Visão
Embriaguez, bebedeira, pifo, carraspana, borracheira, ebriedade, enfrascanço, tosga, bezana, narsa. Há várias formas de o designar, assim como existem múltiplas maneiras de o experimentar, mas o conceito é sempre o mesmo e acompanha-nos desde os primórdios da Humanidade. Segundo a hipótese do macaco bêbado, aliás, o apreço pelo álcool remonta aos nossos antepassados primatas, quando há cerca de dez milhões de anos eles ousaram descer das árvores para saborear a fruta madura caída no chão, atraídos pelo sabor adocicado e já com um travo a etanol. Não demoraria até adquirirem uma mutação genética altamente facilitadora da metabolização do álcool.
A teoria, proposta pelo biólogo evolucionista Robert Dudley no arranque deste século, tem vindo a ganhar adeptos na comunidade científica e é ponto de partida para o escritor e jornalista britânico Mark Forsyth nos levar por caminhos da História inseparáveis de elevados teores de álcool no sangue. Em Breve História da Bebedeira, livro de 2017 recentemente editado em língua portuguesa (Casa das Letras, 259 págs.), o autor traça um retrato da relação sempre próxima dos humanos com as bebidas alcoólicas: dos grandes festins no Antigo Egito, que se estivéssemos em televisão exigiriam bolinha vermelha no canto do ecrã, às penas de morte cruéis dos astecas, passando pela colonização da América e da Austrália.

Desta viagem, guardou pelo menos uma certeza: “Não existe na História uma cultura que não tivesse consumido álcool. Até o Irão abriu recentemente o seu primeiro centro de reabilitação para alcoólicos, o que é embaraçoso para um país onde legalmente não é sequer suposto haver álcool. Algumas culturas bebem muito pouco, mas não conheço lugar que não o faça de todo. Os humanos são bêbados”, afirma, à VISÃO.
Das muitas histórias que alimentam esta sua convicção e que relata no livro, por vezes com contornos cinematográficos e muito humor à mistura, nenhuma o surpreendeu tanto como o método usado pelos antigos persas para tomarem grandes decisões políticas. “Eles debatiam o assunto duas vezes, uma embriagados e outra sóbrios. Se a conclusão fosse a mesma em ambas as ocasiões, então agiam.”
Já os bárbaros germânicos, de acordo com o historiador romano Tácito, citado no livro, preferiam confiar no “estado de completa embriaguez, com o fundamento de que isso os tornava sinceros”, para deliberarem “sobre a reconciliação com inimigos”, por exemplo. Escreve Forsyth que se trata do “princípio de in vino veritas levado ao extremo”. “Se o álcool leva as pessoas a dizerem a verdade, e se a política está cheia de mentiras e mentirosos, não seria avisado encharcá-los em bebida, a mãe da verdade?”, questiona, sarcástico.
Na Rússia, os todo-poderosos Ivan, o Terrível (séc. XVI), Pedro, o Grande (sécs. XVII e XVIII) e Joseph Estaline (séc. XX) tinham isso em mente, quando embebedavam os colaboradores mais próximos para garantir que nenhum conspirava nas suas costas, lembra o escritor britânico no livro, sugerindo, por outro lado, que a morte de Nicolau II, em 1918, não pode ser dissociada do facto de este czar ter decretado a proibição do consumo de vodka, quatro anos antes.
As festas bem regadas do Antigo Egito
Mark Forsyth defende a tese de que foi a cerveja e não o pão a impelir a Humanidade para a agricultura, cerca de 9 000 a.C., “porque queríamos embebedar-nos com regularidade”. Entre outras razões para a vida de nómada ter dado lugar ao sedentarismo, baseia-se em vestígios arqueológicos descobertos em anos recentes, na Turquia, que apontam para existência prévia da cerveja em relação à atividade agrícola.
Na Suméria (o Iraque de hoje), por volta do ano 3 200 a.C, “toda a gente bebia cerveja”. Definida como “uma espécie de papa de cevada espumosa”, bebia-se através de uma palha para evitar “uma grande quantidade de resíduos sólidos a boiar à superfície”. Era produzida em tabernas, por norma geridas por mulheres. Beber constituía “uma alegre prática de convívio”, mas se as taberneiras tentassem enganar um cliente, corriam o risco de ser afogadas. E se uma sacerdotisa lá entrasse para beber, era queimada viva.
O contraste com o Antigo Egito, dois milénios volvidos, é gritante, pelo menos entre as gentes mais abastadas. “Penso que foram o povo mais bêbado da História”, diz-nos Forsyth, numa entrevista por escrito. “Eles insistiam em beber até vomitar. O Festival de Hathor, a deusa da cerveja, foi a farra mais extrema que encontrei. Até a ressaca eles transformaram numa espécie de experiência religiosa sagrada.”

Álcool era sinónimo de sexo e, talvez por isso, as mulheres eram vistas pelos homens como iguais. “Em matéria de bebedeira tinham uma igualdade de género espantosamente moderna”, lê-se no livro. “É bebedeira pura e dura”, com o tal Festival da Embriaguez, em honra da deusa respetiva, a arrastar a multidão presente, depois de passar ao estado ébrio, para ter relações sexuais em público, no átrio do templo de Hathor, incentivada pelo sacerdote de serviço. Depois, adormeciam, para acordarem na alvorada e assistirem à primeira luz do dia refletir numa estátua de Hathor. “Neste momento de comunhão perfeita, tudo aquilo que pedirmos à deusa é-nos concedido. Se bem que eu seja levado a imaginar que muita gente se esquecesse do que queria pedir-lhe”, graceja o autor, sobre aquilo a que chama “embriaguez religiosa”.

Dionísio, o deus grego do vinho, já era mencionado por essa altura, mas Forsyth avança 700 anos no tempo para aterrar na Grécia Clássica, século V a.C., onde o consumo de álcool era encarado com reticências. Platão, por exemplo, valorizava aqueles que não perdiam o autodomínio sob a influência do álcool. Os gregos reuniam-se para o efeito em casas particulares, em pequenos grupos nos quais não havia lugar para mulheres, a menos que fossem escravas, e bebiam ao ritmo das indicações de um mestre de cerimónias, por vezes ao som de flauta.
No Império Romano, Baco assumiu o papel de Dionísio e o convívio proporcionado pelo álcool ganhou contornos de exibição de poder. “Ninguém estava ali para se divertir, mas sim para saber qual era o degrau que ocupava na escala social, para aplaudir quem estava nos degraus acima e troçar de quem estava nos degraus abaixo”, lê-se no livro. Não era uma prova de vinhos mas de ostentação, com a vantagem, na comparação com os gregos, de as mulheres poderem participar, “um significativo momento de igualdade”, assinala o autor.
Do uísque ao rum
O escritor português Afonso Cruz partiu da mesma hipótese evolucionista na sua obra O Macaco Bêbado Foi à Ópera: Da Embriaguez à Civilização, na qual cita o livro de Mark Forsyth. À VISÃO, sublinha tratar-se “de uma teoria com alguma credibilidade”, sobre um período importante para o desenvolvimento posterior da espécie humana, tal como é o da transição para um modo de vida sedentário, “que mudou radicalmente a sociedade”, abrindo caminho às cidades – dois pontos relevantes da sua abordagem à História da Humanidade.
Através do estudo da atividade cerebral, sabe-se hoje que, tal como o nosso antepassado primata passou a sentir mais fome depois de provar álcool, obrigando-o a acumular mais energia, os humanos precisam de ingerir calorias depois uma noite bem regada. “É por isso que, quando bebemos demais, vamos para as rulotes de hambúrgueres e cachorros quentes”, ri-se Afonso, que sublinha “o grande sentido de humor” de Forsyth numa obra de carácter histórico.
Um bom exemplo é a forma como ele descreve “um homem chamado George Washington”, o “grande destilador do jovem país”, que em 1797 “produzia mais de 40 mil litros de uísque por ano”. Uma grande oportunidade de negócio, uma vez que, nas palavras do escritor britânico, “para um colono que parte para o Oeste ao encontro do grande desconhecido, com limitações de espaço e de peso na caravana, um barril de uísque é garantia de mais bebedeiras durante mais tempo”.

Sem nunca referir que está a mencionar o Presidente americano então em exercício, por sinal o primeiro, escreve ainda que, antes de se tornar “magnata do uísque”, Washington “tivera uma espécie de carreira política”, recordando que “ofereceu álcool de graça aos votantes durante a campanha” para a Câmara dos Burgueses, em 1758. Já na esfera militar, lembra que ele “teve a brilhante ideia de duplicar a ração de rum dos seus homens, dando origem a um fenómeno estranho conhecido como EUA”.
Por falar em rum, foi esta bebida espirituosa que arruinou os planos de Inglaterra para colonizar a Austrália sem vislumbre de álcool. O rum não só seguiu a bordo dos primeiros navios a zarparem para os antípodas como se tornou moeda de troca e negócio clandestino dos militares enviados para patrulhar a região, que inclusive organizaram uma rebelião, bem-sucedida, para expulsar da ilha um dos primeiros governadores nomeados pela metrópole britânica.
Pelo menos, não foi preciso matar ninguém. Uns quatro ou cinco séculos antes, na civilização asteca, o álcool também era muito malvisto. Durante a coroação, um novo imperador lamentava-se: “Antes do adultério, da violação, da sedução das raparigas, do incesto, do roubo, do crime, da maldição e do falso testemunho, da maledicência e da calúnia, das rixas e das desordens, está sempre a embriaguez.”
A punição para os bêbados era pesada. Se fosse plebeu, seria espancado ou estrangulado em público até à morte. Sendo nobre, seria estrangulado até à morte, mas em privado. Vai um brinde?
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O título da crónica de Pedro Guerra no jornal O Independente não era um mero trocadilho com o seu nome. Chamava-se “Guerra à vista” por ser grande a probabilidade de gerar conflito e polémica. A fama já vinha das notícias que o jornalista escrevia, nos anos 90, ainda antes de ter espaço reservado. E dos muitos títulos corrosivos que lhe saíam da cabeça diretamente para a manchete, imagem de marca da irreverência do semanário criado por Paulo Portas e Miguel Esteves Cardoso. Na política e no futebol, para onde seguiria após renunciar à carteira de jornalista – como assessor de Paulo Portas e em várias funções no Benfica –, Guerra justificou sempre o apelido. Agora está no epicentro de um alegado esquema de corrupção na arbitragem que o FC Porto lançou sobre o rival da Luz, mas já antes muitos outros episódios revelavam o gladiador que afronta tudo e todos. Desafiámo-lo a comentar seis deles e a resposta veio via SMS.
1 – “Herdade para ter juízo”
Ficou conhecido como o caso do “Monte dos Frades”. Segundo noticiava O Independente em 1992, o então ministro das Finanças Jorge Braga de Macedo teria recebido indevidamente subsídios comunitários para a sua herdade em Avis, no Alentejo. Em causa estavam verbas destinadas a jovens agricultores, o que não era o caso do ministro de 46 anos. O jornal acusou-o de recorrer ao nome de um cunhado mais jovem, que cumpria o requisito da idade, para obter os fundos para o projeto. Pedro Guerra saiu-se com o trocadilho “Herdade para ter juízo” e a primeira página seguiu assim para as bancas. Braga de Macedo processou o jornal e o caso arrastou-se nos tribunais, até O Independente ser condenado a pagar uma indemnização, em 2000.
Pedro Guerra: “O ministro das Finanças disse em tribunal que o que mais o apoucou foi o título. O truque era simples: trocadilhos com ditados populares ou filmes e séries de TV.”
2 – O roubo de Luís Filipe Vieira
Em 2001, Pedro Guerra desenterrou a sentença que tinha levado à condenação de Luís Filipe Vieira, em 1993, pelo “crime de roubo”, a 20 meses de prisão. O caso remontava a 1984, quando Vieira era apenas um “comerciante”. Um amigo pediu-lhe ajuda para cobrar uma dívida e planearam roubar um camião ao devedor. “Luís Filipe Vieira e José Gama pagaram, como acontece nos casos de cobranças difíceis, os serviços da rapaziada musculada”, escreveu o jornalista, sobre o método utilizado. Quando a notícia foi publicada, Vieira já não era um anónimo: tinha deixado a presidência do Alverca para assumir a pasta do futebol no Benfica. “A sorte dos arguidos, Luís Filipe Vieira incluído, foram duas leis da amnistia, que lhes valeram o perdão total das penas de prisão”, acrescentava o artigo.
Pedro Guerra: “Foi uma mera notícia de Justiça, sem a gravidade que maldosamente lhe atribuem. Ficou tudo em pratos limpos num jantar em que um amigo comum nos sentou à mesa. Percebi nessa noite que o Benfica iria voltar à ribalta com Luís Filipe Vieira.”
3 – Salário acima do ministro
Quando Paulo Portas assumiu o cargo de ministro de Defesa, em 2002, convidou o seu ex-jornalista para ser seu assessor. Um salário bruto de 4888 euros, publicado em Diário da República, foi notícia nos jornais. Nem o Avante! deixou escapar a oportunidade de assinalar um rendimento tão elevado, acima do auferido pelo próprio ministro. Um erro de publicação que “foi depois retificado”, explicou o próprio Guerra ao Observador, no ano passado, sem precisar quanto recebia, afinal. “Já não me lembro”, justificou.
Pedro Guerra: “Fui assessor com muito gosto enquanto o dr. Paulo Portas liderou o CDS. Com a sua saída, o partido nunca mais será o mesmo.”
4 – O agente da desinformação
À TSF, a socialista Ana Gomes denunciou, em 2011, aquilo a que chamou de “central de desinformação e calúnia de dirigentes do PS” durante o processo Casa Pia, que funcionava, segundo a eurodeputada, “junto do então ministro Paulo Portas”. E acrescentou que “Pedro Guerra era um dos principais agentes dessa central de desinformação”, acusada de ter “alimentado o tratamento na Imprensa” em relação a alguns dos seus companheiros de partido.
Pedro Guerra: “Só a psiquiatria pode explicar. Um evidente caso de falta de vergonha e de decoro de quem se julga justiceira. Uma paraquedista sobrevivente que tem amigos nos sítios certos e que vamos ter de continuar a aturar, infelizmente.”
5 – Jorge Coroado ao ataque
Num despique verbal com Jorge Coroado na CMTV, em 2014, a conversa descambou quando o ex-árbitro lhe disse que não era “aplaudómetro”. “Eu não aplaudo só porque me pagam para aplaudir”, atirou. Em resposta, Guerra contra-atacou assim: “Você já tem uma certa idade e eu respeito isso, mas fica-lhe mal.” Seguiram-se 50 segundos de troca de galhardetes, com Coroado na ofensiva. “Mentiroso é você, emprenha pelos ouvidos. Se gosta de aplaudir, parabéns, continue que é o seu modo de vida.”
Pedro Guerra: “Destila ódio ao Benfica. Frustrado por nunca ter sido presidente do Conselho de Arbitragem. E ainda bem que não foi.”
6 – Desafiado para a luta
Terminado o programa Prolongamento, da TVI 24, de 6 de outubro de 2015, Eduardo Barroso levantou-se e dirigiu-se a Pedro Guerra, desafiando-o para um duelo de punhos “lá fora”. Bruno de Carvalho tinha acabado de denunciar o que ficaria conhecido como o caso dos vouchers e os ânimos exaltaram-se. Aconselhado por Manuel Serrão a não o fazer, o cirurgião do Sporting acabou por não esperar o representante do Benfica para o confronto físico. Mas na semana seguinte, depois de Guerra o ter chamado de cobarde, abandonou de vez o programa.
Pedro Guerra: “Além da falta de chá e de educação, este conhecido sócio do Sporting, que se julga dono do clube, tem a virtude de estar com todos os presidentes. Não aguentou a minha pressão alta e fugiu.”
Artigo publicado na VISÃO 1267 de 21 de junho
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“A utilização do sistema judicial como arma para silenciar as mulheres alimenta a impunidade”. A frase não é minha, faz parte de uma das conclusões de um relatório das Nações Unidas elaborado após o surgimento global do movimento #MeToo. Naquilo que o mesmo documento descreve como uma “reviravolta perversa”, deixa para reflexão a forma como “as mulheres que denunciam publicamente alegados perpetradores de violência sexual estão cada vez mais sujeitas a processos por difamação ou acusadas de calúnia ou falsa denúncia”. Pernicioso, mas cada vez mais comum.
Voltei a este documento ontem, o mesmo dia em que as vítimas do CES foram levadas a tribunal. Não na sequência do relatório da Comissão Independente do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, que confirma ao longo de 114 páginas a existência de padrões de conduta de abuso de poder e assédio alavancados por uma hierarquia que o facilitava, totalizando um somatório de 32 denúncias. Mas sim enquanto arguidas num processo de proteção de bom-nome e honra de Boaventura Sousa Santos, que, trocado por miúdos, se diz difamado pela carta pública que um coletivo de 13 investigadoras publicou, exigindo a sua suspensão pelos alegados atos e conduta abusivos.
Em jeito de lembrete, dizia o dito relatório da Comissão Independente que “várias pessoas denunciantes descrevem, quer na qualidade de denunciantes, quer na qualidade de testemunhas, as mesmas situações e/ou situações semelhantes de assédio moral, sexual e abuso de poder”. Comportamentos de abuso sexual relatados? “Toques indesejados e não consentidos em partes do corpo como coxas, nádegas e zonas genitais; abraços demasiado longos e apertados”, “relações sexuais com pessoas em posições hierárquicas inferiores e/ou de vulnerabilidade, enquanto estas se encontravam sob efeito de substâncias (ex.: álcool) e sem condições plenas para prestar consentimento livre e esclarecido” e ainda “relações sexuais com alunas/investigadoras cuja avaliação estava diretamente dependente das pessoas que as procuravam”. “Contactos em horas impróprias (por vezes durante a madrugada) para tratar de assuntos não urgentes e, por vezes, para satisfação de necessidades e caprichos pessoais”. A lista continua muito para além disto. Porém, nenhum nome em concreto foi escrito.
Não deixa de ser irónico que sejam as alegadas vítimas a chegarem primeiro a julgamento, agora como alegadas difamadoras.
Não deixa de ser irónico que sejam as alegadas vítimas a chegarem primeiro a julgamento, agora como alegadas difamadoras. Ou sintomático da estratégia de ‘lawfare’ em que tantas vítimas se veem envolvidas mundo fora, quando ousam denunciar situações de abuso e violência, principalmente quando estas envolvem homens em situações de poder. Eles sabem que ripostar com um processo por difamação deixa as denunciantes em apuros, começando desde logo por não terem como acionar uma equipa legal equiparada que as defenda. O movimento #MeToo pode ter crescido à escala global graças ao envolvimento de estrelas de Hollywood, mas sejamos claros: as vítimas de violência sexual não são todas atrizes com elevado poder económico. Bem pelo contrário. E o jogo de poder alavancado pelos agressores também se alimenta dessa certeza de facilidade de manutenção de silêncio: elas raramente têm como lhes fazer frente. Não têm nem o dinheiro, nem a reputação pública do seu lado.
O mito das falsas denúncias
Recordam-se de em 2017, uma mulher desconhecida ter feito uma publicação no Facebook, acusando o cineasta Brett Ratner de agressão sexual? A resposta foi imediata: uma ação judicial por difamação contra ela. A mulher foi aconselhada por um advogado a apagar a publicação mas, umas semanas depois, o LA Times publicava uma reportagem onde outras seis mulheres, incluindo atrizes, acusavam Ratner de assédio sexual e comportamentos inapropriados. Na altura, o advogado da mulher que ousou fazer a primeira denúncia pública frisava que a retaliação pela via do processo de difamação não a pretendia silenciar apenas a ela: a ideia seria enviar uma mensagem clara das consequências a outras que pensassem em fazer o mesmo. Mas o tiro poderá ter saído pela culatra. O cineasta acabou por retirar a queixa por difamação e, como é comum no EUA, chegaram a um acordo.
Só que nem sempre corre assim. A guerra jurídica, para quem tem poucos recursos financeiros, pode trazer um sentimento de impotência e de medo esmagador às vítimas. Ou só a ideia de ter de passar por isto pode demover muitas outras de sequer tentar. Quem recorre a esta estratégia também sabe disso. Por outro lado, as vítimas sabem também que a sociedade ainda é muito mais permeável à defesa da boa honra do alegado agressor, acreditando na sua palavra como ponto de partida, principalmente se foram famosos – como se estes não tivessem “necessidade” de assediar ninguém. E bastante punitiva das alegadas vítimas, sobre as quais recai uma desconfiança histórica, como sendo as ardilosas, que têm algo a ganhar com tal acusação e vexame púbico, preconceitos estes que pouco têm de empírico.
Existem falsas denúncias? Sim, e devem obviamente ser punidas, mesmo que sejam, reforço, absolutamente residuais. A sociedade ainda prefere acreditar que os números são ao contrário? Parece que sim
Algo que explica muito bem o incrível livro “#MeToo: Um Segredo Muito Público” (do coletivo de investigadoras portuguesas Maria João Faustino, Júlia Garraio, Rita Santos e Sílvia Roque), que faz uma análise bastante séria de factos e números do assédio sexual: “Importa sublinhar que as falsas denúncias de crimes sexuais não são mais elevadas do que as relativas a outros crimes e são efetivamente baixas, estimando-se que se situam entre 2% a 10%. Apesar de não haver evidência de que haja uma maior incidência de denúncias falsas nos crimes sexuais, legados de centenas de anos de descrença na palavra das mulheres fazem com que a categoria jurídica ‘falta de provas’ seja interpretada de forma equivocada como sinónimo de falsa denúncia”. Reforçando também estas importante reflexão quanto aos casos mais mediáticos, que não pode deixar de ser feita: “O facto de grande parte dos homens acusados ter um forte poder económico que lhes permite contratar equipas de advogados com amplos recursos contribui para adensar o potencial dos tribunais como espaço de deslegitimação da palavra das vítimas e reposição das relações de poder tradicionais”.
Existem falsas denúncias? Sim, e devem obviamente ser punidas, mesmo que sejam, reforço, absolutamente residuais. A sociedade ainda prefere acreditar que os números são ao contrário? Parece que sim. Ppelo menos é o que faz ao questionar automaticamente a índole da vítima, que não é mais do que dizer que acredita mais no alegado agressor. E este é um problema estrutural de normalização da violência sexual. Os julgamentos fazem-se em tribunal e não nas redes sociais? Absolutamente de acordo. A justiça tem vieses na forma como olha para estes casos? Tem, e não podemos menosprezar isto. Não é ao acaso que a difamação entre nesta equação como arma de arremesso jurídica bastante estratégica. E, infelizmente, uma estratégia bem conseguida.
O filho do proprietário de um restaurante em Issy-les-Moulineauxm, nos arredores de Paris, fez, este sábado, quatro funcionários reféns. O autor do sequestro já foi detido.
A situação passou-se no restaurante L’Olivier, segundo anuncia a agência France Press, e, depois de montado um grande dispositivo policial, com agentes armados, os quatro empregados acabaram por ser retirados em segurança.
Albert Botbol de 74 anos, proprietário do restaurante, chegou a ser indicado como sendo o autor do sequestro. Segundo a Sic Notícias, o filho do proprietário do restaurante será alguém com perturbações devido à dependência de drogas, que teria já problemas com as autoridades.
Num comunicado publicado pouco depois de se ter iniciado o sequestro, o restaurante confirmou que quatro pessoas tinham sido retidas por um homem armado. “A brigada de intervenção está no local. Não há clientes entre os reféns”, lê-se.
???? Communiqué sur la situation à Issy-les-Moulineaux : pic.twitter.com/xkXqGDvznZ
— Pizzeria L’Olivier (@OlivierPizzeria) November 16, 2024
As imediações do edifício foram encerradas e a polícia pediu à população que evitasse a zona e que os “deixe trabalhar”.
????Incident en cours dans notre restaurant à #IssylesMoulineaux.
— Pizzeria L’Olivier (@OlivierPizzeria) November 16, 2024
Merci de laisser les forces de sécurité et de secours travailler. pic.twitter.com/JAi7Dr3rmO
Artigo atualizado às 18h
O escritório de Michael Leon, professor emérito no Departamento de Neurobiologia e Comportamento da Universidade da Califórnia, em Irvine, é uma pequena sala de um antigo laboratório, com pouca decoração nas paredes além dos canos que sobraram de um lavatório. “Não há qualquer papel na sua secretária”, reparou o jornalista que ali esteve a entrevistá-lo para a última edição da UCI Magazine, a revista daquela universidade norte-americana.
“Gosto de simplicidade”, disse-lhe então o neurobiólogo, fazendo um paralelismo entre o seu local de trabalho espartano e um determinado modo de pensar: “Quando comecei a fazer investigação clínica, tornou-se claro que as boas soluções complicadas podem levar milhares de milhões de dólares e décadas para serem eficazes, por isso sinto-me atraído por respostas simples a questões complexas.”
Já no século XIV, o filósofo franciscano inglês Guilherme de Ockham defendia que, em igualdade de condições, a explicação mais simples é geralmente a mais provável. Além de seguir este princípio de economia de pensamento (também conhecido como Navalha de Ockham), Michael Leon foi aplicando o que ia aprendendo no laboratório aos problemas reais das pessoas. As mais de quatro décadas a estudar a ligação entre o nariz e o cérebro não têm parado de dar frutos.
O ultimo estudo que liderou, e cujas conclusões foram recentemente publicadas na revista científica Frontiers in Molecular Neuroscience, partiu de uma premissa simples: estando uma longa e diversificada lista de problemas de saúde ligados tanto à perda olfativa como ao aumento da inflamação, não haverá algo mais profundo nessas associações?
Prever o futuro
Bingo! Ao rastrearem metodicamente 139 doenças neurológicas, somáticas e congénitas/hereditárias, o neurobiólogo e a sua equipa descobriram uma via comum que liga esses dois fatores. Mais: concluíram que, muitas vezes, a perda do olfato surge antes de se sentirem os sintomas das doenças, o que indica que ela pode aumentar a vulnerabilidade e prever futuros declínios cognitivos e mesmo a mortalidade.
A boa notícia que vem à boleia da descoberta do papel fundamental da inflamação é a possibilidade de recorrer ao enriquecimento olfativo como “tratamento”. Este estudo veio provar que os aromas agradáveis podem melhorar a memória, tanto em adultos saudáveis como em adultos afetados por demência, possivelmente devido aos seus efeitos anti-inflamatórios.
Muitas vezes, a perda do olfato surge antes de se sentirem os sintomas das doenças, o que indica que ela pode prever futuros declínios cognitivos
Não é de hoje a noção de que a disfunção olfativa é um sinal precoce de vários problemas de saúde, não apenas neurológicos. No início dos anos 1990, os cientistas concluíram que a perda do olfato surge muito antes do que qualquer outro sintoma de Alzheimer e de esclerose múltipla. E, nas décadas seguintes, chegaram à mesma conclusão ao estudarem pessoas com esquizofrenia, perda cognitiva, Parkinson, depressão e doenças cardiovasculares.
Recentemente, o comum dos mortais aprendeu na pele que perder a capacidade de cheirar era sinal de que se encontrava, muito provavelmente, infetado com o vírus da Covid-19. O novo estudo vem agora dizer que a inflamação pode estar na origem da disfunção olfativa associada à infeção por SARS-CoV-2 – assim como dos outros 139 problemas de saúde analisados.
“Talvez o sistema olfativo [as estruturas do corpo, incluindo o nariz, que regulam o olfato] seja particularmente sensível à inflamação que o atinge, quer a partir de outras partes do cérebro, quer através da corrente sanguínea periférica”, escrevem os investigadores. Em alternativa, sugerem, a inflamação poderá ser desencadeada por agentes que entram pelo nariz, como a poluição do ar ou odores desagradáveis.
No caso específico da Covid-19, Michael Leon e a sua equipa põem a hipótese de o sistema olfativo ser particularmente sensível aos danos infligidos por outras fontes de inflamação (cérebro ou corpo) que surgem de várias doenças, por já estar a suportar níveis elevados de inflamação respiratória devido à exposição a agentes voláteis do ar.
Estudos anteriores concluíram que as infeções por Covid-19 que produzem perda do olfato podem promover a perda cognitiva que se observa no Alzheimer. Dado o número de sistemas fisiológicos que são habitualmente afetados na Covid-19, os autores desta nova investigação não acreditam que a perda do olfato tenha sido o único fator a aumentar o risco dessa doença, mas sugerem que ela possa ter contribuído para a degradação de regiões do cérebro essenciais para o funcionamento normal da memória.
Acesso à memória
Lembre-se que o sistema olfativo comunica diretamente com o sistema límbico, uma região do cérebro associada à memória. Os cheiros estão, assim, mais fortemente ligados à maneira como recordamos acontecimentos passados, comparando com outros sentidos como a visão ou o som.
“O sistema olfativo é o único sistema sensorial que tem um acesso direto, através de uma autoestrada, aos centros de memória do cérebro. Todos os outros sentidos têm de ir pelas ruas secundárias para lá chegar”, disse Michael Leon, à NBC News, há cerca de um ano, a propósito de um seu outro estudo em que descobriu que o enriquecimento olfativo pode melhorar a memória dos adultos mais velhos em 226 por cento.
Nesse estudo, publicado em julho do ano passado, também na Frontiers in Molecular Neuroscience, uma equipa de investigadores liderada pelo neurobiólogo expôs vinte pessoas (com mais de 60 anos e geralmente saudáveis) a seis meses de enriquecimento olfativo durante a noite. Todas melhoraram significativamente a sua capacidade de recordar listas de palavras, em comparação com um grupo de controlo.
Mesmo sabendo que os neurónios envolvidos no olfato têm acesso direto à tal “autoestrada” para regiões do cérebro relacionadas com a memória, os cientistas não conseguiram, então, explicar como é que os aromas noturnos tinham produzido aquele resultado impressionante. “Agora [com o novo estudo], sabe-se que os aromas agradáveis podem reduzir a inflamação e, assim, melhorar a saúde do cérebro”, congratula-se Michael Leon.
“Se perguntarmos às pessoas qual o sentido de que estariam mais dispostas a abdicar, seria o olfato”, costuma dizer o neurobiólogo. Mas, se souberem a sua perda tem sido associada a tantas doenças e ao declínio cognitivo, talvez mudem de ideias. Simples, não?
Dar pelo sinal de alarme
O olfato não é sempre afetado da mesma maneira. Encontre as diferenças
Parosmia
Quando o cérebro não identifica o odor corretamente. A pessoa pode sentir um cheiro (e consequentemente paladar…) a comida estragada quando perante um alimento em perfeitas condições
Fantosmia
Também conhecido como alucinação olfativa. Esse “odor fantasma” é quase sempre desagradável, como se a pessoa estivesse perante algo podre ou queimado
Anosmia
Quando há a perda total do olfato. Além da incapacidade se uma pessoa sentir odores, também prejudica o seu paladar
Hiposmia
Há uma diminuição da capacidade olfativa. A pessoa sente o cheiro, mas precisa de uma concentração maior das partículas que provocam esse odor
Hiperosmia
É o aumento da capacidade total do olfato. Basta uma pequena concentração de partículas para que a pessoa sinta o odor de uma maneira excessiva
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Bem-vindo à nova série do podcast Tech Flow, que será inteiramente dedicada à cibersegurança. Ao longo de cinco episódios, exploramos a segurança informática de forma descomplicada – dos conceitos gerais que definem esta área, às novas tecnologias que estão a transformar a forma como utilizadores, empresas e organizações devem abordar a segurança digital. Este é um podcast que tem como objetivo sensibilizar os utilizadores e os decisores – porque no fim de contas, todos usamos tecnologia – para a importância da cibersegurança no dia-a-dia.
Novo episódio na próxima quarta-feira, 20 de novembro, às 15h30,
sobre “O impacto das tecnologias quânticas na cibersegurança“
Quais os impactos positivos e negativos da Inteligência Artificial na cibersegurança? Quais as novas tipologias de ameaças e como a IA está a tornar alguns ataques mais eficazes? Como é que as empresas podem tirar benefício da IA e cibersegurança, por exemplo, através dos Centros de Operações de Segurança (SOC)? E qual o futuro da cibersegurança à medida que a IA continua a evoluir?
As respostas a estas e outras perguntas são dadas por Pedro Adão, professor associado no departamento de Engenharia Informática do Instituto Superior Técnico (IST) e Frederic Reyntjens, gestor de serviços partilhados da Warpcom. Pode ver o terceiro episódio do Tech Flow na versão vídeo no início deste artigo ou ouvir aqui a versão em áudio:
Tech Flow, episódio 3
Veja ou reveja os outros episódios já publicados do podcast Tech Flow:
- 2º episódio | Fraude do CEO, phishing e ransomware. Conheça (e proteja-se contra) os ataques informáticos mais comuns
A nova série do podcast Tech Flow, dedicada à cibersegurança, é feita pela Exame Informática em parceria com a Warpcom.
Os distritos de Faro e Beja e o arquipélago da Madeira estão este sábado sob aviso amarelo devido à previsão de aguaceiros, pontualmente fortes e que poderão ser acompanhados de trovoadas e granizo, segundo o IPMA.
Por causa do mau tempo, no Algarve, há registo de várias ocorrências devido à forte precipitação. A Estrada Nacional 125 está interdita ao trânsito na zona de Luz de Tavira, assim como a linha ferroviária na zona da Fuzeta (Olhão) devido ao descarrilamento de uma composição, causado por pedras na linha.
Descarrilamente entre Fuseta e Fuseta-A. Fotos de Filipe Manuel partilhadas no grupo de Facebook “Os Amigos da Fuzeta”. Efeitos do mau tempo no Algarve ???? pic.twitter.com/qheuJhxgT1
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Trabalhos esta manhã na Fuseta. Transbordo rodoviário entre Fuseta-Moncarapacho e Olhão. pic.twitter.com/Fj1x9Jvuwq
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O IPMA prevê para este sábado no continente céu muito nublado e aguaceiros, por vezes fortes e acompanhados de trovoada no centro e sul, diminuindo de intensidade e frequência a partir da tarde. É ainda esperado vento por vezes forte nas terras altas e uma subida da temperatura máxima.
O aviso amarelo, o menos grave de uma escala de três, é emitido sempre que existe uma situação de risco para determinadas atividades dependentes da situação meteorológica.