A atribuição, na semana passada, do Prémio Nobel da Paz ao antigo Presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, foi justa, a vários títulos.
Primeiro, Carter foi sempre um político democrata, idealista, que procurava nortear-se por valores e por princípios, mais do que por interesses estratégicos, económicos ou outros.
Segundo, porque a sua presidência não foi agressiva, nem belicista, nem imperialista. E não se diga em contrário que foi ele que ordenou a (falhada) união militar contra o Irão: não se tratava de invadir ou atacar este país, ou de intervir na sua política interna, mas apenas de tentar salvar a vida dos diplomatas e militares americanos que se encontravam reféns e cercados por uma multidão ululante dentro da embaixada dos EUA em Teerão.
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Era uma missão humanitária.
Terceiro, porque, após o termo das suas funções presidenciais, Carter dedicou vinte anos da sua vida a promover a causa dos direitos humanos por todo o mundo e a servir de medianeiro em diversos conflitos militares, em que a sua intervenção abriu caminho para a paz.
O prémio Nobel da Paz foi, pois, merecido e justo para Jimmy Carter.
É claro que a escolha do seu nome, nesta altura, não foi inocente: Carter foi a primeira figura de renome a criticar há menos de um mês a política belicista e imperial do Presidente Bush quanto ao Iraque. E fê-lo de forma clara e desassombrada, chamando a atenção para que a grave violação do direito internacional que os EUA se preparam para cometer, e sublinhando o que eu próprio já escrevi nesta revista o carácter extremista da ala mais conservadora e radical do Partido Republicano, que está a dominar as opções da administração Bush.
Quer isto dizer que a concessão do Nobel da Paz a Carter, nesta altura, foi uma crítica ou uma bofetada de luva branca dada pelo Comité de Oslo ao Presidente Bush? É óbvio que houve uma intenção crítica. Mas a questão tem de ser vista através de uma análise mais fina.
Se olharmos para trás, poderemos verificar que nos últimos dez ou quinze anos o Prémio Nobel da Paz foi sempre atribuído com intenção política, e não apenas com base no passado da personalidade galardoada, mas sobretudo com vista a apontar e abrir os caminhos do futuro.
Assim, em pleno apartheid na África do Sul, o prémio foi para Nelson Mandela: anos depois, caía o odioso regime do apartheid e Mandela era eleito Presidente da República.
Depois, em pleno conflito israelo- palestiniano, o Nobel da Paz foi para Yasser Arafat: tempos volvidos, veio a criação da Autoridade Nacional Palestiniana.
Enfim, com a ditadura militar na Indonésia a recusar vigorosamente a autodeterminação de Timor Leste, o prémio Nobel da Paz foi para D. Ximenes Belo e Ramos Horta: pouco tempo depois, caiu a ditadura, fez-se o plebiscito em Timor, e a independência foi conseguida.
Vê-se, assim, que o prémio Nobel da Paz, pelo seu enorme prestígio e consequente influência nas opiniões públicas tenta e quase sempre consegue abrir caminho para as soluções mais justas e mais conformes ao Direito Internacional.
Quer isto dizer que a atribuição do prémio a Carter vai travar a cavalgada militar de Bush contra o Iraque? Só o futuro o dirá. Mas é razoável prever que Bush vai dar mais algum tempo aos inspectores das Nações Unidas; que os EUA vão sofrer mais e maiores pressões de terceiros países; que o Partido Democrático, na oposição, vai ganhar mais coragem para criticar e controlar Bush; e, sobretudo, que a opinião pública americana vai começar a ser menos «unanimista » a favor da guerra.
Este prémio veio no momento certo para dar uma última oportunidade à Paz.
Artigo publicado na VISÃO em outubro de 2002.
Se tem 35 ou mais anos, existe a forte probabilidade de ter tido um telemóvel da Motorola em algum ponto da vida. Talvez um DynaTAC ou StarTAC para os pioneiros. Talvez um Razr num passado mais recente. Talvez até um Moto G, quando a empresa foi adquirida pela Google na década passada. O impacto da Motorola no desenvolvimento dos dispositivos móveis é inegável, mas nem tudo correu de feição à tecnológica.
Agora, sob a égide da gigante chinesa Lenovo, a marca está aos poucos a ganhar terreno. Sobretudo na Europa, onde se manteve tímida nos últimos anos, enquanto marcas como a Apple, Samsung e Xiaomi se estabeleciam de pedra e cal junto dos utilizadores.
Nesta entrevista, a diretora-geral da Motorola para a Península Ibérica, Andrea Monleon, garante que “Portugal é um dos países onde se vai focar” no próximo ano e que “a ambição é avançar passo a passo, mas com um crescimento significativo trimestre a trimestre”.
Vi o seu perfil no LinkedIn e percebi que para si, liderar desde 2023 a Motorola, é como um regresso às origens, pois começou na empresa em 2010. Como foi voltar?
Bem, é fantástico. Foi o meu primeiro emprego. Comecei na Motorola Mobility com um estágio. Honestamente, tem uma grande carga emocional, porque, como disse, foi a minha primeira experiência profissional após a faculdade. Este regresso à empresa tem uma grande componente emocional, depois de ter estado noutros fabricantes.
Também vi no seu LinkedIn que trabalhou na Blackberry, na Huawei nos seus anos áureos, na Samsung, Oppo, Xiaomi… É justo dizer que sempre que uma marca quer crescer, liga-lhe?
Acho que houve muitas mudanças no mercado em termos de fabricantes. Este mercado é muito rápido e acho que quando alguém tenta entrar num novo mercado, procura pessoas que sejam uma solução ‘plug and play’, que já conheça todos os clientes e todo o mercado. Suponho que isso foi parte do que aconteceu nos últimos anos.
A Motorola anunciou recentemente o regresso ao mercado português. Imagino que a marca nunca saiu completamente, mas o que está a mudar? Porquê este anúncio e porquê agora?
A Motorola tem mantido uma posição forte noutras regiões fora da Europa, Médio Oriente e África [EMEA] nos últimos dez anos. Portanto, de certa forma, nunca saímos de algumas regiões, como a América do Norte e a América Latina, onde tínhamos uma posição muito sólida e continuamos a tê-la. Contudo, há cerca de cinco ou seis anos, depois de a Lenovo adquirir a empresa em 2014, recomeçaram o negócio noutras regiões, como a EMEA. Nos últimos cinco anos, estabeleceram-se em novos países e focaram-se neles, para que a presença na EMEA cresça de ano para ano. No último ano fiscal, em 2023, Espanha foi um dos países nos quais a empresa decidiu colocar o foco. E Portugal é um dos países onde se vai focar no ano fiscal de 2024. Esta é a razão principal. Queremos realmente ser um parceiro-chave na EMEA, como somos na América Latina e na América do Norte. Esta é a estratégia: a cada um ou dois anos, focamo-nos num país e colocamos os recursos necessários para sermos um parceiro forte nesse país. Agora é Portugal e estou muito contente, entusiasmada e emocionada com esta decisão da empresa, para ser sincera.
Qual é o plano para competir com marcas já bem estabelecidas como a Samsung, Apple e Xiaomi, que dominam o mercado português? Mesmo sabendo que a Motorola tem uma forte ligação emocional com os consumidores, o mercado mudou.
Um dos pilares é maximizar, obviamente, o legado que temos em torno da marca, porque acreditamos que temos um legado forte e sabemos que os consumidores portugueses gostam de soluções inovadoras e fiáveis. Tentamos oferecer esta proposta de valor ao mercado. Queremos ser um pouco mais disruptivos do que os nossos concorrentes em termos de design – por exemplo, todas as histórias em torno da cor Pantone têm uma narrativa interessante para contar aos consumidores finais. Acreditamos que temos propostas excecionais em termos de design e tecnologia nos nossos produtos para tornar a marca ou a nossa proposta de valor diferente daquilo que outros estão atualmente a oferecer no mercado. Não só no segmento de consumo, mas também no segmento empresarial. Este é um dos nossos principais objetivos, não só no mercado português, mas em toda a EMEA. Há um fabricante em particular que é muito forte no segmento empresarial e queremos ser um fornecedor-chave nesse segmento.
A Lenovo tem uma posição muito forte na área dos computadores pessoais, também no segmento empresarial. Pretendem usar essa posição para ajudar a Motorola a ganhar tração, por exemplo, com pacotes combinados de produtos?
Antes de mais, o ADN da empresa, obviamente, é muito forte no segmento empresarial, por isso queremos aproveitar isso e abordar os principais clientes em conjunto, apresentando uma proposta completa. Atualmente, já começámos com esta tipologia de proposta de pacotes combinados com a Lenovo, não só com PC, mas também com tablets, nos quais temos também uma posição muito forte. Esta é uma das estratégias em que estamos a trabalhar com a Lenovo. Além disso, estamos a preparar um portfólio exclusivo da Motorola para o segmento empresarial. Apresentámos recentemente dois dispositivos, há cerca de dois meses, e esta é uma das estratégias-chave para este segmento.
Que dispositivos são esses?
São os Thinkphone: o novo Thinkphone 25 e o Thinkphone G75. Estes são os dois dispositivos que estamos a propor, e a proposta de valor baseia-se principalmente em dois anos de produção total dos dispositivos, cinco anos de suporte completo em termos de atualizações de software e uma embalagem completamente diferente: incluirá o carregador, uns auriculares e um protetor de ecrã. Acho que isto pode ser uma proposta interessante.
Mencionou consumidores e empresas, mas, quando falamos do mercado de smartphones, há uma terceira parte – as operadoras de telecomunicações e as lojas de retalho. Qual é a estratégia? Os consumidores também terão os telemóveis Motorola disponíveis na sua operadora ou na loja habitual?
Temos uma estratégia de canal de venda completa. Estamos a abordar ambos os canais. Atualmente, já estamos em duas das três operadoras em Portugal. Fazemos parte do portfólio da Meo e da Vodafone. Também começámos com os retalhistas, como a Worten, a Fnac e a Rádio Popular. A estratégia para os próximos meses é aumentar a nossa capilaridade no País. Não queremos ser um parceiro menor no mercado. Temos de ser humildes e avançar passo a passo. Não interpretes mal a minha mensagem, mas realmente acredito que precisamos de consolidar a posição a cada trimestre. A nossa ambição é ser um parceiro-chave no País. E para isso, temos de abordar ambos os canais: telecomunicações e retalho.
Disse que pretende avançar passo a passo. Tem algum objetivo específico que gostaria de alcançar no primeiro ano ou nos dois primeiros anos de mercado?
A ambição da empresa é ser agressiva em termos de crescimento, mas também consolidar e avançar passo a passo. Existem alguns países na região EMEA onde já temos 15% de quota de mercado. Em Espanha, apresentámos os resultados do segundo trimestre e atualmente temos 6,4%, segundo a IDC. Se analisarmos o crescimento nos últimos seis trimestres, começámos praticamente do zero e conseguimos atingir esta quota de 6%. A abordagem para Portugal é exatamente a mesma. A ambição é avançar passo a passo, mas com um crescimento significativo trimestre a trimestre.
Mas o mercado português é muito mais pequeno do que o mercado espanhol. Isso traz mais desafios na forma como pretendem alcançar esses objetivos?
Honestamente, vejo desafios muito semelhantes, porque é um mercado muito maduro. Já tivemos uma presença no passado e agora queremos recomeçar. Mas, honestamente, estou bastante otimista e sei que vai ser difícil. Vamos ter de trabalhar muito para alcançar os nossos objetivos. Portanto, não estou a dizer que vai ser fácil, de todo. Mas penso que temos de maximizar a nossa proposta de valor em torno do produto. A estratégia da Motorola baseia-se principalmente no produto: ser fiável, fácil de utilizar e dar um valor acrescentado ao consumidor final. Por isso, estou otimista. Temos de trabalhar muito, mas acredito que será uma história de sucesso.
Há algo específico ou único no mercado português que o distinga do mercado espanhol?
Pelo que vemos em estudos e pela nossa experiência anterior noutros fabricantes, os consumidores portugueses têm um grande foco na tecnologia. Creio que dão mais atenção a isso do que outros mercados. Por esta razão, estamos a destacar aquilo que podemos dar ao cliente final pelo mesmo preço em comparação com outras marcas. Não se trata de posicionar a Motorola no segmento de entrada, mas sim de disponibilizar mais especificações pelo mesmo preço. Penso que esta atenção à tecnologia é bastante relevante no mercado português e é algo no qual estamos a focar-nos.
E que tipo de posicionamento no mercado pretendem ter em Portugal? Como é que a Motorola vai equilibrar a acessibilidade de preço com a aposta em smartphones topo de gama?
Essa é a parte mais difícil. Precisamos de algum volume para alcançar capilaridade, mas também queremos estar muito bem posicionados em termos de valor. Acho que temos de tirar partido de ambos. Para mim, a família Edge é essencial, não só no mercado português, mas em toda a região EMEA, porque é onde podemos realmente mostrar o nosso potencial em termos de produto e design. A família Edge é a chave para transmitir a nossa mensagem ao consumidor e conseguir um bom equilíbrio entre volume e valor. Obviamente, a linha Razr tem um apelo mais emocional, permite ligar-nos emocionalmente ao cliente final. Em termos de design, o que posso dizer? É realmente bonito e permite contar uma boa história em torno das cores, texturas e do design. Contudo, a família Edge, que se situa na gama média-alta do nosso portefólio, é, na minha opinião, a mais crucial.
Aqui vai uma pergunta na qual deve apresentar os melhores argumentos que tiver na manga – porque é que um consumidor português deve comprar um smartphone Motorola e não de outra marca?
Vamos oferecer a melhor experiência. Temos uma diferenciação clara em relação a outros fabricantes em termos de design aspiracional, fiabilidade e duração da bateria. Vai tornar a vida mais fácil, digamos assim. Para mim, estes são os aspetos mais importantes da nossa proposta: fiabilidade, durabilidade da bateria e um dispositivo visualmente apelativo em termos de design. São os três pilares principais para nós.
Como vê a adoção dos dispositivos dobráveis nos mercados espanhol e português? Quando pensamos em smartphones topo de gama, existem duas tipologias: os dobráveis, que são mais futuristas, e os telemóveis ultra-premium, como o iPhone 16 Pro, o Samsung Galaxy S24, entre outros. E estão a entrar nesse segmento com um dobrável. Isso representa um desafio adicional? Ou considera que este é um tipo de dispositivo que os consumidores portugueses já estão a comprar?
Em termos de mercado de dispositivos dobráveis, os modelos concha [flip, no original em ingês] são os que estão mais maduros, se é que podemos falar de maturidade neste tipo de categoria, mas, para mim, é a que está mais consolidada, tanto no segmento de consumo, como no segmento empresarial. Portanto, é nesta que estamos a apostar e é uma aposta a longo prazo para a Motorola. Está realmente consolidada no nosso portefólio e acreditamos que vai crescer ano após ano. Para os primeiros utilizadores deste formato, tudo gira em torno do design, mais uma vez. É bastante curioso, porque, para os homens, uma das principais razões pelas quais mencionam este formato é o tamanho, gostam da possibilidade de ter algo mais compacto. É muito interessante, porque há uma abordagem diferente entre homens e mulheres neste tipo de dispositivo, mas, no final, ambos acabam por valorizar os argumentos relacionados com o design. Por isso, vamos continuar a apostar nesta categoria. Esperamos um aumento de vendas ano após ano, e os preços também estão a ser democratizados. Os fabricantes estão a conseguir baixar um pouco os preços. A Motorola lançou este ano dois dispositivos diferentes, o Razr 50 Ultra e o Razr 50, com uma diferença de preço de 300 euros, o que os tornou mais acessíveis. Estamos realmente a apoiar esta categoria.
Estive recentemente no Lenovo Tech World e uma das principais ideias lá é que estamos a viver a revolução da Inteligência Artificial. E, se uma empresa quer estar bem estabelecida nesta revolução, no caso de um fabricante de hardware, precisa de ter uma boa posição em diferentes segmentos como PC e tablets, mas os smartphones são os computadores que todos trazem consigo o dia todo. E é aqui que a Lenovo/Motorola não tem uma presença tão forte como outras marcas. É por isso que a Motorola está a apostar em novos países? Está a preparar-se para esta revolução da IA e precisa de estar nas mãos dos consumidores, não apenas nos portáteis ou nos tablets?
Sem dúvida. Complementa esta experiência 360º para o cliente final, porque, como disseste, o smartphone é o dispositivo que carregamos connosco o dia inteiro. A médio e longo prazo, a ideia é criar sinergias entre PC, smartphones e também tablets. Obviamente, estamos apenas a começar. Para mim, a história da IA ainda não começou verdadeiramente na nossa vida diária, mas estamos claramente a preparar todo o portefólio, ou seja, PC, smartphones e tablets, para avançar juntos nesta jornada da IA.
Outra coisa que vi lá foi o que a Motorola chamou de Grandes Modelos de Ação (LAM na sigla em inglês) – basta dar uma instrução ao assistente digital, a dizer, p.ex., “preciso de ir para casa”, e o assistente, sozinho, abre a aplicação da Uber, seleciona a melhor viagem e, no final, pergunta: “Organizei esta viagem para ti, custa 10 euros, queres aceitar?”. A questão é que, pelo menos por agora, isso só funciona em inglês. A Motorola está a trabalhar para trazer este tipo de assistência inteligente para outros idiomas, como o espanhol e o português?
Isso acontecerá em breve, sem dúvida. É um grande avanço. Estamos atualmente a abrir a fase de testes. E há muitas novidades em torno do conceito de assistente, captura e criação para o nosso Moto AI. Portanto, certamente, isto será disponibilizado noutras línguas. Estamos a testar esta funcionalidade de automatização de tarefas, aumento da criatividade e captação de momentos. Tudo isto está relacionado com a IA. Sem dúvida que será aberto a outros idiomas.
Como é que a Motorola está a adaptar-se à ascensão de funcionalidades baseadas em IA, seja na fotografia ou na assistência por voz? Quais são os vossos planos nesta área?
Os nossos planos passam pelos pontos que mencionaste. Estão principalmente focados na automatização de tarefas. Para mim, esta é a aplicação-chave que precisamos de destacar, mas também envolve criatividade, fotografia e edição de conteúdos. Há ainda muita informação que ainda não está oficialmente divulgada. Voltaremos com uma explicação mais abrangente sobre a direção que estamos a seguir em termos de IA.
Durante os 104 minutos de Aqui, a câmara mantém-se estática, como se estivesse ali esquecida, sem qualquer tipo de movimento. Diante disto, podemos pensar que estamos perante um realizador minimalista europeu, que quer transportar para o cinema a liberdade de olhar dos espectadores de teatro. Mas não.
O realizador em causa é Robert Zemeckis, autor de grandes sucessos de bilheteira, incluindo a saga Regresso ao Futuro e Forrest Gump (aquele que roubou o Oscar a Pulp Fiction, num dos mais consensuais erros históricos da academia).
A imobilidade da câmara de Zemeckis é compensada pelo movimento do que se passa do lado de lá. Não é por a câmara não se mexer que se torna um filme parado. Aliás, a sua ousada lógica de movimento nem se aproxima assim tanto do teatro, afigura-se mais como um desafio tecnológico, algo que Zemeckis gosta e sabe explorar no seu cinema.
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Se tudo tem um tempo e um espaço, em Aqui Zemeckis encontrou um subterfúgio para congelar o vetor espaço e assim debruçar-se plenamente sobre o vetor tempo, tornando-o um ponto de reflexão filosófica e até existencial.
Aqui parte da novela gráfica de Richard McGuire e conta com Eric Roth no argumento, que já trabalhara com Zemeckis em Forrest Gump
Aqui é um multiplot condensado num só enquadramento, em que mantemos o mesmo olhar sobre uma sala de estar americana ao longo de séculos.
Aliás, o filme passa mesmo pelo tempo anterior à construção da moradia, quando os nativos habitavam aquelas terras virgens. Zemeckis salta entre tempos e personagens de forma não cronológica, dando uma ideia de aleatoriedade, que é como quem diz, ao longo dos séculos as preocupações humanas mantêm-se: a vida, o nascimento, a morte, o amor, o desamor, etc…
Não obstante a alternância, acaba por se focar mais numa história familiar, dando protagonismo a Tom Hanks e Robin Wright. Zemeckis, que sempre foi um adepto da experimentação tecnológica, usa software para o rejuvenescimento digital das personagens. O resultado é impressionante, sobretudo em Hanks, que o recoloca na imagem que guardamos dele dos anos 80. O cinema sempre foi feito de pequenos e grandes truques.
Aqui é conceptual e tecnologicamente ousado, cheio de pirotecnia, mas não deixa de ser um bom filme de Natal, daqueles que só os americanos sabem fazer.
Aqui > De Robert Zemeckis, com Tom Hanks, Robin Wright, Paul Bettany > 104 min
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A morte de Jimmy Carter foi anunciada pelo filho, citado pelos meios de comunicação norte-americanos.
Carter assumiu o cargo de 39.º Presidente dos Estados Unidos em 1976 vencendo o então Presidente Gerald Ford por uma margem de votos tangencial e numa América ainda marcada pelo escândalo “Watergate” que forçou o Presidente Richard Nixon a demitir-se.
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Ficou no cargo apenas durante quatro anos.
Em 2002 foi galardoado com o Prémio Nobel da Paz.
É impossível passar 2024 em revista sem destacar Rúben Amorim, a maior figura do ano na área do Desporto e uma das mais destacadas de todo o panorama nacional. O desempenho do treinador português de apenas 39 anos ao longo dos 12 meses que agora terminam foi a todos os níveis notável, não só pelo que conseguiu enquanto esteve à frente da equipa profissional de futebol do Sporting, mas também pelo consequente salto na sua carreira, que o colocou à frente dos destinos de um dos maiores clubes do mundo.
Os resultados do Sporting durante o ano civil de 2024 são praticamente irrepreensíveis e são a prova inequívoca da competência revelada por Rúben Amorim, algo de que já tinha dado prova em 2020/2021, naquela que era apenas a sua segunda época como treinador, quando levara os leões à conquista de um título de campeão nacional que lhes escapava há 18 anos. Na segunda metade da temporada passada, jogando um futebol intenso, extremamente competitivo e competente, o Sporting sagrou-se campeão nacional com mais dez pontos do que o segundo classificado, o Benfica, e 18 face ao terceiro, o FC Porto. Uma época extraordinária, que, ainda assim, contou com os desaires na Taça da Liga (derrota por 0-1) frente ao Sporting de Braga, na Liga Europa, na qual foi afastado nos oitavos de final pela Atalanta e na final da Taça de Portugal, perdida no prolongamento, por 1-2, para o FC Porto. Nada, porém, que retirasse a Rúben Amorim o estatuto de melhor treinador da temporada.
Até trocar Alvalade por Old Trafford, Rúben Amorim só empatou, fora, contra o PSV Eindhoven. De resto, foram 16 vitórias em 17 jogos, com destaque para a goleada ao Manchester City
A segunda metade do ano também não começou bem para o treinador do Sporting, que viu a sua equipa perder (3-4) a Supertaça, outra vez para os Dragões, num jogo em que, aos 24 minutos, vencia por 3-0 e praticava um futebol espetacular. O mesmo que, depois desse tropeção, lhe permitiu arrancar para um primeiro terço de temporada exemplar, com um registo de 16 vitórias em 17 jogos para todas as competições. Até à data em que trocou Alvalade por Old Trafford, Rúben Amorim só empatou, fora, contra o PSV Eindhoven. De resto, foram 11 triunfos consecutivos para a Liga, dois nas Taças, de Portugal e da Liga, e três em quatro jogos para a Liga dos Campeões, com destaque para a goleada de 4-1 sobre o colosso Manchester City. Uma equipa que voltou, entretanto, a vencer no passado dia 15 de dezembro, já ao serviço do United, tornando-se o primeiro treinador, a seguir ao lendário Sir Alex Ferguson, a conseguir triunfar no seu primeiro derby de Manchester.
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Os primeiros tempos em Inglaterra não têm sido tão bem-sucedidos como os últimos dez meses passados em Alvalade. Ainda assim, Rúben Amorim leva um saldo de quatro vitórias em oito jogos, tendo perdido com o Arsenal, o Nottingham Forest, orientado pelo português Nuno Espírito Santo, que está a ser a grande surpresa da Premier League, e, mais recentemente, com o Tottenham. Apesar disso, o antigo jogador do Benfica continua a contar com o apoio incondicional por parte dos adeptos e da esmagadora maioria dos críticos, que lhe reconhecem a capacidade de refundar uma equipa em crise profunda e reconstruir um grupo que, se não já nesta época, pelo menos na próxima possa regressar ao alto galarim do futebol inglês e europeu.
Trunfo viking
Colado ao sucesso de Rúben Amorim esteve, este ano, Viktor Gyökeres, o ponta de lança sueco que carregou, com a sua extraordinária veia goleadora, o Sporting para a conquista do título nacional em maio último. Eleito melhor jogador da Liga, da qual foi também o principal artilheiro, o “homem da máscara” foi outra das grandes figuras do ano desportivo nacional e internacional em 2024. Aos 46 golos apontados nos 56 jogos que disputou em todas as competições (seja ao serviço do Sporting, seja da sua seleção), Gyökeres soma já, na segunda metade do ano que agora termina, o impressionante registo de 31 golos em 36 jogos. Destaque, neste capítulo, para os quatro golos que marcou nas vitórias (5-1) do Sporting frente ao Estrela da Amadora e da Suécia face ao Azerbaijão (6-0), orientado por Fernando Santos. Nota ainda para os dois hat-tricks conseguidos frente ao Farense e, sobretudo, contra o Manchester City, na despedida de Amorim de Alvalade. Enfim, registos impressionantes de um atleta que foi, indiscutivelmente, a grande figura do ano do futebol português dentro das quatro linhas.
Sucesso além-fronteiras
Ainda na área do futebol, 2024 foi também um ano de excelência para o bracarense Artur Jorge, que, em abril, trocou o Sporting de Braga pelo Botafogo do Rio Janeiro. Apesar de ter apenas a conquista de uma Taça da Liga no currículo, foi o escolhido pelo milionário norte-americano John Textor para tentar trazer de volta à glória o histórico clube carioca, talvez entusiasmado pelo sucesso que treinadores portugueses como Jorge Jesus e Abel Ferreira têm conseguido conquistar, nos últimos anos, no futebol brasileiro. E o resultado acabou por sair bem melhor do que a encomenda, com Artur Jorge a conseguir conduzir o Fogão à “glória eterna”, que é como chamam em Terras de Vera Cruz ao feito de vencer, na mesma época, a Taça dos Libertadores da América e o Brasileirão, apenas conseguido, em toda a história do futebol brasileiro, pelo Santos de Pelé e o Flamengo de Jorge Jesus.
Por falar do técnico nascido na Reboleira, este foi também um ano muito especial. O seu regresso às arábias para orientar o Al-Hilal ficou marcado pela conquista do título de campeão da Arábia Saudita, numa época em que viu o seu nome ficar para a história do futebol mundial e no Livro dos Recordes do Guinness, ao se tornar o treinador responsável pela maior série de vitórias consecutivas de uma equipa de futebol, fixando a nova marca em 34 triunfos.
O ano da despedida de…
• Rafael Nadal Aos 38 anos, o espanhol a quem chamam O Rei da Terra Batida, anunciou o ponto final numa carreia notável no ténis mundial, modalidade em que é um dos poucos candidatos ao título de Melhor de Todos os Tempos. Com 103 vitórias em torneios ATP, Nadal foi o primeiro tenista a atingir os 22 triunfos em Grand Slams, os quatro principais torneios do circuito mundial (Roland Garros, Open da Austrália, Wimbledon e US Open). Foi ainda medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Pequim (2008) e do Rio de Janeiro (2016), desta vez em pares.
• Nelson Évora O campeão olímpico do triplo salto em Pequim 2008 anunciou, em novembro, que vai colocar um ponto final na sua carreira em 2025. Com 40 anos, o antigo atleta do Benfica e do Sporting explicou que estava a preparar o corpo da melhor forma para dar “ainda dar uns saltinhos” na época de 2025.
• Telma Monteiro A melhor judoca portuguesa de todos os tempos, com presença em cinco Jogos Olímpicos, medalha de bronze no Rio de Janeiro em 2016, quatro vezes vice-campeã do mundo e detentora de 15 medalhas em europeus, seis das quais de ouro, colocou o ponto final na sua carreira, abraçando, a partir de agora, com 38 anos, o cargo de coordenadora da modalidade no Benfica.
• João Sousa O tenista português terminou a carreira profissional a 3 de abril, aos 35 anos, após perder na primeira ronda do Estoril Open, o único disputado no nosso país e um dos quatro torneios ATP que conquistou na sua carreira, em 2018. A melhor posição do tenista de Guimarães no ranking foi a 28.ª posição, em maio de 2016.
• Filipa Martins Aos 28 anos, a primeira e até agora única ginasta portuguesa a disputar a final do concurso completo (all around) nuns Jogos Olímpicos anunciou, em setembro, o final de uma carreira que, além do 20.º lugar em Paris2024, conta com brilhantes participações em mundiais e europeus e conseguiu que um movimento por si criado, o “Martins”, fosse incluído no Código de Pontuação.
• Pepe Com uma carreira repleta de títulos, o internacional português nascido no Brasil pendurou as chuteiras no final da última época, com 41 anos. Na sua longa carreira de profissional de futebol, destacou-se, sobretudo, ao serviço do FC Porto, do Real Madrid e da Seleção Nacional. Foi campeão nacional em Portugal e em Espanha, venceu três Ligas dos Campeões e foi três vezes campeão da Intercontinental. Por Portugal, venceu o Euro2016 e a Liga das Nações 2018/2019.
• Andrés Iniesta Em setembro deste ano, o futebolista catalão de 40 anos, considerado um dos melhores da história do futebol espanhol, disse adeus aos relvados. Ao longo da carreira, conquistou 35 troféus, 29 ao serviço do FC Barcelona, entre os quais quatro Ligas dos Campeões. Pela seleção de Espanha, foi campeão do mundo em 2010 e da Europa em 2008 e 2012. Prepara-se, agora, para abraçar a carreira de treinador.
Honra olímpica
Apesar das desilusões que representaram as prestações dos atletas em quem eram depositadas maiores esperanças (as do canoísta Fernando Pimenta e do nadador Nuno Ribeiro), a participação portuguesa nos Jogos Olímpicos de Paris2024 igualou, em termos de medalhas, a melhor de sempre (Tóquio2020), mas acabou por ser a mais pontuada da história do desporto nacional. A comitiva portuguesa regressou com uma medalha de bronze – de Patrícia Sampaio, no Judo –, duas de prata – para Pedro Pablo Pichardo, no triplo salto, e Iúri Leitão, na modalidade de omnium, em ciclismo de pista – e uma extraordinária medalha de ouro, conquistada pelo mesmo Iúri Leitão e o seu colega Rui Oliveira, também no ciclismo de pista, mas na modalidade de madison.
Navegadoras a caminho da Suíça
No ano que passou, o futebol feminino voltou a ser totalmente dominado pelo Benfica, que venceu Campeonato, Taça de Portugal, Taça da Liga e Supertaça, viu a sua treinadora, Filipa Patão, estar entre o lote das nomeadas para a melhor do ano da revista France Foot, e sua melhor jogadora, Kika Nazareth, a estabelecer o recorde da maior transferência de sempre em Portugal com a sua contratação pelo FC Barcelona. A nível da Seleção Nacional, 2024 também correu bem ao futebol português, com as Navegadoras a conseguirem garantir o apuramento para a fase final do Campeonato da Europa, que se realizará em julho do próximo ano, na Suíça. Esta será a terceira participação consecutiva, depois da estreia na Holanda, em 2017, e da presença no Inglaterra 2022.
Não sou de tentar adivinhar o ano de 2025. Gosto, no entanto, de anos ímpares. Porque são ímpares. Únicos. Sem igual. Mas daí a pensar que será inimitável ou excecional, vai uma distância impossível de percorrer.
O que sabemos, por antecipação e pelo calendário, é que Trump regressa à Casa Branca no dia 20 de janeiro, que no final de fevereiro haverá eleições na Alemanha e que a paz na Ucrânia e no Médio Oriente continuará difícil de concretizar. Haverá muitas tréguas, eventualmente, mas as hostilidades não se dissiparão em 2025.
2025 será o que tiver de ser, na verdade. Como todos os outros anos passados e futuros. Num segundo, ultrapassamos a barreira formal e psicológica de 24 para 25. Não dói, não espanta, não atemoriza. É uma festa, um foguete, um desejo.
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Por cá, o calendário político será agitado. O Presidente entrará no seu último ano de mandato (até março de 2026), estarão conhecidos e reconhecidos os candidatos às eleições de Janeiro de 26 e, muito antes disso, entre setembro e outubro, teremos as autárquicas – uma espécie de aquecimento das máquinas partidárias que se enfrentarão, por interpostos candidatos, nas Presidenciais. Tudo normal, portanto.
Por curiosidade, perguntei à IA Gemini como será 2025. E ela disse: Tecnologia em alta. Metaverso em expansão. Sustentabilidade em foco. Economia dinâmica.
“Obrigado”, disse eu!
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.
No triste dia em que o Fausto nos deixou, senti-me na obrigação de deixar umas palavras sobre ele nas minhas páginas nas redes sociais. Acabava a dizer “sabia-o doente, mas é sempre um choque quando a morte bate à porta de um amigo, e nem pede para entrar”. A consternação do momento. E antes, elaborava assim: “O que há de tão especial e único no Fausto (notável, como ele gostava de dizer) é o facto de ele ter criado um estilo pessoalíssimo, uma estética inspirada na música de raiz portuguesa, nos ritmos e até instrumentação própria, acrescentando a modernidade da sua forma de tocar a guitarra acústica, também ela pessoal e quase intransmissível. Cimentou esta estética nessa obra-prima chamada Por Este Rio Acima, que está e estará sempre em lugar de honra na história da música portuguesa. Qualquer música.
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De certo modo, ironicamente, o Fausto foi sempre seguindo (e perseguindo) a cartilha que ele próprio criou, com regras estritas e rigorosas, a que pouco fugia. Talvez a aventura dos Três Cantos tenha sido um pouco a excepção, porque entrecruzou três universos, e porque teve a batuta do
Zé Mário Branco a dar-lhe uma unidade comum e particular. Um momento único para nós três, de tão boa memória.”
Não falei ali de O Namoro, que lhe “roubei” e gravei antes de ele próprio o fazer. Muitas vezes, quando a cantava, era tida como minha, e eu próprio a sentia quase como minha. Mas fazia sempre questão de precisar que se tratava de um poema de um angolano, Viriato de Cruz, musicado pelo Fausto. Aquele “Aí Benjamim!” ecoou em muitas salas deste país, e até em Cabo Verde, Angola, Moçambique.
As canções dele (letras e músicas) continuam, e continuarão, a ecoar num lugar especial da nossa sensibilidade.
O Fausto é para durar.
*Sérgio Godinho Músico. Em 2024 percorreu o País com o espetáculo Liberdade
A primeira vez que o vi, ó Nossa Senhora da azinheira, foi no cinema da 7.ª esquadra, em Luanda. O filme chamava-se Rocco e os Seus Irmãos, e Alain Delon, na pele de um pugilista, filho de família operária, era um James Dean sem queixinhas. Nesse cinema ao ar livre – e já Delon peregrinara, entretanto, das mãos (e porventura das pernas) de Visconti para as de Antonioni, coisas a que eu era miúdo demais para ligar pevide –, eis que volto a vê-lo em Le Samouraï, em português chamado com alguma propriedade O Ofício de Matar, que era o que no filme fazia: matar pessoas. À estarrecedora beleza de homem, que já estava em Rocco, juntava-se agora uma virilidade toda entretecida em silêncio e solidão. Mas, sobretudo, costurada com indesculpada e prodigiosa vontade de absoluto. No cinema, só Clint Eastwood é digno de beijar a fímbria deste manto. Com uma diferença, Clint é todo feito em pedra, enquanto Delon é tecido nessa carnal matéria humana de que são feitos os sonhos.
Falei de absoluto e vejam: já essa inquietação fizera Delon fugir de casa aos 14 anos, apanhado num porto francês a querer ir para a América. Aos 16, numa de “Angola é nossa”, foi voluntário para a tropa, batendo com os jovens costados na guerra da Indochina. Lá, vê num cinema Jean Gabin e decide: quer ser actor. Volta a Paris e o esplendor dos seus 20 anos de veterano de guerra trespassa o nascente feminismo: desse “deuxième sexe”, de que falava a Beauvoir, o corpo de Delon foi o promíscuo contentamento. As mulheres amaram-no de cima abaixo, Romy Schneider mais do que ninguém.
De Delon, “o mais cool dos actores” como disse Leonardo Di Caprio, pode dizer-se tudo, que foi rebelde, delinquente, talvez mafioso, mas tem de se dizer que amou Romy com incensurável nobreza. As cartas que ele lhe escreveu, a última a uma Romy já morta, são o testemunho da irrefreável ternura de um samurai. Eis o seu epitáfio: era actor e sabia escrever cartas de amor.
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*Manuel S. Fonseca “Ex-produtor de cinema, ex-cinéfilo (que agora já não vale a pena)”, nas palavras do próprio. Foi fundador da editora Guerra e Paz
Percorreu sem faltas, algo raro, o percurso entre o estatuto de objeto de consumo – e de desejo – dos adolescentes reunidos em torno da revista Salut Les Copains! e do chamado ié-ié francês e a condição de referência da canção francesa capaz de dispensar mais adjetivos. O disco de estreia foi publicado em 1962, o do adeus em 2018. É só fazer as contas… Este último foi como um filho tardio, porque há muito tempo tinha começado o calvário com um linfoma que a levou várias vezes a reivindicar – em vão – a eutanásia. A parisiense fez grande parte do seu caminho musical longe das modas de ocasião, construindo um património sólido, múltiplo, tocante e decisivo, padrão para tantos praticantes e ouvintes. Cantou Brassens e para ela escreveu Gainsbourg. Trabalhou com o omnipresente Benjamin Biolay, mas também com Étienne Daho e Thomas Dutronc, o seu único filho, também ele músico. Escreveu um livro-testemunho sobre a sua luta contra o cancro, um romance chamado L’Amour Fou e uma autobiografia notável, Le Désespoir des Singes… et Autres Bagatelles. Teve papéis de relevo em apenas três filmes, ganhou prémios da crítica e de popularidade. Foi visada em poemas de Bob Dylan e Manuel Vázquez Montalbán, referida em romances de Michel Houellebecq e Paul Guimard, directamente nomeada em canções de Renaud ou do britânico Bill Pritchard. Muito mais do que uma cantora, a história da música – a francesa, mas não só – não será rigorosa, nem tão sedutora, sem ela. “Como dizer-te adeus?” é a pergunta-título de uma das suas canções. A resposta é simples: continuando a ouvir a sua voz, doce e firme, e as suas cantigas, imensas e íntimas. Sempre que possível, sempre que for necessário. Ou seja, sempre.
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*João Gobern Jornalista e comentador. Desde 2015 realiza e apresenta, na Antena 1, o programa Bairro Latino, sobre música francesa, espanhola e italiana