tira o melhor proveito da região da Ria de Aveiro e também da expressividade dos rostos dos atores (António Durão, Vítor Correia, Miguel Borges, entre outros). A isto junta-se a música de Dada Garbeck, sendo que o músico vimaranense tem interpertado a banda sonora original em cineconcertos.

“A Pedra Sonha dar Flor”, de Rodrigo Areias, Adaptação de “A Morte do Palhaço”, de Raul Brandão

De onde vem a paixão por Raul Brandão?

Rodrigo Areias: Há um lado muito vimaranense, de pertença à nossa comunidade, pois toda a vida de adulto e a produção literária de Raul Brandão foi feita aqui. Eu cresci na Polvoreira e a casa do Alto, onde viveu o Raul Brandão, é mesmo ali ao lado, na freguesia da Nespereira. Isso por si só suscita curiosidade. Apesar da literatura ser universal, ele está a falar de coisas de forma muito local, que reconheço como minhas. O primeiro livro que li foi A Farsa e pensei: “Uau, o que é que é isto?”

Foi a partir desse fascínio que surgiu a ideia do filme?

Havia várias pessoas à minha volta que partilhavam o fascínio pelo Raul Brandão. O Pedro Bastos, que escreve o argumento, tinha um conhecimento elevado sobre a sua obra, e o Eduardo Brito, também argumentista, foi responsável pelo transporte do espólio do Raul Brandão da Torre do Tombo para a Sociedade Mateus Sarmento. A verdade é que começámos por querer fazer um documentário sobre o Raul Brandão, depois passou a ser sobre  o Hálito Azul e finalmente  sobre A Morte do Palhaço, que resulta neste A Pedra Sonha dar Flor.

Tem muitas obras lá misturadas.

Faz sentido que assim seja, depois de conhecer por dentro a obra do Raul Brandão. Por exemplo, o Avejão como peça de teatro é uma versão estendida da cena do Senhor Gregório, de A Morte do Palhaço. Há muitos exemplos, de personagens que vão saltando, como o Pipa, e isso cria-te uma curiosidade sobre os próprios personagens. A estrutura de A Morte do Palhaço tem interesse, é um livro casca de cebola, camada atrás de camada. Muitas vezes tínhamos discussões sobre quem está a dizer a frase.

O universo de Raul Brandão por vez é bastante, pesado, quando fala de questões existenciais, tabus e tragédias…

Se passamos a vida inteira a acreditar em algo que, no final, percebemos que não existe, que vida é esta, afinal? Coloca-se sempre à prova aquele que viveu com Deus. Há também um lado de exposição da religião, e da forma como os padres se colocavam em termos sociais e económicos. Isso revela uma grande coragem, estamos a falar da década de 20 do século passado. 

Coloca-se sempre à prova aquele que viveu com Deus. Há também um lado de exposição da religião, e da forma como os padres se colocavam em termos sociais e económicos. Isso revela uma grande coragem, estamos a falar da década de 20 do século passado

rodrigo areias

Mantiveste-te fiel à crueza do livro?

Quase sempre. Senti necessidade amenizar a questão das prostitutas, porque nos textos de Raul Brandão é muito mais visceral, duro, violento. Quando a Luísa se vai suicidar no rio é de uma violência grande. Um texto incrível, que pode não ter uma relação direta com a realidade, mas as pessoas acabam por perceber.

Até que ponto tudo o que se ouve é tirado dos livros do Raul Brandão?

Quis mesmo que o texto fosse todo dele, mesmo que retirando de livros diferentes. Isso é uma mais-valia para o filme. Cria alguma densidade e distanciamento, mas é fundamental para ser justo para com o autor.

Há de facto um distanciamento. Apesar da sucessão de tragédias, estamos perante um mundo que não é o nosso, uma espécie de ambiente idílico, mas ao contrário…

O que ajuda na abstração é não ter um tempo. A época é híbrida, às vezes parece que estamos nos anos 80, mas não há a certeza. Isso é das coisas que gosto mais de fazer, esbater o tempo, para que não torne importante.

Até porque há um circo….

E há artistas de circo a entrarem no filme. Era importante trazer elementos da realidade das artes circenses, hoje em fim de ciclo, porque isso também representa um fim de ciclo naquela obra.

Apesar de não existir uma narrativa linear, o filme é fluído. O que lhe dá consistência?

Coexistem no mesmo espaço. Vem por exemplo no cenário da ria. Aparece, não só porque tenho um fascínio por aquela paisagem, mas também porque é abordada em Os Pescadores. A personagem do ladrão, que entra em várias obras, no final está a falar sobre a ria, como uma divindade.

Toda a riqueza daquele território é canalizada pela água. É algo fora do real. Sempre me fascinou aquelas casas em ilhas, no meio da ria. Um princípio de isolamento, mas em que a água também transforma as pessoas. Filmámos a Aveiro, Ovar, Estarreja e Águeda.

O trabalho fotográfico é quase emoldurável. Como foi feito?

Criei regras de enquadramento. Resolvi ser geométrico. Tinha escalas, lentes, distância e aplicava a regra. Mais por experiência de linguagem. Aquilo propicia todo um lado de fotografia, de expansão do território, de beleza da paisagem, de infinito, de plenitude.

No fundo, isso ajuda na homogeneização narrativa. Porque as pessoas estão enquadradas naquele espaço. Há um personagem que se revela contra o autor do livro e eu acho isso maravilhoso.

A música também cria grande coerência e o filme tem tido apresentações com música ao vivo. Porquê?

Faço isso desde sempre. Vou trazendo experiências musicais diferentes, ainda que o Legendary Tigerman esteja mais presente do que os outros. Julgo que é muito importante a utilização da música de forma a atingir o novo público, uma outra ideia de espetáculos. Tem resultado bem. No Surdina, o público dos cineconcertos foi muito superior.

Musicalmente o que procuraste neste filme?

Aqui volta-se mais às minhas origens, com um só músico, apesar do trabalho de coros do Rui. Ele foi buscar o canto  às almas, que faz parte da nossa tradição. Também cria uma coesão forte.

Fazes sempre filmes muito diferentes. Que pontos encontras em comum entre A Pedra Sonha dar Flor e O Pior Homem de Londres?

Têm ambos um ponto de partida clássico, mas o outro vem da pintura e este da literatura. Saber que ia fazer este filme também me ajudou a fazer o outro. Já sabia que este ia ser mais difícil, duro e radical, e isso permitiu que o outro fosse mais acessível.

A maior diferença talvez seja mesmo que O Pior Homem de Londres não foi produzido por ti…

A equipa acaba por se manter sempre muito parecida de filme para filme. Até em O Pior Homem de Londres aconteceu, apesar de não ser produzido por mim. É um grupo de pessoas tem a intenção de fazer muitos filmes. Um grupo multifacetado.

As pessoas que trabalham fazem muitas coisas noutras áreas, não são profissionais do cinema. Esta coisa do profissional do cinema é que começa a complicar o sistema criativo, que é quando consideram quer não podem trazer nada de criativo para cima da mesa porque são técnicos.

A minha intenção é manter esse sistema sempre ativo: em que uns trabalham nos filmes dos outros, nem sempre nas mesmas funções.

É um pouco a lógica do Fassbinder, que trabalhava com uma equipa fixa, como se fosse uma companhia de teatro…

Sempre vi no Fassbinder um exemplo. Alguém que fez as coisas até ao limite. Consigo fazer isso do ponto de vista do produtor. Produzimos filmes aos montes, porque criámos uma escala de produção hiper independente. A detenção dos meios de produção permite o ato revolucionário de não parar de criar.

Não sendo sempre eu o realizador, queremos criar as condições para que o ímpeto criativo não seja atropelado por outra coisa. Nisso identifico-me pelo Fassbinder. Não com os seus filmes que são muito diferente, embora admire bastante.

Produzimos filmes aos montes, porque criámos uma escala de produção hiperindependente. A detenção dos meios de produção permite o ato revolucionário de não parar de criar

rodrigo areias

Quantos filmes têm em mãos?

São sempre cerca de 20. Queremos dar espaço para que cada um produza os seus filmes. Por exemplo, o Pedro Bastos está a fazer um filme em 35 mmm com uma câmara à manivela… O Quintela anda a filmar bruxaria em São Tomé. E o cinema aqui neste território consegue dinamizar outras artes. Aparecem editoras de poesia como a Cutelo, do Rui Dias, que também trabalha coo assistente de câmara

Tudo isto em Guimarães…

Estamos sediados num centro cultural. Quando chegámos lá nem paredes tinha. Chove lá dentro, mas não saímos de lá nem por nada. É um centro cultural punk, que reconstruímos das cinzas. Não é em sofás de couro que vamos gastar o nosso dinheiro.

Tenho que criar condições técnicas para fazer os filmes e sobretudo condições de vida para todos aqueles que trabalham comigo. Não produzimos filmes, mas sim pessoas. Unimo-nos para nos manifestar artisticamente, mas no final queremos todos beber cerveja e comer bifanas.

Em comunicado, o Ministério da Administração Interna (MAI) esclarece que, ao contrário do que foi noticiado, “não corresponde à verdade que as câmaras de videovigilância, do edifício que sofreu a intrusão, estivessem avariadas ou desligadas, na altura da intrusão, já que estavam a funcionar normalmente e as imagens eram visíveis no respetivo posto de controlo”, apesar de a PSP ter demorado várias horas a detectar a ocorrência.

“Havia uma falha na gravação de imagens que é uma coisa distinta do que vem sendo propalado por várias fontes não fidedignas, mas que não impediram a identificação do suspeito e a sua, agora, detenção”, lê-se.

Segundo o jornal Público, para a identificação do suspeito do crime foram essenciais vídeos feitos pelo pessoal que estava na trabalhar na obra do edifício contíguo por cujos andaimes o homem de 39 anos terá acedido ao local e também as gravações feitas pelas câmaras de segurança de outros prédios à volta.

O MAI adianta ainda que dois oito computadores desaparecidos do edifício na Rua de São Mamede, em Lisboa, assaltado na madrugada de dia 28 de agosto, só dois estavam a uso e que os restantes eram “computadores de reserva/substituição”. Em “ambos os casos, seja nos computadores de reserva/substituição, seja no caso dos dois computadores que estavam a uso, não existiu, nem existe, qualquer risco de acesso a qualquer informação e ou documentos, confidenciais ou não”, acrescenta o comunicado.

Os “computadores furtados eram meros terminais de acesso a informação sediada em servidor e, logo, não acessível apenas com o computador, sem acesso à mesma. Ainda, assim, estes computadores não estavam, nem estiveram, ligados, nem tem acesso, a informação classificada ou de relevância”, segundo o MAI.

Na sequência da investigação, a PSP deteve na segunda-feira um suspeito do assalto, um homem de 39 anos com “um vasto histórico criminal” e que “cumpriu pena de prisão em França, por crimes de igual natureza, evadindo-se daqueles estabelecimentos prisionais e terá regressado a Portugal no início do presente ano, vindo, desde então, segundo está a apurar-se, a praticar ilícitos da mesma natureza”.