A diminuição da jornada laboral ressurge neste momento em Portugal pela mão do Partido Socialista com a apresentação de um dos seus compromissos eleitorais: a redução da jornada laboral semanal no setor privado para 37 horas e meia. Importa contextualizar para se perceber que importância pode ter esta medida para os trabalhadores e para a economia.
Em 1996, o governo socialista liderado por António Guterres deu um passo importante neste âmbito ao fixar o limite máximo de 40 horas semanais de trabalho. A transição foi feita em duas fases: em 1997, passou-se das 44 para as 42 horas, e no ano seguinte, atingiu-se o objetivo das 40 horas. Na altura, também se levantaram receios: diziam que as empresas sofreriam com os custos, que a produtividade cairia e que o desemprego aumentaria. Nenhum desses cenários se concretizou.
No início deste século a França introduziu o limite de 35 horas semanais de jornada de trabalho. Hoje, duas décadas depois, o debate volta à agenda política com novos dados e novas experiências. O governo espanhol anunciou recentemente a redução da jornada para 37,5 horas semanais. Em Portugal, a Administração Pública já pratica, em quase todas as suas carreiras, as 35 horas semanais, sem prejuízo da produtividade e com ganhos reais na qualidade de vida dos trabalhadores.
Ao longo das últimas décadas, a produtividade aumentou substancialmente graças à tecnologia, à automação e à reorganização do trabalho. No entanto, esses avanços não se refletiram proporcionalmente na vida dos trabalhadores — nem nas suas remunerações, nem na sua disponibilidade de tempo. Mantemo-nos presos a um modelo de 40 horas, que ignora as transformações profundas do mundo laboral e os conhecimentos atuais sobre saúde física e mental.
Reduzir a jornada de trabalho é, acima de tudo, devolver tempo às pessoas: tempo para estar com a família, cuidar da saúde, descansar, estudar, participar na vida cívica. Tempo para viver com dignidade. Experiências realizadas em diversos países mostram que jornadas mais curtas aumentam a satisfação, reduzem os níveis de stress e promovem a saúde mental. Trabalhadores mais felizes são também mais criativos, mais comprometidos e menos vulneráveis ao esgotamento. Esta mudança não beneficia apenas os trabalhadores — beneficia também as empresas e a economia.
Como é que as empresas se vão adaptar? Nas empresas de laboração contínua, a única coisa que é necessário fazer é ajustar os turnos à nova condição em que cada trabalhador terá mais um dia de folga. Nas restantes empresas bastará ajustar o horário de serviço em meia hora. Os ganhos associados a trabalhadores mais saudáveis – porque estão mais descansados – levam as organizações a obter ganhos de produtividade que compensam os custos iniciais.
Acresce a evidência que os mercados de trabalho mais próximos de Portugal, Espanha e França, não só remuneram melhor os seus trabalhadores como têm jornadas de trabalho mais curtas. Ganham mais, trabalhando menos. Neste contexto, a proposta de redução para 37,5 horas semanais — ou seja, apenas meia hora a menos por dia — não representa qualquer ameaça à economia. Pelo contrário: representa um avanço civilizacional, um sinal de maturidade social e uma vitória para os trabalhadores.
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